Discurso durante a 162ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Comentários sobre a renúncia do Presidente Alberto Fugimori e sobre seu posicionamento referente aos interesses das empresas petrolíferas Shell e Mobil Oil, no controle do fornecimento de gás natural peruano.

Autor
José Fogaça (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: José Alberto Fogaça de Medeiros
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Comentários sobre a renúncia do Presidente Alberto Fugimori e sobre seu posicionamento referente aos interesses das empresas petrolíferas Shell e Mobil Oil, no controle do fornecimento de gás natural peruano.
Publicação
Publicação no DSF de 28/11/2000 - Página 23182
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, PERU, RENUNCIA, ALBERTO FUGIMORI, EX PRESIDENTE DA REPUBLICA, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, EXPECTATIVA, CONVOCAÇÃO, ELEIÇÕES.
  • ANALISE, ACORDO, POLITICA, PAIS ESTRANGEIRO, PERU, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), FAVORECIMENTO, EMPRESA MULTINACIONAL, AREA, ENERGIA, GAS, PETROLEO, REGISTRO, NACIONALISMO, ALBERTO FUGIMORI, EX PRESIDENTE, IMPEDIMENTO, MONOPOLIO, EXPLORAÇÃO, TRANSPORTE, DISTRIBUIÇÃO, GAS NATURAL, MOTIVO, LOBBY, RENUNCIA, GOVERNO, CRITICA, ORADOR, INTERFERENCIA, SOBERANIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 27/11/2000


            O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Havendo número regimental, declaro aberta a sessão.

            Sob a proteção de Deus, iniciamos os nossos trabalhos.

            O Sr. 1º Secretário em exercício, Senador ...................... procederá à leitura do Expediente.

            É lido o seguinte:

            EXPEDIENTE

 

            O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - O Expediente lido vai à publicação.

 

            O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - Concedo a palavra ao nobre Senador Paulo Hartung, para uma comunicação de liderança, por cinco minutos.

            O SR. PAULO HARTUNG (PPS - ES. Para uma comunicação de liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero registrar, com enorme satisfação, a reeleição para o quinto mandato consecutivo do Presidente da seccional capixaba da Ordem dos Advogados do Brasil, Dr. Agesandro da Costa Pereira. A justiça e a cidadania do Espírito Santo só têm a ganhar com a decisão dos advogados do Estado de reconduzir o Dr. Agesandro para o cargo, com 63% dos votos, numa eleição - disse inclusive a um amigo dele - consagradora. Encontra-se presente o ex-Ministro Bernardo Cabral, amigo do Dr. Agesandro, que faz questão que conste nos Anais que também faz esse registro.

            Indicado para receber o Prêmio Nacional de Direitos Humanos, por seu trabalho à frente do Fórum de Combate à Violência e à Impunidade, Agesandro da Costa Pereira é um dos grandes defensores dos direitos do cidadão. É, na verdade, um incansável combatente ao crime organizado do Espírito Santo e um lutador pela dignificação da advocacia e respeito às prerrogativas dos advogados.

            A sua passagem pela OAB tem sido marcada, ao longo de quase 10 anos, conforme suas próprias palavras, “pelo resguardo das instituições, à prevalência do estado de direito democrático, à defesa da cidadania, à luta pela seriedade, pela exatidão e pelo aperfeiçoamento institucional”.

            Por outro lado, Sr. Presidente, é motivo de preocupação para os políticos e homens de bem, que querem o melhor para o Espírito Santo, as constantes ameaças que o Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Espírito Santo vem recebendo em represália às suas ações contrárias ao crime organizado - eu mesmo já estive nesta tribuna, denunciando essas ameaças e pedindo providências ao Ministro da Justiça. Essas ameaças levaram o atual Ministro da Justiça a determinar que a Polícia Federal preste segurança à integridade física do Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil - Espírito Santo.

            As propostas de Agesandro para um novo mandato à frente da OAB-ES estão numa importante entrevista dada por ele ao Jornal A Gazeta, de Vitória, no último domingo, na qual fala dos últimos mandatos e dos seus planos para mais um período à frente da instituição.

            Na entrevista, ele relata a sua valiosa contribuição para os trabalhos da CPI do Narcotráfico e volta a denunciar a infiltração do crime organizado nas instituições do Espírito Santo, com a anuência de agentes políticos e de policiais.

            Por ser o Ministro José Gregori um atento observador dos acontecimentos no Espírito Santo - agora mesmo, há poucas semanas, eu estive no seu gabinete, levando o Prefeito eleito de Vila Velha, o jovem Deputado Max Filho, que também estava sendo ameaçado de morte - e por estar contribuindo muito com nosso Estado, creio que ele já deva ter tomado conhecimento da entrevista. Contudo, Sr. Presidente, requeiro, na forma do Regimento Interno, que seja enviada cópia desta comunicação ao Ministro, assim como da matéria de A Gazeta, que ora peço transcrição nos Anais da Casa, só para conhecimento dos colegas e de todos os telespectadores da TV Senado. A matéria tem como título

“O crime organizado está nas instituições”. Reeleito na OAB-ES, Agesandro da Costa Pereira afirma que há agentes políticos que servem ou fecham os olhos para o crime.”

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente. Repito o que mencionei no início da minha comunicação: a minha alegria, a alegria dos capixabas de ver o Dr. Agesandro reeleito com uma votação consagradora para mais um mandato na Ordem dos Advogados do Brasil, seccional Espírito Santo. Tenho certeza que, somando as entidades civis de defesa dos direitos humanos do Estado do Espírito Santo na luta contra a violência, contra a impunidade, que tem uma presença lamentavelmente na vida do meu Estado, superaremos esse momento difícil com a nossa luta e determinação.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR PAULO HARTUNG EM SEU PRONUNCIAMENTO.

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            O SR. PRESIDENTE (Nabor Júnior) - V. Exª será atendido na forma regimental.

            Concedo a palavra à Senadora Maria do Carmo Alves por 20 minutos.

            A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da Oradora.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nos últimos dias, têm-se tornado manchete repetitiva nos jornais de Sergipe, meu Estados, notícias alarmantes sobre a chegada da seca em nosso sertão e todo o rastro de dor que costuma acompanhá-la: a fome, a sede, os saques, a perda de safra, o desespero do nosso sertanejo. E a solução proposta para esse drama?

            Vendo as famigeradas frentes de emergência, além do abastecimento urgente de água e de alimentos para os sertanejos carentes, às vésperas da virada do milênio, é triste e frustrante constatar, no que diz respeito à forma de assistência do nosso semi-árido, que pouquíssimo se mudou em profundidade desde o século XIX, há cem anos.

            Se ocultássemos as datas, não veríamos distinção entre o teor das matérias dos jornais nordestinos de hoje e os órgãos de imprensa da região dos últimos meses de 1899, demonstrando um misto de absoluta incompetência e fria indiferença dos governos brasileiros ao longo do século que se extingue quanto às questões que angustiam o povo dos nossos sertões.

            O que é inaceitável, ao se verificar que inúmeros povos do mundo árido e semi-árido, pobres ou ricos, já transformaram as seqüelas da seca em problemas de um passado distante, com seus povos atualmente desfrutando da prosperidade de grandes produtores de alimento.

            A diferença básica é que esses outros povos construíram infra-estruturas permanentes para conviver normalmente com as estiagens, da mesma forma que os habitantes do hemisfério Norte aprenderam a conviver com seus invernos glaciais, enquanto aqui nossos Governos, tais como avestruzes, preferem enfrentar as secas com medidas paliativas e emergenciais, como se elas fossem desastres imprevisíveis da natureza.

            O imortal Euclides da Cunha, que, além de ser um dos maiores escritores da língua portuguesa, era um competentíssimo engenheiro, profundo estudioso dos nossos sertões, tinha uma noção precisa sobre o fenômeno das secas e não só o diagnosticava com absoluta perfeição, como apresentava, há cerca de 100 anos, soluções que estariam plenamente atuais nesses umbrais do século XXI. Em seu livro Contrastes e Confrontos, escrito em 1907, não só defendia toda uma estratégia integrada de forma permanente do Governo para o enfrentamento adequado da seca, como insistia que esse fenômeno natural do nosso semi-árido é “o único fato de toda a nossa vida nacional ao qual se possa aplicar o princípio da precisão”. O grande mestre lembrava aos incautos governantes que a seca “só nos impressiona quando aparece; é uma eterna e monótona novidade”. Em resumo, Euclides da Cunha defendia para a região, já àquela época, obras de acumulação de água, açudagem, irrigação, perfuração de poços, plantio de árvores adaptadas ao clima quente e a própria transposição das águas do rio São Francisco, o chamado rio da unidade nacional. Ainda que àquela época o rio São Francisco não havia sido submetido à cruel degradação ecológica que o desfiguraria, sobretudo nesses últimos 50 anos.

            No seu conjunto, eram soluções abrangentes não muito diferentes daquelas que seriam implementadas por outras nações ao longo do século XX com tal sucesso que as transformariam nos pólos de excelência da produção de alimentos do mundo moderno como o oeste americano, a Índia, a China e tantos outros.

            Interessante é que, se retrocedermos no tempo a 130 anos passados, à seca de 1877, a mais devastadora da história, responsável pela morte de mais de 500 mil nordestinos, o equivalente a mais de 5% da população brasileira de então - a maior hecatombe da nossa história -, vamos ler sugestões parecidas no relatório da comissão nomeada pelo Imperador para diagnosticar a tragédia. Indo mais além, chegando-se ao Brasil Colônia, à seca de 1794, que dizimou 1/3 da população da província de Pernambuco, vamos constatar que os métodos emergenciais usados para enfrentar a seca não diferiam muito dos métodos primitivos usados em nossos sertões dos dias de hoje.

            Seria interessante conhecermos em detalhes a verdadeira incúria administrativa e política que marca a trágica história das nossas secas no livro, lançado na semana passada, no Salão Negro do Senado, Vida e Morte no Sertão, de um autor cearense, Marco Antônio Villa.

            É verdade que nós, políticos nordestinos, não temos razões para nos orgulhar do retrato em preto e branco ali traçado, um retrato fiel do papel melancólico que temos desempenhado pela nossa omissão e, às vezes, subserviência, ante o imperador, ante presidentes e ditadores que, ao longo destes últimos 150 anos, com raríssimas exceções, têm tratado os nordestinos como verdadeiros párias no estabelecimento das prioridades nacionais.

            Trago essas questões pertinentes ao Nordeste brasileiro, Sr. Presidente, para reflexão nossa e deste augusto Plenário, no apagar do milênio, com a plena consciência de que, se não nos convencermos de que não há problema mais grave na realidade nacional do que as profundas desigualdades regionais, que já sendo as maiores do mundo moderno, tendem a se acentuar, se persistirmos em nos omitir, corremos o risco de, no decorrer do próximo século, vermos cindida a unidade nacional, o maior legado que nossos ancestrais nos transferiram. Não há mais espaço para mantermos dois países dentro de uma mesma nação. Ou, na antológica definição de que nos fala Edmar Bacha, a manutenção de uma Belíndia, uma Bélgica desenvolvida no Sul-Sudeste, ao lado de uma Índia miserável no Nordeste.

            Até porque temos um pleno conhecimento técnico e os meios de superarmos esse status quo infame, que agride nossos brios cristãos e de brasilidade.

            Só nos falta, Sr. Presidente, a firme decisão política. A mudança desse contexto é a missão indelegável que nos cabe neste momento.

            A questão crucial que se coloca é: considerando que o modo de se conviver com as secas, em sua grande maioria, já era conhecido pelos técnicos e políticos brasileiros há pelo menos 130 anos; considerando que as secas vêm provocando, ao longo dos 500 anos da nossa história, uma ininterrupta sangria nos cofres públicos; considerando que as secas promovem ciclicamente uma trilha de horror, provocando a miserabilidade de dezenas de milhões de sertanejos e a morte impiedosa de milhões de nordestinos; considerando que as secas são fenômenos perfeitamente previsíveis; considerando que está provado, por vários exemplos no mundo, que as regiões semi-áridas são economicamente viáveis; por que não se implementa uma infra-estrutura permanente que possibilite a extirpação da miséria do Nordeste e lhe dê condições de alcançar o pleno desenvolvimento auto-sustentável? Por que nossos sertanejos continuam a ser tratados como uma sub-raça, a quem, no máximo, nossa fria tecnocracia admite - depois de enormes pressões, é verdade! - lhes mandar as vergonhosas e inúteis esmolas das frentes de emergência, mas lhes nega peremptoriamente conceder um plano mínimo de obras, que lhes permita conviver digna e economicamente com as secas?

            Para se ter uma idéia do verdadeiro genocídio que se tem abatido sobre os nordestinos, recentes pesquisas extremamente conservadoras dão conta de que nos últimos 150 anos as secas foram responsáveis no mínimo pela morte de 3 milhões de nordestinos.

            Repito, Srªs e Srs. Senadores, três milhões de nordestinos foram mortos pelas secas. Isso sem incluir as dezenas de milhares de retirantes que morreram anonimamente nos seringais da Amazônia, para onde foram levados amontoados promiscuamente como gado, tangidos nos vagões dos trens destinados ao transporte de animais e, tempos depois, nos primeiros desumanos “paus de arara”. Convém ressaltar que dezenas de milhões de outros não morreram, no mesmo período, porque emigraram, numa das maiores diásporas da história, que levou os nossos melhores braços para construir o progresso de outras terras, desde a Amazônia ao desenvolvimento do Sul-Sudeste e, mais recentemente, a pujante nova fronteira agrícola do Centro-Oeste.

            Vale aqui um termo de comparação. Três milhões de mortos equivalem à metade dos judeus incinerados nos fornos crematórios alemães na 2ª Guerra Mundial, fato que estarreceu a humanidade, provocando a repulsa de todo o mundo civilizado. Paradoxalmente, dentro do nosso País, tais cifras estarrecedoras são apenas adendos estatísticos, manejados com frieza cirúrgica pelos nossos soberbos tecnocratas sob a cruel indiferença da nossa classe dirigente.

           Mas voltemos a nossa questão inicial: por que nada se faz de permanente em favor dos sertanejos nordestinos - e permanente é o que queremos -, para interrompermos esse circo de horror que se repete ao longo da nossa história? Por que, nessa virada de milênio, quando se ingressa na civilização do conhecimento, com todo o arsenal tecnológico à nossa disposição, nada de novo teríamos a apresentar a nossos antepassados de 200 anos atrás sobre os métodos de enfrentamento das secas?

           A resposta poderia ser resumida em apenas três palavras: falta de decisão política!

           Vejamos três exemplos emblemáticos da forma omissa, para dizer o mínimo, como nossos dirigentes têm tratado o Nordeste ao longo desse último século e meio.

