Discurso durante a 131ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Responsabilidade do Senado Federal diante da investigação dos fatos que originaram a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito do Futebol.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FUTEBOL.:
  • Responsabilidade do Senado Federal diante da investigação dos fatos que originaram a instalação da Comissão Parlamentar de Inquérito do Futebol.
Publicação
Publicação no DSF de 10/10/2000 - Página 20109
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FUTEBOL.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, ESPORTE, ECONOMIA, PAIS, ESPECIFICAÇÃO, FUTEBOL, CRIAÇÃO, EMPREGO, RENDA, CONTRIBUIÇÃO, CRESCIMENTO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB).
  • JUSTIFICAÇÃO, IMPORTANCIA, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), FUTEBOL, SENADO, NECESSIDADE, INVESTIGAÇÃO, TIME, PAIS, SONEGAÇÃO, RECOLHIMENTO, CONTRIBUIÇÃO, PREVIDENCIA SOCIAL, SONEGAÇÃO FISCAL, IMPOSTO DE RENDA, IRREGULARIDADE, VENDA, ATLETA PROFISSIONAL, EXTERIOR, INTERFERENCIA, EMPRESA MULTINACIONAL, NEGOCIAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, devo oferecer respostas a questões suscitadas por brasileiros referentes à instalação da CPI do Futebol nesta Casa do Congresso Nacional.

Entre as inúmeras manifestações de apoio a essa CPI, há também aqueles que não compreendem por que o Senado brasileiro pretende investigar o futebol no País, alegando que há questões mais sérias que poderiam perfeitamente ocupar o tempo dos Parlamentares. Mas, certamente, trata-se de exceção.

Ainda ontem, em São Paulo, no programa de televisão do jornalista Juca Kfouri, enquête realizada deu conta que 82% dos telespectadores apostam no sucesso desta Comissão Parlamentar de Inquérito. Oitenta e dois por cento afirmaram que acreditam nos resultados desta CPI em favor da moralização do futebol no País. É claro que essa expectativa da sociedade aumenta e muito a responsabilidade do Senado Federal. O Senado tem o dever de oferecer respostas à sociedade brasileira, que há muito exige uma investigação rigorosa para apurar fatos reiteradamente denunciados na mídia brasileira.

Queremos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em respeito àqueles que questionam a validade da CPI do Futebol, fazer algumas afirmações.

Obviamente, o futebol tem o seu lado lúdico, pois é a grande paixão do povo brasileiro. Certamente, é o pouco de alegria que ainda resta a tantos brasileiros sacrificados nos finais de semana especialmente. No entanto, além de ser a grande paixão nacional, o futebol é uma atividade econômica essencial para o desenvolvimento deste País. No mundo, é responsável pela geração de 400 milhões de empregos e mobiliza anualmente um capital de giro da ordem de US$280 bilhões.

No Brasil, a Fundação Getúlio Vargas apresentou um relatório, em 1997, dando conta de que os negócios do esporte no nosso País movimentam US$32 bilhões anualmente.

No nosso País, o futebol mobiliza 60% dos valores aplicados em esporte. Os negócios do esporte representam 1,7% do PIB brasileiro. Nos países industrializados, em países da Europa e também nos Estados Unidos da América do Norte, o esporte representa 4% do PIB. Na América Latina, ainda 1% do PIB. No entanto, há uma previsão de investimentos mais significativos nos próximos cinco anos que elevarão essa participação para cerca de 3%. Hoje os esportes na América Latina mobilizam US$20 bilhões anualmente. Espera-se para dentro de cinco anos uma movimentação de cerca de US$60 bilhões anualmente, correspondendo portanto a 3% do PIB da América Latina. O próprio BID anuncia investimentos mais significativos no esporte neste lado da América.

Portanto, se considerarmos a importância econômico-social do esporte para o desenvolvimento do nosso País, justificamos de pronto a instalação desta Comissão Parlamentar de Inquérito, que tem por objetivo investigar denúncias, apurar a procedência de indícios fortemente divulgados pela imprensa do País ao longo do tempo.

É evidente que aqueles representantes das organizações que administram o futebol no País - CBF, federações, clubes, empresas patrocinadas - não desejam tal investigação. O fato de a CBF resistir já, há algum tempo, a instalação de uma CPI na Câmara dos Deputados revela a necessidade dessa instalação. Essa resistência é sintoma das irregularidades, das falcatruas e da corrupção, estimuladas pela impunidade que lamentavelmente grassa no nosso País, notadamente em uma atividade quase que clandestina porque sem transparência alguma, sem nenhum tipo de fiscalização de natureza pública que permita a avaliação das contas, dos negócios, das transações realizadas.

