Discurso durante a 132ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

- Necessidade de providências imediatas para conter o avanço da violência no País.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA. DROGA.:
  • - Necessidade de providências imediatas para conter o avanço da violência no País.
Aparteantes
Carlos Bezerra, Romeu Tuma.
Publicação
Publicação no DSF de 11/10/2000 - Página 20210
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA. DROGA.
Indexação
  • GRAVIDADE, AUMENTO, VIOLENCIA, BRASIL, ALTERAÇÃO, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, DEFESA, ESTUDO, PREVENÇÃO, REPRESSÃO, COMBATE, ORIGEM, CRIME, ESPECIFICAÇÃO, AMPLIAÇÃO, EDUCAÇÃO, EMPREGO, OPOSIÇÃO, TRAFICO, DROGA, IMPLEMENTAÇÃO, PROGRAMA NACIONAL, SEGURANÇA PUBLICA.
  • GRAVIDADE, INDICE, HOMICIDIO, VITIMA, POLICIAL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), SUPERIORIDADE, PARTICIPAÇÃO, MENOR, JUVENTUDE, CRIME ORGANIZADO, ESPECIFICAÇÃO, TRAFICO, DROGA.
  • APREENSÃO, RISCOS, TRANSFERENCIA, TRAFICO INTERNACIONAL, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, REGIÃO AMAZONICA, BRASIL, DEFESA, REFORÇO, FORÇAS ARMADAS, FAIXA DE FRONTEIRA, NECESSIDADE, RECURSOS ORÇAMENTARIOS, SETOR.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, volto à tribuna do Senado Federal para tecer considerações sobre um dos mais graves problemas que enfrenta a nossa sociedade: a violência.

A violência, infelizmente, se inseriu em nosso cotidiano, com profundas mudanças nos hábitos sociais de toda a população brasileira, como resultado de uma perversa conjunção de fatores sociais, econômicos e culturais que modificaram a forma como temos encarado nosso semelhante, antes com afabilidade e confiança e agora com desconforto e suspeita.

Casos de violência criminosa, observado em nosso dia-a-dia, não só na vida pública, mas também em nossa vida pessoal, demandam que repensemos a questão, tanto no que se refere à sua prevenção e repressão como nas mais profundas causas do desajuste social que a provocam, uma vez que a significativa incidência de atos violentos, no Brasil, vêm elevando as estatísticas nacionais a índices alarmantes, já situados hoje entre os piores do mundo.

Sr. Presidente, a cidadania é uma construção coletiva, vinculada à participação dos membros de uma sociedade nas decisões que afetam, tendo como baluartes fundamentais a garantia de direitos e a exigência de deveres numa relação de igualdade entre eles. Assim, os problemas de uma sociedade devem merecer de seus governantes, que são os responsáveis maiores pela decisões, a prioridade máxima de atuação, já que são eles os que promovem, de forma global, o bem-estar de qualquer comunidade.

Sob tal ótica, torna-se fundamental entender a violência e atuar vigorosamente sobre suas causas estruturais. Essas causas, segundo revelam as conclusões de relevantes e modernos estudos, estão centradas nas carências educacionais, na falta de oportunidades de emprego e na escalada das drogas, inclusive em seu componente de geração fácil de riqueza.

Igualmente identificados em tais estudos e ainda mais alarmante está comprovado que o grupo etário mais envolvido com a violência como praticante ou vítima é o de jovens de 15 a 24 anos - vejam os senhores de 15 a 24 anos! - o que nos leva à conclusão extremamente desconfortável de que estaremos comprometendo o futuro do Brasil se não conseguirmos mudar esse quadro.

Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, nós, brasileiros, somos extremamente criativos, inclusive no campo da violência. Quem leu os jornais de hoje e os da semana passada pôde constatar que a moda primavera-verão na área da violência, refiro-me ao Rio de Janeiro, é a de matar policiais. Todos os dias mata-se um policial, mesmo estando ele de folga, basta que o identifique como tal que ele é morto. Aliás, já tivemos outras modas: a do seqüestro - que, embora mais ameno, ainda existe -; a do seqüestro relâmpago e até a ameaça de seqüestro, onde o seqüestrador determinava, de antemão, a quantia que queria receber, senão aquele indivíduo seria o próximo a ser seqüestrado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a ausência de um projeto de amadurecimento orientado de nossa juventude, que efetivamente elimine a atual exclusão dos jovens, provoca uma descrença no futuro e nas instituições, que conduz à vulnerabilidade ao apelo fácil do vício e, ainda pior, das drogas como meio de enriquecimento.