           Comecemos pelo nosso piedoso Imperador Pedro II. Em plena seca de 1877, a mais dantesca que nos atingiu, enquanto centenas de milhares de sertanejos morriam de fome e sede, causando movimentos de solidariedade no mundo inteiro, Sua Majestade desfrutava de um badalado deleite intelectual ao lado de sábios da Europa distante. Mais recentemente, em pleno chamado milagre do regime militar, o poderoso General Presidente Médici visitou o Nordeste mergulhado em mais uma grande seca. Conta-se que o duro ditador chegou a chorar emocionado com a miséria que constatou, mas seu gesto de solidariedade parou aí. Enquanto Sua Excelência enxugava suas nobres lágrimas, assinava um decreto retirando 25% dos subsídios da região para construir a Transamazônica. Note-se que naquela fase do proclamado Brasil Grande, havia recursos abundantes para obras faraônicas por este Brasil afora. Mas, ainda assim, não se impediu de se desviar do modo insensível os minguados fundos destinados ao Nordeste para uma obra cujo esforço de execução deveria ser partilhado por todos os brasileiros e não apenas pelos mais pobres.

           Finalmente, é oportuno analisar o que ocorre no Governo atual, à frente do qual está um dos Presidentes mais cultos da nossa história. Mais do que isso, um cidadão que marcou sua rica biografia por uma luta em prol da construção de uma sociedade mais justa, não apenas como político. O renomado sociólogo Fernando Henrique Cardoso galvanizou minha geração pelas teses humanistas expostas brilhantemente em seus livros. Daí por que os corações nordestinos se encheram de esperança quando o intelectual idealista assumiu o Governo. Enfim, havia a firme esperança de que, pelo menos no fim do milênio, as teses de combate às desigualdades prevaleceriam e, evidentemente, ao Nordeste, que abriga mais de 50% da miséria absoluta nacional, seria dada a sonhada prioridade.

           Essa era a fé que se acendia nos sofridos corações dos nordestinos. Mas, já ressabiados com tantas decepções de promessas e juramentos descumpridos, no fundo se perguntavam: será que esse novo Presidente será um grande político, um verdadeiro líder, um estadista que planeja para as próximas gerações ou será apenas um político menor, que se preocupa tão-somente com as próximas eleições?

           O que esperamos, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com essa nova seca que assola o Nordeste, especialmente o meu Estado, é que o Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, possa implementar um plano nacional para uma convivência tranqüila com a seca, como já fizeram outros países do mundo civilizado. 

           O Sr. Edson Lobão (PFL - MA) - V. Exª me concede um aparte?

           A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL - SE) - Pois não, Senador Edison Lobão.

           O Sr. Edson Lobão (PFL - MA) - Senadora Maria do Carmo, as lamúrias do povo nordestino, que neste momento são transmitidas por V. Exª, são verdadeiras e não são novas, em verdade existem há séculos. Todo relato que faz V. Exª já demonstra isso. Houve momentos em que de fato pareceu que o Governo Federal desejou implantar uma política mais firme, mais direta, mais efetiva no sentido de minorar essa situação dos nordestinos. Recordo que, quando cheguei à Câmara dos Deputado, por volta de 1979, juntei-me ao Deputado Manoel Novais, um baiano, que fora o responsável pela criação da Companhia Vale do São Francisco, a Codesvaf, e juntos resolvemos fazer um diagnóstico completo das dificuldades e das mazelas que tanto prejudicavam, como ainda hoje prejudicam, o Nordeste brasileiro. Fizemos um simpósio, ouvimos todos os governadores do Nordeste, ouvimos ministros, sociólogos, cientistas; eu, que fora designado relator, ao final elaborei e procurei ser sucinto - e o levamos ao então Senhor Presidente da República, Sr. João Baptista Figueiredo. Havia 28 solicitações ao Governo Federal em caráter de urgência e de médio prazo. Dizíamos que, se essas 28 solicitações fossem atendidas, não se salvaria o Nordeste por inteiro, mas muito se mudaria na face calcinada daquelas terras tão sofridas. O Presidente, emocionado, no Palácio do Planalto, veio às lágrimas e determinou que, das 28 solicitações - e Sua Excelência teve a paciência de ouvi-las uma a uma - pelo menos 22 fossem implementadas prontamente pelo seu Governo. Sabe V. Exª quantas o foram? Nenhuma. Nenhuma delas foi cumprida pelos Ministros de Sua Excelência. Não se diga que o Presidente da República fazia apenas uma cena, não fazia. Sua Excelência não estava apenas encenando, mas sofrendo pelo povo nordestino naquele momento. Mas parece-me que há uma máquina demoníaca no Governo Federal, na Esplanada dos Ministérios, sejam quais forem os ministros, que não permite uma tomada de solução no sentido de resolver tais problemas. Virgilio Tavora, que foi Deputado, Governador, Ministro do Interior e Senador da República, era um bravo lutador por essa causa, tendo lutado dia e noite durante anos por uma solução para o Nordeste e também não conseguiu êxito. Penso que só com a mão de Deus conseguiremos. Quando Deus resolver retirar os hebreus do Egito, incumbiu Moisés dessa tarefa e teve que lançar as dez pragas sobre o Egito, ele próprio, Deus, mandava as pragas e fazia com que o monarca não cumprisse a ordem de retirar os hebreus. Tenho, portanto, a impressão de que o sofrimento do Nordeste está um pouco parecido com isso. Por mais que se faça, por mais que se reclame, por mais que estejamos aqui todos os dias - e V. Exª é uma palavra firme nesse sentido - a bradar pelo Nordeste, não avançamos quase nada. Em muitos momentos e em muitos lugares, nem sequer água há para beber. E agora se fala em transposição de águas do rio São Francisco, e muitos dizem que isso não significa nada, apenas 3% das águas atuais do São Francisco, que nenhum mal ou dano causaria, mas há também aqueles que acham que males imensos poderão sobrevir se essas águas forem transpostas. O fato é que estamos sempre diante de dificuldades cada vez maiores e de soluções cada vez mais distantes. Cumprimento V. Exª pela disposição de vir aqui lutar por seu povo, lutar pela sua gente, pelo pedaço do Nordeste, que é também meu, sofrido o meu tanto quanto o de V. Exª, mas, quem sabe, um dia, Deus vai apiedar-se de nós também.

            A SRª MARIA DO CARMO ALVES (PFL - SE) - Agradeço o aparte de V. Exª, Senador Edison Lobão, e incorporo-o ao meu pronunciamento. Acredito que temos de somar forças, a fim de lutarmos contra essa situação. Temos exemplos pontuais, no mundo inteiro e em vários Estados do Nordeste, de projetos que estão ajudando os sertanejos a conviver com as secas. E é por projetos como esses que acredito devemos lutar e batalhar.

            Muito obrigada.

 

            O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Concedo a palavra ao nobre Senador Gilberto Mestrinho, por 20 minutos.

            O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sábado passado, após duas semanas de discussões, foi encerrada em Haia a cúpula de 180 nações que buscavam encontrar um consenso sobre a questão do suposto aquecimento do globo terrestre.

            Nessas semanas, posições foram marcadas, idéias foram discutidas; mas o fundamental, o básico, aquilo que na Eco 92 foi estabelecido e posteriormente firmado em Kyoto, no Japão, em 1997, ficou totalmente em segundo plano. Por quê? Por uma razão simples: segundo fortes correntes de pensamento, a Terra está sofrendo um processo de aquecimento, e há projeções de que, até o fim do século, haverá uma elevação de até 5ºF a 6ºF na temperatura do planeta, podendo causar problemas para pequenas ilhas e alguns países baixos, alterações climáticas no mundo, aquecendo algumas regiões e melhorando sua agricultura e esfriando outras, piorando sua agricultura.

            Se esse suposto aquecimento está efetivamente acontecendo - os indicativos no histórico da civilização não o confirmam -, a verdade é que a sua causa fundamental não foi descoberta. Diz-se que esse aquecimento é conseqüência da emissão de gases e poluentes na atmosfera. No entanto, outras correntes dizem que a causa fundamental são as mutações do círculo solar e as explosões que acontecem no centro do nosso sistema, que trazem reflexos na temperatura do Universo.

            Tudo isso são conjecturas. Se a Ciência até hoje não conseguiu saber nem quantas estrelas há, nem quantas luas tem Júpiter, que faz parte do nosso sistema, quanto mais a causa fundamental do aquecimento terrestre. Contudo, diz-se que o motivo são esses gases, esses combustíveis. Quando falam nisso, afirmam que é preciso encontrar um sumidouro ou reduzir a emissão desses gases, sendo que estes são emitidos pelos países desenvolvidos, aqueles que queimam combustíveis fósseis porque têm grandes usinas, fábricas, veículos circulando. E tais combustíveis cobrem a troposfera, que está a mais ou menos 10 km de altura da Terra, impedindo a passagem do frio para as camadas mais baixas.

            Por outro lado, outros dizem que uma das causas desse aquecimento são as supostas queimadas na Amazônia. Imaginem que tolice, Srªs e Srs. Senadores, que barbaridade até do ponto de vista do bom senso!

            Primeiramente, a Floresta Amazônica inteira e todos os vegetais existentes sobre a Terra são conseqüência da absorção do gás carbônico da atmosfera. Então, os vegetais não são mais nem menos do que uma bateria de gás carbônico transformado em matéria. Mesmo que houvesse queimadas - e há queimadas no mundo inteiro, não só na Amazônia -, o que aconteceria? Apenas a devolução à atmosfera do carbono que havia sido retirado. O balanço seria zero. Não haveria acréscimo nenhum da quantidade de gás carbônico na atmosfera! Então, não há responsabilidade nenhuma das supostas queimadas na Amazônia pelo aquecimento da Terra.

            E mais, Srs. Senadores: somente os cerrados do Brasil central e o pampa gaúcho retiram da atmosfera 2 milhões de toneladas de gás carbônico por ano! E não estou falando de árvores, mas do cerrado, constituído de vegetação rasteira. Então, essas falácias inventadas, fonte de publicidade e escândalo, não têm nenhum fundamento científico no que diz respeito ao que se apregoa sobre nossa Amazônia.

            Sr. Presidente, voltemos a Haia. Discutia-se a possibilidade de aqueles países emissores de agentes poluentes na atmosfera, especialmente o CO2, pagarem uma contribuição obrigatória. Com tais recursos, seria estimulada a redução da emissão desses gases, como também seriam desenvolvidas atividades relacionadas à cobertura vegetal para sumidouro de gás carbônico. Infelizmente, dos 180 países presentes no Japão na época em que foi firmado o Protocolo de Kyoto, somente 30 países o subscreveram até hoje. Os outros não o fizeram, entre esses os principais.

            Isso vale um raciocínio: qual o país que tem mais cientistas no mundo? Os Estados Unidos. Qual o país que defende com mais ardor a sua qualidade de vida e os seus interesses? Os Estados Unidos. Qual o país que tem mais interesses diversificados no mundo inteiro? Os Estados Unidos. Então, se houvesse esse pavor, essa comoção de que a situação na Terra ficaria impossível de se viver, os Estados Unidos e o Canadá já teriam tomado uma medida há muito tempo e assinado o Protocolo de Kyoto - e não o fizeram.

            Sempre que defenderem o meio ambiente sadio às nossas custas, teremos uma posição contrária. Ora, se o mundo desenvolvido pretende desfrutar os seus padrões de qualidade de vida e um meio ambiente sadio, que nos pague por isso.

            O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Ouço o aparte do Senador Bernardo Cabral.

            O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Senador Gilberto Mestrinho, V. Exª é conhecido como uma das autoridades na matéria, e é bom que alguém aborde o chamado efeito estufa e o fiasco que foi a reunião em Haia, quando não se cumpriu nem o que havia sido decidido na Eco 92, depois do Protocolo de Kyoto. Os Estados Unidos não assinaram o acordo, declarando o representante daquele País que não pretendia alterar o seu way of life. Eles querem exatamente melhorar cada vez mais o seu padrão de conforto, o que provocou um protesto firme da representante da França que preside a reunião em Haia, demonstrando que temos razão - nós, amazonenses, que viemos sempre e a todo instante alegar que essas queimadas são uma falácia. Pelo menos em nosso Estado, continuaremos mantendo 98% da nossa floresta tropical intactos. Se a nossa floresta precisa receber uma retribuição de quem a está poluindo, nada melhor que ouvir o que V. Exª está registrando. Cumprimento V. Exª, Senador Gilberto Mestrinho, pelo pronunciamento. Quando as revistas de maior circulação, que fazem a opinião pública, divulgam assuntos que não são absolutamente verdadeiros em nossa região, precisamos fazer esse tipo de protesto, essa análise consciente, séria, apontando caminhos e indicando soluções. Vale a pena ouvi-lo na tribuna.

            O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Agradeço-lhe, nobre Senador Bernardo Cabral, o seu aparte, pela identidade de nossos pontos de vista e pela sua posição sempre em defesa da região amazônica.

            O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT - AM) - Concede-me V. Exª um aparte?

            O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Ouço o aparte do Senador Jefferson Péres.

            O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT - AM) - Senador Gilberto Mestrinho, é impossível termos certeza se as previsões catastróficas para um futuro não muito distante acerca de derretimento de calotas polares e de elevação das águas oceânicas serão realmente confirmadas e em quanto tempo. Está certo quem divulga essas previsões ou quem as nega? Não sei. Mas creio que, pelo sim, pelo não, será bom para toda a humanidade que as nações mais poluidoras comecem realmente a reduzir, por pouco que seja, a quantidade de poluentes que jogam na atmosfera a todo instante. O Protocolo de Kyoto sugere cerca de 5% de redução até 2012. É claro que as queimadas na Amazônia e em outras florestas tropicais têm uma contribuição mínima, em comparação com a queima de combustíveis fósseis em todo o mundo. Não somos os grandes vilões nessa história, mas apenas “vilõezinhos”. Seria melhor que aceitássemos a tese do mecanismo de desenvolvimento limpo, segundo o qual eles, quando não cumprissem as metas, emitiriam certificados que permitissem investir nos países que estivessem cumprindo metas em projetos de reflorestamento. Assim, receberemos algum benefício, e eles reduzem ou pagam pelo que fizeram, sem estabelecer um imposto, que é uma contribuição coercitiva e difícil de ser aceita pelos países ricos. Pelo menos, o MDL é uma forma inteligente de tentar conciliar interesses. Concordo com V. Exª de que não podemos embarcar nessas previsões apocalípticas, mas também não devemos pensar que tudo o que se está prevendo em termos de piora do meio ambiente num futuro previsível seja incorreto. Em parte, eles devem ter razão, e é bom que tomemos cautela. Não, evidentemente, jamais, abdicando do nosso legitimo interesse de nos desenvolvermos.

            O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Agradeço-lhe pelo aparte, nobre Senador Jefferson Péres.

            Certa vez, numa sala de aula, uma professora disse “Daqui a cinco mil anos, o mundo vai acabar”, e o Joaquinzinho perguntou: “Quando, professora?”. Ela respondeu “Daqui a cinco mil anos”, e ele, “Ah bom, pensei que fosse somente em três mil”.

