Discurso durante a 125ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Importância das Cooperayivas Integrais de Reforma Agrária - CIRAS, na organização e consolidação dos assentamentos agrários.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA. REFORMA AGRARIA.:
  • Importância das Cooperayivas Integrais de Reforma Agrária - CIRAS, na organização e consolidação dos assentamentos agrários.
Publicação
Publicação no DSF de 27/09/2000 - Página 18980
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA. REFORMA AGRARIA.
Indexação
  • CRITICA, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PAIS, INEFICACIA, POLITICA AGRICOLA, AUSENCIA, QUALIFICAÇÃO, PRODUTOR RURAL, INEXISTENCIA, INVESTIMENTO, CIENCIA E TECNOLOGIA.
  • DEFESA, IMPORTANCIA, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, FORMAÇÃO, COOPERATIVA INTEGRAL DE REFORMA AGRARIA (CIRA), OBJETIVO, APOIO, IMPLANTAÇÃO, DESENVOLVIMENTO, PROJETO, COOPERATIVA, REFORMA AGRARIA, MELHORIA, ASSENTAMENTO RURAL.

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O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, trato hoje de um tema que nos últimos anos tem sido o mais palpitante e incompreendido pela elite brasileira. Fala-se muito - sempre se falou, desde a época do Brasil-colônia - de reforma agrária que seria, antes de tudo, a distribuição de parcelas de terra aos camponeses que manifestassem desejo de explorá-las, tornando-as produtivas para seu grupo familiar e para a comunidade em geral.

            Contudo, a simples concessão de áreas de cultivo, seja como doação, transferência a título precário e experimental, ou pelas formas previstas no Estatuto da Terra, não será o caminho mais adequado para conseguir-se o grande objetivo da redistribuição da propriedade fundiária, hoje em poucas mãos - as dos grandes proprietários que realizam, bem ou mal, a atividade agrícola.

            O próprio Estatuto da Terra, dando forma a conceitos manifestados na abundante legislação e pensamento de cientistas nacionais e estrangeiros, indica os objetivos dessa reforma, como "o conjunto de medidas que visem a promover melhor distribuição da terra, mediante modificações no regime de sua posse e uso, a fim de atender aos princípios de justiça social e do aumento de produtividade".

            A distribuição da propriedade disponível para o processo de reforma tem como clientes os lavradores sem terra, que trabalham no imóvel desapropriado como posseiros, assalariados, parceiros e arrendatários; aos agricultores cujas propriedades não alcancem a dimensão da propriedade familiar da região; aos agricultores cujas propriedades sejam comprovadamente insuficientes para o sustento próprio e o de sua família; e aos tecnicamente habilitados na forma da legislação vigente ou se manifestam competentes para a prática das atividades agrícolas.

            Entretanto, a reforma agrária não é apenas um isolado objetivo de caráter social porque tem muito de empreendimento econômico para que seja uma forma efetiva de transformação.

            Um dos mais autorizados doutrinadores deste continente, com uma visão alicerçada em vasta experiência, o mexicano Ramon Fernandez y Fernandez, comentou que "uma reforma agrária regressiva é aquela em que predominam os motivos puramente políticos sobre as finalidades econômicas. De acordo com este tipo de reforma coloca-se a terra em mãos do maior número de camponeses, com o fim de tornar possível a paz social e a estabilidade das instituições, já que os camponeses sem terra constituem a força subversiva mais importante num país com um débil desenvolvimento industrial. Uma reforma agrária progressista é a definida convencionalmente como instrumento de desenvolvimento econômico".

            Portanto, a possibilidade de se alcançarem os objetivos da reforma agrária está condicionada, antes de tudo, a condições econômicas de qualificação dos seus beneficiados. Ou isso, ou o fracasso certo, previsível, que só serve para desmoralizar a idéia reformista, dando razão aos que a ela se opõem com argumentos falaciosos.

            Sr. Presidente, temos que partir de duas considerações básicas. A primeira se exprime na convicção generalizada de que o país não possui uma política agrícola e o sinal disso é o clamor permanente dos produtores, aqueles que dispõem de terra ou são empresários agrícolas; a segunda é que só se pode distribuir terras quando se atribui condições econômicas para a atividade agrícola, proporcionando qualificação técnica para o empreendimento econômico poder produzir, escoar a produção, com acesso a tecnologia.

