Discurso durante a 114ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Prejuízo causado ao Brasil pelo modelo de privatização adotado pelo Governo Federal, sobretudo quanto aos serviços de utilidade pública.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • Prejuízo causado ao Brasil pelo modelo de privatização adotado pelo Governo Federal, sobretudo quanto aos serviços de utilidade pública.
Publicação
Publicação no DSF de 06/09/2000 - Página 17724
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, ADOÇÃO, MODELO, PRIVATIZAÇÃO, SERVIÇO, UTILIDADE PUBLICA, EFEITO, INEFICACIA, SETOR, TELEFONIA, FORNECIMENTO, ENERGIA ELETRICA, PRECARIEDADE, RODOVIA.
  • CRITICA, GOVERNO FEDERAL, CONCESSÃO, EMPRESA PRIVADA, EXPLORAÇÃO, SERVIÇO, UTILIDADE PUBLICA, GARANTIA, AUMENTO, TARIFAS, EFEITO, PREJUIZO, CIDADÃO, PAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, quero trazer a esta Casa algumas breves reflexões sobre as conseqüências nefastas da privatização em massa dos serviços de utilidade pública. Principalmente, a conseqüência imediata, na forma de tarifas escorchantes, que vêm sendo pagas, dolorosamente, pela população.

            A privatização da telefonia, da distribuição de energia elétrica, de rodovias, foi uma das grandes bandeiras do atual Governo. Foram feitas promessas à Nação de que as privatizações trariam mil benefícios, mil benesses. Quem se opunha às privatizações, como foi o nosso caso, a Oposição, era tachado de atrasado, acusado de combater a “modernidade”.

Agora, estamos vendo as conseqüências das privatizações: um modelo de privatização mal formulado, apressado, procurou atrair grupos investidores privados embutindo nos contratos de concessão a garantia de reajustes anuais generosos, amarrados a índices de inflação. Realmente, atraídos por essa garantia de reajustes anuais automáticos, os investidores ofereceram altíssimos ágios para ganhar os leilões de privatização. Pelas telefônicas, pagaram 22 bilhões de reais, o dobro do preço estimado.

Está se revelando, agora, porque pagaram tanto: os reajustes de tarifa, anuais e automáticos, garantem-lhes lucros fabulosos. Reajustes que são negados ao trabalhador, pois, segundo o Governo, isso poderia trazer de volta a inflação. Ora, Sr. Presidente, o que está trazendo de volta a inflação, em boa parte, são os reajustes dados pelo Governo, por obrigação contratual, às empresas privadas que compraram as telefônicas, as distribuidoras de energia elétrica e as rodovias.

O Governo caiu numa armadilha e levou consigo o consumidor brasileiro dos serviços dessas empresas. A principal bandeira do Governo, a estabilidade dos preços do Plano Real, está sendo desmoralizada por erros grosseiros do próprio Governo.

E não só pelo que ocorre com os preços desses serviços podemos detectar os erros da privatização. Há outros aspectos que revelam a fraqueza do modelo adotado. Os grandes ágios obtidos nos leilões de privatização deveriam servir, segundo o Governo, para reduzir a dívida pública. O que vemos é bem diferente: o endividamento público, desde a posse do Presidente Fernando Henrique Cardoso, em janeiro de 1995, saltou de 60 bilhões de reais para 500 bilhões, por causa das altas taxas de juros impostas pela política econômica do Governo, com o objetivo de estabilizar os preços. Preços que, como vemos, estão sendo desestabilizados por iniciativa do próprio Governo. Os conhecidos 22 bilhões de reais que renderam os leilões das telefônicas estatais só bastaram para pagar 2 meses de dívida pública.

            E tem mais: na verdade, o ágio pago pelos grupos privados que arremataram as estatais, nada custa para eles. Isso mesmo: esse ágio, que agora vem sendo pago pelo pobre consumidor brasileiro, sai de graça para esses grupos privados, porque eles podem descontá-lo do Imposto de Renda. Um estudo elaborado pela Receita Federal indica que, com isso, apenas com a venda de duas estatais paulistas, a Telesp e a Companhia Paulista de Força e Luz, os cofres públicos perderão 1,4 bilhão de reais de impostos, perdoados porque o investidor teve a despesa com o ágio. Esse valor é 4 vezes maior que a cobrança da CPMF sobre todas as operações na Bolsa de Valores de São Paulo, em 1998.

Além de acusar a Oposição de atrasada, por se opor a esse modelo de privatização que lesa o patrimônio nacional, o Governo nos ridicularizava sempre que apontávamos a importância estratégica de o Estado deter o controle de setores sensíveis como são as utilidades públicas. Duas notícias recentes demonstram que nós, da Oposição, estávamos firmemente plantados na realidade quando falávamos do fator estratégico.

