Discurso durante a 119ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise da proposta de emenda à Constituição que trata da Reforma do Poder Judiciário.

Autor
Bernardo Cabral (PFL - Partido da Frente Liberal/AM)
Nome completo: José Bernardo Cabral
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA JUDICIARIA.:
  • Análise da proposta de emenda à Constituição que trata da Reforma do Poder Judiciário.
Aparteantes
Agnelo Alves, Jefferson Peres, José Alencar.
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/2000 - Página 18642
Assunto
Outros > REFORMA JUDICIARIA.
Indexação
  • DEBATE, REFORMA JUDICIARIA, RECEBIMENTO, SUGESTÃO, MEMBROS, TRIBUNAIS, EXPECTATIVA, AUDIENCIA, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, DEPOIMENTO, PRESIDENTE, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB).
  • DEFESA, ORGANIZAÇÃO, AGILIZAÇÃO, JUSTIÇA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, POPULAÇÃO CARENTE, SOLICITAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, SENADOR.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, está na ordem do dia, não dos nossos trabalhos, mas na pauta do interesse da sociedade a Proposta de Emenda à Constituição que trata da Reforma do Poder Judiciário. Vários são os colegas que me têm falado sobre a matéria, e mais recentemente o eminente Senador José Alencar, com relação a assuntos do seu Estado.

Essa é uma matéria que deve merecer alta reflexão. É preciso conduzi-la tendo em mente que o Poder Judiciário deve sofrer modificações estruturais e não apenas no sentido daquela linearidade, aqui e acolá, como se fosse matéria conjuntural.

            O assunto tem-me chegado à mão de várias partes do País, inclusive em conversas pessoais com Ministros do Supremo Tribunal Federal, do Superior Tribunal de Justiça, do Tribunal Superior do Trabalho, do Superior Tribunal Militar e de alguns Tribunais Federais e Regionais. Tudo isso está sendo feito com a experiência, sem falsa modéstia, de quem, quando foi Relator da Assembléia Nacional Constituinte, conseguiu examinar 62 mil emendas. E não é possível que se trate o assunto apenas com a idéia de se pegar o palco iluminado, ao invés de se ficar na platéia obscura.

Tenho-me recusado a dar entrevistas sobre o assunto. Entendo que é preciso uma maior maturação. No entanto, isso não exclui que, no momento devido, alguns colegas - já, de logo, cito dois que ficaram muito preocupados, sem desmerecer os demais: Senadores Amir Lando e José Alencar -, reúnam-se, sobretudo na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, sob a Presidência do Senador José Agripino, para que possamos ouvir os interessados, inclusive o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Reginaldo de Castro, uma vez que se deve auscultar a opinião de vários segmentos.

            Ainda ontem, a preocupação das Presidências do Tribunal de Justiça e do Tribunal Regional Eleitoral do meu Estado foi altamente válida porque este País não pode ficar apenas ao sabor de algumas susceptibilidades que retirem de outros órgãos a circunstância local que deve ser apreciada. Sei que não será uma matéria fácil, como aconteceu na CPI do Judiciário, sob a Presidência do Senador Ramez Tebet e Relatoria do eminente Senador Paulo Souto, mas não deverá apenas ficar encerrada na figura de um Senador.

O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT - AM) - Permite-me V. Exª um aparte, eminente Senador Bernardo Cabral?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Proponho-me desde logo, como tenho feito, a ouvir vários colegas, entre os quais o Senador Jefferson Péres, a quem concedo um aparte neste momento.

O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT - AM) - Senador Bernardo Cabral, agrada-me ouvir V. Exª, que recebeu a honrosa incumbência de relatar a Reforma do Judiciário, dizer - e não se poderia esperar outra coisa - que agirá com toda a tranqüilidade e responsabilidade que o trato desta matéria está a exigir. É uma das mais importantes reformas a serem feitas nesta Legislatura e foi amplamente debatida na Câmara. Contudo, isso não justifica, Senador Bernardo Cabral, nenhum açodamento. V. Exª faz muito bem em reabrir o debate, uma discussão ampla com a sociedade. Um homem com a sua experiência só poderia agir dessa maneira. Ainda, Senador Bernardo Cabral, que tenha de retornar à Câmara, que atrase por dois anos, vamos fazer a reforma que o País está esperando de nós. Meus parabéns a V. Exª.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Agradeço ao eminente colega de representação, Senador Jefferson Péres. Trilhamos o mesmo caminho: não é possível imaginar que se possa fazer uma reforma do Poder Judiciário em que não se ataquem a fundo problemas de recursos e de estatística como a que, ontem, me chegou à mão, revelando que, no ano passado, só o Tribunal Superior do Trabalho julgou mais de um milhão de processos. Isso inviabiliza qualquer Justiça bem feita, distribuída regularmente, organizada.

