Discurso durante a 133ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Posicionamento favorável à aprovação da Reforma Tributária de forma cronológica e gradativa.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • Posicionamento favorável à aprovação da Reforma Tributária de forma cronológica e gradativa.
Publicação
Publicação no DSF de 12/10/2000 - Página 20359
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, VISITA OFICIAL, PAIS ESTRANGEIRO, PAISES BAIXOS, CONCENTRAÇÃO, ESFORÇO, GRADUAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, VIABILIDADE, APROVAÇÃO, PROPOSTA, ESPECIFICAÇÃO, FEDERALIZAÇÃO, LEGISLAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS).
  • DEFESA, ESSENCIALIDADE, ATENDIMENTO, PRE REQUISITO, EXISTENCIA, CRONOGRAMA, GRADUAÇÃO, IMPLANTAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, NECESSIDADE, ASSINATURA, CONSOLIDAÇÃO, PACTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, GOVERNADOR, PREFEITO, DEFINIÇÃO, DECISÃO, ACORDO, MANUTENÇÃO, DIFERENÇA, REPARTIÇÃO PUBLICA, RECEITA.
  • IMPORTANCIA, REFORMA TRIBUTARIA, REDUÇÃO, IMPOSTOS, BRASIL, VIABILIDADE, ATIVIDADE, PRODUÇÃO, EMPRESA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, hoje temos aqui, na mídia impressa que é distribuída entre os Senadores, uma importante declaração do Presidente da República, em Amsterdã, na Holanda, onde se encontra.

Diz o jornal O Globo:

Ao encerrar ontem sua visita oficial à Holanda, num seminário sobre a economia brasileira, o Presidente Fernando Henrique anunciou que o Governo não deve mais insistir na aprovação de uma reforma tributária ampla. Para viabilizar a reforma, o Presidente acha que o melhor caminho é concentrar os esforços em torno de temas mais consensuais, entre os quais ele identificou a proposta de federalização da legislação do ICMS.

O ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços) hoje é uma atribuição dos Estados, e, portanto, sua legislação é estadual. O Presidente quer federalizar, para que o ICMS seja cobrado pela União, e, depois, seja feita a repartição proporcional dos Estados. Aliás, isso está no bojo de quase todas as propostas de reforma tributária com a criação do IVA - Imposto sobre Valor Agregado, que seria, da mesma forma, federalizado.

Mas creio que a palavra do Presidente veio trazer um pouco mais de transparência sobre a posição política do Governo. Há muito que o Governo vem sendo um tanto quanto omisso nesse debate. Mais do que omisso, acho que o Governo tem sido falho nesse debate, porque não tem sido suficientemente esclarecedor e veemente no sentido de mostrar, à sociedade como um todo e aos empresários brasileiros - que tanto querem a reforma tributária -, que não se faz reforma tributária assim. Em nenhum lugar do mundo, não há - pelo menos que eu conheça - uma experiência histórica conhecida em que todos os impostos existentes foram subitamente transformados de um dia para o outro, e, a partir daí, tenha-se passado a um modelo inteiramente novo e transformador do sistema. Isso não existe como experiência. Suponho eu que nenhum Governo do planeta - onde quer que exista um Governo - admitiria uma súbita mudança para saltar no espaço desconhecido, para dar um salto no escuro, para pular num abismo, porque isso levaria a uma grande insegurança tributária, a uma incerteza enorme quanto à arrecadação.

Se a reforma tributária é importante e necessária - e ela o é -, não tenho dúvida em afirmar que o Governo não deu ao tema a relevância que ele merece. E porque não deu, não explicou à sociedade que ele, Governo, não poderia ser a favor - como nenhum Governo pode - de uma reforma tributária abrupta, instantânea, numa ruptura única de um sistema para iniciar, no dia seguinte, um outro completamente diferente. Isso é inaceitável para a continuidade de um processo administrativo.

Hoje, no Brasil, é de mais ou menos 30% do PIB o que se arrecada com impostos. Desse modo, claro, há um certo padrão de carga tributária real que é auferido pelos cofres públicos, o que leva ao pagamento sistemático, cotidiano e diário das despesas mensais dos funcionários públicos. Ou seja, há todo um calendário regular de gastos, que, não sendo atendido, pode produzir até um colapso social, uma hecatombe pública.

Com todo o respeito aos Srs. Deputados e aos chamados defensores de uma reforma tributária ampla, irrestrita, total, absoluta e instantânea, não consigo ver nessa atitude, nessa proposição, algo que possa ser realmente plausível, aceitável e negociável politicamente. Não é plausível e não é negociável politicamente.

