Discurso durante a 100ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Transcurso dos 30 dias da morte do jornalista Barbosa Lima Sobrinho. Considerações sobre o projeto aprovado na Câmara dos Deputados que institui a chamada "Lei da Mordaça".

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. JUDICIARIO.:
  • Transcurso dos 30 dias da morte do jornalista Barbosa Lima Sobrinho. Considerações sobre o projeto aprovado na Câmara dos Deputados que institui a chamada "Lei da Mordaça".
Publicação
Publicação no DSF de 17/08/2000 - Página 17099
Assunto
Outros > HOMENAGEM. JUDICIARIO.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, BARBOSA LIMA SOBRINHO, JORNALISTA, ELOGIO, VALORIZAÇÃO, NACIONALISMO.
  • CRITICA, DEMORA, SENADO, REALIZAÇÃO, VOTAÇÃO, PLENARIO, PROJETO DE LEI, PROIBIÇÃO, DIVULGAÇÃO, CARACTERISTICA, PROCESSO PENAL, INVESTIGAÇÃO, JUDICIARIO.
  • COMENTARIO, OCORRENCIA, PEDIDO, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE IMPRENSA (ABI), CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), REALIZAÇÃO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, SENADO, OBJETIVO, DISCUSSÃO, PROJETO DE LEI, ANTERIORIDADE, VOTAÇÃO, PLENARIO.
  • CRITICA, POSSIBILIDADE, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, PROIBIÇÃO, DIVULGAÇÃO, IMPRENSA, CARACTERISTICA, PROCESSO PENAL, DEFESA, IMPORTANCIA, GARANTIA, LIBERDADE DE IMPRENSA, PAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, hoje é o trigésimo dia da morte de Barbosa Lima Sobrinho. Trago, mais uma vez, o voto de pesar e de profunda tristeza deste Congresso Nacional exatamente pela morte daquele que, nos três séculos em que viveu - XVIII, XIX e XX -, deixa para nossa geração a mensagem mais pura, mais bela e mais grandiosa de pátria, de nacionalismo e de civismo. Trinta dias de sua morte - parece que foi ontem - e ainda não aconteceu a votação, no plenário, da Lei da Mordaça. O Senador Lauro complicou ainda mais a tramitação ao enviar o estudo com relação ao Presidente da República para os jovens e brilhantes Procuradores. São elogios como esses que estão fazendo aparecer a Lei da Mordaça, lei que a Câmara dos Deputados, em gesto épico, rejeitou quando da Lei da Reforma Judiciária, mas que, lamentavelmente, aprovou num projeto de lei de Presidente.

Há dois projetos na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania: um aprovado pela Câmara dos Deputados, dependendo de apreciação - e como não é emenda constitucional, o Governo fechou questão neste projeto com a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Uma vez aprovado nas duas Casas, a Lei da Mordaça entrará em vigor. O outro é um projeto do Senador Jorge Bornhausen. A diferença entre o que vamos votar e a Lei do Judiciário é que lá as questões eram civis, e aqui incluem questões da área penal, invocam, inclusive, sanções de ordem penal.

Não foi votado lá porque, quando estive no Rio de Janeiro participando de uma homenagem ao aniversário de Barbosa Lima Sobrinho, a OAB pediu-me para requerer audiência pública na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania antes de votar a matéria. Solicitei à OAB que fizesse o pedido por escrito. A OAB, a ABI e a CNBB querem ser ouvidas antes de ser instituída a Lei da Mordaça no Brasil.

O Presidente da Comissão, com muita elegância, concordou. Mas lá se vão três meses. Na época, Barbosa estava vivo, falei com ele, que me fez essa solicitação. Em sua homenagem, a votação não saiu e o Presidente e o Plenário concordaram em convocar uma audiência pública, que não sei quando sairá. E é essa audiência que está trancando a vinda da matéria a plenário e a sua votação.

