Discurso durante a 141ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a pobreza no Brasil e as soluções para o seu combate, a propósito da realização do fórum do Banco Mundial que debateu o tema. Necessidade da aplicação criteriosa do Fundo de Combate à Pobreza, após sua aprovação na Câmara dos Deputados.

Autor
Maguito Vilela (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Luiz Alberto Maguito Vilela
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • Considerações sobre a pobreza no Brasil e as soluções para o seu combate, a propósito da realização do fórum do Banco Mundial que debateu o tema. Necessidade da aplicação criteriosa do Fundo de Combate à Pobreza, após sua aprovação na Câmara dos Deputados.
Publicação
Publicação no DSF de 25/10/2000 - Página 21005
Assunto
Outros > POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • REGISTRO, SEMINARIO, DESENVOLVIMENTO, COMBATE, POBREZA, REALIZAÇÃO, BANCO MUNDIAL, BRASILIA (DF), DISTRITO FEDERAL (DF), DIVULGAÇÃO, RELATORIO, SITUAÇÃO, BRASIL, APRESENTAÇÃO, ALTERNATIVA, SOLUÇÃO.
  • NECESSIDADE, ATENÇÃO, PLANEJAMENTO, INVESTIMENTO, FUNDO ESPECIAL, COMBATE, POBREZA, OBJETIVO, ATENDIMENTO, POPULAÇÃO, MISERIA.
  • GRAVIDADE, INEFICACIA, GASTOS PUBLICOS, POLITICA SOCIAL, BRASIL.
  • DISCORDANCIA, ORADOR, OPINIÃO, ECONOMISTA, BANCO MUNDIAL, NECESSIDADE, AUMENTO, TAXAS, CRESCIMENTO ECONOMICO, OBJETIVO, ERRADICAÇÃO, POBREZA.
  • DEFESA, POLITICA NACIONAL, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, GARANTIA, RENDA MINIMA.

            O SR. MAGUITO VILELA (PMDB - GO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Banco Mundial acaba de realizar um importante fórum de debates sobre Desenvolvimento e Ataque à Pobreza, aqui mesmo em Brasília. Em três dias de discussões e palestras; acadêmicos, representantes das igrejas e sindicatos, sociólogos, economistas e técnicos do Banco Mundial debateram o tema com profundidade. O Encontro serviu também para o lançamento de um relatório do Banco Mundial sobre a pobreza no Brasil e alternativas de soluções.

            As conferências e o próprio relatório que foi divulgado não trouxeram quase que nenhuma informação nova a respeito da temática. E talvez isso tenha sido o mais importante do Encontro, porque trata-se de algo muito grave. Não há nada novo neste preocupante quadro da miséria brasileira e muito menos em ações que possam efetivamente diminuir a gravidade do problema.

            Num país com as riquezas que o Brasil dispõe, num cenário onde tem-se exaustivamente debatido a questão, como temos feito inclusive aqui no Congresso Nacional, chegar-se à conclusão de que não há nenhuma perspectiva concreta de redução deste dramático quadro, é algo para nos preocupar profundamente. E nos deixar em estado de alerta total para que os investimentos que sairão do Fundo de Combate à Miséria possam ter destino específico, dentro do objetivo central para o qual foi criado: socorrer as pessoas que estão em situação de pobreza absoluta, passando por necessidades prementes, como a falta do que comer.

            E não são poucas essas pessoas, como ficou confirmado pelos dados apresentados pelo Banco Mundial. São 35 milhões de brasileiros vivendo abaixo da linha de pobreza, exatos 22,6% da população nacional. Entende-se por viver abaixo da linha de pobreza quem ganha mensalmente menos de 65 reais individualmente dentro de uma família. É um contigente enorme de seres humanos, para quem falta praticamente tudo. Educação, saúde, moradia e, claro, comida.

            As razões para a existência deste triste cenário também são apresentadas no relatório. Razões que, de longa data, são velhas conhecidas nossas. O governo tem recursos para o setor social, mas investe mal. Investe muito mal.

