Discurso durante a 123ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Justificativas à apresentação de projeto de lei visando retirar do Programa Nacional de Desestatização o setor de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica e o setor de saneamento básico.

Autor
Heloísa Helena (PT - Partido dos Trabalhadores/AL)
Nome completo: Heloísa Helena Lima de Moraes Carvalho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRIVATIZAÇÃO.:
  • Justificativas à apresentação de projeto de lei visando retirar do Programa Nacional de Desestatização o setor de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica e o setor de saneamento básico.
Publicação
Publicação no DSF de 22/09/2000 - Página 18893
Assunto
Outros > PRIVATIZAÇÃO.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PROGRAMA NACIONAL DE DESESTATIZAÇÃO.
  • ANALISE, PROCESSO, PRIVATIZAÇÃO, OCORRENCIA, CORRUPÇÃO, CRIME DO COLARINHO BRANCO, FAVORECIMENTO, SETOR, INICIATIVA PRIVADA, PREJUIZO, BRASIL, DEFESA, ABERTURA, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA.
  • PROPOSTA, RETIRADA, PROGRAMA NACIONAL DE DESESTATIZAÇÃO, SETOR, ENERGIA ELETRICA, SANEAMENTO BASICO, IMPORTANCIA, AMPLIAÇÃO, ACESSO, POPULAÇÃO CARENTE, ABASTECIMENTO DE AGUA, COLETA, ESGOTO, MANUTENÇÃO, SUBSIDIOS, TARIFAS.

A SRª HELOÍSA HELENA (Bloco/PT - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dou conhecimento à Casa de que estou apresentando um projeto de lei mediante o qual proponho que se alterem dispositivos da Lei nº 9.491, que estabeleceu os procedimentos relativos ao chamado Programa Nacional de Desestatização.

É claro que todos sabemos que o processo de privatização foi uma bandeira alardeada perante a opinião pública pelo grupo político que ainda governa o País. É claro também que todo povo brasileiro, hoje certamente um número muito maior de pessoas, já consegue identificar que esse processo de privatização ficará marcado na História do País como um gigantesco escândalo nacional. Tivemos a oportunidade de identificar atos abomináveis de corrupção, tráfico de influência, intermediação de interesses privados, utilização de dinheiro público para favorecimento de determinados setores, estabelecimento de preços insignificantes diante do impacto em setores estratégicos para o nosso País. Identificamos, enfim, um gigantesco escândalo nacional. Esperamos que um dia a História, não necessariamente os livros de História dos nossos netos, possa contar esse episódio maldito. Ainda assim, gostaríamos muito que o Congresso Nacional fosse firme, independente, cumprisse suas obrigações constitucionais e abrisse uma CPI para que o povo brasileiro pudesse ver esclarecidas tantas denúncias, atos abomináveis, fatos concretos que realmente mostram o escândalo do processo de privatização.

Como sabemos que essa moda continua, estamos trabalhando muito, até porque no último acordo com o Fundo Monetário Internacional uma das cláusulas tratava da continuidade do processo de desestatização. Sabemos que o FMI manda muito no Brasil. Vimos, por exemplo, há pouco tempo o que aconteceu com as ações da Petrobras na calada da noite - se não fosse trágico, seria cômico. Estamos assistindo agora novamente ao aumento do preço do petróleo, exatamente quando, em visita à Comissão de Assuntos Econômicos, o representante da Agência Nacional esbravejou que não havia crise alguma à vista, que estava tudo muito bem, que havia uma estabillização a longo prazo em relação às questões do petróleo.

Sabemos exatamente o quanto vários analistas que trabalham diretamente nessa área seriam capazes de prever, uma vez que há questões políticas que não se apresentam apenas agora. Por exemplo, no caso da Venezuela, já havia uma sinalização clara. Então, talvez seja essa uma das explicações para o fato de que o Governo Federal, na calada da noite, tivesse patrocinado aquele crime contra o Brasil, contra o patrimônio nacional, para favorecer algumas empresas.