As manchetes nos jornais são permanentes. Já não se fala na Lei da Mordaça, mas na Lei Fernando Henrique, porque a insistência de Sua Excelência é tão grande que, na verdade, se tornou uma questão pessoal.

Nos últimos acontecimentos, vimos os nossos Procuradores atuando, algo de fantástico. Que me perdoe a grande imprensa, mas o esforço que alguns homens do Governo fizeram para tirar o Secretário-Geral e colocar o Promotor no banco dos réus foi fantástico.

Aliás, O Globo de hoje edita a mesma coisa: “Desvio de verba? Corrupção? Vem aí o xarope Fernando: mordaça!” - e traz o Presidente Fernando Henrique Cardoso colocando a mordaça no Procurador que veio depor na Comissão. Esse tipo de charge envolvendo os Procuradores está quase na média da do Senador Antonio Carlos Magalhães colocando o Presidente Fernando Henrique Cardoso no colo e dizendo: “Calma, filhinho, calma”. Está no mesmo pé de igualdade e de quantidade. Quiseram colocar os Procuradores no banco dos réus.

Tenho obrigação de vir aqui porque bati muito à porta dos Procuradores, da Polícia Federal, da Justiça Federal, do Procurador-Geral. Estou lhes cobrando durante muitos anos.

A Senadora Heloisa Helena, Líder do PT, dizia há pouco exatamente o mal que se chama impunidade pela não punição. A não punição passa pelo delegado que não termina o processo, pelo promotor que não denuncia e pelo juiz que não julga. É claro, tudo isso é fruto de uma irresponsabilidade de uma legislação jurídica por que nós, os Congressistas, somos responsáveis.

Criamos uma lei para não funcionar, uma lei que facilita a liberdade dos “Nicolaus” da vida - na hora em que ia ser preso, dez dias antes, avisaram-no: “Olha, foge que vamos te prender” -, que facilita um “Cacciola” que estava preso e não tinha como não estar. Até hoje não entendo - que me perdoe o Presidente do Supremo Tribunal Federal -, mas sob o argumento de que é melhor deixar livre um dia o cidadão do que um dia preso; soltaram-no por um dia e, quando o Presidente determinou sua prisão no outro dia, ele já havia fugido. Na verdade, quando o Vice-Presidente determinou sua soltura, ele já estava com a passagem, com o passaporte e hoje está em sua terra.

Em meio a tudo isso, em meio a toda essa impunidade, somos obrigados a reconhecer que há um movimento novo, o dos Procuradores, dos jovens Procuradores.

Temos que saudar, dizer hosana, dizer, felizes, “chegou alguém, uma classe começou”. Estava na hora de começar uma revolução, uma revolta, um protesto, um grito, uma rebeldia contra a omissão da burguesia, da elite nossa, por deixarmos as coisas acontecer e não fazermos nada!

De repente, um grupo, singelamente, começou. Gente simples, devagarinho, foi levando adiante; dir-se-ia à revelia do seu chefe. Tenho muito respeito pelo Procurador-Geral, mas não me parece que seja esse o estilo dele. Essa gente começou a aparecer. Deram um show. O que o Sr. Fernando Henrique não perdoa, o que a Fazenda não perdoa é o show que eles deram, porque, no Brasil, a coisa mais difícil é prender gente importante. Na Europa, nos Estados Unidos, é fácil prender gente importante, basta sonegar um centavo, um dólar que se está preso, para explicar depois.

Dois Procuradores, no Rio de Janeiro, acompanhados de dois policiais federais e um escrivão, foram a uma juíza e pediram ordem para entrar nas casas do Sr. Chico Lopes, do Sr. Bragança e do Sr. Cacciola. A juíza deu-lhes a autorização, eles foram lá e entraram nas respectivas casas. Na casa do Chico Lopes, ficaram horas e horas e horas. Estava uma rebeldia. O noticiário dizia que eles já estavam incendiando, queimando, fazendo horrores. Como é que ficaram tanto tempo lá? Depois, verificou-se o porquê: eles pegavam documento por documento, registravam, botavam dentro do envelope, lacravam e assinavam os dois policiais, os dois Procuradores e o escrivão. Levaram tudo isso para o escritório da Juíza, ficando lá trancados à chava. A Juíza chamou os advogados dos cidadãos que tinham tido as suas casas invadidas, para abrir na frente deles.