            Em 1997, por exemplo, dos 103 bilhões de reais destinados ao setor, apenas 13% chegaram efetivamente aos 20% mais pobres da população. É o dinheiro para a educação pública que acaba financiando o rico; é o sistema de previdência, arcaico e ultrapassado, que não contribui com a redução das desigualdades; são os recursos desviados para outros setores menos importantes; e por aí vai. Os anos passam, os recursos são gastos erradamente e a pobreza continua aumentando.

            Apesar de tudo, vejo como importante a realização deste Fórum. Essa é uma discussão que não pode terminar. O simples fato de relembrarmos toda a problemática recoloca a questão da fome no centro dos debates. O que acaba servindo como um instrumento poderoso de pressão e cobrança por medidas concretas do governo e de outras instituições.

            Há um ponto defendido pelos economistas do Banco Mundial, no entanto, do qual discordo frontalmente. Eles sustentam que a solução para o Brasil reduzir pela metade seu número de indigentes, é alcançar uma taxa de crescimento econômico a uma média de 6% nos próximos 15 anos. Um grande equívoco. Não é preciso crescimento econômico para diminuir a fome e a miséria, mas políticas específicas de distribuição de renda.

            Não dá mais para nos deixarmos levar por essa eterna cantilena, segundo a qual para dividir o bolo é preciso primeiro fazê-lo crescer. Até porque, se formos ancorar nossos projetos de redução da miséria dentro desta tese, talvez levemos séculos para acudir os brasileiros que passam fome.

            A meta de crescer 6% ao ano, nas atuais circunstâncias, não pode nem ser considerada ambiciosa. É um verdadeiro delírio. Nos últimos 20 anos a taxa média de crescimento da economia brasileira foi de apenas 2,3%.

            O próprio ministro Pedro Malan, durante o debate que participou na Comissão de Orçamento do Congresso, garantiu que, se tudo correr maravilhosamente bem, teremos esse ano um crescimento de 4%, quase a metade do desejado pelo Banco Mundial para que a indigência possa ser combatida.

            Mesmo que fosse possível o cenário traçado pelo Banco Mundial, sem a existência de políticas concretas de estabelecimento de uma renda mínima, certamente a pobreza brasileira não iria diminuir.

            O IPEA já mostrou isso com muita clareza, inclusive aqui no Senado, durante as discussões para a criação do Fundo de Combate à Miséria. A pobreza tem que ser combatida com políticas e projetos concretos de distribuição de renda, e não ancorado num possível e imaginário crescimento econômico.

            E foi dentro deste contexto que criamos o Fundo de Combate à Pobreza. Os recursos oriundos deste fundo terão que ter destino certo e público muito bem definido. É um dinheiro para ser usado em programas específicos de complementação de renda, de segurança alimentar, de atendimento às áreas de saúde e moradia.

            Qualquer tentativa de desvio de objetivos deve ser combatida vigorosamente. Os recursos deste fundo só se justificam se forem para socorrer aqueles que estão em situação de penúria total, morrendo por falta de saúde, teto e comida. São recursos para aqueles que estão no fundo do poço.

            A Câmara dos Deputados tem o dever de manter os objetivos originais contidos no projeto. E o governo federal terá que ter a responsabilidade de cumprir o que foi aqui aprovado, ou então todo o trabalho feito acabará virando letra morta no Orçamento, engrossando os bilhões de reais que, nas estatísticas oficiais, compõem investimentos no setor social, mas que, na prática, não chegam nem perto dos mais pobres.

            E se for assim, aí teremos que acreditar na teoria apresentada pelo economista Ricardo Paes de Barros, do IPEA, um dos mais importantes estudiosos do assunto no Brasil. Disse ele durante o Fórum do Banco Mundial que “se o governo federal pegasse todos os recursos dos programas sociais e jogasse de helicóptero, os pobres teriam mais chances de receber o que lhes é devido”.

            É uma constatação terrível, mas faz sentido.

            Muito obrigado.




Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/10/2000 - Página 21005