Se assentar-se no poder futuramente, no ano de 2003, em 1º de janeiro, um presidente da República de esquerda, ele também não aceitará a perda tributária que poderá estar embutida numa eventual reforma. E não deve, porque se o fizer será um irresponsável.

Evidentemente que, no Brasil, é preciso fazer uma reforma tributária. Mas há várias questões que são indispensáveis, ou seja, há requisitos ou pré-requisitos que são essenciais ao debate da reforma tributária, sem os quais não há como iniciá-la. E a primeira condição, o primeiro pré-requisito, sem dúvida nenhuma, é este ao que me refiro, a reforma tem que ser um cronograma, tem que ser um programa de longo prazo ou de médio prazo, para ir acontecendo no tempo. Uma reforma tributária tem que ser evidentemente a partir de um núcleo único, mas a partir de uma implantação cronologicamente espaçada no tempo. A partir de uma implantação que, no mínimo, considere uma gradualidade, porque, se assim não o for, nenhum Presidente da República eleito - nem o Fernando Henrique, nem o Lula, nem o Ciro Gomes, nem ninguém, nem se for Presidente da República o meu conterrâneo e querido amigo, Senador Pedro Simon - consentirá que isso aconteça. Como também se, eventualmente, o Presidente do Senado hoje, Senador Antonio Carlos Magalhães, vier a ser Presidente da República, da mesma forma, não consentirá que tal aconteça, porque qualquer Presidente responsável e sério vai dizer que uma reforma assim, abrupta, total, instantânea, absoluta, joga o País num quadro de incerteza.

A União arrecada hoje uma quantia mais ou menos em torno de R$140 bilhões com impostos básicos. Ora, isso representa, sem dúvida, algo em torno de 10 a 15% do PIB. As contribuições para o INSS são da ordem de R$76,5 bilhões. Dessas receitas, 45% ficam com os Estados, 28% ficam com os Municípios, e a União fica com 26%.

Aí entra o segundo pré-requisito, essencial. É tão essencial e tão indispensável quanto o primeiro: faz-se necessário um pacto assinado e consolidado entre Presidente da República, Governadores de Estado e Prefeitos Municipais ou por meio de suas lideranças representativas, no sentido de firmar a decisão e o acordo de que as diferenças serão mantidas e as repartições de receita proporcionalmente respeitadas. Sem esse pré-requisito, sem esse acordo, sem esse pacto anterior, não haverá também a reforma tributária, nem aquela que possa ocorrer no prazo e no tempo a que acabamos de nos referir.

É claro que a reforma tributária é importante. É claro que há uma enorme complexidade de tributos no País, que é danosa para a atividade empresarial, para a atividade produtiva. A complexidade tributária é inimiga da eficiência empresarial. Portanto, a teoria da simplificação tributária é válida, é procedente. É preciso reduzir o número de impostos no Brasil, sim. Reduzir o número de impostos não significa reduzir o quantum arrecadado pelo Governo. Reduzir o número de impostos simplesmente significa facilitar, simplificar, viabilizar a atividade empresarial e produtiva no País.

É importante que isso seja dito, porque, neste momento, com todo o respeito, pela primeira vez, o Presidente da República foi sincero, ultrapassando um pouco o contido argumento até hoje utilizado pelos representantes da equipe econômica, que têm dito que querem a reforma tributária, mas sempre um pouco diferente daquela que está sendo levada adiante.

A verdade é que não se pode fazer em lugar nenhum do mundo uma reforma tributária assim, como eu acho que jamais se fez. Eu não conheço exemplo na história em que um país tenha ido dormir com um modelo tributário e, no dia seguinte, tenha nascido outro modelo tributário completamente distinto, completamente diferente. Isso não existe. Essa é uma experiência que possivelmente nenhum povo fará, em nenhum lugar do universo.

Logo, não se tente fazer isso no Brasil, porque será uma perda de tempo, como eu acho que o longo e penoso processo da Comissão de Reforma Tributária da Câmara foi frustrante. Eu me condoía com aquele entusiasmo, com aquela disposição de trabalho, com aquela seriedade com que o Deputado Germano Rigotto, meu conterrâneo, levava adiante os trabalhos daquela comissão que S. Exª presidia. O Deputado Germano Rigotto foi absolutamente brilhante no que lhe competia ser: presidir com seriedade, com eficiência, democraticamente e de forma esclarecedora, mostrando à sociedade, aos interessados, principalmente empresários e sindicatos, o que estava sendo feito. Todo aquele gás, toda aquela força, toda aquela energia despendida pelo Deputado Germano Rigotto acabou-se mostrando frustrada, e as conseqüências que S. Exª buscava não lograram acontecer.