Chamaram os Procuradores a Brasília. Isso foi manchete na imprensa, e a pergunta era: que punição levarão?

Vim a esta tribuna, dei o meu voto de solidariedade e recebi aparte de vários Líderes e Parlamentares, dando um voto de solidariedade a eles e ridicularizando as notícias de imprensa, dizendo que - e parece ser verdade - eram chamados a Brasília para sofrer punição, porque não podiam fazer isso, sem ordem, sem orientação, sem determinação.

Tenho respeito pelo Procurador-Geral da República e sei que ele tem respeito pelo Senado. A verdade é que vieram aqui e até receberam elogio por parte do Procurador-Geral.

De lá para cá, tem havido uma série de atividades, nesse estilo, feitas por eles. Uma delas foi investigar a vida do Sr. Eduardo Jorge, que é até bonita. É uma atividade bonita de ver. Ele dá até um personagem para uma novela da TV Globo. É um jovem, casa com uma mulher bonita, começa de baixo, se junta a um senador. Esse senador é um revolucionário, no Senado, ele debate, luta. Depois, vai para o Itamaraty, percorre o mundo. Vai para o Ministério da Fazenda. Seu líder é eleito Presidente e ele é o secretário particular de Sua Excelência. Não há nada que não passe por ele. É o chefe da reeleição. E depois diz: “Eu me desiludi. Esta não é a socialdemocracia que eu queria. Queria uma outra socialdemocracia”. Sai de lá, compra uma casa de R$1,2 milhão e vai viver um outro estilo de vida, que deve ser analisado, porque todos falam em lobby, que é algo comentado no mundo inteiro.

Nosso vice-Presidente, Marco Maciel, um homem de bem, excepcional, apresentou um projeto, que considero correto, regulamentando o lobby. O que é o lobby? Ele é feito por pessoas que representam empresas ou por donos de empresas interessadas em projetos ou fatos; essas pessoas circulam abertamente por aqui, andam pelo Congresso. Por exemplo, os produtores de fumo vêm ao Congresso tentar fazer com que a lei que proíbe a propaganda do fumo seja a menos rigorosa possível. É o lobby. Respeitável.

Ele não é isso. Ele cria empresas, não de lobby. Imaginem se o ex-secretário particular da Presidência da República vai fundar um escritório de lobby! Não! É uma questão que tem de ser analisada, tem de ser aprofundada. É um escritório para orientar as empresas a conhecer o Governo por dentro. Isso é muito importante. Nos Estados Unidos, que é o país mestre da comunicação, ninguém tinha se dado conta da importância disso. Lobby, não! Lobby soa falso, soa a dinheiro. Agora, criar uma empresa, no sentido de dizer: “Venham cá, vocês da Souza Cruz, vocês têm que conhecer o Governo, têm que saber como é o Governo. Por exemplo, O Fernando Henrique não fuma, a não ser um charuto de vez em quando. Vocês têm que conhecer o Governo.” Esta é a especialidade do Sr. Eduardo Jorge: orientar o empresário a conhecer o Governo por dentro. E aí facilita as coisas.