As drogas são, assim, uma das mais relevantes causas da violência, por sua abrangência social, econômica e, por que não dizer, política.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senador Ney Suassuna, permita-me um aparte?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Terei muito prazer em ouvi-lo, Senador Romeu Tuma, principalmente porque V. Exª é um especialista na área de combate à violência.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Nobre Senador Ney Suassuna, V. Exª traz à tribuna um assunto que me tem amargurado muito nesses últimos dias. Pensando assim, sentimos uma espécie de revolta pela indiferença com que algumas autoridades tratam esse assunto, dizendo ser normal policiais servirem de alvo para marginais e bandidos, ou serem caçados nas ruas, sem nenhum tipo de respeito ou qualquer tipo de proteção. O fato de a polícia sair às ruas em manifestos pedindo segurança significa a falência total do Estado. A população normal tem de ficar permanentemente prisioneira do medo, pois a própria polícia sente o mesmo. Diariamente, ocorrem resgates de prisioneiros nas delegacias, e de forma violenta. O policial sente-se humilhado e imobilizado ao ver a casa em que trabalha ser invadida e os presos resgatados. Essa situação faz com que esse homem não tenha mais a devoção de que precisa para exercer o trabalho de proteção à sociedade. Lembro-me que, há algum tempo, se dizia: “Ai, do bandido que matar um policial”. No entanto, hoje, se diz: “Ai, do policial que não souber prender com delicadeza o assassino, o estuprador, o assaltante que violenta as famílias”. Há uma reviravolta na própria estrutura e no cumprimento do Código de Processo Penal. O rigor da lei tem de ser realmente viável até a imobilização do marginal - usando-se o mesmo tipo de agressão até que ele possa ser imobilizado. Esses indivíduos são foragidos das prisões, vêm com as armas mais modernas, invadem delegacias, resgatam os presos, assaltam pessoas nas ruas com a maior facilidade. Há uma reincidência, sob todos os aspectos analisados, quase que permanente. Não há bandido novo no mercado. Os que vão acumular os 10% restantes dos 90% de reincidência são os menores que completam a maioridade. A violência tomou conta das cidades. Na minha cidade está terrível. De forma que aproveito o pronunciamento de V. Exª para dar um grito de desespero para que a situação melhore. Devemos ver com melhores olhos os policiais e devolver-lhes o respeito da população. Não deve haver uma suspeita permanente sobre a ação policial. Eles têm sido inibidos em sua função de dar segurança à população. Incorporo-me a esse grito de alerta de V. Exª e agradeço, como policial, a oportunidade de fazê-lo na pessoa de V. Exª.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador Romeu Tuma. Incorporo os dizeres de V. Exª ao meu discurso como uma parte nobre dele. V. Exª foi ao fulcro da questão. A polícia não tem condições de combater o crime sem o respeito principalmente das autoridades e da imprensa, que detém um poder importante, senão o mais importante. Eu me referia, Senador Romeu Tuma, a algo que me preocupa: o fato de que as drogas exponenciaram todos os problemas.

Na última década, constatou-se o crescimento de todas as modalidades de delitos de violência em nosso País: homicídios, roubos, seqüestros, estupros, principalmente no segmento regionalizado das periferias das grandes cidades brasileiras. Ao qualificarmos e mensurarmos o contexto de tais delitos, identificamos que o crime organizado, vinculado ao tráfico de drogas, cresceu e tornou-se o seu responsável mais relevante.

O Sr. Romeu Tuma (PFL - SP) - Senador Ney Suassuna, desculpe-me por interromper V. Exª. Quanto ao problema das drogas, quero fazer um alerta. Pretendo solicitar ao Presidente da Casa a possibilidade de comparecer à próxima reunião da Interpol, que se realizará na Grécia no próximo dia 30, ocasião em que se discutirá, dentre outros assuntos, o tráfico internacional de drogas. O Brasil sempre foi considerado um país de trânsito. Atualmente, não: há uma responsabilidade sobre a produção, e o consumo aumentou assustadoramente. Não há uma política de prevenção e de recuperação do usuário de droga. Discute-se muito a legalização - que é um outro debate -, mas não há investimentos nessa área da parte do Governo. A lei que dispõe sobre esse tema está tramitando há mais de um ano. O Senador Artur da Távola pediu vista e apresentou um outro relatório. Essa lei objetiva regularizar a matéria, tratando o usuário de forma diferenciada da prisão, que é o sentido essencial da recuperação, a fim de evitar o consumo, porque é a pressão consumidora que estimula a produção. Está-se promovendo agora a operação na Colômbia, que é uma coisa terrível. O Brasil tem de deslocar força para evitar a passagem para o lado de cá. Nesse sentido, V. Exª está seguindo a linha mais correta.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Esse é o tema de que tratarei a seguir e representa a nossa preocupação maior.