A CBF vem investindo há algum tempo na falta de transparência; investe também na desorganização do futebol brasileiro, e essa desorganização só interessa à desonestidade. A anarquia, a desorganização do futebol faz prevalecer a impunidade, que estimula a corrupção, com prejuízos qualitativos, econômicos e sociais ao esporte no Brasil.

Para justificar essa CPI, elencamos alguns itens fundamentais: a sonegação do recolhimento da contribuição à Previdência Social. Um levantamento recente do Ministério da Previdência Social informa que federações e clubes devem mais de R$150 milhões à Previdência Social. O Flamengo, cerca de R$20 milhões; o Fluminense, mais de R$9 milhões; o Palmeiras, mais de R$7 milhões; o Atlético Mineiro, mais de R$6 milhões, e o Internacional de Porto Alegre, mais de R$5 milhões, sendo esses os maiores devedores da Previdência Social no País. Há responsabilidade das autoridades relativamente a essa apropriação indébita de recursos da Previdência Social e, portanto, à população trabalhadora do País. Federações, clubes, entidades futebolísticas recolhem a contribuição de funcionários e jogadores de futebol e não a repassam à Previdência Social, constituindo-se esse fato em crime de apropriação indébita, que levou recentemente à prisão o presidente da Federação Paranaense de Futebol. 

Elencamos como segundo item a sonegação do Imposto de Renda por parte de jogadores, técnicos de futebol, clubes, empresas e empresários de jogadores. A Receita Federal informa que, nos últimos dois anos, multou em US$23,570.00 jogadores, técnicos, clubes e empresários de futebol por sonegarem Imposto de Renda.

Para alguns, sonegar impostos é normal no nosso País. Lamentavelmente, tem sido algo natural, sem a necessária penalização, sem o rigor da lei a desestimular essa prática. Ouvimos declarações de autoridades do futebol que tornam visível essa postura diante da sonegação, fato para nós da maior gravidade. Em países sérios, pessoas ricas, famosas e poderosas vão para a cadeia. É bom lembrar um exemplo histórico: Al Capone foi preso exatamente por sonegar. Portanto, essa questão não pode prevalecer impunemente diante dos olhos da Nação, porque as pessoas mais simples, mais humildes e despossuídas economicamente são obrigadas a pagar religiosamente as suas obrigações com o Erário, sob pena de punições rigorosas. Enquanto isso, os mais poderosos, aqueles que ostentam popularidade nacional, estão isentos desse dever cívico que é o pagamento dos impostos ao Estado.

            Outro item diz respeito à venda de jogadores para o exterior. O Decif, que é o Departamento de Combate a Ilícitos Cambiais e Financeiros do Banco Central, revela irregularidades que superam - não há uma cifra definida - US$100 milhões no período compreendido entre 1992 e 1998. Jogadores negociados com o exterior, com o registro de somas vultosas no Brasil, sem o correspondente ingresso da moeda estrangeira no nosso País, sem o registro de operações cambiais correspondentes àquilo que se divulga de valor dos passes negociados com os clubes estrangeiros.

Poderíamos citar alguns exemplos, mas creio que a responsabilidade desta Casa é evitar execrar pessoas, evitar expor pessoas indevidamente antes que se comprove o ilícito, antes que se comprove a veracidade das denúncias, enfim, antes que se esclareça a veracidade dos fatos. O Banco Central já investiga esse fato. Esses recursos ficaram no exterior, depositados em contas bancárias, ou ingressaram no País de forma irregular. O fato é que não existem registros de operações cambiais referentes à maioria das milionárias transações efetuadas entre clubes brasileiros e clubes estrangeiros, e quando há registro de operação cambial não é pelo valor registrado da venda desses jogadores. Há suspeitas não só do crime de sonegação de cobertura cambial, mas também de lavagem de dinheiro, que precisam ser investigados. De outro lado, há denúncias relativamente a depósitos em nome de jogadores contratados de clubes do exterior, depósitos em contas em bancos localizados em paraísos fiscais, especialmente nas Ilhas Virgens britânicas. Denúncia de um conselheiro de nome Paulo César Ferreira, do Clube Regatas Flamengo, dá conta de que teriam sido realizados depósitos em nome de jogadores adquiridos recentemente por aquele clube do Rio de Janeiro em paraísos fiscais visando ludibriar o Fisco brasileiro e o Fisco dos países de origem desses jogadores.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a responsabilidade do Senado diante desses fatos é evidente. Nós, além desses fatos, acrescentamos a relação dos clubes com os bingos, que são decorrentes de concessão pública, de concessão oficial. E há aí denúncias de uma relação promíscua de clubes de futebol, de federações da área de esportes com os bingos instalados em vários pontos do país.