Esses Procuradores resolveram avançar, resolveram procurar, resolveram cobrar. E aí, o que acontece? Em primeiro lugar, houve um impacto tremendo com a vinda do Sr. Eduardo Jorge. Ele veio e, na minha opinião, saiu-se bem; tão bem que eu diria que houve um empate de zero a zero. Temos que entender que o Congresso Nacional chama as pessoas para depor, e elas depõem, falam, analisam, e nós ouvimos, escutamos, divergimos, deliberamos - isso é uma coisa. Agora, chamar uma pessoa para debater um aspecto ético-jurídico, se é corrupção ou não, aí tem que haver uma CPI. O cidadão tem de vir jurando dizer a verdade, ou ele vem como ontem e hoje. Hoje, assisti 10% e fui embora. Ontem, fiquei até à meia-noite, a reunião foi fantástica. Eu me perguntava: o que está pensando essa gente que está nos assistindo pela televisão. Hoje, fiquei com vergonha; às 10 horas, eu me levantei e saí, porque eu não tinha o que fazer ali. Os cidadãos, que eram todos responsáveis por tudo o que aconteceu, de repente só faltaram dizer que não sabiam quem era Nicolau. O resto, tudo valia.

Dentro desse contexto, os procuradores estavam agindo. E estavam agindo como? O Sr. Eduardo Jorge disse o seguinte: “Eu estava no gabinete da Presidência como secretário particular do Presidente. Com a morte do Serjão, como não tinham ninguém, fui elevado ao número 2 - o Serjão era o número 2 -, deram-me o comando da campanha”. Ele ficou com o comando da campanha, fez a campanha e, terminada a campanha, não quis ficar. Então, o que ele fez? Durante muito tempo, com muito esforço, com a luta do trabalho dele, ele comprou uma casinha aqui, outra ali, um terreno ali, uma casinha no Rio de Janeiro e depois, pensando já no que ia fazer, vendeu aquela casa, a outra, aquela outra, pegou esse dinheiro e investiu não sei se em um fundo, não sei, uma coisa entre um milhão e duzentos, um milhão e trezentos. Aí resolveu sair do Governo: “Não quero, não é mais a socialdemocracia que eu imaginava”. O Presidente reelegeu-se.

Não é um gesto fácil. Onde vamos ver antecedentes como esse? Quais são os antecedentes que conhecemos? Mais bonito do que esse é o de Che Guevara, que ganhou a eleição, e o Fidel Castro assumiu a presidência. O Che Guevara disse: “Eu já cumpri minha parte em Cuba. Vou fazer minha parte lá em Angola e na Bolívia”.

O Sr. Eduardo Jorge fez a parte dele. Não era a socialdemocracia que ele queria, então, vendeu as casas por um milhão e duzentos, pegou esse dinheiro e comprou uma casa por um milhão e duzentos.

Posso dizer alguma coisa sobre isso que ele está dizendo? Não posso dizer nada. O que ele está dizendo é tudo verdade, absolutamente correto e merece respeito. Ou é tudo mentira! Mas, para investigar uma questão dessa, é necessário abrir as contas do cidadão. Se ele está sob investigação, a fórmula para conhecer é abrir a conta, é investigar. Era o que estavam fazendo os Procuradores. Mas, de repente, passaram a ser maus. Em primeiro lugar, considerei um exagero o que a imprensa estava fazendo. Era um exagero. Batiam, batiam, era a bola da vez, queriam desmontar o Sr. Eduardo Jorge. Admirou-me a competência com que veio e a classe que teve para responder à inquirição sem se deixar levar pela avalanche de boatos e fatos publicados pela imprensa.

De repente, a imprensa deixou de lado o Sr. Eduardo Jorge. Foi a coisa mais engraçada! Após o depoimento, já não se fala mais nele. Agora, os réus são os Procuradores. O caso Eduardo Jorge leva o Governo a rediscutir a Lei da Mordaça. Esta deve ser votada imediatamente. O que é a Lei da Mordaça? É uma coisa fantástica, porque nem na ditadura fizeram isso. É verdade que a ditadura tinha uma censura total. É verdade! É verdade que na ditadura diziam o que podia sair no jornal ou não, o que se podia fazer ou não. É verdade! Mas a ditadura não criou uma lei; teve a vergonha de pelo menos não colocar no papel o que agora está no papel. Eles tinham a censura - o que queriam que saísse saía; o que não queriam que saísse não saía -, mas colocar no papel uma lei como a lei da mordaça, nem no tempo da ditadura. Nem no tempo da ditadura!