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Ouço, com muito prazer, o Senador José Alencar.

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Eminente Senador Bernardo Cabral, digo o mesmo que acabou de externar em seu aparte o eminente Senador Jefferson Péres. De fato, V. Exª está de parabéns pela forma como deseja tratar esse assunto de importância fundamental para o País. Há alguns pontos da Reforma Judiciária que foram objeto de modificações estaduais isoladas, como o Tribunal de Alçada, já unificado ao Tribunal de Justiça em quase todos os Estados. Três Estados ainda o mantêm: o meu Estado, Minas Gerais; o Paraná e São Paulo. Em todos os outros eles estão unificados, com grande proveito não só para a eficiência da Justiça propriamente, como também na economicidade com que passam a ser operados. Tenho em mão, e gostaria de passar a V. Exª, um ofício assinado pelo eminente Presidente do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, Juiz Tybagy Salles de Oliveira, e também um artigo muito importante, que aborda exatamente a unificação da Segunda Instância. O ofício assinado pelo Presidente do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, de forma sucinta mas muito objetiva, trata da unificação desses tribunais. Quero reiterar o meu apreço por V. Exª e o reconhecimento de que esse projeto, recebido da Câmara por V. Exª, está em boas mãos no Senado. É, de fato, matéria que deve ser cuidada sem açodamento e com o maior respeito, até mesmo ouvindo-se, como V. Exª disse, o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil e outras autoridades do setor. Meus parabéns. Agradeço a V. Exª pelo aparte que me concedeu e desejo-lhe muita boa sorte nesse trabalho de grande significação que realizará.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Senador José Alencar, em primeiro lugar, agradeço a V. Exª o registro que faz da minha atuação. De logo adianto-lhe que esse material que recebeu do Presidente do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais será anexado ao que me está chegando à mão e examinado com o carinho que V. Exª merece.

Devo dizer, Sr. Presidente, que, aos dezessete anos de idade, tive um irmão, moço ainda, na casa dos vinte anos, brutalmente assassinado. Esse, talvez, tenha sido o motivo pelo qual ingressei no curso de Direito: acusar o matador do meu irmão. Levado a três julgamentos, foi o réu condenado, e, a partir daí, convivi - e já se vão mais de quarenta anos - com o Poder Judiciário.

            Costumo dizer, Sr. Presidente, que conheço muito bem o Poder Judiciário por dentro para me impressionar com as críticas que a ele fazem pelo lado de fora. Desse modo, com essa trilha e com essa determinação, ouvindo os meus colegas - não só aqueles que militam no foro mas também os que têm uma experiência de vida e são diplomados pela universidade da experiência -, acredito que devamos colher o material necessário, indispensável e, diria até, inadiável, para que se possa dar ao povo brasileiro aquilo que reclama: uma Justiça mais rápida - Rui Barbosa dizia, há mais de oitenta anos, que a Justiça brasileira era tardinheira, que tardava e custava muito dinheiro. Dessa forma, terminar-se-á com a pior das frases que conheço para quem não sabe defender os seus direitos: “É melhor um péssimo acordo que uma boa demanda.” Isso contraria tudo aquilo que deve haver na mão de cada cidadão que quer fazer valerem os seus direitos, sem dobrar-se aos que, eventualmente, estejam no poder para esmagar as suas necessidades. E é aí que a Justiça tem que entrar, a Justiça acessível aos mais necessitados, aos chamados “pobres”, a fim de que se acabe com aquela história dos três pês, os quais me recuso a repetir para que não se traga a este debate, mais uma vez, a chamada demagogia barata.

Sr. Presidente, a minha intenção é recolher o apoio de todos os meus colegas que aqui se encontram, dos que já sofreram na pele injustiças em função de uma Justiça mal distribuída, para chegarmos a bom termo.

Desta vez, não se pense que o Senado vai ser apenas uma Câmara Alta que registra ou banca o cartório que reconhece firma. Vamos fazer as alterações que entendamos devam ser feitas, ainda que a matéria tenha que voltar à Câmara e se demore um pouco mais. Nessa hora, a pressa é - vale mais uma vez o registro - inimiga da perfeição.

