Discurso durante a 103ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Necessidade de pesquisas e debates sobre os "organismos geneticamente modificados".

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • Necessidade de pesquisas e debates sobre os "organismos geneticamente modificados".
Publicação
Publicação no DSF de 22/08/2000 - Página 17210
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • COMENTARIO, APREENSÃO, POSSIBILIDADE, RISCOS, SAUDE, POPULAÇÃO, PAIS, ADOÇÃO, ALTERAÇÃO, GENETICA, ALIMENTOS.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, ANALISE, BENEFICIO, PREJUIZO, SAUDE, POPULAÇÃO, POSSIBILIDADE, APOIO, COMBATE, FOME, ANTERIORIDADE, CONSUMO, ALIMENTOS, PRODUTO TRANSGENICO.
  • SOLICITAÇÃO, COMISSÃO DE ASSUNTOS SOCIAIS (CAS), PROVIDENCIA, INVESTIGAÇÃO, BENEFICIO, PREJUIZO, ADOÇÃO, PRODUTO TRANSGENICO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, não poderia me abster de opinar sobre a questão dos chamados organismos transgênicos. Por isso, proponho ao Senado um maior aprofundamento sobre essa questão, pois os transgênicos podem trazer riscos para a sociedade. Como sabem os Senhores e as Senhoras Senadoras, os “transgênicos” ou Organismos Geneticamente Modificados são os produtos resultantes da manipulação genética de vegetais e animais. Desde 1952, quando uma descoberta científica permitiu isolar os mecanismos responsáveis pela hereditariedade, a chamada Biotecnologia tem avançado muito, trazendo impactos para a saúde, agricultura e pecuária, para citar apenas três.

Na saúde humana, o benefício mais conhecido é o da produção de insulina humana para o tratamento da diabetes, a partir de uma bactéria que recebeu o gene humano. Para a pecuária, o fenômeno “Dolly”, há poucos anos, assombrou e maravilhou o mundo, com a clonagem de um animal daquele porte. Faço essas reflexões para antecipar aos Senhores e às Senhoras que, em tese, não sou contra os avanços potencialmente trazidos pelos transgênicos, pois eles são frutos de descobertas científicas de grande potencial benéfico.

Entretanto, Senhoras e Senhores Senadores, a ciência e particularmente o seu subproduto tecnológico, não estão dissociados de escolhas econômicas e escolhas políticas. Um exemplo disso é que todo o avanço representado pela chamada “revolução verde” na agricultura não foi capaz de acabar com o fenômeno da fome entre populações de países africanos, asiáticos, latino-americanos - e particularmente, não foi capaz de acabar com a fome entre nós, no Brasil.

Assim sendo é que rejeito qualquer defesa incondicional dos transgênicos, simplesmente pelo fato de eles incrementarem a produção agrícola e, assim, possibilitar a produção de alimentos para toda a população do planeta.

No caso específico dos organismos transgênicos que estão em vias de serem testados, plantados e comercializados no Brasil, chamo a atenção para a semente de soja Roundup Ready (RR), da empresa fabricante de pesticidas e defensivos agrícolas Monsanto. Há denúncias de entidades de defesa do meio ambiente de que essa empresa estaria pressionando as autoridades brasileiras para aprovar essa variedade de soja em função da posição estratégica do Brasil no mercado mundial. Por ser o Brasil um dos maiores produtores mundiais, enquanto a soja transgênica não for plantada aqui, a multinacional terá dificuldade de impor a soja RR ao mundo. O problema para a Monsanto está na resistência dos consumidores europeus a alimentos transgênicos. Alguns fabricantes europeus de alimentos estariam dispostos até a pagar mais por soja não modificada geneticamente.

Enquanto isso, mesmo aprovada a soja transgênica pela CNTBio - Comissão Técnica Nacional de Biossegurança, a pertinência dessa aprovação vem sendo questionada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e pelo Instituto de Defesa do Consumidor (IDEC). Este último, por sinal, obteve liminar na Justiça contra a permissão concedida pelo CNTBio.

As alegações da SBPC, do IDEC e do Greenpeace, assim como de outras entidades de defesa do meio ambiente e do consumidor alertam para os riscos trazidos tanto para os seres humanos quanto para o meio ambiente como um todo. Afirmam as entidades que há risco de poluição genética e ambiental e de aumento na utilização de produtos químicos, com a crescente dependência destes, pois tanto a semente geneticamente modificada quanto o herbicida são produzidos pelo mesmo fabricante.

