Discurso durante a 152ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa da extinção do Fundo de Amortização da Dívida Pública, com destinação dos recursos à área social.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • Defesa da extinção do Fundo de Amortização da Dívida Pública, com destinação dos recursos à área social.
Publicação
Publicação no DSF de 11/11/2000 - Página 22327
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, DETERIORAÇÃO, GASTOS PUBLICOS, GOVERNO, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, MAIORIA, POPULAÇÃO, AMPLIAÇÃO, EMPOBRECIMENTO, REDUÇÃO, QUALIDADE DE VIDA.
  • DEFESA, EXTINÇÃO, FUNDOS, AMORTIZAÇÃO, DIVIDA PUBLICA, VIABILIDADE, APLICAÇÃO, RECURSOS, SUPERAVIT, BALANÇO PATRIMONIAL, AUTARQUIA, FUNDAÇÃO, FUNDOS PUBLICOS, SOLUÇÃO, PROBLEMAS BRASILEIROS, NATUREZA SOCIAL, ESPECIFICAÇÃO, REFORMA AGRARIA.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, cada vez mais o Governo Federal abandona sua função primordial de agente de distribuição de renda e do desenvolvimento econômico e social, para, com entusiasmo, cumprir seu papel de crupiê do capital financeiro. Pois qual é o papel do crupiê nos cassinos? O crupiê é aquele rapaz que usa um quepe preto esquisito e trabalha com aquele pequeno rodo e, a todo momento, puxa para si as fichas alheias que repousam sobre o pano verde das mesas de jogo. Sua função é organizar as apostas, recolher o dinheiro delas, pagar aos que acertaram os prognósticos e direcionar o resto do dinheiro, o grosso do dinheiro, para a banca.

E é isso que o Governo Federal tem feito. Com uma pequena modificação. Recolhe o dinheiro não dos apostadores, mas do povo brasileiro, na forma de impostos; organiza a jogatina dos mercados financeiros, dando-lhes lastro seguro na forma de títulos públicos; depois destina o dinheiro dos impostos para pagar esses especuladores que operam com títulos públicos, esses capitalistas que, avessos ao risco e à função social que seu capital deveria cumprir na forma de geração de emprego e renda, preferem arriscar seu dinheirinho comprando dívida pública. Mas arriscar está longe de ser um verbo adequado para descrever essa situação.

O fato, porém, -- Senhor Presidente, -- é que, cada vez mais, os recursos escassos do contribuinte brasileiro são desviados dos gastos que dizem respeito à melhoria da vida do cidadão, -- os chamados gastos sociais, -- para serem despejados no bolso inútil e estéril da especulação. Menos saúde, menos educação, menos infra-estrutura urbana, menos crédito agrícola, menos irrigação, menos assistência social -- e mais dinheiro para pagamento de dívida pública, essa fornalha que torra o dinheiro do povo e que, à medida que queima dinheiro, mais dinheiro exige para queimar.

Ilustra esse fato, por exemplo, reportagem recente da Agência Estado que faz alusão a um estudo do IPEA e da qual passo a ler um pequeno trecho conclusivo:

“Do total das despesas [do Governo Federal] efetivas na última década, o montante destinado ao pagamento da dívida pulou de 50,23% para 63,29% [a partir de 1997]. Enquanto isso, o gasto social -- que em 1995 chegou a responder por 32,67% da despesa efetiva -- caiu para 22,88% no ano retrasado.”

Na verdade, para provar a deterioração dos gastos sociais no atual Governo, não se necessita de números. Basta dar uma olhada nas ruas e verificar a piora que têm sofrido as condições de vida da população mais pobre! Quem tem olhos -- vê; quem não tem -- se preocupa com estatísticas!

Entretanto não quero, no dia de hoje, ficar malhando em ferro frio! Quero me pronunciar contra um mecanismo perverso, que deveria ser desmontado de forma imediata!, e que tem sido um dos responsáveis pelo desvio de recursos das rubricas sociais para o pagamento da dívida impagável. Refiro-me ao Fundo de Amortização da Dívida Pública, instituído pelo Governo Federal em dezembro de 1997, sendo um dos itens relacionados no chamado Pacote das 51 Medidas, pacote baixado em conseqüência da crise da Rússia.

De acordo com essa determinação legal, as autarquias, fundações e fundos públicos federais ficaram obrigados a repassar para o Fundo de Amortização da Dívida Pública o resultado do superávit financeiro apurado em seu Balanço Patrimonial, isto é, passaram a recolher a um fundo destinado a amortizar a dívida pública qualquer sobra de caixa.

De acordo com levantamento e estudo feito a partir de dados colhidos do Sistema Integrado de Fiscalização Financeira (SIAFI), publicado no Jornal a Folha de São Paulo, somente em 1998 foram repassados ao Fundo de Amortização da Dívida Pública nada menos do que 1 bilhão 246 milhões de reais.

É curioso ver a situação do INCRA, -- órgão que está sempre à míngua de recursos para fazer frente a sua gigantesca tarefa, que é promover a reforma agrária no Brasil, não só doando terras, mas também dando condições técnicas e financeiras para que as famílias assentadas produzam. Pois bem, o INCRA repassou para o Fundo da Dívida, desde 1998 até agosto último, o montante de 208 milhões de reais! São recursos que deveriam estar sendo aplicados na finalidade para a qual foram instituídos, gastos no exercício posterior ao da sobra de caixa, como se fazia antes do Pacote das 51 Medidas, isto é, aplicados na reforma agrária; mas que, ao contrário, saem do campo e rumam para satisfazer a ciranda de papéis financeiros emitidos pelo Governo.

Não somente o INCRA, mas também as agências de regulamentação das telecomunicações e de energia elétrica, as universidades públicas, a CAPES, escolas técnicas e outros fundos destinados à educação e à saúde têm se convertido em grandes contribuintes para o pagamento da dívida pública, uma dívida que, como já disse, quanto mais se paga, maior fica. Esse dinheiro, -- volto a insistir, -- está sendo desviado de sua finalidade, de gastos que aumentam o bem-estar da coletividade, para serem carreados para o poço sem fundo da dívida pública: dinheiro que é sonegado à população!

Como se vê, o passo inicial para se tentar alguma recuperação dos gastos públicos, que têm sido deprimidos ano após ano, é revogar a lei que deu origem ao perverso Fundo de Amortização da Dívida. A crise da Rússia já está distante na memória, ocorreu no final de 1997. A crise já passou, mas o fundo permaneceu.

Por isso, torna-se necessário que se acabe com o Fundo de Amortização da Dívida Pública, cessando o pagamento dessa dívida com dinheiro necessário à sobrevivência do povo brasileiro!

Era o que tinha a dizer.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/11/2000 - Página 22327