Surgiram, nos últimos anos, as guerras de gangues na disputa pelo controle e pela distribuição de drogas, com um crescente envolvimento de crianças e adolescentes, situação em que as chacinas se tornaram comuns e banais, como forma de disputa de poder.

A ação do Estado em tal contexto tem buscado atacar os problemas já sobejamente identificados e alardeados, como a deficiência de nosso sistema penal, a falência da segurança pública e a corrupção disseminada do aparato policial.

Sei que há bons e maus policiais. Mas gostaria que cada um pensasse que profissão é ser policial: sair com um 38 na cintura de manhã cedo e não saber se volta para ver a família, ganhando um salário irrisório. E ainda se exige desse homem que enfrente quadrilhas que usam balas traçantes de AR-15.

O Sr. Carlos Bezerra (PMDB - MT) - Permite-me V. Exª aparte, Senador Ney Suassuna?

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Ouço V. Exª com muita satisfação.

            O Sr. Carlos Bezerra (PMDB - MT) - Nobre Senador Ney Suassuna, é louvável a preocupação de V. Exª com relação a essa questão que hoje cresce no Brasil assustadoramente. O meu Estado, Mato Grosso, era um Estado pacato. Hoje vive um enorme clima de violência. A nossa capital, Cuiabá, é a terceira mais violenta do Brasil. Hoje, pela manhã, balearam o Presidente do PT, o Sindicalista Sivaldo Dias Campos, dentro de sua casa. Ontem à tarde, mataram um empresário na porta da Assembléia Legislativa. Além da questão das drogas, há outros responsáveis pelo aumento da violência no País: o desemprego e a crise econômica. Na nossa cidade de Cuiabá, o índice de desemprego é o dobro do índice nacional. Fui Governador de Estado, e uma das primeiras tarefas de meu governo foi restabelecer a dignidade da Polícia Militar. O policial passou, inicialmente, a receber 11 salários mínimos; expulsamos mais de quinhentos maus policiais da corporação. Criamos os Conselhos Municipais de Segurança, com sedes em cada município e com linha direta de telefone com o Governador no caso de ocorrência de qualquer fato grave nos municípios. O Conselho Municipal de Segurança era atendido imediatamente. Resultado disso: a segurança pública funcionou como nunca no Estado. O soldado ficava satisfeito, ganhando um soldo razoável de 11 salários mínimos. Havia o gatilho, porque a inflação era alta naquela oportunidade. Fui o único Governador do Brasil a conceder o gatilho - se o índice da inflação subia para 40%, os servidores recebiam 40% a mais no contracheque no mês seguinte. O que está havendo é que os policiais ganham um salário de fome, que não dá sequer para alimentar a sua família. No mês passado, um policial em Cuiabá suicidou-se com um tiro na cabeça. Deixou uma carta para a mãe dizendo o motivo: ele percebeu que, para dar conta da sobrevivência da família, tinha de praticar atos ilícitos com os quais não concordava, a sua consciência não permitia. Então, ele preferiu morrer. O soldo que recebe o policial é tão irrisório que não dá para nada. O problema hoje dos governantes diz respeito ao Estado mínimo, de querer colocar em segundo plano o serviço público - e aí incluo a segurança pública -, de pagar um salário irrisório, o que gera essa segurança pública que aí está, sem estrutura, sem munição, sem arma. A segurança não é prioridade. No meu Estado, por exemplo, a segurança só funciona com o apoio da prefeitura, que fornece a gasolina para o carro andar, aloca prédio e implanta uma série de benefícios. Então, a grande responsabilidade, a responsabilidade maior da crise social que vivemos é a incompetência da maioria dos governantes no Brasil com relação à segurança pública. Por isso essa situação se agrava a cada dia. E não adianta fazer plano federal, na última hora, com a crise social piorando no Brasil, com o desemprego avançando e a população empobrecendo. Não se resolverá a questão social dessa maneira. Parabéns a V. Exª pelo seu pronunciamento.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, nobre Senador Carlos Bezerra. Fico muito feliz com a intervenção de V. Exª. O que V. Exª acabou de falar do seu Estado é verdadeiro até mesmo para Brasília, uma cidade que não tinha tradição de violência e na qual, agora, temos visto uma seqüência de atos de brutalidade e selvageria.