            Tomemos como paradigma a economia de um país democrático, o caso da Venezuela, onde são notáveis os trabalhadores de reforma da vida rural. Um dos seus melhores cientistas sociais, o Prof. Victor Gimenez Landinez, que foi seu Ministro da Agricultura, aconselhava: "a mais delicada tarefa da Reforma Agrária consiste na atenção para os problemas da justa distribuição da terra. E, como temos afirmado, ela seria um fracasso se não se planifica conjuntamente o crédito, a assistência e a segurança dos mercados”.

            Assim, Srªs e Srs. Senadores, é inacreditável que o Brasil tendo ao longo de mais de um quarto de século, com o Estatuto da Terra, editado em 1964, e que resultou de pressão sobre o governo autoritário, ainda não tenha obtido a reforma da vida rural.

            Contudo, chegamos nesta verdadeira convulsão do campo, representando uma etapa que parece decisiva diante da atuação dos movimentos sociais dos trabalhadores no campo, que, deflagrando um processo de ocupação de terras, conseqüência da omissão do Poder Público, revela a grande dificuldade desse momento, que é a fixação dos sem-terra nas áreas ocupadas.

            Trata-se do assentamento, que deve significar como última etapa do processo, uma organização que seja, ao mesmo tempo, o atendimento de reivindicações mal contidas e a necessidade de lhe assegurar a permanência da mudança, em termos de empresa econômica e condições de vida social, já que entendemos que reforma agrária não se deve cingir a propósitos meramente políticos eleitorais, mas basear-se em um critério pluralista, considerando os aspectos políticos, sociais e econômicos simultaneamente.

            O assentamento é uma forma complexa de organização que somente pode prosperar se atendidos os requisitos de uma estrutura social e econômica, por menor que seja. Observa-se que em relação aos assentamentos de responsabilidade individual, a preferência é pelos produtos que compõem a chamada cesta básica que poderá resolver, é bem verdade, a situação do grupo familiar, mas não concorre para o desenvolvimento do setor agrícola como um todo.

            Inquietante, Sr. Presidente, é que não se conhece qualquer plano do governo federal para dar forma aos assentamentos ou comunidades de trabalhadores, motivo pelo qual as reivindicações dos trabalhadores sem terra são por recursos financeiros, hoje nem sempre bem aplicados. Se existe tal modelo nas cogitações do Estado, é segredo. A propósito recentemente o Ministro da Reforma Agrária declarou que tinha um plano de reforma podendo-se deduzir que não é o constante da legislação vigente, a começar pelo Estatuto da Terra.

            Todavia, não existe segredo. Está previsto no mesmo Estatuto um tipo viável de organização que não poderia resultar de geração espontânea nem do alvedrio dos novos proprietários, daí ter que contar com a colaboração do governo. Falo da organização, à base de cooperação, são as Cooperativas Integrais de Reforma Agrária previstas no Decreto nº 58.197, de 15 de abril de 1966 que regulamentou o Capítulo III do Título III da Lei nº 4.504, de 1964.

            A função das CIRAS seria dar apoio à implantação e desenvolvimento dos projetos de Reforma Agrária nas áreas declaradas prioritárias e aos demais projetos que, a juízo do poder público, se enquadrem no processo reformista.

            Evidentemente que há outras formas de associação e de conjugação de esforços visando a tornar realidade a Reforma Agrária, mas das CIRAS e de quaisquer outras formas de organização não se tem notícia. O processo de reforma atravessa, agora, uma etapa de improvisação perigosa que não atende aos objetivos de mudança racional.

            Um assentamento, sob suas várias formas, deve atender à organização dos trabalhadores, com vistas à racionalização do processo produtivo, incluindo as etapas da comercialização e da elevação do padrão de vida dos seus associados. Um processo de mobilidade vertical. Este é, sem dúvida, o ponto crucial da reforma agrária que se precisa resolver no Brasil, em meio a inquietações e dúvidas em que sucumbe o chamado Estado de Direito.

            Portanto, sinalizo que a concepção simplista de assentamento levará, fatalmente, à frustração da reforma agrária. É necessário adotar o cooperativismo, com suas formas históricas, singulares, vivas, dinâmicas, vez que trata-se de um modelo integrante da própria realidade da nossa sociedade.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/09/2000 - Página 18980