Discurso durante a 148ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com o novo valor do salário mínimo, para não induzir a aumento de impostos.

Autor
Freitas Neto (PFL - Partido da Frente Liberal/PI)
Nome completo: Antonio de Almendra Freitas Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SALARIAL.:
  • Preocupação com o novo valor do salário mínimo, para não induzir a aumento de impostos.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 07/11/2000 - Página 21899
Assunto
Outros > POLITICA SALARIAL.
Indexação
  • DEFESA, OPORTUNIDADE, DISCUSSÃO, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, EPOCA, ELABORAÇÃO, ORÇAMENTO, UNIÃO FEDERAL, IMPEDIMENTO, POSSIBILIDADE, ALEGAÇÕES, INSUFICIENCIA, RECURSOS, REALIZAÇÃO, DESPESA, AUMENTO, SALARIO.
  • CRITICA, HIPOTESE, AUMENTO, IMPOSTOS, ORIGEM, FONTE, RECEITA, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, ONUS, ASSALARIADO, CLASSE MEDIA.
  • COMENTARIO, PESO, RENUNCIA, NATUREZA FISCAL, FAZENDA NACIONAL.
  • DEFESA, CRITERIOS, EXAME, PROPOSTA, OBTENÇÃO, RECURSOS, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, AUSENCIA, PREJUIZO, NATUREZA SOCIAL, NECESSIDADE, ESTUDO, REESTRUTURAÇÃO, ISENÇÃO FISCAL.

           O SR. FREITAS NETO (PFL - PI. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, embora com atraso, finalmente, chegou-se ao consenso de que se precisa elevar o salário mínimo para um patamar mais razoável, algo em torno de R$180,00. Tudo parece indicar que no ano que vem já teremos em nível nacional um salário mínimo com esse valor. Trata-se de reconhecer o óbvio, com os atuais R$151,00 é impossível cumprir-se a determinação constitucional de que todo trabalhador ganha o suficiente para atender as suas necessidade vitais básicas e as de sua família, como moradia, alimentação, educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e Previdência Social. Qualquer brasileiro sabe que apenas a alimentação absorverá mais de dois terços desse total, mesmo assim e se tanto para uma família pequena. É uma conta que não fecha.

Um reajuste condigno para o mínimo, bandeira assumida pelo Presidente desta Casa, Senador Antonio Carlos Magalhães, não constitui questão partidária. Não pode e não deve ver-se defendida apenas por uma corrente. Constitui uma questão nacional. A sensibilidade do Senador Antonio Carlos Magalhães e a persistência da Bancada oposicionista, nesta Casa como na Câmara dos Deputados, colocaram efetivamente o aumento real do salário mínimo na agenda nacional.

Todo economista sabe - embora alguns não o reconheçam - que é impossível garantir a prosperidade de um país quando uma parcela substancial da população conta com rendimentos insuficientes para inserir-se no mercado. Sem consumidores não haverá uma economia de escala, não será possível baratear a unidade de produção e não será atingida a produtividade indispensável para se dar o salto que nos colocará entre as nações mais desenvolvidas. Por mais que se louve a globalização, o último decênio comprovou que ela não dispensa a existência de mercados internos fortes.

O aumento real do salário mínimo não se resume, portanto, a uma dimensão ética, representando também uma questão de racionalidade econômica. Se o reconhecimento desse fato não chegou a garantir um reajuste condigno ao se discutir o salário mínimo no ano passado, desta vez tudo indica que se chegará a um resultado que, se não for o ideal - e dificilmente o será, tal o abismo criado entre o que se paga hoje e o que será razoável em qualquer tempo -, ao menos se aproximará mais do desejável.

O Presidente da República soube reconhecer esse fato e, com seu arguto senso de oportunidade, determinou que se aceitasse a correção do mínimo em níveis superiores aos inicialmente previstos pela sua equipe técnica. Impôs uma exigência: a indicação de fontes de recursos, o que é formalmente razoável consoante o espírito de racionalidade e de responsabilidade fiscal bem como o de transparência, hoje predominantes na ação do Estado.