            Há uma diferença muito grande entre a queima dos combustíveis fósseis e a queima de restos de campos ou de florestas. O combustível fóssil vem do centro da Terra e agrega à atmosfera, especialmente à troposfera, o gás carbônico. Já a queima da floresta ou dos campos devolve à atmosfera o gás carbônico que havia sido retirado. Há essa diferença. Daí por que os países poluidores deveriam dar uma contribuição para aqueles países que podem manter ou formar florestas, para servir de sumidouro para esses gases. Pode-se também reduzir as emissões, o que é muito difícil sob certos aspectos, porque eles, desenvolvidos, não querem atrasar o seu progresso, o seu desenvolvimento, o seu crescimento econômico. E qualquer redução importa nisso.

            As companhias de petróleo já protestam, exigindo indenização caso haja redução no uso dos combustíveis fósseis - especialmente do petróleo. A Nigéria, a Arábia Saudita têm protestado contra isso. Por quê? Porque, infelizmente, quem domina o mundo é a força econômica, o interesse econômico. Os países hegemônicos, ou os países que dominam determinados nichos da atividade humana, dão as cartas e jogam de mão.

            Essa, infelizmente, é a situação dolorosa que todos vivemos. Mas, o fundamental, o importante, é que o Governo brasileiro, especialmente a delegação brasileira que nos representa nesses conclaves, nessas conferências tome posição favorável ao interesse nacional, ao interesse do Brasil, e que não sigam modismos, ou sigam a opinião nem sempre acertada, nem sempre nacional de certas ONGs, ou de certos “ongueiros” que acompanham a delegação brasileira. Essa é a realidade.

            O Brasil não deve seguir a opinião daqueles que entendem que não é ético aceitarmos pagamento por sermos sumidouros de todo esse lixo que jogam na atmosfera. Antiético é nos engessarem, estrangularem-nos, não quererem que se faça nada na Amazônia para o desfrute de seu bem estar e continuarmos sendo o sumidouro, de graça, com a conivência de autoridades brasileiras. Isso é que não aceitamos.

            Assim, feitas tais colocações, gostaria de dizer que nós, da Amazônia, desejamos um desenvolvimento racional, um desenvolvimento sustentado que dê às gerações presentes um meio de vida sem sacrificar as gerações futuras. Mas que não queiram que as gerações presentes não façam algo em seu benefício, em razão das gerações futuras. Vivemos o hoje. O hoje é que é fundamental; o ontem não volta, e o amanhã nunca chega.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

            O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Tem a palavra o Senador Antonio Carlos Magalhães, por cessão do Senador Sebastião Rocha e permuta com o Senador Jefferson Péres.

            O SR. ANTONIO CARLOS MAGALHÃES (PFL - BA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, há cerca de uma semana, eu denunciava da tribuna do Senado um escândalo na Sudam. Hoje, volto com elementos indiscutíveis e, dentro em pouco, apresentarei mais sobre a corrupção mais deslavada do Brasil: a Sudam.

            Quero dizer que o Jornalista Josias de Souza tem feito um trabalho que o Brasil deveria agradecer, que é tão sério, tão profundo, tão verdadeiro. Entretanto, as coisas estão ocorrendo no Brasil como nunca aconteceram antes. Tudo passa normalmente como se a corrupção não fosse um mal para esta Nação. Luta-se por um salário mínimo de R$180,00, hoje menos de US$100, e as fontes do Governo dizem que não há como pagar. Bastaria o dinheiro da corrupção na Sudam para que o Governo não discutisse como pagar o salário mínimo.

            Digo com todas as letras que a Sudam é hoje, no Brasil, o maior covil de ladrões. Não há meias palavras, está provado pelas reportagens apontadas. A de ontem é intitulada: “Governo engasga com R$180 milhões e engole R$690 milhões”. Essa reportagem, inclusive pedirei sua transcrição, é um documento suficientemente forte para que o Governo interviesse hoje na Sudam. Não creio que vá acontecer porque os padrinhos da Sudam são poderosos, são corruptos. É com o dinheiro da Sudam que pagam matérias para ofender a minha pessoa e a minha família, inclusive minha filha. Tal acontece em um País que despreza os valores morais. Mas os valores morais vão mudar a situação por bem ou por mal. Não pensem os corruptos que vão ficar sossegados. Enquanto eu vida tiver e assomar a esta tribuna estarei sempre aqui para adverti-los; estarei sempre aqui para demonstrar que este País tem jeito, tem jeito sim, mas só tem jeito depois que extirpar a corrupção.

            E o pior, hoje um dos apontados por corrupção, o Sr. Maurício Vasconcelos, em vez de defender-se acusa; não há uma defesa sequer sobre esses R$690 milhões. Ele confessa, não sei se corajosamente ou cinicamente, tudo o que as reportagens têm publicado.

            Fala-se tanto nesta Casa em CPI - coisa que acredito sempre salutar -, mas não saiu uma CPI sobre a Sudam. Já devia a Sudam, por motivo de higiene, pela Vigilância Sanitária talvez do Dr. Serra, estar ou fechada ou higienizada. O País não pode continuar com essa sangria!

            Ainda há poucos dias, na quarta-feira passada, um empresário me procurou, foi a minha casa; levou documentos irrefutáveis e me disse que não suporta mais. O homem chorou e o fez porque não pode pagar as comissões que se exigem. E - manda a verdade que eu o diga - esse empresário fez questão de dizer que o Ministro não tinha culpa; que tinha tratado do assunto com S. Exª, e que prometera resolvê-lo. Mas, por acaso encontrei o Ministro em São Paulo, disse-lhe que iria fazer este discurso, que o assunto iria para a imprensa, e que mandava a verdade que lhe dissesse que esse empresário que conversou comigo não o culpava mas a toda a máquina do Ministério e à Sudam e apresentou dezenas de casos - que transcreverei - envolvendo milhões e milhões de reais em que os donos da Sudam e o Senador que a protege estavam diretamente envolvidos.

            Quero dizer a esta Casa que não tenho o que temer pessoalmente e nem a minha família. As ofensas que fizerem não me atingirão e serão repelidas judicial e moralmente. Cumprirei o meu dever até o fim. Com o apoio desta Casa, estou certo. Mas, mesmo que fosse um só, não desistiria desta cruzada, cuja bandeira partidos adversários, como o PT, utilizaram em favor da ética e da moral, e os resultados lhes foram favoráveis nas últimas eleições. Conseqüentemente, não pensem os senhores que aqueles que não estão defendendo a moralidade pública ou administrativa vão vencer eleições com o dinheiro roubado. Não! A consciência livre do povo brasileiro é maior do que esta. Roubam o dinheiro, ficam marcados perante o eleitorado, ficam marcados perante as suas famílias e nos acusam daquilo que fazem. Aí sim é o Satanás pregando quaresma! É nesse caso, sim, da Sudam que Satanás aparece por inteiro pregando quaresma!

            Ora, Sr. Presidente, a Nação que enfraquece os seus valores morais não vence. Não há desenvolvimento à custa da imoralidade. Não há segurança quando o organismo público é corrupto. Então quando isso acontece nessas áreas maiores não queiram exigir da polícia seriedade, não queiram punir os contínuos quando se devem punir os dirigentes. Essa triste situação que atravessamos não pode continuar. Se quiserem há exemplos à vontade: assessorias são criadas pelas próprias pessoas da Sudam para tirar seu dinheiro, mas nada é feito, passam àqueles que nomeiam e fazem a farra com o dinheiro público. Isso é ruim para a Amazônia, que é patrimônio nacional e internacional, que não pode nem deve ser explorada pelos estrangeiros nem pelos maus brasileiros que estão dirigindo seus destinos.

            Sr. Presidente, tenho aqui uma série de empresas com projetos irregulares. Nesta lista há mais de quinze, nesta outra há mais de vinte. O caso da Planalto Industrial é das maiores vergonhas que conheço. O próprio pedreiro Manoel Trindade relata que foi procurado por Manoel Monteiro, proprietário da empresa Interlagos Bolsas e Veículos, que lhe ofereceu R$100 mil pela utilização de seu nome na transição de financiamentos da Sudam. Tenho isso gravado. Assim como esse caso, há centenas de outros do Sr. Manoel Monteiro, que cita ter entregue a um Senador e a uma Deputada recursos para ter êxito nos seus projetos.

            Sr. Presidente, não se trata de querer ofender ninguém, mas de uma prestação de contas de um mandato que espero honrar até o fim, sem deixar que fatos como esses passem despercebidos.

            Ah, se houvesse uma CPI para ouvir Maria Auxiliadora Barra Martins! Esse nome provavelmente não é desconhecido dos amazonenses e muito menos dos paraenses. Precisamos saber como funciona o esquema da Sudam.

            O esquema da Sudam funciona na base de dois artigos dos seus estatutos: o quinto e o nono. O art. 5º é para os ladrões completos e o art. 9º para os que querem ainda ter uma capa de seriedade. Pelo art. 5º, o dinheiro é todo da Sudam; pelo art. 9º, dá-se a oportunidade de captação de recursos. Esse pode ter projetos sérios e projetos desonestos. No caso desse de R$190 milhões citado ontem, confirmou-se hoje que o senhor proprietário da Usimar recebeu o dinheiro. Encontra-se aqui um pedido correto da Governadora do Maranhão: que o projeto, se aprovado dentro das regras - o repórter faz questão de dizer - e das disponibilidades seja localizado no Maranhão. Coisa que faço, que ela faz e que todos fazem. Mas o que não se pode dizer, desse projeto, é que ele é a maior imoralidade já vista na vida pública. Confessa o Secretário Maurício Vasconcelos, um pecador também, que esse projeto não vai seguir o curso, porque o homem recebeu o dinheiro e não deu nenhuma contrapartida, e milhares e milhares de reais que poderiam estar em outras ações honestas do Pará e do Amazonas, da região amazônica, não são concretizadas por falta de recursos.

            Venho a esta tribuna pedir providências ao Senhor Presidente da República. Os documentos estão aqui. Vamos passá-los à Taquigrafia. A sindicância não precisa ser feita, porque o Secretário do Ministério confessou. O que precisa, como disse o repórter, é o Governo mostrar que está vivo e condenar essa ladroagem oficializada havida na Sudam para destruir a moralidade da Amazônia, que merece respeito. A Sudam é, como disse, o covil de ladrões maior deste País. Portanto, peço ao Senhor Presidente da República e ao Sr. Ministro Fernando Bezerra que tomem as providências necessárias. A confissão, o Secretário do Ministério já fez e o fará com relação a todos os outros, que são iguais a esse caso, fruto de furtos.

            Daí por que assomo a esta tribuna hoje, com a responsabilidade do meu mandato. Caso não o prove, deixo o mandato, trazendo inclusive o empresário que chorou na minha casa porque não pode mais trabalhar ante a roubalheira da Sudam.

            Chegou o momento em que o silêncio, a omissão do Governo passa a ser conivência, e essa conivência é danosa pelos efeitos morais que causa à Nação brasileira.

            Tenho certeza de que o Senhor Presidente da República não tem conhecimento, pelo menos, da extensão desse fato. De hoje em diante, não pode ignorá-lo nem Sua Excelência, nem o Ministro, nem aqueles que continuam lesando a Amazônia por meio de esquemas políticos e imorais.

            Podem, Sr. Presidente, atacar-me e a minha família impoluta. Usaremos dos processos legais no Judiciário. Porém, mais do que no Judiciário, a minha voz estará sempre alerta nesta Casa, para defender a honestidade e a seriedade da vida pública brasileira, sem a qual este País jamais se desenvolverá.

            Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR ANTONIO CARLOS MAGALHÃES EM SEU PRONUNCIAMENTO.

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            O SR. PRESIDENTE (Geraldo Melo) - Concedo a palavra ao Senador Jefferson Péres.

            O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso.) - Senador Antonio Carlos Magalhães, os fatos denunciados na imprensa a respeito de projetos aprovados na Sudam são muito graves. V. Exª fez bem em verbalizá-los na tribuna. Espanta-me que o Presidente da República não tenha determinado enérgicas providências ao Ministro Fernando Bezerra para apurá-los.

            Devo, no entanto, esclarecer a V. Exª, Senador Antonio Carlos Magalhães, que a Sudam está a 1.500 quilômetros de Manaus. A sede dela é em Belém. Asseguro-lhe que nenhum superintendente da Sudam foi indicado por políticos do Amazonas. De forma que, se V. Exª quiser propor uma CPI, estou disposto a assinar o requerimento tranqüilamente - e creio que, também, os demais Senadores do Amazonas.

            Espero providências do Executivo e do Ministério Público também.

            O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT - AM) - Com muito prazer, Senador.

            O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Senador Jefferson Péres, fico muito contente que os três Senadores do Amazonas defendam essa CPI. Partindo de V. Exª, cuja moral é inatacável, cuja vida pública honra seu Estado e o País, fico satisfeitíssimo de saber que esses superintendentes jamais tiveram o aval de homens do porte de V. Exª. A origem é outra. Todos sabem; só o Governo não quer ver.

            O SR. JEFFERSON PÉRES (Bloco/PDT - AM) - O assunto levantado por V. Exª, de certa forma, relaciona-se com o que pretendia abordar. Mostra quão injusto é este país chamado Brasil, Senador. Os recursos da Sudam, como os da Sudene, são oriundos do Imposto de Renda. Os incentivos fiscais são Imposto de Renda devido e que a legislação permite sejam aplicados no Nordeste e na Amazônia. Esses recursos, que deveriam ser recolhidos aos cofres públicos, são dinheiro público, portanto, que está sendo, há décadas, em grande parte, desbaratado. Para usar uma palavra dura, mas corretíssima, esse dinheiro está sendo furtado, Senador Antônio Carlos Magalhães. Enquanto os bilhões de Imposto de Renda - se contados os mais de 30 anos da Sudam - são dessa forma malbaratados, o Governo tunga a classe média brasileira, mete a mão no bolso da classe média brasileira ao não fazer a correção da tabela de deduções.

            Os Parlamentos foram criados para legislar, mas também, e principalmente, para conter a voracidade fiscal dos governantes. Nós, Congressistas, temos a ilusão de que fazemos esse controle e, na verdade, pelo menos no Brasil, o Poder Executivo abusa do poder de tributar.

            A Constituição foi generosa ao permitir que o Governo possa elevar ou reduzir por decreto as alíquotas de dois impostos tão importantes quanto o IPI e o Imposto de Importação, e ficamos na ilusão de pensar que não é possível fazer o mesmo com o Imposto de Renda. No entanto, eles vêm fazendo isso há seis anos; e o Congresso assiste impassível e impotente a esse abuso de tributação por parte do Poder Executivo.