Estamos apresentando um projeto que se propõe a retirar da Legislação, da Lei nº 9491, que trata dos procedimentos relativos ao Programa Nacional de Desestatização, os serviços de geração, transmissão e distribuição de energia elétrica e de saneamento básico, compreendendo as ações de abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta e destinação de resíduos sólidos e drenagem urbana.

É evidente que todos conhecemos - já houve vários debates públicos nesse sentido - o problema das nossas hidrelétricas. Tanto é verdade que o Governo Federal recusou-se a dar continuidade ao seu processo de privatização, certamente com medo da repercussão eleitoral. Isso foi declarado publicamente. O Governo Federal teve inclusive a ousadia de dizer perante a opinião pública que iria fazer o projeto de transposição do Rio São Francisco com o dinheiro da privatização da Chesf. A privatização das hidrelétricas é uma realidade, é uma intenção clara do Governo Federal, que continua se ajoelhando perante o Fundo Monetário Internacional. Portanto, repito, mediante o projeto que apresento estamos tentando estabelecer que empresas como as chamadas empresas de saneamento básico, que compreendem as ações de abastecimento de água, esgotamento sanitário, coleta e destinação de resíduos sólidos e drenagem urbana também possam ficar de fora do processo de desestatização.

Sabemos que atualmente mais de 15 milhões de pessoas não têm acesso ao abastecimento público de água. Dessas, 92% pertencem a famílias com renda mensal inferior a três salários mínimos. A situação é mais dramática ainda em relação à coleta de esgotos, onde praticamente 40 milhões de pessoas estão excluídas desse atendimento por parte do poder público; 80% dessas pessoas também com renda mensal inferior a três salários mínimos.

Entendemos que não basta apenas estabelecer algum mecanismo compensatório, como a tarifa social. Esse incentivo já é uma realidade, continuará existindo. No entanto, é de fundamental importância que esse setor, que, além de se destinar a prestar um tipo de serviço essencial, seja rentável. Se assim não fossem, é óbvio que iria contrariar a lógica do setor privado, de investir em setor que não oferece lucros. Sabemos que muitas dessas empresas públicas passam por problemas graves, problemas financeiros, menos pela atividade que desenvolvem, mas muito mais pelo parasitismo de que foram vítimas por parte de algumas personalidades políticas. E como sabemos que, em todos esses processos de privatização, imediatamente o Governo Federal viabiliza recursos para que seja entregue ao setor privado só o filé, aquilo que efetivamente oferece lucro, que seja feito também um ajuste no sentido de que essas empresas possam ser devolvidas.

Todos sabemos, e a História mostra isso, que a prestação de serviço de abastecimento de água, energia, saneamento básico, em muitas comunidades urbanas e rurais, só poderia estar acontecendo em função do subsídio cruzado, onde alguns acabam tendo que pagar mais para que o Estado tenha possibilidade de proporcionar o benefício aos que pagam menos. Tentamos, então, evitar que mais uma vez o Estado acabe por comprar serviços, porque determinadas comunidades, tanto rurais quanto urbanas, que não têm nenhuma condição efetiva de se submeter ao preço definido pelo mercado, vão precisar ter o abastecimento de água, esgotamento sanitário e a energia. E quem vai pagar por isso? De fato, acaba o próprio Estado comprando a prestação de serviços para empresas privadas, cujo objetivo, como não poderia deixar de ser, evidentemente, é o lucro.

Estamos apresentando esse projeto de lei no sentido de que essas empresas públicas que estão submetidas à voracidade de alguns setores do País - o fazemos evidentemente muito mais em relação ao Fundo Monetário Internacional - possam ser excluídas do processo nacional dos procedimentos relativos ao programa nacional de desestatização do nosso País.

Obrigada, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/09/2000 - Página 18893