E agora o que querem? Querem o seguinte: um delegado de Polícia está examinando um caso; está examinando se o Pedro Simon brigou com a vizinha ou não, se deu uns tapas no fulano ou não, se apanhou ou andou bebendo e fazendo escândalo; o delegado ainda está averiguando; e esse caso deve ser mantido em sigilo, não pode sair na imprensa. Se sai na imprensa, o delegado é culpado, e pode até perder o cargo; ele tem que trabalhar em sigilo. Um promotor recebeu esse dossiê do Pedro Simon, que deveria ser mantido em sigilo, e está sem saber se oferece ou não uma denúncia contra o Pedro Simon. “- É, parece que esse Pedro Simon andou bebendo um pouco demais, parece que ele andou dando uns tapas um pouco fortes demais, parece que quebrou até o braço do cara, parece que há até um laudo mostrando que isso aconteceu. Então, o promotor está com um projeto para apresentar denúncia; e sai no jornal: “O promotor João vai apresentar denúncia contra o Pedro Simon”. Ele pode ser demitido. Pela lei da mordaça, isso não pode acontecer. O promotor tem que manter sigilo.

Aí, o promotor conseguiu manter o sigilo; e chegou à conclusão de que não tem o que discutir, que esse Pedro Simon realmente é réu; e faz a denúncia: “Denuncio Pedro Simon, porque no dia tal estava bêbado, na boate tal, ficou bravo e deu uns tapas - até estou bancando o bacana, porque nem bebo e nem tenho força - no fulano e no beltrano, que foram para o pronto-socorro, e levaram uns pontos...” Denuncia. E chega às mãos do juiz. Então, o juiz está com um processo contra o Pedro Simon, para decidir. E ele vai decidir. Se sair nos jornais que ele está com esse processo, pau nele! Só pode sair a decisão dele; não pode sair uma vírgula a respeito do fato de que ele tem um processo, uma denúncia assinada por um promotor contra o Pedro Simon, que ele vai decidir etc. Isso é sigilo absoluto, é a mordaça absoluta. Quando ele condena o Pedro Simon, essa condenação é o que sai no jornal.

É isso que querem no Brasil. O Brasil, que já é o País da impunidade, o Brasil, que já é o País onde quem vai para a cadeia é só o ladrão de galinha, o Brasil que já é o País que tem mil fórmulas de levar adiante e recorrer e recorrer novamente, este País é que, de repente, quer criar uma lei como essa, quer botar uma espada, quer dizer, o delegado, o promotor e o juiz vão agir, tremendo, com medo de perder a função, de ser demitido ou ir para a cadeia. Perderão toda a liberdade, toda a autonomia, toda a possibilidade de agir, de buscar, de procurar, de ver e de rever; agirão sob o manto do medo e, o que é mais importante, a imprensa passa a não saber de nada. Tudo será jorrado para debaixo do tapete, e não vamos tomar conhecimento de nada. Meu Deus do Céu, que lugar do mundo tem uma lei como esta? De onde copiaram uma lei maldita como essa lei da mordaça? Meu Deus, não consigo entender.

Fico pensando: “Mas o Fernando Henrique...” Será que o homem se transforma e se transforma e se transforma e, de repente, não guarda nada das suas origens? Sempre ouvi falar que nós que temos uma mãe que nos orienta, que nos educa, que nos informa nos bons princípios, nós que, quando crianças, entramos na escola e recebemos, no início, uma boa formação, e que isso nos acompanhará no decorrer da nossa vida. De repente, vejo o Fernando Henrique, o meu Fernando Henrique, que eu adorava, que eu achava o homem mais preparado para ser Presidente da República, um homem extraordinário, de cultura, de capacidade, ser o defensor da lei da mordaça, isso não consigo entender. A CNBB, a OAB, a ABI, qualquer outra entidade são, por unanimidade, contra. Por que não fazem o contrário? O que é que pune mais? O que é mais grave? Por que não colocam mordaça na imprensa, então? Por que não têm coragem de colocar? Se o delegado, o promotor e o juiz não podem, então o jornalista também não pode. Por que não fazem isso? Porque eles têm medo da imprensa. A imprensa publica. E acho que é uma grande conquista a imprensa livre, embora muitas vezes a imprensa faça injustiças, embora muitas vezes a imprensa cai no exagero que não dá para entender, embora muitas vezes seja difícil recuar, embora muitas vezes brinquem com a honra do cidadão. Mas daí a defendermos mordaça na imprensa?