Evidentemente, assim estabelecida, a questão conduz o Congresso Nacional a um desafio. Ao contrário do que ocorria no passado, o salário mínimo afeta antes o setor público que o setor privado. Especialmente nas Regiões Sul, Sudeste ou Centro-Oeste, são poucos, em números relativos, os empregados de empresas particulares remunerados com base no salário mínimo. A quase totalidade dos governos estaduais e o Governo Federal contam com poucos funcionários recebendo o salário mínimo. Recebem hoje o salário mínimo servidores de prefeituras das regiões mais pobres do Brasil, pequeno número - proporcionalmente - dos empregados do setor privado, em geral de prestadoras de serviços terceirizados, além de uma significativa parcela dos aposentados - infelizmente, pois quem tanto trabalhou merecia hoje um tratamento melhor.

Pelo peso que o salário mínimo representa para a Previdência Social e, em conseqüência, para as despesas bancadas pelos cofres públicos, a hora apropriada para se discutir o reajuste é esta, ou seja, quando se prepara o orçamento geral da União. Em anos anteriores, como se sabe, o reajuste do salário mínimo entrava em debate entre fevereiro e abril - pouco antes de se efetivar -, quando o Orçamento já estava pronto, o que limitava o alcance das providências a serem tomadas. Hoje, embora haja a exigência de indicarem-se as fontes de receita, não haverá como alegar insuficiência de recursos para fazer frente às despesas decorrentes do reajuste.

O consenso a que se chegou a respeito da justiça e inevitabilidade de honrar reajuste adequado para o salário mínimo fez com que as discussões se centrassem precisamente na indicação de fontes de receita. Já se aventaram dezenas de hipóteses. Uma delas é claramente inaceitável: o aumento de impostos. A carga tributária brasileira corresponde a 33% do Produto Interno Bruto, constituindo-se em uma das mais elevadas do mundo. Além disso, é injusta e inadequada, onerando determinados estratos sociais, em especial os assalariados de classe média, de forma bem superior às demais. Não podemos corrigir uma injustiça cometendo outra.

O remanejamento de recursos orçamentários também tem sido discutido. A proposta de Orçamento conta com dotações para investimento e custeio que ainda não passaram por crivo acurado. Nem todas as obras que dela constam são prioritárias, nem todo consumo previsto é indispensável. Basta avaliar as dotações de alguns Ministérios e constataremos que existem, com certeza, gastos a serem checados e, talvez, cortados.

Entretanto, é provável que não seja preciso chegar a isso. Em depoimento prestado à Comissão Parlamentar de Inquérito do Senado, o Ministro da Previdência e Assistência Social, Waldeck Ornelas, demonstrou a dimensão da renúncia fiscal em sua área. Pelos cálculos do Ministro, alcança mais de R$8 bilhões anuais, o que ultrapassa em muito as despesas com o reajuste do salário mínimo.

O peso da elisão fiscal sobre os cofres públicos - e nesse caso não apenas sobre as contribuições previdenciárias - tem sido mostrado fartamente pelo Secretário da Receita Federal, Everardo Maciel. São brechas absurdas, às vezes por simples deficiência da legislação e em outros casos por incentivos indefensáveis, que terminam por prejudicar políticas públicas e aumentar as desigualdades.

Essa é uma questão crucial. Estímulos fiscais são toleráveis ou mesmo recomendáveis quando visam a reduzir desigualdades entre regiões do território nacional ou entre estratos sociais. A própria Constituição assim o determina. Não é o que ocorre, como demonstrou o Secretário Everardo Maciel em várias oportunidades. A renúncia fiscal, que poderia ser reduzida para cobrir o acréscimo de despesas com o salário mínimo, acaba por conduzir à maior concentração de renda entre regiões e estratos sociais.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL - RR) - Senador Freitas Neto, gostaria de merecer-lhe um aparte, quando V. Exª julgar oportuno.

O SR. FREITAS NETO (PFL - PI) - Concedo o aparte a V. Exª com muito prazer.