            O jornal O Globo há dias publicou matéria a respeito, outros órgãos da imprensa também o fizeram. Ontem o articulista Elio Gaspari voltou ao assunto, mostrando quanto isso está custando aos assalariados, principalmente aos servidores públicos, dois terços dos quais não têm reajuste há seis anos e vêm, portanto, sendo duplamente lesados, com o congelamento dos salários e agora com a não correção da tabela de deduções do Imposto de Renda. Juízes de primeiro grau têm concedido liminares que o Supremo Tribunal Federal cassou, sem apreciar o mérito, mas duvido muito que o Poder Judiciário considere constitucional o poder de aumentar o Imposto de Renda indiretamente, como vem fazendo o Poder Executivo. O Senador Paulo Hartung apresentou projeto, visando a coibir esse abuso. Lamento S. Ex.ª não estar presente, mas tenho dúvida quanto à constitucionalidade de seu projeto, em razão do vício de origem quanto à iniciativa, que em matéria tributária só pode ser do Executivo. Não sei se por via de um projeto de resolução se poderia no Congresso Nacional fazer algo nesse sentido. Se for o caso, creio que até a própria Constituição deveria ser emendada. O que não podemos é assistir, de braços cruzados, ao Governo aumentar os impostos dos assalariados sem que o Congresso, ¾ que foi, em sua origem histórica, criado para evitar isso, ¾ às portas do terceiro milênio, nada possa contra esse abuso. Vou examinar de que forma - via decreto legislativo ou via emenda à Constituição - poremos um cobro nisso. Contudo, o fato é que grande parte da sociedade brasileira clama e reclama, com toda a razão, da inatividade do Congresso diante de uma prática que se vai constituindo num verdadeiro escândalo, intolerável para os autênticos representantes do povo.

 

           O SR. PRESIDENTE (Álvaro Dias) - Com a palavra o Senador Bernardo Cabral.

           O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a vida, às vezes, é repleta de coincidências.

           Tenho em mão um livro, que acaba de ser publicado na França, intitulado A Amazônia e a Globalização, pela Editora L’Harmattan, que tem, não só naquele país como também no Canadá, na Hungria e na Itália, filiais. A obra é de um graduado na Universidade Católica de Louvain, com Doutorado em Sociologia na Universidade de Berlim. Ele fala - e depois vou abordar o tema - sobre o perigo que cerca a Amazônia.

           Já hoje, nesta Casa, o Senador Antonio Carlos Magalhães anuncia um perigo maior. Ao longo de seu discurso, registrou que não era bom para nós daquela região que o mundo tomasse conhecimento de um órgão que é obrigado a cuidar do seu desenvolvimento se visse tisnado pela corrupção.

           Quero dizer ao Senador Antonio Carlos Magalhães que, além de nenhum de nós três termos feito nenhuma indicação, também não temos nenhum projeto que merecesse nossa interferência para a sua aprovação. Ainda bem que isso nos salva, e nos salva por uma razão muito grave, que vou sugerir a V. Exª.

           A denúncia feita, a documentação trazida, os indicativos que aqui foram devidamente apreciados -- e é claro que não preciso de mais nenhuma CPI - formam, por si, uma notitia criminis absolutamente formada. Sugeriria à Mesa, que acaba de tomar conhecimento do discurso, Senador Antonio Carlos Magalhães, que não se possa omitir de encaminhá-lo ao Ministério Público Federal para as providências penais cabíveis. Isso não pode ficar aqui apenas. Não há como não se ecoar lá fora. Ou esses homens públicos têm remorso - e o remorso é o filho bastardo da consciência com o crime -, ou vamos ficar vendo, cada vez mais, a população tomando conhecimento de que se não dá um mínimo para o que se chama de salário, e se amplia a corrupção, conforme denunciou o Senador Antonio Carlos Magalhães.

           Vejam o que quero dizer: enquanto lá fora o professor Argemiro Procópio faz uma obra com quase 300 páginas, verdadeiro hino de louvor à Amazônia, que trata, durante muitos anos, já que viveu no Amazonas, da sua preocupação, que seja um patrimônio nosso, nacional, os brasileiros estão dilapidando esse patrimônio, por meio da via oblíqua da corrupção.

           Observe, a obra é divida em três partes, e por isso que falo na coincidência aqui tratada no discurso do Presidente do Senado. A primeira parte trata das raízes históricas da globalização na Amazônia, e ele subdivide em dois capítulos: “A Igreja no Processo de Colonização da Amazônia” e “Padres e Soldados na Conquista do Mundo Amazônico”. A segunda parte se ocupa da globalização e da miséria - essa miséria que se amplia porque os recursos financeiros não são lá aplicados - e é subdividida em três capítulos abordando “A Decadência da Agricultura e o Começo das Drogas”, “Monocultura Amazônica no Contexto Agroalimentar Mundial” e, por fim, “A Redescoberta do Ouro”. A terceira parte aborda a Amazônia nas relações internacionais e se subdivide em dois capítulos: “A Integração pelo Tráfico de Droga” e “O Colonialismo Ecológico e o Comunismo”.

           O Professor Argemiro Procópio foi um homem perseguido pelo governo militar. Em 1972 teve que se ausentar do Brasil. Atualmente é professor de Relações Internacionais na Universidade de Brasília.

           O que chamo de coincidência? O Senador Gilberto Mestrinho iniciou falando a respeito da Amazônia, mostrando os riscos que todos nós corremos pelo desrespeito àquilo que se convencionou na Eco-92, no Protocolo de Kyoto e agora com o fiasco na Conferência de Haia. Ou seja, a Amazônia está no cenário mundial como a região mais rica do Brasil e que, no entanto, pelo descaso, pelo desleixo e, sobretudo, pela omissão das autoridades, que deveriam logo, tão-somente, com uma publicação, chamar à responsabilidade seus subordinados e não o fazem e, consequentemente, ficamos, nós da região, a ter que sofrer na pele, ouvir uma acusação altamente procedente, altamente oportuna e não podermos fazer nada, porque se trata, infelizmente, daquilo que grassa neste País, que é a corrupção.

           O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT - AM) - V. Exª me permite um aparte?

           O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Ouço V. Exª com prazer.

            O Sr. Jefferson Péres (Bloco/PDT - AM) - Veja, Senador Bernardo Cabral, enquanto vozes no mundo acadêmico no Brasil e no exterior se levantam em defesa da Amazônia e daquele enorme patrimônio que temos lá, dentro do Brasil, além de fatos como este trazido à tribuna pelo Senador Antonio Carlos Magalhães, de verdadeiro saque da região, ainda ocorre a miopia de setores políticos do nosso País. Há um ano lutamos aqui, nós da Bancada do Amazonas com a ajuda de outros Senadores de outros Estados, para que respeitem a nossa Constituição, para que nos concedam, mantenham incentivos fiscais que a Constituição prorrogou até 2013 e que teimam em nos negar, Senador Bernardo Cabral, sem atentarem para a consolidação do Parque Industrial de Manaus, que está relacionado com a preservação da Floresta, que no Amazonas chega a 98% da nossa reserva florística preservada, graças, em grande parte, àquele parque industrial gerado pela clarividência do Marechal Castello Branco. Tentam nos negar esse fato por meio de uma luta mesquinha em torno de dois produtos, Senador Bernardo Cabral, que são importantíssimos para a consolidação daquele parque e nada representam para o parque industrial do Sudeste. Estamos lutando há um ano. O desfecho será amanhã na reunião da Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Veja que contraste brutal entre a lucidez de tantas pessoas do mundo acadêmico, no Brasil e no exterior, e, repito, a miopia de tantos homens públicos deste País.

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Há pouco, Senador Jefferson Péres, quando se reportava às palavras do Senador Antonio Carlos Magalhães, V. Exª lembrava que o resultado do Imposto de Renda e de incentivos fiscais decorrentes dessa circunstância fomentaram esse tipo de corrupção. A Zona Franca de Manaus não recebe um centavo de Imposto de Renda e nem qualquer ajuda do Governo Federal. Recebe incentivos fiscais das empresas que para lá vão, porque sentem que há segurança constitucional. É o que o Governo muda e não diz, talvez porque não esteja sendo bem informado por sua assessoria. É realmente amanhã que travar-se-á a luta, mas em um nível diferente do que a imprensa tem noticiado. Esquecem-se de que a Zona Franca da Manaus inclui toda a Amazônia ocidental: Amazonas, Acre, Roraima, Rondônia. Portanto, não é circunscrita ao nosso Estado. Ali teremos apenas, segundo alguém diz, um convencimento de que só queremos para nós, quando temos repetido várias vezes, não fosse o Nordeste, o Centro-Oeste e o Norte unidos, não estaríamos dando nenhum passo, porque se convencionou dizer que queremos levar para o Amazonas as indústrias de São Paulo ou mesmo de outros Estados, o que não é verdade, não queremos é que nos tirem as nossas indústrias.

            O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - Permite-me V. Exª um aparte Senador Bernardo Cabral?

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Ouço já V. Exª, Senador Gilberto Mestrinho.

            Eu gostaria de completar meu raciocínio sobre esse problema do lado acadêmico, traçando um estudo sobre a Amazônia.

            Essas riquezas todas, a premissa que se faz para se chegar a uma conclusão atual fica difícil quando aparecem denúncias de corrupção, porque dá a entender que naquela região só sobrevive quem faz a comissão.

            Ora, um empresário que vai a casa do Presidente do Senado Federal e mostra, demonstra, prova que ela exista, não é possível que haja da nossa parte uma omissão. Quero dizer ao Senador Antonio Carlos Magalhães que a Bancada do Amazonas irá até o fim para apurar essa onda de corrupção que V. Exª denunciou. Não haverá da nossa parte nenhuma omissão, porque aí não se trata de coloração político-partidária, mas, sim, de uma região que precisa ser respeitada. Esteja certo V. Exª disso.

            O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Bernardo Cabral?

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Pois não, Senador Antonio Carlos Magalhães.

            O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - Senador Bernardo Cabral, aproveito a oportunidade para dizer que fiquei muito feliz, sobretudo com a forma e competência com que V. Exª coloca os assuntos, o que já é da tradição de V. Exª de parlamentar de muito tempo. Hoje, num discurso inesperado, V. Exª vem demonstrar ao Plenário desta Casa e ao País a posição unânime da Bancada do Amazonas contra os desmandos e a corrupção na Sudam. V. Exª o faz com muita propriedade e ainda sugere que a Mesa envie a denúncia com rapidez ao Ministério Público para que seja apurada devidamente. Comandarei essa batalha, mas, agora sim, inspirado no gênio de V. Exª, que sempre está a serviço das boas causas no País. Muito obrigado a V. Exª.

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Eu que agradeço, Senador Antonio Carlos Magalhães, porque o assunto é de uma responsabilidade muito grande e não tem como não encontrar eco nesta Casa. De modo que, tão logo seja encaminhada a denúncia ao Ministério Público, se for necessária alguma contribuição, - esteja convencido disso - a Bancada estará marchando ao lado de V. Exª.

            Ouço o Senador Gilberto Mestrinho com muito prazer.

            O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - Senador Bernardo Cabral, V. Exª está abordando um assunto muito oportuno, inclusive porque é a manifestação de um estudioso da Amazônia que viveu no exterior e não está impregnado dos falsos mitos que dizem respeito à região. A Amazônia é muito diferente da idéia que se tem aqui e que se espalha no Brasil inteiro, cheia de falácias, de mistificação, sem a busca de razões históricas, como está exposto nesse livro, e das conseqüências da evolução das atividades econômicas no mundo inteiro, o avanço tecnológico, e os seus reflexos na própria região amazônica. E mais, há aquela concepção de que existe no País, para alguns, brasileiros de primeira e de segunda. Essa idiossincrasia que alguns têm em relação ao caboclo e ao índio fica patente até em certas reivindicações. Agora mesmo, trava-se essa luta da Lei de Informática, em que 97.16% das indústrias de informática estão no Estado de São Paulo. Há uma na Bahia, porque o Governo daquele Estado deu tudo, e essa foi a única forma de ir para lá. Há três no Paraná, se não me engano. Parece-me que há duas ou três no Rio Grande do Sul, o resto está em São Paulo. São Paulo, que sozinho arrecada mais que as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste reunidas, quebrará se não for tirado o direito da Zona Franca de produzir telefones celulares e monitores de computadores. O que há neste País é um absurdo e é colocado como se fosse questão nacional por uma indústria que há nove anos, há 10 anos com medidas provisórias, não acrescentou nada na atividade brasileira de informática.

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - V. Exª sabe qual foi o prejuízo? Mais de R$7 bilhões que deixaram de ser recolhidos.

            O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - O prejuízo foi de R$7.2 bilhões de déficit. Enquanto o Governo não tem recursos para aumentar o salário mínimo, quer dar agora a empresas que às vezes não têm sequer o cuidado de trocar as embalagens que vêm do exterior, benefícios que somam mais de R$3,5 bilhões por ano e que serão incalculáveis no futuro pois, como está na proposta e com o avanço tecnológico, brevemente tudo dependerá da informática. O Ministério da Ciência e Tecnologia passou a legislar por portaria e, só na véspera da Lei de Informática, assinou várias portarias aprovando projetos. E podem conseguir! Outro dia, essas pessoas fizeram um escândalo nacional porque uma indústria de automóvel estava sendo financiada e indo para a Bahia. No entanto, agora mesmo foi dado um financiamento igual à Volkswagem e ninguém disse nada. Por quê? Porque se destinava aos brasileiros de primeira classe, para os privilegiados deste País. Por isso, Senador Bernardo Cabral, V. Exª tem todo apoio em seu discurso. Parabéns!

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Obrigado, Senador Gilberto Mestrinho.

            A obra LAmazonie et la Mondialisation - Essai d’écologie politique - A Amazônia e a Globalização - Ensaio de Ecologia Política, que me trazia à tribuna, foi exatamente o caminho natural para se mostrar como as coisas são convergentes. O que o Senador Gilberto Mestrinho disse em seu aparte está absolutamente dentro do nosso contexto: brasileiros de primeira e de segunda classes. A denúncia registrada pelo Senador Antonio Carlos Magalhães está dentro do conceito da Amazônia. Essa obra do Professor Argemiro Procópio, que fiz questão de mostrar a V. Exª, publicada no exterior, faz com que os olhos estejam voltados para a Amazônia. Não é possível que não se tome uma providência em derredor da sua manutenção.

            É rigorosamente verdadeira a denúncia que V. Ex.ª faz. E veja bem: V. Ex.ª não faz uma denúncia contra São Paulo. V. Ex.ª; faz uma denúncia contra aqueles que se aproveitam do Estado de São Paulo para prejudicar o Nordeste e o Norte, quando eles também são nossos irmãos, porque muitos paulistas estão no Amazonas e se transformaram em segundos amazonenses, contribuindo com as suas famílias. Agora, o que se vê é a deturpação daquilo que foi acordado no Governo.

            O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Permite-me V. Exª. um aparte?