O que eu defendo - e o Governo não consegue votar - é que a imprensa deve nos dar o direito de resposta. Não adianta, numa página, chamar o deputado João da Silva disso e daquilo, e ele ir à tribuna, responder e sair na carta ao leitor sua resposta em duas linhas: “Recebemos uma carta do deputado João da Silva dizendo que não é verdade o contexto das páginas 5, 6, 7, 8 e 9.” Aí é duro. Isso eu acho que deve ser analisado. Não que a imprensa não publique. Não é amordaçar a imprensa! Pelo amor de Deus, jamais! Não aceitarei, jamais, qualquer tipo de censura à imprensa, mas defendo o direito de o cidadão se defender, a chance que ele tem de resposta.

Para mim, a imprensa é uma maravilha. Essa TV Senado caiu do Céu, porque pode não ser como deveria, um canal aberto - e acredito que será -, mas não há lugar em Brasília que não tenha 20, 30, 40, 70, 80 pessoas que a assistam e a divulgam. Em mais de uma oportunidade em que falaram coisas que não eram verdadeiras a meu respeito, avisei - e era lá no meu Estado, o Rio Grande do Sul; eu, candidato - e disse: “Meus amigos, eu gostaria que vocês, às quatro horas da tarde de quarta-feira, assistissem à TV Senado, porque, entre quatro e seis horas, vou ocupar a tribuna e vou responder sobre isso que a televisão noticiou.” Recebi milhares de respostas. E foi impressionante. Mas e os que não têm nem isso? Com isso o Governo não se preocupa, porque a imprensa, de um modo geral, é a favor dele.

Vamos fazer essa reunião pública, essa audiência pública, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, sobre a Lei da Mordaça. Talvez seja esse o último pedido atendendo a uma solicitação escrita, quando ainda era vivo Barbosa Lima Sobrinho. Vamos debater, vamos analisar inclusive os mínimos detalhes! Alguns são muito otimistas, porque pensam que o mais difícil já conseguiram. A Lei da Mordaça passou na Câmara e, agora, está aqui no Senado. Pensam que no Senado é mais fácil, porque como nós, Senadores, somos mais reacionários, mais vaidosos - muitos de nós foram Governadores, Ministros -, temos mais a perder e, por isso, vamos votar a favor desse projeto. Eu, porém, dou-me conta de que não. Os que estão pensando assim estão enganados. Fomos nós, Senadores, que aprovamos o projeto de lei que acaba com o sigilo bancário e que ainda não se transformou em lei porque está parado lá na Câmara dos Deputados. Nós, Senadores, atendendo a pedido do Supremo, aprovamos o projeto segundo o qual não é preciso licença do Senado para processar Deputado. Contudo, a matéria está parada lá na Câmara dos Deputados. Nós, Senadores, já votamos o projeto que proíbe Senador de nomear parente no seu gabinete, o qual também está parado na Câmara. Então, não pensem alguns que, porque o Projeto da Mordaça passou lá, também vai passar aqui com facilidade.

Saio daqui para ir à missa do meu amigo, cristão fervoroso, Barbosa Lima Sobrinho. Seria muito bom se ele conseguisse comover o nosso Presidente Fernando Henrique Cardoso, a fim de que ele ou orientasse a sua Bancada no sentido de rejeitar o projeto, ou retirasse o próprio projeto.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/08/2000 - Página 17099