O Sr. Agnelo Alves (PMDB - RN) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Ouço, com muito prazer, o Senador Agnelo Alves, representante de um dos Estados por que tenho muito apreço. Seu irmão e eu - lá se vão muitos anos - fomos cassados no mesmo dia e perdemos nossos direitos políticos por dez anos, porque éramos opositores ao Governo militar.

O Sr. Agnelo Alves (PMDB - RN) - Muito obrigado a V. Exª, sempre muito generoso para comigo.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - V. Exª merece.

O Sr. Agnelo Alves (PMDB - RN) - V. Exª é uma das amizades que prezo, um dos homens que mais admiro neste País, desde o tempo da Constituinte, quando tive a oportunidade de conhecê-lo.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Muito obrigado.

O Sr. Agnelo Alves (PMDB - RN) - Sr. Senador, o problema da Justiça, no Brasil, impressiona-me, e gosto sempre de ouvi-lo sobre o assunto. Ninguém mais do que V. Exª está autorizado a falar, a tratar desse tema, mas me atemoriza o fato de que, por exemplo, tivemos uma CPI do Judiciário que ficou resumida a um juiz do Trabalho. Depois, a um possível envolvimento seu com outra pessoa. Da essência, das modificações necessárias nunca se trataram, e tais questões nunca foram objeto de debate na mídia ou no plenário. Também impressiona-me muito, na Justiça, o mandado de segurança, ou a medida liminar, digamos assim, que o juiz concede, cujo mérito parece-me não ter prazo para ser julgado, terminando por se transformar numa legislação própria, acima do Legislativo e do Poder Executivo, que a sanciona. Quer dizer, concede-se uma liminar e, com isso, praticamente fixa-se uma lei, não havendo pressa de se julgar o mérito. As coisas andam amarradas e eu gostaria de conhecer um meio de dinamizá-las. É claro que a Justiça tem sua repercussão como instituição, mas chego a pensar que os que fazem o Poder Judiciário vivem, ainda, num tempo bastante atrasado, que não é o atual. Então, eu gostaria de ouvir V. Exª falar mais sobre esse assunto, que é muito palpitante e importante.

O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - V. Exª tem absoluta razão, Senador Agnelo Alves. A liminar foi idealizada quando havia um fato relevante. Há até duas expressões latinas que expressam esse pensamento. Diz-se que se concederia a liminar quando houvesse a “fumaça do bom Direito” e o “perigo em mora”, o fumus boni juris e o periculum in mora.

Acontece que, neste País, introduziu-se a chamada indústria das liminares. Concede-se liminar com muita facilidade, e o mérito não é julgado. E o que é mais grave é a chamada liminar satisfativa. O que se compreende como liminar satisfativa? O cidadão pode - não é necessário o instituto do mandado de segurança, esse remédio jurídico - entrar com uma medida cautelar, e pede-se a liminar. O juiz concede essa liminar satisfativa, e se eventualmente a outra parte tiver razão, quando chegar ao final, o assunto estará superado e o prejuízo não poderá ser reparado. Essa é a forma pela qual temos que idealizar aqui o meio corretivo para que isso não se repita e para que não cause estragos que não podem ser reparados mais adiante.

V. Exª, portanto, faz uma observação corretíssima. Desde logo devo salientar que se trata de um tema que tratarei com especial atenção, matéria sobre a qual nos devemos debruçar, até para que não se repita o que temos visto recentemente neste País: as chamadas liminares, que podem ser satisfativas para uns, mas altamente prejudiciais para outros.

Sr. Presidente, essa era uma espécie de comunicação que queria fazer - menos do que um registro - no sentido de que a Casa tome conhecimento, porque vamos entrar em recesso branco. É claro que até o dia 2 ou 3 de outubro nada será feito. Mas é hora de plantar - a chamada hora de plantar, como diz a Bíblia - para depois, então, colher. É o que diz o Senador Pedro Simon, do alto de sua imensa superioridade - não que S. Exª olhe com soberano desprezo para cá, mas sempre com sua gentileza. Trata-se de alguém de quem tenho colhido subsídios para reforçar teses. Ainda ontem, tive uma honra muito grande de funcionar como seu Relator ad hoc na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e ver o seu parecer aprovado por unanimidade.

Concluo, portanto, Sr. Presidente, pedindo, encarecendo, aos eminentes Colegas que dêem as suas contribuições, porque serão bem recebidas.

Com isso, por enquanto, sobre esse assunto, deixo a matéria em compasso de espera.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/2000 - Página 18642