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Faço um registro antes de V. Exª. me apartear, Senador José Jorge, porque eu ia tocar no nome de V. Ex.ª V. Ex.ª foi rigorosamente correto no seu parecer, na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Honrou todos os compromissos que tinham sido assinados e tratados no Palácio do Planalto, com a minha presença, inclusive, com papel timbrado do Palácio do Planalto.

            Depois que V. Exª. honrou esse compromisso, quando passou para a segunda Comissão, foi alterado o acordo.

            Ouço V. Ex.ª, mas eu precisava fazer esse registro, porque o Amazonas é muito reconhecido a V. Exª., Senador José Jorge.

            O Sr. José Jorge (PFL - PE) - Senador Bernardo Cabral, agradeço as palavras de V. Exª e gostaria de dizer que, pelo fato de ter sido o Relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania desse Projeto da Lei de Informática, tive a oportunidade de acompanhar de perto os entendimentos, as divergências e, finalmente, chegar a um acordo, que, posteriormente, como V. Ex.ª citou, foi modificado e entrou novamente numa rota de colisão. No entanto, gostaria de dizer também a V. Ex.ª que, em realidade, como o Senador Gilberto Mestrinho acabou de falar, incentivos fiscais não podem deixar de ter, também, uma conotação regional. Portanto, na hora em que o Governo abre mão de cobrar determinados percentuais de impostos para a instalação de empresas - que é um programa que pode e deve ser realizado sempre que possível - não se pode deixar de levar em conta um certo equilíbrio regional desses incentivos, porque senão todos os incentivos se concentrarão na região mais desenvolvida. É o que se chama de economias externas. Nenhuma empresa em igualdade de condições vai deixar de se instalar em São Paulo para se estabelecer em Pernambuco ou no Amazonas, exatamente pelas economias externas já existentes na infra-estrutura, na mão-de-obra etc.

            Então, se não há incentivo fiscal, cada um que se instale onde for melhor para si. Mas, se há incentivos fiscais, temos de ter também integrada a eles uma política regional que permita equilibrar esses investimentos. Essa é a luta do Amazonas em relação ao Projeto da Lei de Informática, mas também nossa, do Nordeste, no sentido de que, se não houver uma política regional dentro do incentivo fiscal, haverá uma concentração industrial cada vez maior. Solidarizo-me, pois, com V. Ex.ª

            O SR. BERNARDO CABRAL (PFL - AM) - Agradeço-lhe o aparte de solidariedade, porque a situação tem sido assim. Se o Nordeste, o Norte e o Centro-Oeste não se unirem, evidentemente não será possível, qualquer que seja a bandeira que se desfralde aqui, sairmos vitoriosos da guerra, porque a munição do adversário é muito maior.

            Concluo meu pronunciamento, Sr. Presidente, fazendo um adminículo ao que disse o Senador Antonio Carlos Magalhães. O Presidente da República está na obrigação de tomar uma providência administrativa, porque a outra, de ordem jurídica, não cabe a Sua Excelência.

            Segundo, já que tocamos no problema da Zona Franca de Manaus, orientar aqueles que não devem estar levando ao Presidente da República a verdadeira saga pelo que se passa no problema dos incentivos fiscais.

            São dois assuntos que Sua Excelência não pode deixar de tomar conhecimento.

            O terceiro, Sr. Presidente, é que, na forma regimental, vou pedir a V. Exª que faça chegar ao Professor Argemiro Procópio o registro que fiz de sua obra - a sua obra acabou motivando que se fizesse uma análise, à vista da denúncia formulada pelo Presidente do Senado, Senador Antonio Carlos Magalhães -, para que ele, na área acadêmica, verifique que as suas preocupações não são em vão. Se a sua obra ecoou no plenário deste Senado, com todo o meu respeito e minha admiração, também sobre ela podemos ter feito o paralelo de que a Amazônia não pode servir de refúgio para tudo aquilo que seja considerado desonesto.

            Sr. Presidente, espero que V. Exª defira, na forma regimental, fazendo chegar meu registro, mediante ofício da Mesa, ao Professor Argemiro Procópio, uma vez que seu endereço é conhecido, sendo ele Professor na Universidade de Brasília.

            Encerro, aguardando a resposta ao meu requerimento.

            O SR. PRESIDENTE (Álvaro Dias) - Senador Bernardo Cabral, V. Exª será atendido na forma regimental. Está deferido o seu requerimento oral.

 

            O SR. PRESIDENTE (Álvaro Dias) - Concedo a palavra ao Senador Eduardo Siqueira Campos por cessão do Senador Juvêncio da Fonseca.

            O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, entendendo a gravidade de tudo que já foi tratado nesta tarde, embora traga para a tribuna assunto diverso, entendo estar trazendo e dando continuidade a um assunto não menos grave, de interesse de milhares de brasileiros.

            Na semana passada, tive oportunidade de apresentar na tribuna desta Casa uma denúncia feita pela Rede Bandeirantes de Televisão, que, numa série de reportagens, trazia o trabalho de um advogado paranaense que se aprofundou no assunto: inscrição de brasileiros no Serasa - que é uma entidade civil fundada e financiada pela Associação dos Bancos, pela própria Febraban -, assunto do qual eu já vinha trabalhando em meu gabinete. Depois do meu pronunciamento e depois da matéria, recebi mais de 200 correspondências através da minha caixa postal eletrônica, trazendo a indignação de muitos brasileiros que, indevidamente, se encontram com o seu acesso ao crédito cerceado em função dessa tal inscrição na Serasa.

            Sr. Presidente, o importante é que, na mesma matéria e no mesmo dia, o presidente daquela instituição, o Dr. Elcio Anibal de Lucca, negou que houvesse essas inscrições na Serasa e que tivesse ocorrido injustiça. Mantive contato com o advogado, que até então se mantinha anonimamente na questão para poder realizar o seu trabalho, e apresentei o requerimento de informações neste plenário e na Comissão de Assuntos Econômicos, esperando que, nesta terça-feira, o pedido possa ser julgado e haja a convocação não só do referido presidente, mas do advogado Edson Galdino Vilela de Souza, que conseguiu - e teve o cuidado de fazê-lo com o oficial de cartório, mediante escritura pública - inscrever o Presidente da República, alguns Senadores e Governadores de Estado no cadastro nacional de pessoas com restrição ao crédito.

            Tenho a impressão de que, neste momento, já que o Presidente da Serasa negou que tivesse havido tais inscrições, eles já possam tê-las retirado, porque já sabem que serão convocados a comparecer na Comissão de Assuntos Econômicos. O Regimento Interno não deixa dúvidas com relação à atribuição da referida Comissão de tratar de assuntos pertinentes ao sistema bancário e de crédito.

            Sr. Presidente, veja a gravidade do caso: existem diversas modalidades pelas quais se inscrevem os pobres consumidores. Entre elas, o advogado, juntamente com o oficial e o serventuário do cartório, escolheu o Presidente da República, como se tivera Sua Excelência recebido um adiantamento, um crédito de R$200,00 e não tivesse honrado ou liquidado esse débito.

            A minha preocupação maior, Sr. Presidente, diz respeito às correspondências que estou recebendo. Na maioria delas, dizem os signatários: “Senador, está chegando o Natal; Srs. Senadores, Srs. integrantes do Banco Central, Sr. Ministro da Fazenda, está chegando o Natal”. Ora, há milhares de operações, muitas das vezes para comprar um pequeno objeto de consumo, um pequeno presente para um filho, e a grande maioria desses signatários não pode fazer. Alguns poucos ainda apelam para os parcelamentos, quando sabemos ser esse processo altamente prejudicial para o consumidor em função da taxa de juros, em função da falta de acesso de muitos ao mercado de consumo. Ainda assim, há um outro expediente impeditivo ao crédito, que é injusto, violador dos direitos do cidadão, tendo em vista o que diz a Constituição brasileira: é a tal inscrição na Serasa.

            Sr. Presidente, estou abismado com o número de correspondências, com o grau de injustiça que estou encontrando no teor delas. São pessoas que fazem relatos absurdos com relação não só à Serasa, mas ao Telecheque, ao SPC, ao DPC e a outras entidades que, segundo as suas próprias páginas da Internet, estão ganhando prêmios internacionais em função das perversidades que estão cometendo.

            Mas precisou chegar, Sr. Presidente, ao Senhor Presidente da República, aos Parlamentares desta Casa e da Câmara dos Deputados, que, surpresos, descobriram que estavam lá relacionados como emitentes de cheques sem fundos e ainda como se tivessem cometido falência fraudulenta, como foi o caso do eminente Deputado Aloizio Mercadante, que ficou surpreso, mas achou inteligente a estratégia.

            Cito com sua autorização, Sr. Presidente, os nomes do Dr. Edson Galdino Vilela de Souza e de seu irmão, Dr. Edilson Galdino de Souza, que gastaram mais de dois anos pesquisando, trabalhando a matéria e tiveram o cuidado, já sabendo que seriam acusados, de transformarem o seu trabalho, essas inscrições na Serasa, em escritura pública, em documentos lavrados em cartório. E anunciaram-me preliminarmente, antes de formular o convite, que estão dispostos, querem vir à Comissão de Assuntos Econômicos prestar depoimentos, trazer a esta Casa todas as informações.

            Estou abismado, Sr. Presidente, porque eles estimam que possa vir a ser em torno de 40 milhões de pessoas, ou seja, um quarto da população brasileira que teve o seu nome inscrito na Serasa, e mensalmente pode chegar a um milhão de pessoas que têm o seu nome inscrito. E qual não é o trabalho para que o cidadão retire o seu nome da Serasa! Como é difícil, Sr. Presidente!

            E mais. O cidadão, tendo seu direito violado, recorre à Justiça; o juiz concede a liminar, mas a Serasa não retira o nome do cidadão. Há pessoas que ainda estão com pendências judiciais em discussão, mas já estão preliminarmente inscritas na Serasa, com liminar determinando a retirada de seu nome. Mas eles estão impedidos, com prejuízos enormes para suas empresas, para as pequenas atividades comerciais. Agora, imaginem isso para o assalariado.

            Sr. Presidente, não quero, em absoluto, que a empresa prestadora do serviço, a Serasa, sinta-se aqui denunciada como se fosse alguma coisa altamente negativa para o País. Entendo importante para a atividade comercial, para a atividade bancária, para a atividade econômica, que exista, sim, a prestação do serviço, para que aqueles que cometem crimes contra a própria economia popular como cheques sem fundos e outras operações fraudulentas, o sistema de crédito, o sistema bancário e o sistema comercial tenham mecanismos de detectar, salvaguardando, assim, o comerciante, as pessoas que lidam, diariamente, com os cheques, com operações de crédito. Essas, sim, precisam do serviço. Ou seja, não quero aqui que deixe de ser analisada a parte positiva, a prestação do serviço, até mesmo a justificada existência de tal entidade. Não quero aqui dizer que tudo aquilo que faz a Serasa tenha que ser combatido ou mesmo que ela tenha que ser punida ou extinta.

            Mas, Sr. Presidente, confirmadas as denúncias dos Advogados Edson Galdino Vilela de Souza e Edilson Galdino de Souza, preliminarmente, já que está devidamente feita por documento público de cartório a inscrição, entre outros, como diz, do próprio Presidente da República, já fica clara a gravidade, em primeiro lugar, da quebra do sigilo bancário, da quebra do sigilo das informações pessoais demonstradas na televisão, com a maior facilidade. Isso em se tratando de autoridades do porte do Presidente da República. Imaginem V. Exªs o que não vem acontecendo com o pobre cidadão brasileiro, com o pobre consumidor brasileiro. Isso já é um crime que precisamos apurar!

            Certamente, no intuito de fazer justiça, de dar a ele o mais amplo direito de defesa e de esclarecimento, se não for o caso de defesa, é que protocolei, na Comissão de Assuntos Econômicos, requerimento, convidando o Dr. Elcio Anibal de Lucca, homem premiado internacionalmente, em função dos serviços prestados pela própria Serasa, para que ele possa vir à Comissão. Mas, antes, Sr. Presidente - já que ele era aquilo que se diz comumente na imprensa: uma fonte preservada do telejornalismo da Rede Bandeirantes -, já com sua autorização e com sua aquiescência, estou propondo e protocolando, na data de hoje, um requerimento à Comissão de Assuntos Econômicos, que espero ver votado amanhã, para que, em primeiro lugar, possa vir o advogado, que se dispõe a trazer toda a documentação, todo o acervo de sua pesquisa. São dados estarrecedores sobre o prejuízo sofrido por mais de 40 milhões de brasileiros, muitos deles indevidamente inscritos em função de empresas que contratam o serviço e, a seu bel-prazer, inscrevem os consumidores como se fossem definitivamente devedores. Muitos deles sequer possuíam algum tipo de débito, mas, por alguma razão, alguém conseguiu inscrever seus nomes.

            Dessa forma, Sr. Presidente, apresentei requerimento de informações ao Banco Central, já que grande parte das informações estão de posse dos bancos e de seus cadastros. Que tipo de convênio e de contrato o Banco Central detém com a Serasa? Que tipo de monitoramento o Departamento de Fiscalização do Banco Central exerce sobre essa entidade? Que se esclareça definitivamente esse vínculo, já que a Serasa é uma entidade totalmente privada que presta serviço aos bancos, mas que, por sua vez, mesmo privada, está sob o controle do Banco Central. E não há ninguém nem entidade qualquer no País que tenha o direito de violar o sigilo do consumidor, expondo-o a situação de ridículo e causando-lhe prejuízos muitas vezes irreparáveis, atingindo o mais elementar de todos os seus direitos - o direito ao crédito.

            Sr. Presidente, estou impressionado com os fatos que ocorrem na economia brasileira, principalmente nesta época próxima do Natal, em que se aquecem as vendas em todos os municípios, e o consumidor, com a perspectiva do décimo terceiro salário, vê-se em condições de parcelar suas compras, procurando o acesso ao crédito. Em função disso, recebi milhares de correspondências durante os cinco dias após meu pronunciamento, todas elas pedindo que o Senado tome uma providência urgente para que a Serasa retire, gratuitamente, a inscrição indevida dessas pessoas. Além disso, é necessário que se cumpram as liminares em favor desses consumidores e que se aprofunde a investigação, para que possamos definitivamente esclarecer o modo como se processam essas inscrições, feitas tão facilmente até mesmo quando se referem a autoridades brasileiras. Sendo fácil inscrever uma autoridade brasileira, podemos imaginar como não tem sido a vida do cidadão brasileiro atormentado por tal inscrição na Serasa.

            Sr. Presidente, ainda dentro do tema Direitos do Consumidor, quero dizer que faz um ano que apresentei a esta Casa projeto de lei sobre matéria também de grande interesse, determinando às seguradoras que paguem a indenização do seguro por perda, roubo ou furto do bem assegurado pela importância constante na apólice.