Então, eu quero aqui ressalvar que os Deputados trabalharam intensamente, mas parece-me que o enfoque estava equivocado, ou seja, não haverá para país algum do mundo essa troca de guarda tributária, do tipo sai um sentinela e entra outro. Isso não existe. O que pode haver, sim, é um processo cronogramático, um processo cronológico, ou seja, distribuído no tempo e por etapas. Nessas etapas, sim, poder-se-á, pontualmente, implementar as novas definições tributárias do País.

Se não for assim - não por desejar que seja assim, mas por ter convicção e consciência de que é assim -, eu devo dizer com toda a clareza que, se a reforma tributária não for cronogramática, ela não existirá, não ocorrerá; não virá nunca. Os senhores empresários poderão bater, xingar, exigir, pedir e reivindicar, com toda a justiça, porque, realmente, o modelo tributário no Brasil muitas vezes estimula a improdutividade, mas quero deixar bem claro que, por mais justa que seja a reivindicação dos senhores empresários, por mais procedente e veraz que seja, por mais verossímil e necessária que seja, não vejo como, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, se possa fazer a reforma tributária como está sendo pensada. Basta examinar a experiência dos outros povos. A reforma tributária pode ser feita por partes, gradualmente, previsivelmente programada, mas não desse jeito.

Infelizmente, devo dizer isso, sem que eu aqui esteja defendendo o Governo, porque nem essa, com cronograma, espaçada no tempo, o Governo intentou apoiar ou fazer. Desse modo, repito, o Governo foi omisso e falho na questão da reforma tributária. Acho que isso é um pouco reconhecido, até mesmo pelas hostes governistas.

Devo dizer que o Presidente da República, nessa declaração que presta aos jornais, tem razão. É preciso que a reforma tributária seja limitada, o que não significa que o sistema não seja inteiramente remodelado. No entanto, ela tem de focar partes, primeiro, ela tem de ser gradual, tem de produzir avanços seqüenciais e, na medida em que consolidar uma, pode passar para a outra. É assim que se faz reforma tributária em qualquer parte do mundo.

Agora, devo dizer que o Presidente também teve muita razão no que disse quando lhe pediram para acabar com a CMPF. Alegaram que a CPMF é um imposto em cascata, porque cada vez que se emite um cheque, cada vez que se faz uma transação financeira bancária, paga-se a CPMF. Portanto, de fato, esse imposto tem um certo sentido de cascata, sim. Ele acaba-se agregando sobre todas as fases, todas as etapas do processo produtivo. Isso é inegável, mas a CPMF tem um objetivo também, um critério que é cadastral e, de certa forma, também recenseador. Qual é o maior papel da CPMF na minha opinião? Não é o dinheiro que ela arrecada, o que também é importante, é importantíssimo, mais do que isso, é um cadastro de quem está gastando, fazendo circular dinheiro, de quem deposita, retira, movimenta. Então, pessoas que fazem circular enormes quantias de dinheiro em sua mão, que depositam enormes quantias de dinheiro na sua conta pessoal bancária, estão pagando um Imposto de Renda pequeno, invisível, microfísico, porque o Brasil é o País da sonegação. E o Presidente diz isso claramente em sua declaração, quando afirma que a cobrança da CPMF deixaria de existir se o Imposto de Renda fosse pago plenamente.

Concordo inteiramente com o Presidente, já que é procedente a sua análise, até porque temos uma arrecadação de 31% a 32% do PIB, mas a carga tributária legal, aquela estabelecida pela lei, é mais ou menos de 45% do PIB, ou seja, se não houvesse sonegação, a arrecadação seria da ordem de 45% do PIB. Ou seja, há uns 15% de perda de arrecadação.

Portanto, Sr. Presidente, agradeço a tolerância e encerro o meu pronunciamento dizendo que uma reforma tributária de bom conteúdo, eficaz do ponto de vista social, desde logo tem o meu apoio. Sou a favor da reforma tributária. Apenas defendo que ela seja feita de um modelo programático e cronogramático - como já disse - porque senão ela nunca acontecerá.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/10/2000 - Página 20359