O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PFL - RR) - É muito importante a abordagem que V. Exª faz da questão do salário mínimo, uma vez que desde o ano passado o Congresso, em especial o Senado, tomou posição firme em defesa de um salário mais digno para os trabalhadores. Evoluímos, porque o salário mínimo deixou de ser sempre estabelecido por decreto no primeiro dia de maio de cada ano, de acordo com o que entendia, digamos assim, o Governo Federal. Agora, estamos discutindo o assunto. A área econômica do Governo é composta de técnicos tão comprovadamente capazes, homens experientes na área, que não são capazes de indicar no Orçamento enviado para o Congresso as fontes para custear um salário mínimo de R$180, 00 (cento e oitenta reais) ou de R$200,00 (duzentos reais). Parece-me sobremodo admirável. É uma surpresa para mim que nos “joguem a peteca”, para que o Congresso Nacional encontre as formas de cortar, para estabelecer um salário mínimo que dê dignidade ao trabalhador brasileiro. Portanto, aproveitando o pronunciamento de V. Exª, conclamo a equipe econômica do Governo Federal para que, em vez de ficar nesse “jogo de empurra”, efetivamente, de coração e peito aberto, busque, junto com o Congresso Nacional, encontrar o modus faciendis, para que, todo ano, o Poder Executivo encaminhe o Orçamento com as previsões orçamentárias das receitas e despesas, de forma a que se corrija, minimamente, a distorção imensa que há no salário mínimo no Brasil. Muito obrigado pela oportunidade!

O SR. FREITAS NETO (PFL - PI) - Agradeço-lhe, Senador Mozarildo. Concordo plenamente com V. Exª e peço-lhe permissão para incluir seu aparte no meu pronunciamento.

Desta vez, pelo menos, já que os técnicos encarregados da elaboração da proposta orçamentária não mostram as fontes, devemos discutir. Louvo esse fato, porque, nos outros anos, antes de discutirmos, vinha a resposta pronta de que o Orçamento já estava votado. Aí sim, era completamente impossível fazer as alterações que o Congresso gostaria e que as finanças públicas pudessem suportar.

Devo dizer que ninguém deseja desequilibrar o Orçamento da República, ninguém quer a volta da inflação. Penso que essa foi uma grande conquista do povo brasileiro, especialmente do assalariado, pois a inflação era um imposto pesado que a classe mais pobre do País pagou durante muito tempo. É evidente que está na hora de resolver a questão. E, assim como V. Exª, também ratifico, conclamando os técnicos a fim de que sejam parceiros do Congresso Nacional no momento de solucionar a questão.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, temos um caminho a seguir. Não será o de manter em níveis irrisórios o salário mínimo. Não será o de aumentar a carga tributária de quem já está onerado ao extremo. Não será o de proceder a remanejamentos irresponsáveis na Proposta do Orçamento-Geral da União. Devemos, ao contrário, examinar criteriosamente essa proposta, para verificar quais os recursos que podem ser alocados sem prejuízos sociais. E devemos, antes de mais nada, reestudar a renúncia fiscal, verificando a quem beneficia e como poderá ser reestruturada.

Precisamos lembrar também que a injustiça não atende apenas aos trabalhadores que recebem o salário mínimo. Há muitas outras categorias profissionais que vêm arcando com o custo da atual política econômica em proporção muito maior que os demais.

Ao prever - corretamente - um aumento maior para o salário mínimo, a União está impondo um ônus aos municípios. Mais exatamente aos pequenos municípios do interior, aqueles que pagam o mínimo a certo número de seus servidores. A medida, repito, é acertada. Compete a esses municípios remanejar seus recursos, embora parcos, para garantir uma remuneração menos degradante aos funcionários. No entanto, também a União, como os Estados, praticam injustiças nessa área. A maior delas, talvez, é sonegar à grande maioria de seus funcionários, durante quase seis anos, qualquer tipo de correção salarial. O último reajuste do funcionalismo, vale lembrar, ocorreu em 1º de janeiro de 1995. A Proposta de Orçamento para 2001 também não inclui dotação para um reajuste, exceção feita aos chamados aumentos pontuais que beneficiam apenas algumas carreiras, assim condenando os servidores a mais um ano de aperto de cintos.

Ao proceder a esse exame global das dotações orçamentárias, em um esforço determinado pelo consenso a respeito da necessidade de se reajustar o salário mínimo, devemos aproveitar a oportunidade para estudar medidas que possibilitem um desafogo também em outras áreas. Talvez a mais grave injustiça que se pratique hoje neste País seja submeter trabalhadores - e em especial os aposentados - a sobreviver com o salário mínimo. Não é a única injustiça, porém. Outras existem, e precisam ser sanadas.

Obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/11/2000 - Página 21899