            Na verdade, o consumidor faz um contrato com a seguradora segundo a estimativa do valor do bem e recebe o seguro, em caso de sinistro, pelo valor de mercado. Se um veículo cotado em R$30 mil, por exemplo, for furtado ou sofrer acidente, a seguradora vai pagar a indenização com base em seu valor de mercado. Ouço daqui a concordância de nosso companheiro e ex-ministro Senador Renan Calheiros. Existem vários julgados no STJ reconhecendo o direito líquido e certo de o consumidor receber o valor da apólice, ou seja, o valor sobre o qual foi calculado o seguro. O que ocorre é diferente. Contrata-se um seguro sobre R$30 mil, por exemplo, e depois, em caso de sinistro, discute-se qual é o valor de mercado. Mesmo já havendo uma decisão do STJ em favor do consumidor no sentido de que este deve receber o valor efetivamente contratado na apólice, enquanto o cidadão não ingressa em juízo, enquanto não há uma decisão definitiva do Superior Tribunal de Justiça, enquanto o processo corre durante anos nas diversas instâncias, prevalece o que vêm pagando as seguradoras.

            Sr. Presidente, tendo em vista que esse projeto foi apresentado há um ano - tenho informações de que se encontra pronto para ser votado -, na terça-feira estarei presente à reunião da Comissão de Assuntos Econômicos, com a esperança de que o consumidor brasileiro veja transformado em lei esse direito contra o qual vêm sendo cometidos abusos por parte de todas as seguradoras do País.

            Discuti o assunto com diversos representantes, trouxeram-me toda a argumentação, mas o elementar, Sr. Presidente, é que quem contrata e paga um seguro sobre determinado valor não pode receber outra coisa senão o valor contratado. Isso é óbvio! O STJ já decidiu sobre o assunto, mas infelizmente essa decisão só é válida para os que recorrem ao Judiciário. E, às vezes, milhares de pessoas não o fazem por não poder pagar um advogado ou por falta de conhecimento. Outros já ingressaram na Justiça, mas o processo está ainda na primeira instância.

            Era isso o que me trouxe a esta tribuna, anunciando também que o convite aos advogados que realizaram a pesquisa da Serasa será protocolado hoje na Comissão de Assuntos Econômicos.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

            O SR. PRESIDENTE (Bello Parga) - Concedo a palavra ao nobre Senador Álvaro Dias, o próximo orador inscrito.

            O SR. ÁLVARO DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Sr. Senadores, um desastre social está ocorrendo no Brasil, desastre insuficientemente notado: a exclusão da maioria dos trabalhadores de qualquer cobertura previdenciária. A falta de informação, as dificuldades burocráticas, a escassez de empregos com carteira assinada estão deixando dezenas de milhões de brasileiros fora do Regime Geral de Previdência Social. Em sua grande maioria, são trabalhadores e trabalhadoras pobres.

            Sim, essa triste realidade castiga principalmente os mais pobres. Ao se aproximarem da idade da aposentaria, ao verem começar a se reduzir e se esgotar sua energia, sua vitalidade, alguns trabalhadores descobrem que não terão condições de provar o mínimo de dez anos de contribuição ao INSS e não terão acesso à aposentadoria. Como nos últimos anos aumentou muito a proporção dos trabalhadores sem carteira assinada, a tendência é de que, no futuro, esse desastre se agrave e se transforme em verdadeira catástrofe social.

            A Pesquisa Nacional de Amostragem por Domicílio - Pnad -, realizada em 1988 pelo IBGE, revela que apenas 39% das pessoas com renda de um salário mínimo têm cobertura da Previdência. Já entre os que têm renda superior a 20 salários mínimos, a cobertura chega a 84%. Veja-se que, nessa faixa mais alta, podem estar incluídos assalariados, autônomos, setor privado, setor público e mesmo empregadores. Na faixa mais baixa, estão, com certeza, assalariados sem carteira assinada e pequenos autônomos. De qualquer forma, essa estatística caracteriza bem a vulnerabilidade do trabalhador mais pobre, sua situação mais frágil, seu futuro mais desassistido e sombrio.

            Os números mais gerais, abrangendo toda a população, são igualmente impressionantes. Recentemente, o próprio INSS divulgou um quadro altamente preocupante: 38,7 milhões de trabalhadores do setor privado estão sem cobertura da Previdência Social, o que corresponde a 59,1% desse universo, praticamente 60%. Seis entre dez trabalhadores brasileiros deveriam, mas não têm cobertura previdenciária. Trata-se de uma situação presente dramática e de uma previsão trágica para o futuro.

            Esse gigantesco contingente desprotegido terá de recorrer a uma das seguintes soluções, todas frágeis ou improváveis: poupança própria acumulada - sorte de poucos; apoio da família - apenas uma possibilidade; previdência privada - privilégio das faixas salariais melhores; ou esquemas assistenciais precários - nem sempre disponíveis.

            A sociedade brasileira e o Poder Público ainda podem reagir contra esse estado de coisas. É preciso dar informação a essa massa sem cobertura previdenciária. É urgente facilitar-lhe o acesso ao sistema.

            Sr. Presidente, a mera divulgação desse triste quadro já é um serviço que se presta. É o que fez a Folha de Londrina recentemente, em 29 de outubro, publicando uma excelente reportagem que ocupou quatro páginas de uma edição de domingo, com entrevistas com gente que sofre o problema na carne. Está desenhado um painel assustador de desassistência e desemprego.

            A matéria do jornalista Lino Ramos, intitulada “Mãe recorre a Nossa Senhora para manter os filhos”, publicada no jornal Folha de Londrina, traz foto da família e diz: “Viúva, Maria Aparecida Bigetti sustenta três excepcionais com pensão de R$132,87”.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o quadro não é apenas melancólico, mas vergonhoso.

            Ainda há pouco ouvimos desta tribuna denúncias do Presidente da Casa, Senador Antonio Carlos Magalhães, de desvios que superam R$600 milhões em apenas uma instituição pública do País, a Sudam. Certamente, quanto maior a corrupção, maior a tragédia da miséria; quanto maior a conivência governamental, maior a injustiça social e mais perverso o drama que vivem os desassistidos no nosso País.

            A Folha de Londrina agregou a essa matéria estatísticas relevantes, números sobre um universo humano que inclui gente que trabalha na informalidade, por salário ou por conta própria; gente do mundo rural ou do ambiente urbano; gente das capitais ou do interior; gente que vive “de bicos” ou que tem profissão reconhecida e prestigiada.

            Por exemplo, no Brasil, dos 3,2 milhões de trabalhadores domésticos, dois milhões não têm carteira de trabalho assinada, ou seja, 63,8% - o que reduz enormemente o número de contribuintes do INSS, já que o não registrado nesse setor raramente filia-se à Previdência. É assustador verificar que 63,8% dos trabalhadores não possuem carteira assinada e, por isso, não podem receber a assistência previdenciária.

            Em relação aos trabalhadores de vias públicas - camelôs, ambulantes -, 88,6% não contribuem para a Previdência. São números lamentáveis, pois todos os dias há pessoas que constatam estarem desprotegidas na velhice - e esse contingente, no futuro, crescerá mais e mais.

            Sr. Presidente, é bom lembrar que a Previdência oferece o chamado Amparo Social, benefício muito restrito. A ele têm acesso apenas inválidos e idosos acima de 67 anos que sejam membros de famílias cuja renda mensal per capita seja menor do que ¼ do salário mínimo.

            Seria catastrófico se crescentes multidões de idosos passassem, cada vez mais, a depender da assistência social da Previdência, porque o benefício é restrito e porque se trata de despesa para a qual não houve contribuição. Seria uma carga pesadíssima para a Previdência Social e para a sociedade. O Amparo Social existe para a exceção. A regra saudável, socialmente, é atrair os trabalhadores produtivos para o sistema.

            A contribuição para o

            INSS é módica e, além disso, traz benefícios ao segurado mesmo antes da aposentadoria, como o auxílio-doença, o salário-maternidade e o auxílio-acidente. A solução desse gigantesco impasse é atrair o trabalhador, transformando-o de excluído em contribuinte. É interessante adotá-la não somente para evitar sofrimento humano, que é multiplicado por milhões, como para viabilizar as finanças da Previdência. A situação atual significa uma grande perda econômica para o sistema.

            Apesar de a população economicamente ativa ter aumentado em cerca de dez milhões de trabalhadores na última década, o número de pessoas que contribuem para o sistema previdenciário público estacionou, segundo dados do IBGE. Assim, o sistema, por mês, arrecada R$4,4 bilhões e paga R$5,1 bilhões, o que significa um déficit de quase R$10 bilhões anualmente nas contas do INSS. A razão sempre suscitada para justificar o salário mínimo insuficiente e vergonhoso que se paga neste País é esse déficit de quase R$10 bilhões, com uma renúncia de cerca de R$8 bilhões. Obviamente, são excluídos milhões de brasileiros do sistema previdenciário, que não contribuem e que não se beneficiam, agravando a situação de déficit do caixa da Previdência Social no nosso País.

            As políticas macroeconômicas recentes agravaram essa situação. A abertura descontrolada da economia colocou nosso mercado de trabalho face a face com as pressões esmagadoras da globalização. Tornou-se regra a falta de vagas para trabalhadores de baixa qualificação e até mesmo para os qualificados. Generalizou-se a terceirização.

            O trabalhador levado à informalidade trabalhista tende a não se registrar no sistema previdenciário. Para superar isso, é preciso um grande esforço de informação e de conscientização. É bom lembrar que mesmo o trabalhador com carteira assinada pode ver-se sem cobertura previdenciária quando o empregador comete a fraude do não recolhimento das contribuições - não se trata de caso raro.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sugiro ao Governo Federal que faça uma campanha de informação e de conscientização para agregar um número maior de contribuintes e, conseqüentemente, oferecer o atendimento de fundamental importância social a um maior número de trabalhadores brasileiros.

            No que concerne às mudanças estruturais do mercado de trabalho nos últimos anos, existe a pressão da flexibilização das leis trabalhistas. No Brasil, há uma polêmica em andamento. Na visão sindicalista, já houve flexibilização excessiva, que teria incentivado a terceirização. Segundo a perspectiva dos empregadores, justamente a rigidez das leis trabalhistas desencoraja a contratação direta de trabalhadores.

           Sr. Presidente, é evidente que, para superar o problema da exclusão previdenciária, será necessário um enorme esforço. É preciso afastar o fantasma da insegurança na velhice, que hoje ronda a maioria dos trabalhadores brasileiros. Há que se fazer um mutirão que inclua Poder Público e sociedade, no sentido da informação, da conscientização, da doutrinação mesmo. É inadiável que se facilite o acesso do trabalhador à filiação previdenciária, que se desimpeçam os canais burocráticos.

           Para se ter uma idéia de como a formalização previdenciária é causa de aflição para o trabalhador, vale citar o caso de um Vereador de Londrina, mencionado na reportagem a que me referi. Aliás, quero aplaudir essa reportagem pelo seu conteúdo. Em quatro páginas do jornal, a reportagem faz um diagnóstico da crise da Previdência Social no nosso País, um diagnóstico de profundidade, alertando para a necessidade dessa conscientização que cabe ao Governo liderar. Esse Vereador de Londrina transformou seu gabinete, há sete anos, em uma espécie de pequeno escritório de auxílio à regulamentação da situação previdenciária de qualquer interessado. Em sete anos, doze mil pessoas foram lá atendidas, num movimento que atualmente atinge seiscentos atendimentos por mês.

           Imagine, Sr. Presidente, se todos os Vereadores deste País se dispusessem a realizar esse tipo de campanha de elucidação, de conscientização, auxiliando trabalhadores a regularizarem sua situação junto à Previdência Social, transformando-os de excluídos em contribuinte e beneficiários do sistema previdenciário brasileiro.

           Louvo também a atuação do Vereador Santa Rosa, de Londrina. A sua iniciativa deve servir de exemplo para que os vereadores brasileiros possam contribuir dessa forma, uma vez que são eles os líderes mais próximos da população no contato do dia-a-dia com os trabalhadores da sua cidade.

           É evidente, por esse exemplo de intermediação entre trabalhadores e INSS, ser necessário, no mesmo sentido, um vasto engajamento de sindicatos, prefeituras, empresas, organizações assistenciais, entidades profissionais, associações de bairro, clubes de serviço, órgãos estaduais, igrejas e comunidades, todos estendendo e ampliando, com sua atuação, o alcance da ação administrativa do INSS.

           Não tenho dúvida, Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, de que se esse mutirão de conscientização se efetivar neste País certamente o cenário será outro. A Previdência não terá o déficit que sustenta há tantos anos em função do crescimento dos contribuintes, e obviamente, milhares de trabalhadores serão atendidos, fato que não ocorre hoje porque são trabalhadores excluídos dos benefícios da Previdência Social no Brasil.

           É verdade que com algum atraso o Ministério da Previdência despertou para o problema. Por meio da Portaria nº 1.671, de 15 de fevereiro deste ano, o Ministério instituiu o Programa de Estabilidade Social, com a finalidade de ampliar o contingente de trabalhadores com acesso à cobertura dos benefícios da Previdência Social.

           Segundo o Programa, o INSS dedicar-se-á, mediante providências internas variadas, ao esforço que incluirá a simplificação do acesso do trabalhador no sistema, a interiorização da rede de atendimento, a produção de informações acessíveis, ações de orientação e também o que é extremamente louvável: a celebração de parcerias com entidades da sociedade civil, governos estaduais e municipais, visando incluí-los nessas ações e objetivando principalmente o processamento, por essas entidades de governos, de solicitações de inscrições de trabalhadores na Previdência Social.

           Sr. Presidente, estou apontando de maneira abreviada para uma chaga social que, se não assistida urgentemente, tende a se agravar. A exclusão de dezenas de milhões de trabalhadores do sistema previdenciário é, além de uma dor presente, um veneno de efeito retardado que agredirá o nosso futuro como sociedade. É problema que transcende a Previdência, envolvendo questões de política macroeconômica, pressões da globalização e as leis trabalhistas, que exigem, para a sua superação, um vasto engajamento de numerosos agentes sociais.

           O programa iniciado pelo Ministério da Previdência e Assistência Social acena com alguma esperança. Já perdemos muitos anos enquanto o problema se avolumava. É preciso que as parcerias imaginadas pelo Programa de Estabilidade Social realmente se concretizem e se multipliquem. Devemos, nesta Casa, acompanhar a questão atentamente, medindo os resultados do programa e prontos a contribuir, se necessário, com novas medidas e soluções.

           Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

           O SR. PRESIDENTE (Lauro Campos) - Concedo a palavra ao nobre Senador Renan Calheiros por vinte minutos.

           O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, no dia 6 de março de 1998, o Diário Oficial da União publicou a sanção do Sr. Presidente da República à Lei 9.614, que modificou o Código Brasileiro de Aeronáutica. A lei, de iniciativa do próprio Poder Executivo, permite o abate de aeronaves hostis, com o objetivo de aumentar o policiamento do espaço aéreo brasileiro, especialmente nos vôos não regulares.