Vários Prefeitos da Paraíba estão visitando Brasília pela primeira vez. Conversávamos sobre isso. Eu lhes dizia que vinha fazer este discurso. O Prefeito de Cabedelo, por exemplo, Júnior, acabou de me dizer que, nos últimos quatro anos, aumentaram em 75% todos os tipos de crime. A Paraíba era uma ilha de tranqüilidade. Havia os crimes emocionais, passionais, mas roubos, estupros seguidos de assassinato não eram freqüentes. O País todo está assim. É preciso tomar cuidado, até porque outros vetores igualmente relevantes e alarmantes estão diante das nossas vistas, como, por exemplo, a internacionalização do tráfico de drogas e a nossa proximidade de uma das maiores regiões produtoras mundiais, o que vai requerer a nossa ação imediata, principalmente porque a Colômbia será protagonista de intensa luta para diminuição do narcotráfico, a qual poderá refletir-se no Brasil.

O Plano Colômbia, assim denominado um conjunto de ações militares a serem desenvolvidas contra os produtores e traficantes no país vizinho, embute grave risco à nossa segurança, uma vez que se pode antever como natural a migração dos cenários ora instalados na Amazônia colombiana para a Amazônia brasileira, fronteiriça e ainda desguarnecida de proteção efetiva.

Temos de prover as Forças Armadas de recursos para a defesa do nosso território e patrulhamento daquela fronteira, sob pena de nos tornarmos um novo pólo da criminalidade relacionada às drogas. A oportunidade do tema é inegável, uma vez que ora se discute o próximo orçamento nacional e assume urgência e relevância a modernização da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, para que, com sua ação firme e eficiente no território amazônico, possam transmitir à Nação a tranqüilidade de que não estaremos sediando as atividades criminosas do narcotráfico.

Faço um alerta aos meus companheiros, aos meus Pares no Senado. Aprovamos, nesta Casa, um empréstimo de R$500 milhões para a Marinha, e a contrapartida não foi colocada no Orçamento. Há dois anos não se faz nada. Agora, estamos lutando por um empréstimo para a Aeronáutica, pois, dos seus 700 aviões, 49 estão voando e o restante está parado, esperando peça. Não há como recuperá-los, lembra o Senador Romeu Tuma. Para o Exército, conseguimos aprovar oito helicópteros, mas seriam necessários muitos mais para uma região do tamanho da Amazônia. Estamos diante de um fato que pode ser uma tragédia futura. Por isso, precisamos estar precavidos.

No plano interno, temos também premente necessidade de atuação do Estado na reformulação das ações de segurança pública, tanto para o combate direto ao tráfico de drogas como para a prevenção e repressão da violência a ele associada.

Sr. Presidente, é fundamental que seja implantado, de forma explícita e conseqüente, o Programa Nacional de Segurança, anunciado pelo Governo Federal há mais de dois meses, cujas ações operacionais ainda não se materializaram e, portanto, não produziram os efeitos almejados.

O reaparelhamento das polícias, a adequação e profissionalização dos efetivos policiais civis e militares, a implantação de sistemas justos de remuneração e, principalmente, a restauração de sua credibilidade perante a sociedade são fundamentais para que a segurança pública, dever constitucional do Estado, torne-se uma realidade visível aos cidadãos.

No entanto, como educador que sou, tenho que ressaltar minha fé suprema em que somente uma ação estrutural no cenário educacional, que resgate os valores maiores da cidadania, do convívio social e do nacionalismo, poderá ter sucesso definitivo sobre os graves problemas da violência.

Temos que educar - e educar bem - para que, em vez da tentação do vício, nossos jovens tenham interesse e oportunidade de crescer como homens sérios, honestos e preparados para construir um Brasil melhor. Não é tarefa fácil, nem de retorno imediato, mas somente a perseverança e a permanente atenção dos homens públicos para a questão educacional renderão os frutos que todos desejamos.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/10/2000 - Página 20210