            Uma notícia é a que se refere à ameaça de falta de geração de energia elétrica no País, a partir de 2001. O Governo montou um programa que prevê a construção, pela iniciativa privada, de dezenas de usinas geradoras termelétricas. Mas os grupos privados relutam em embarcar no programa, em assumir os riscos. As únicas usinas garantidas são as 10 termelétricas a serem construídas pela Petrobras, ela sim, ainda, felizmente, sob controle estatal. O domínio estratégico do Estado sobre o gás natural poderá nos salvar de uma catastrófica crise de falta de energia elétrica.

A segunda notícia nos vem dos Estados Unidos. Lá, a empresa estatal alemã de telefonia, a Deutsche Telekom, quer comprar uma empresa telefônica americana, a Voice Stream. Já surgiu uma forte oposição organizada no Senado norte-americano, que condena essa compra, preocupada com a segurança nacional. Os senadores dizem que não se pode deixar em mãos de governos estrangeiros um setor estratégico como o de telecomunicações. Curiosamente, essa posição parece eco do que falava, em 1998, a esquerda brasileira, acusada de atrasada. Aqui, no Brasil, nosso Governo cansou de permitir que estatais estrangeiras comprassem empresas brasileiras de telefonia e de energia elétrica, criando um perigo estratégico potencial para o País.

Sr. Presidente, alguns desses tópicos, sobre os quais estou discorrendo, foram muito bem apresentados em matéria do jornal Correio Braziliense, de Brasília, em sua edição do dia 20 de agosto próximo passado. Lá está perfeitamente ressaltado o sacrifício do pequeno consumidor de energia elétrica e de serviços telefônicos, que não tem reajustes em seus modestos rendimentos, mas tem que pagar pelos reajustes inflacionários que o Governo garantiu ao arrematantes das estatais.

Os preços desses serviços, telefone, energia elétrica, pedágio de rodovias, estão altos demais para o bolso do brasileiro. Em alguns casos, as tarifas sofreram reajustes espantosos. Em Brasília, a assinatura básica de serviço telefônico residencial custava 3,73 reais, em janeiro de 1997. Em junho daquele ano, com a Telebrasília sendo preparada para a privatização, houve um salto para 13,81 reais. Em agosto de 1999, a assinatura passou para 16,14 reais. Agora, está em 19,77 reais, a serem pagos mensalmente mesmo que o telefone não seja utilizado.

            No final do mês de agosto, a Rede CELPA- Centrais Elétricas do Pará, aumentou de 16,11% o preço da energia ao consumidor no meu Estado. A direção da CELPA, que foi privatizada no primeiro mandato do Governador Almir Gabriel, anunciou que o aumento concedido é escalonado, estando isento ou pagando menos os consumidores de baixa renda. Ao verificar isso com detalhes, pudemos constatar que a faixa de isento compreende um número muito pequeno de consumidores, cerca de 7%. Além desses, faixas intermediárias pagaram aumento menor, de 8 e 12%, portanto, índices ainda acima da inflação prevista para este ano. O restante, que equivale a 80% dos consumidores, pagarão a totalidade do aumento. Ou seja, o escalonamento é uma enganação.

Além de o Governo assegurar reajustes inflacionários aos serviços privatizados, em muitos desses novos contratos de concessão as tarifas estão atreladas ao IGPM, um índice que vem atingindo valores superiores aos dos índices que medem a inflação ao consumidor. Veja-se o absurdo, Sr. Presidente: não só o serviço é reajustado, o que é negado ao salário do trabalhador, como é reajustado acima da inflação!

Apesar de o Governo não revelar os números, devem ser enormes os lucros que estão sendo auferidos pelos arrematantes privados das estatais. Há uma saída para essa situação: fazer como fez o governo trabalhista do Reino Unido, chefiado por Tony Blair. Há 3 anos, quando constatou que o modelo de privatização lá adotado havia propiciado lucros excessivos aos grupos privados que compraram as estatais, o Governo inglês impôs um Imposto de Renda extraordinário sobre esses lucros. É um conceito tributário perfeitamente defensável e que poderia ser acolhido por nosso Governo, caso ele tivesse coragem política e interesse em defender os brasileiros. E não se diga que Tony Blair é da esquerda atrasada: ele pertence à chamada Terceira Via, tão elogiada teoricamente por Fernando Henrique Cardoso.

            Sr. Presidente, infelizmente esta é a situação nas nossas empresas estatais privatizadas: os reajustes inflacionários negados aos brasileiros são generosamente concedidos aos grupos privados que as compraram, às expensas do explorado consumidor de seus serviços. Todos sabemos dos esforços do Governo, por meio do então Secretário da Presidência, Eduardo Jorge, para convencer o Tribunal Regional do Trabalho, presidido pelo juiz fugitivo Nicolau dos Santos Neto, a não conceder aos trabalhadores brasileiros a atualização dos seus salários. Ao mesmo tempo em que fazia isso, esse Governo permitiu a correção das tarifas púbicas pela inflação e por índices até mesmo superiores à inflação. Dois pesos e duas medidas, usados contra o povo brasileiro. Povo em defesa do qual esta Casa deve sempre estar atenta e disposta a agir.

Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/09/2000 - Página 17724