           A medida, Sr. Presidente, além de fornecer meios para reprimir o narcotráfico e o contrabando de armas, significa a preservação da soberania do espaço aéreo nacional. Os debates acalorados em torno desta lei demonstraram sua importância na vigilância do espaço aéreo brasileiro, notadamente nas áreas de fronteira e no combate ao tráfico de drogas e ao contrabando de armamentos.

           Reconhecendo, Sr. Presidente, a essencialidade e a urgência desta medida, os Ministérios da Justiça e Aeronáutica, ainda no ano de 1998, elaboraram com a agilidade que a circunstância reclamava, uma proposta de decreto regulamentando o que caracterizaria, na prática, aeronave hostil e em que momento extremo poderia ser abatida.

           Tive a honra de assinar como ex-Ministro da Aeronáutica Lélio Viana Lôbo a regulamentação desta lei e enviá-la ao Palácio do Planalto. Passados dois anos e meio precisamente, essa regulamentação de importância estratégica irrefutável continua dormitando em alguma gaveta ociosa. Nutríamos uma esperança não concretizada de que essa medida estaria no plano de segurança nacional anunciado com pompa pelo Governo em junho deste ano.

           Lamentavelmente, isso não ocorreu como também não saíram do papel outras providências anunciadas à época. Posteriormente, o investimento norte-americano no combate ao tráfico na vizinha Colômbia também poderia ter ensejado a ressurreição dessa medida, mas infelizmente nada aconteceu.

            A regulamentação da medida, para quem não se recorda, em função do longo hiato entre sua sanção e hoje, é simples e fornece instrumentos eficazes para que o País não seja um corredor indulgente do narcotráfico, um corredor indulgente do contrabando de toda ordem, como é hoje lamentavelmente.

            Com essa regulamentação, entre outros casos, aeronaves que não tiverem plano de vôo autorizado, que não possuírem autorização para sobrevôo em território nacional, que tiverem decolado de pistas clandestinas, que voem com as luzes apagadas, que estiverem com marcas falsas ou não tiverem marcas ou matrículas estarão sujeitas à destruição na hipótese de não obedecerem às ordens das autoridades brasileiras. Na abordagem dessas aeronaves, Sr. Presidente, Srs. Senadores, a primeira providência seria a de determinar um local para pouso e averiguação. Descumprida essa ordem, a interceptação poderia ser feita por rádio ou sinais visuais de conhecimento de toda a aviação. Não sendo atendida a determinação, estaria o piloto autorizado a efetuar tiros de aviso. Desrespeitadas todas as orientações anteriores, estaria a autoridade brasileira autorizada a abater a aeronave hostil. Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, o gravíssimo problema da insegurança do País nos impõe responsabilidade e agilidade.

            O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Concede-me V. Exª um aparte?

            O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Concedo o aparte a V. Exª.

            O Sr. Romero Jucá (PSDB - RR) - Meu caro Senador Renan Calheiros, pedi este aparte para apoiar o discurso de V. Exª e registrar que aqui nesta Casa temos debatido muito - inclusive na semana passada com o Ministro da Defesa - a questão da segurança, principalmente da região Amazônica e da área fronteiriça, que se depara hoje com o problema de narcotráfico e de guerrilha. O que V. Exª coloca tem sido parte também desse debate, e a grande maioria dos debatedores tem se colocado a favor das medidas necessárias para combater com energia e com vigor a falta de uma política mais forte no tocante ao narcotráfico e à invasão do território brasileiro. V. Exª listou as providências anteriores ao abate do avião, no caso. Sem dúvida alguma, são providências que dão margem e dão chance a qualquer tipo de intervenção que evite a determinação maior. Mas, se necessário, todos nós entendemos que deve o Governo brasileiro agir com rigor para conter a ameaça, que é grave, principalmente na região Amazônica. Portanto, quero também somar a minha voz à de V. Exª num momento em que sugere medidas e cobra o andamento de providências que já tinham sido tomadas e que estariam tramitando no Governo Federal. Como Senador de Roraima, como Senador da Amazônia, não posso deixar passar uma oportunidade desta e somar a minha voz à de V. Exª, num momento em que todos nós queremos instrumentos fortes para que a Amazônia seja preservada, para que as fronteiras sejam preservadas e que haja o combate a um mal que atualmente é de todo o País, e principalmente da região, que é o narcotráfico envolvido inclusive com a guerrilha em países vizinhos. Gostaria de parabenizar V. Exª e de cobrar as providências solicitadas no discurso que profere.

            O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Agradeço o oportuno aparte de V. Exª

            O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Permite-me V. Exª um aparte, nobre Senador Renan Calheiros?

            O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Pois não, nobre Senador Ramez Tebet.

            O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Renan Calheiros, todo o Brasil acompanhou a atuação de V. Exª à frente do Ministério da Justiça. Eu particularmente louvei e louvo aquela atuação de V. Exª em dois tópicos. V. Exª não se descurou um instante sequer com relação ao exercício da cidadania no Brasil. Eu me recordo quando V. Exª defendeu ardentemente o não-atrelamento da dolarização, em defesa, naturalmente, da cidadania. V. Exª deu-me cobertura em pronunciamento que fiz nesta Casa a respeito do Projeto Sivam, por exemplo, que atualmente é uma realidade, porque é um instrumento para promover, por seu intermédio, a defesa dessa vasta região brasileira, que é a região Amazônica. Porque, como disse o Senador Romero Jucá, não é possível continuarmos assistindo a esse contrabando desenfreado, a essa impunidade no tráfico de drogas e entorpecentes. Isso atenta contra a soberania nacional. V. Exª, que é homem do Nordeste, ao se pronunciar nesta Casa, mais uma vez, tem os olhos voltados para essa grande região do Brasil, que é a região Amazônica. Também não pertenço à região Amazônica, sou da Região Centro-Oeste, mas todos nós, antes de tudo, somos brasileiros. Urge, portanto, defender o território nacional a qualquer custo. Quando relatei o Projeto Sivam/Sipam, propugnei no meu relatório por um projeto de desenvolvimento para a região Amazônica, porque sabemos que essa região sempre foi cobiçada pelo mundo inteiro, falam até em soberania relativa. Se não ocuparmos a Amazônia, se o Brasil não tem capacidade para gerir a Amazônia, então os povos estrangeiros teriam esse direito. Isso é tese defendida na França, por exemplo. François Mitterrand já afirmava isso. Então, Senador Renan Calheiros, quero parabenizar V. Exª, relembrando sua atuação no Ministério da Justiça, confirmada aqui no Senado da República. V. Exª está de parabéns, e todos nós pensamos como V. Exª.

            O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Agradeço o aparte.

            V. Exª tem absoluta razão. O projeto Sivam é uma realidade. Precisamos implementar, o mais rapidamente possível, a Ação Pró-Amazonia e o Promotec, no âmbito da Polícia Federal, e regulamentar a lei que permitirá o abate de aeronaves hostis. É urgentíssimo que seja feito porque, verdadeiramente, Senador Ramez Tabet, V. Exª tem razão: devemos defender o espaço aéreo nacional.

            O Sr. Moreira Mendes (PFL - RO) - Permite-me V. Exª um aparte?

            O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Ouvirei o Senador Moreira Mendes.

            O Sr. Moreira Mendes (PFL - RO) - Eminente Senador Renan Calheiros, há quinze minutos encontrava-me em audiência com o Comandante da Força Aérea, Brigadeiro Batista e tratávamos de assuntos de interesse do Estado. Por iniciativa minha, tendo em vista que acompanho a questão do abate das aeronaves não-identificadas, clandestinas, perguntei a S. Exª por que o Brasil não procede desse forma. O Brigadeiro, muito ético e cauteloso, preferiu não adentrar na questão por respeito, possivelmente, ao Ministro da Defesa. Vindo para cá escutei o início do pronunciamento de V. Exª e fiz questão de chegar a tempo para aparteá-lo. Para nós que vivemos na Amazônia, tal qual os dois Senadores que me antecederam no aparte, é de fundamental importância que o Governo tenha sensibilidade e realmente regulamente a lei. É serio o problema do narcotráfico nos países vizinhos à Amazônia, sobretudo na Colômbia, no Peru e na Bolívia - os dois últimos, com mais avanços no combate a esse crime. É preciso entender que, se o Brasil não der a atenção necessária a essa questão, os produtores e traficantes de drogas - ou seja, o crime organizado - acabarão migrando para o lado de cá. Então, é preciso que as Forças Armadas brasileiras tenham instrumentos para combater o narcotráfico. As pessoas que lidam com drogas são tão audazes que não vão respeitar os sinais tradicionais, as comunicações, os avisos. Se as aeronaves não forem abatidas, para servirem de exemplo, não conseguiremos combater o narcotráfico e o crime organizado na Amazônia. Quero parabenizá-lo pela iniciativa e dizer-lhe que também estou juntando-me a V. Exª nessa cobrança ao Governo, que precisa, com coragem, regulamentar essa lei já aprovada nesta Casa. Parabéns pela iniciativa eminente Senador.

            O SR. RENAN CALHEIROS (PMDB - AL) - Agradeço o aparte a V. Exª. Realmente é muito importante que façamos coro para agilizar a regulamentação dessa lei, que é fundamental sob todos os aspectos, até mesmo para que possamos defender a soberania do espaço aéreo nacional.

            Como disse, Sr. Presidente - já vou encerrar -, o gravíssimo problema da insegurança no País nos impõe, na prática, responsabilidades e agilidade. Não há dúvidas de que o narcotráfico e o contrabando de armas alimentam essa violência. Dentro desse entendimento, não é legítimo ao Estado brasileiro retardar a vigência de uma lei tão importante como a que permite o abate de aeronaves hostis.

            Portanto, Sr. Presidente, faço desta tribuna um apelo pessoal ao Ministro da Justiça, José Gregori, ao Ministro da Defesa, Geraldo Quintão, e ao Presidente Fernando Henrique Cardoso para que retomem, o mais rápido possível, a regulamentação da lei, a fim de que possamos, na prática, contar com instrumentos que auxiliem na repressão ao tráfico de drogas e de armas, como disse anteriormente, na defesa do espaço aéreo nacional. Dessa forma, estaremos dando um importante passo para diminuir o vergonhoso índice de violência que assola o País.

            Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente, e peço-lhe que se digne de mandar publicar a proposta de regulamentação anexa ao meu discurso.

            Muito obrigado.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR RENAN CALHEIROS EM SEU PRONUNCIAMENTO:

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            O SR. PRESIDENTE (Lauro Campos) - V. Exª será atendido na forma do Regimento Interno.

            Concedo a palavra ao nobre Senador Romero Jucá.

            S. Exª dispõe de 20 minutos.

            O SR. ROMERO JUCÁ (PSDB - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, pedi a palavra para fazer um registro breve. Há cerca de dois e meio, o meu Estado, Roraima, passou por uma situação de extrema dificuldade. A imprensa nacional, a internacional e o povo brasileiro acompanharam os problemas decorrentes do incêndio que se alastrou por grande parte do Estado e destruiu inclusive muitas pequenas propriedades rurais.

            Pois bem, tirada a lição daquela catástrofe, estamos registrando com satisfação que agora o Governo Federal começa a se precaver e a tomar providências anteriores a qualquer tipo de fato.

            Neste fim de semana, o Ministro José Sarney Filho esteve em Roraima levando recursos e fazendo um convênio para definir a atuação de brigadas antiincêndio. Também reuniu-se com prefeitos para analisar a realidade, exatamente porque havia indícios de que poderia haver parecido com o incêndio que ocorreu há dois anos e meio.

            Pedi a palavra hoje para registrar o fato de que há uma mudança de comportamento. O Ministério do Meio Ambiente agora se antecipa aos estudos, aos questionamentos, e prepara-se para agir de forma preventiva, na possibilidade de um desastre. Também quero louvar a ação do Ministro, que se deslocou até Roraima, a fim de ouvir dos prefeitos, dos segmentos produtores e políticos e, enfim, de toda a população do Estado as preocupações e as sugestões de providências que poderiam ser tomadas conjuntamente. S. Exª também assinou convênio para atuação das brigadas antiincêndio.

            Portanto, quero fazer esse registro, parabenizar o Ministro e dizer-lhe que estaremos atentos, acompanhando esse trabalho, subsidiando o Ministério do Meio Ambiente exatamente para que as ações dele não parem aí, a fim de que possamos avançar na conscientização ambiental e na preparação de uma legislação modelo que evite a tragédia que ocorreu há cerca de três anos.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

            O SR. PRESIDENTE (Lauro Campos) - Concedo a palavra ao eminente Senador Ademir Andrade. (Pausa)

            Concedo a palavra ao nobre Senador José Fogaça.

            S. Exª dispõe de 20 minutos.

            O SR. JOSÉ FOGAÇA (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos, neste mês, acompanhando aqui no Brasil os fatos políticos preocupantes que vêm ocorrendo no Peru.

            A República do Peru foi abalada recentemente pela renúncia do Sr. Alberto Fujimori, que renunciou, do Japão, praticamente numa espécie de auto-exílio, ameaçado que estava por processos judiciais e, possivelmente, tendo saído do governo, de ser imediatamente preso dada uma série de acusações que contra ele se registram, uma vez que seus auxiliares, entre eles o Sr. Vlademiro Montesinos, estão indiciados por prática de corrupção. O Peru está passando por um momento de grande preocupação, de grande turbulência política.

            Assume a Presidência do Peru, por um período de oito meses, para convocar eleições, o Sr. Valentín Paniagua, Presidente da Câmara dos Deputados, que possivelmente não vai alterar em grande profundidade a política econômica vigente no país, que já é, neste momento, de estagnação. O povo peruano vive uma situação recessiva, dramática e difícil, mas, para o período de oito meses, o Sr. Paniagua muito pouco poderá fazer, pois não terá condições de planejar e de prever acontecimentos a longo prazo. Evidentemente, dentro de oito meses, o Peru terá outro presidente eleito pelo voto direto e popular. Desta vez, um presidente legítimo, não marcado pela mancha de uma reeleição a partir de uma manifestação do Supremo Tribunal, manifestação esta que era, sem dúvida, bastante acumpliciada com o Sr. Alberto Fujimori.

            Desse modo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, temos um quadro preocupante vivido por este País vizinho e amigo: a República do Peru.

            Todavia, confesso que não fiquei inteiramente satisfeito com os noticiários a respeito da queda do Sr. Fujimori. Parece-me que o episódio relativo ao Sr. Montesinos, o chefe do serviço secreto do Sr. Fujimori, veio em uma hora muito propícia, diria mesmo apropriada demais, parecendo muito mais uma situação encomendada do que propriamente um fato eventual ou inesperado.

            Esse fato não se pode explicar tão-somente pela fragilidade eleitoral do Sr. Alberto Fujimori, uma vez que, apesar das acusações de fraude, teve ele uma votação bastante consistente. Chegou a ser, no primeiro turno, o candidato mais votado, independentemente das acusações de prática de fraude a ele dirigidas. É bem possível que a fraude tenha existido.