No caso em questão, a soja RR é resistente ao herbicida de mesmo nome fabricado pela Monsanto. A vantagem oferecida é a de se poder usar o defensivo agrícola quando a planta da soja já estiver bem desenvolvida sem matá-la, exterminando apenas as ervas daninhas. Essa resistência da soja ao herbicida, por sua vez, só foi possível com a modificação genética que introduziu uma bactéria no gene da soja que a torna resistente a esse veneno específico.

Aí é que entram as críticas e ponderações dos defensores de um ambiente saudável e dos direitos do consumidor:

Até que ponto sementes geneticamente modificadas não “contaminarão” - pelo processo de polinização - outras plantas, tornando-as, também, mais resistentes a herbicidas?

Que impacto o uso de variedades tolerantes aos herbicidas têm sobre o solo e sobre as águas? E como afetam as comunidades microbiológicas? Que conseqüências terão para os nutrientes?

Que conseqüências trarão para a saúde humana?

Þ experimentos já demonstraram que vacas alimentadas com soja modificada produzem leite com maior teor de gordura;

Þ do mesmo modo, aumentam a produção de estrógenos, que são os hormônios femininos responsáveis pelos desenvolvimento dos caracteres secundários;

Þratos alimentados com batatas geneticamente modificadas tiveram o sistema imunológico abalado;

Þ reações alérgicas foram registradas em pessoas que ingeriram um tipo de feijão modificado com genes da castanha-do-pará.

Do ponto de vista internacional a discussão tem sido muito intensa. Nos Estados Unidos, há uma vasta produção de alimentos transgênicos, com aprovação do famoso FDA (Federal Drug Administration). Mas mesmo lá, existe contestação do rigor do FDA, como por exemplo, de que as empresas fabricantes de defensivo auditadas são poucas em relação ao número total; ou de que há contaminação em inúmeros alimentos comercializados.

Já na Europa, exceto na Inglaterra, há resistências aos transgênicos. Na Inglaterra, por sinal, mesmo o Primeiro Ministro Tony Blair tendo se pronunciado a favor, o Príncipe Charles - reconhecido mundialmente por sua defesa das causas ecológicas - protestou, o que pode ter impacto sobre a atitude dos consumidores do Reino Unido.

Na França, por exemplo, há resistência dos consumidores e, com a obrigatoriedade de rotular os produtos de origem transgênica, pode haver prejuízo para os produtores que utilizem sementes modificadas.

O Parlamento Europeu já determinou um seguro obrigatório e normas rigorosas de responsabilidade civil para as companhias detentoras de tecnologia transgênica.

Aqui, próximo a nós, na Argentina, já existe grande produção de soja transgênica e há uma forte pressão para que os nossos plantadores de soja adotem essa tecnologia. Sem dúvida, levando-se em conta a economia feita na ponta do lápis com a plantação - fala-se em custo 35% menor que o cultivo de semente normal - pode haver vantagens. Mas com atitudes como a dos consumidores europeus, de recusa de comprar produtos transgênicos, pode haver um grande prejuízo, em vez de lucro, pois aí não haveria para quem vender. Um exemplo disso é a proibição européia de importação de produtos com genes resistentes a antibióticos, inseridos em algumas culturas transgênicas.

No Brasil, mesmo com a associação da Embrapa com a Monsanto para experiências com a soja transgênica, há resistência, como por exemplo nos Estados do Paraná e do Rio Grande do Sul; neste último, tramita um projeto de lei decretando o Rio Grande do Sul território livre de transgênicos. Aqui no Senado - projetos da Senadora Marina Silva e do Senador Carlos Patrocínio - e na Câmara há propostas que vão da obrigação de rotular os produtos transgênicos à proibição total do cultivo de tais sementes em território brasileiro.

Sei que é grande a pressão exercida pelas empresas do segmento do agribusiness para a liberação dessas culturas. Assim como sei dos riscos que a adoção dessa tecnologia, sem medir os possíveis danos, é uma temeridade.

Assim sendo, Senhoras Senadoras e Senhores Senadores, apelo à Comissão de Assuntos Sociais para que atente para o perigo potencial e tome as medidas necessárias para que o Senado se inteire dos riscos e possa se pronunciar adequadamente a respeito do tema.

Por ora, reservo-me o direito de ter reservas à adoção dessas tecnologias. Creio que é necessário muito mais tempo para podermos comprovar se os transgênicos não ameaçam o meio ambiente nem a vida de nossa população.

Era o que tinha a dizer.

 


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/08/2000 - Página 17210