Eu gostaria de destacar ainda mais um ponto a ser investigado, que é o contrato Nike-CBF, cujo valor é de R$400 milhões. Há denúncias de interferência indevida dessa empresa multinacional, que estaria se valendo desse contrato para interferir, inclusive, em decisões que deveriam ficar adstritas aos dirigentes do futebol brasileiro.

Poderíamos ainda destacar a importância dessa CPI pelo fato de ser o futebol uma atividade econômica em expansão. Na verdade, estamos presenciando, ainda, os primórdios do desenvolvimento desta atividade econômica. Apenas agora grandes patrocinadores demonstram seu interesse em investir em nosso País. Obviamente, esses investimentos seriam maiores se tivéssemos aqui um futebol eficientemente organizado, que oferecesse segurança àqueles que desejam investir.

Mas há uma perspectiva de crescimento, aqui referida anteriormente, que, no que diz respeito ao marketing esportivo, é de 16% ao ano. Enquanto hoje o marketing esportivo corresponde a um valor aproximado de US$250 milhões, estima-se que, em 2009, esse valor crescerá para cerca de mais de US$900 milhões anualmente.

É possível porque, para citar o exemplo das transmissões esportivas por meio das emissoras de televisão, enquanto o campeonato inglês, por temporada, soma cerca de US$750 milhões com as transmissões esportivas, no Brasil elas somam apenas 40 milhões, ou seja, o campeonato inglês fatura, por meio das transmissões pelas emissoras de televisão, 15 vezes mais do que o campeonato brasileiro.

            Portanto, temos muito a evoluir, no que diz respeito à importância econômica e social do futebol para o nosso País. E essa CPI tem a responsabilidade não apenas de investigar para denunciar, mas também a responsabilidade propositiva. Cabe à Comissão Parlamentar de Inquérito, ao final dos trabalhos realizados, com as sugestões que, por certo, serão apresentadas por autoridades do esporte no país, por jogadores, por técnicos de futebol, por empresários e por dirigentes, oferecer proposições que melhorem a legislação esportiva, a fim de coibir os abusos que hoje são praticados impunemente. Tem também a responsabilidade de sugerir uma organização mais competente do esporte nacional, para que, além de melhorar o desempenho das nossas equipes, produza resultados econômicos e sociais que contribuam de forma decisiva para melhorar as condições de vida do povo de nosso País.

Portanto, Sr. Presidente, sem sombra de dúvida, essa é uma atividade que cabe ao Congresso desenvolver. E a CPI do Senado, antes mesmo da sua instalação, produziu o primeiro efeito positivo: a mudança de postura na Câmara dos Deputados. Afinal, há mais de um ano e meio o Deputado Aldo Rebelo tentava a instalação da CPI Nike-CBF, na Câmara dos Deputados, e todas as suas tentativas foram frustradas porque sucumbiram diante da pressão maior dos dirigentes do esporte no Brasil, que possuem assento naquela Casa do Congresso Nacional. É por isso que afirmamos que a CBF vem investindo, há muito tempo, na falta de transparência da administração do esporte em nosso País. Esperamos que a CPI da Câmara dos Deputados possa, nesse paralelismo que poderia ser evitado, resultar também em benefício da investigação, em favor da eficiência da investigação que se pretende. Porque, obviamente, se o Senado alcançar resultados positivos, a Câmara dos Deputados também desejará fazê-lo.

Sr. Presidente, só nos resta fazer o último apelo às lideranças partidárias que contribuem para o sucesso dessa Comissão, destacando a presença determinada do Presidente Antonio Carlos Magalhães, que assegurou o cumprimento do Regimento e tornou irreversível a instalação dessa Comissão Parlamentar de Inquérito, que é uma exigência da sociedade brasileira.

Agradecemos às Lideranças de todos os Partidos, que estão agindo com rapidez para o encaminhamento dos nomes que comporão a Comissão. Certamente, muito em breve poderemos iniciar os trabalhos e oferecer respostas aos questionamentos que são constantemente levantados pela opinião pública brasileira, para que, reduzindo o índice de corrupção no esporte nacional, possamos contribuir para que essa atividade econômica signifique, de forma decisiva, um avanço para a economia, para a geração de empregos, para a geração de renda e de receita pública, elementos indispensáveis para a melhoria da qualidade de vida de todos os brasileiros.

Era o que tinha a dizer.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/10/2000 - Página 20109