            Não há nenhuma dúvida de que o Sr. Alberto Fujimori, tão decantado no início de seu primeiro governo, veio com a marca, com o símbolo e a espada da moralidade. No início do seu governo, mandou fechar o Congresso Nacional, substituiu todos os representantes do Poder Judiciário, fez uma “limpa” e praticamente extinguiu os partidos políticos. Os que existem hoje no Peru não são os partidos liberais do passado, nem o Partido Populista do Sr. Fernando Belaúnde Terry e do ex-Presidente Alan García. São partidos inteiramente novos, desarraigados, sem tradição, sem consistência, sem profundidade, sem raízes políticas.

            O Peru navega, pois, hoje em um mar de superficialidades; não consegue buscar, com legitimidade, em toda a sua profundeza, o verdadeiro fulcro da autenticidade e da autenticação do voto popular. Está aí o Sr. Alejandro Toledo, adversário de Alberto Fujimori, conversando com o mundo - já visitou inclusive o Presidente Fernando Henrique Cardoso - e se posicionando, na verdade, como o reivindicador legítimo do governo daquele país, uma vez que, segundo ele, as eleições recentes teriam sido fraudadas. Esse senhor, que tem claros vínculos com a Direita e com interesses externos ao Peru, também, por sua vez, de certa forma, não tem ligações mais profundas com as grandes vertentes políticas do Peru, desde o liberalismo até o trabalhismo, como nós as conhecemos na versão e nos moldes em que se instituíram no Peru.

            Portanto, está-se diante de um quadro assim: um Presidente da República que renuncia, acusado de fraude; um Presidente da República que, sabidamente, nunca foi um grande amante da democracia institucional; um Presidente que sempre revelou um cunho fortemente autoritário na sua prática, na sua gestão quotidiana; um Presidente da República que jamais mereceu confiança na sua pessoa, na sua condição absolutamente unipessoal, uma vez que nunca foi alguém inteiramente comprometido, alguém que pudesse representar as grandes tradições democráticas e libertárias do povo peruano. O Sr. Alberto Fujimori não tinha nenhum compromisso com esse passado nem com o liberalismo que se transfigurava na candidatura de Mario Vargas Llosa nem com o trabalhismo populista de Belaunde Terry, a quem ele, aliás, combateu tenazmente.

            O Sr. Alberto Fujimori assumiu o Governo peruano com objetivos bastante simpáticos e interessantes às potências internacionais, às grandes empresas, às grandes corporações internacionais. Ele dizia que iria fixar um programa de privatização, um programa de repassagem de uma série de investimentos em energia, de áreas de exploração de gás e petróleo para empresas estrangeiras; e dizia claramente que iria instalar no Peru uma economia de mercado plena.

            No início, portanto, do seu Governo, o Sr. Alberto Fujimori era um homem inteiramente simpático, por exemplo, ao Departamento de Estado dos Estados Unidos. Não havia, naquele momento, restrições a ele; ao contrário, acordos, contratos foram realizados entre empresas estadunidenses e o Governo do Peru, com o respaldo, o aval, o acompanhamento e a aprovação do Governo dos Estados Unidos da América.

            O Sr. Alberto Fujimori chegou a ser visto, portanto, quase como uma espécie de redentor do liberalismo e da economia de mercado na América Latina; alguém que vinha da condição de filho de um imigrante japonês, que lutou muito na vida e sofreu; era pobre, trabalhador e subiu na vida com seu próprio esforço. Estudou e se tornou reitor de universidade; ganhou expressão e respeito político, chegando a ser Presidente da República. Porém, não tinha ele formação ideológica clara, definida e visível; não havia transparência nos seus gestos nem nas suas iniciativas. Essa falta de compromisso fundamental, essa ausência de origem política e essa incerteza quanto ao seu passado, às suas definições e ao seu projeto político geravam em torno dele, no mínimo, uma grande insegurança, insegurança que, aliás, também, de certa forma, pode ter se manifestado entre os seus grandes aliados, inclusive as grandes potências, como os Estados Unidos.

            Sinceramente, eu precisava ter mais clareza e convicção sobre as razões da queda do Sr. Alberto Fujimori. Não foram apenas as dificuldades econômicas por que passa o país, tampouco as acusações de práticas fraudulentas na eleição ou a ilegitimidade institucional de um terceiro mandato, obtido mediante uma decisão encomendada à Suprema Corte do Peru. Essas potências estrangeiras já tiveram uma convivência enormemente amistosa, uma grande tolerância e uma capacidade de condescender com outras situações muito mais graves, muito mais difíceis, muito mais complicadas do que aquelas estabelecidas pelo Sr. Alberto Fujimori. Portanto, realmente me preocupei muito, a partir do momento em que vi o embaixador americano, a voz dos Estados Unidos na OEA, pressionando a eleição de maio deste ano, em que o Sr. Alberto Fujimori disputou ilegitimamente o terceiro mandato de Presidente da República. Ora, muitas vezes situações como essas são plenamente aceitas, são passíveis da mais admirável e tranqüila convivência. São situações absolutamente tranqüilas, e agora eram motivo de manifestações de pressão internacional, com a exigência de presença de um corpo estrangeiro para o acompanhamento e fiscalização das eleições. Sinceramente, eu precisava buscar um elemento de informação mais justificado, mais consistente, de maior peso, de maior importância, que valesse por si mesmo e, por si mesmo, explicasse tudo o que se fez para que o Sr. Alberto Fujimori saísse do poder.

            Depois de muito pesquisar na Internet, buscando sites alternativos no Peru, tomei conhecimento, faz alguns meses - desde então venho guardando informações a respeito do tema - , de um grande campo de gás natural existente na região de Camisea que fica a cerca de 450 km da capital do Peru, em direção aos Andes, em uma região de floresta densa, onde não há estradas, como também não há nenhuma estrada projetada a ser construída. Em Camisea, a Royal Dutch Shell Company, em 1983, há dezessete anos, descobriu a segunda maior jazida de gás natural da América Latina. Um negócio das Arábias, gás natural em abundância, descoberto pela Shell. Depois de tratativas com o Sr. Fujimori, tratativas essas que começaram em 1994, finalmente em 1996, a Shell holandesa e Mobil Oil americana formaram um consórcio para assinar um contrato de 40 anos para a exploração do campo de gás natural de Camisea, em um investimento da ordem de 3,5 bilhões de dólares em 15 anos.

            Daí se pode imaginar que no período de 40 anos que a Shell e a Mobil Oil receberam como concessão, neste período de 40 anos, isso seria, evidentemente, inteiramente pago, inteiramente compensado, inteiramente coberto. E é claro, essas empresas, como é natural, como é lógico, não há nisso nenhuma descoberta, elas só fariam esses investimentos no campo de gás natural de Camisea, nas jazidas de Camisea, se lhes fosse assegurada a plenitude do contrato pelo período de 40 anos.

            Então, em março de 1996, de maneira bombástica, o Sr. Fujimori assinou com essas duas empresas um contrato para exploração de Camisea por 40 anos. E o que havia em Camisea? O que havia ali para ser explorado? As quantidades são absolutamente espantosas, são gigantescas. O gás de Camisea, que deveria começar a ser extraído em 2003, para uma inversão inicial prometida pela Shell e pela Mobil Oil da ordem de US$1,5 bilhão, que se aplicariam nos primeiros 24 meses pós março de 1996, logo após a assinatura do contrato.

            Esse US$1,5 bilhão seria, portanto, a primeira fase. E a inversão total chegaria a mais de US$3 bilhões em 15 anos. A verdade é que ali havia, para ser explorado, 13 trilhões de pés cúbicos de gás e 600 milhões de barris de líquidos condensados, ou seja, de petróleo; 600 milhões de barris de líquidos condensados e 13 trilhões de pés cúbicos de gás! O Sr. Fujimori, na data da assinatura, chegou a chamar de “O Contrato do Século”, The Deal of the Century. Foi o que foi assinado e prometido em 1996. Portanto, a Mobil Oil e a empresa Shell, a partir daí, começaram a explorar essa região. Supostamente iniciaram a primeira fase com a intenção de cumprir o contrato.

            O primeiro processo de investimento de 24 meses, se concluiria em 1998. E, em 1998, novamente as partes se reuniriam para tratar da segunda fase, que era já então a construção do sistema de transporte via gasoduto, depois, a política de distribuição de gás na região de Lima, na grande área de concentração industrial do Peru, e, mais tarde, evidentemente, os excedentes voltados para a exportação.

            Naquele momento decisivo, as duas empresas, em reunião com o Sr. Alberto Fujimori, exigiram que houvesse viabilidade do investimento e do negócio como um todo, aquilo que chamavam de vertical management, ou seja, administração vertical do projeto. O que a Shell e a Mobil Oil exigiram do Sr. Alberto Fujimori? Exigiram que essas empresas, que já detinham o direito de exploração das jazidas de gás, também obtivessem o direito de explorar o sistema de transporte, o gasoduto, posteriormente o controle do sistema de distribuição e, numa terceira etapa, também pudessem ser os exportadores do gás peruano. Não se contentariam nem se limitariam à primeira fase, que era a da retirada do gás da simples mineração. Estavam dispostos a tomar conta de todos os outros momentos do processo, inclusive os direitos de exportação.

            Para isso exigiam determinadas tarifas que o Sr. Alberto Fujimori não aceitou, como também não aceitou dar a uma só empresa o controle de todas as fases: exploração, transporte e distribuição do gás aos consumidores. Se uma empresa só - diz o Sr. Alberto Fujimori - controla as três fases, isso é um monopólio privado, contrário ao interesse do povo peruano. Sim, o Sr. Alberto Fujimori! Esse ditador, possivelmente um homem corrupto - ainda não está provado que ele o seja, mas seu chefe de polícia secreta, Montesinos, seguramente é um corrupto. Esse cidadão teve um momento, um lampejo, na sua vida, que foi extremamente marcante, possivelmente definitivo para sua sorte, para seu destino: resolveu sair da direita e posicionar-se na esquerda.

            Desde 1998, o Sr. Alberto Fujimori vem implementando uma visão nacionalista na política interna do Peru, inclusive recusando duramente todas as tentativas da Mobil Oil e da Shell de controlar e monopolizar o gás peruano. O contrato estava para ser assinado em 1998, foi solicitado um período de seis meses para que houvesse um acordo sobre tarifas e um acordo sobre o chamado vertical management, ou seja, a administração vertical desejada e exigida pela Shell e pela Mobil Oil.

            Pois bem, o período de seis meses se passou e o Sr. Fujimori não voltou atrás e, a partir daquele momento, as duas empresas ameaçaram retirar-se do projeto, retirar-se do Peru e retirar-se, evidentemente, do contrato e dos investimentos. No entanto, naquele momento, tanto a Shell como a Mobil Oil já tinham investido US$250 milhões nos campos de Camisea. Durante a reunião de maior pressão - aquela em que foram mais agudos e intensos os debates e o confronto entre o Sr. Alberto Fujimori e os representantes das duas empresas -, não houve acordo. Algumas semanas mais tarde, o Sr. Rolando Martinez, porta-voz do Governo peruano, disse para a imprensa do Peru que todos sabiam que os embaixadores dos Estados Unidos (país sede da Mobil Oil) e os embaixadores do Reino Unido (país sede da Shell, que é anglo-holandesa, uma empresa que tem um nome holandês, Royal Dutch, mas que, na verdade, é um consórcio entre ingleses e holandeses) iriam encontrar-se com Fujimori, na quinta-feira, para resolver a questão.

            O Sr. Fujimori tinha aceitado a reunião com os embaixadores. Portanto, naquele momento, a questão do contrato da Mobil Oil e da Shell não era mais uma questão de negócios privados, não era mais uma questão empresarial, não era mais um assunto de estrito interesse de duas grandes corporações internacionais. Naquele momento, já era assunto de governos, dada a notória, clara presença e intervenção dos Srs. Embaixadores.

            Naquela reunião houve uma ameaça de que as duas empresas se retirariam definitivamente se Fujimori não lhes entregasse o controle total do processo: a exploração do gás, seu transporte e venda. De modo que, assim, a empresa poderia, de certa maneira, exercendo o monopólio, fixar o preço que bem entendesse, regular a oferta e a procura para a obtenção de vantagens. E o Sr. Alberto Fujimori, pasmem V. Exªs, negou-se a aceitar essa imposição imperialista, e ali assinou também definitivamente o seu destino.

            A partir dali, começaram as pressões, a partir do momento em que os contratos da Shell e da Mobil Oil foram rompidos. A partir dali, é que tudo no Peru ficou errado, tudo o que já sabíamos que estava errado. Para alguns governos, a partir dali, é que tudo que era cor-de-rosa ficou marrom. A partir dali, tudo que era bom ficou mau. O Sr. Fujimori finalmente era um ditador, era um homem que não tinha respeitado as tradições democráticas do Peru. Finalmente, se descobria que o Sr. Fujimori era realmente um homem perigoso, um homem muito perigoso para a democracia.

            A História está cheia de exemplos de homens que começam com uma campanha de absoluta moralidade em defesa, possivelmente, de interesses macropopulares, sempre com uma linguagem de pureza, contra a política, contra a corrupção, principalmente dos políticos mais tradicionais, e esse arrivista, que é o Sr. Alberto Fujimori, naquele momento, foi descoberto pelos países mais fortes e poderosos do continente, entre eles os Estados Unidos, cujo Embaixador passou a ser seu inimigo declarado.

            O Sr. Fujimori manteve pé em 1998; não aceitou as pressões em 1999 e, no início do ano 2000, cometeu o erro fatal e definitivo: reabriu a concorrência para exploração do gás de Camisea, considerou que a Shell e Mobil Oil estavam fora e que, a partir daquele momento, quem quisesse explorar o gás de Camisea estava com a licitação aberta. Ocorreu, então, naquele momento, a formação de um consórcio liderado pelo grupo Pluspetrol, Resources Corporation, da Argentina, um grupo argentino, que trouxe consigo capital coreano, a empresa SK Sucursal del Perú, e, para completar, convidou uma empresa menor da área de energia do Estado do Texas, nos Estados Unidos, conhecida como Hunt Oil Company of Perú.

           Portanto, a Hunt, a Pluspetrol e a SK formaram um consórcio e venceram a concorrência. Praticamente, eram os únicos concorrentes que tinham viabilidade. Nenhuma das grandes empresas internacionais, em solidariedade com a Mobil Oil e com a Shell, acorreu e disputou a licitação, apenas um pequeno grupo fraco e frágil de pequenas empresas que se formaram, sob a liderança desse grupo argentino, que é inequivocamente um grupo inexpressivo, em termos de proporção com as grandes irmãs. E é este o grupo que detém agora os direitos de exploração do gás de Camisea, o que significava dizer que estava tudo perdido, que não adiantava mais o Embaixador dos Estados Unidos colocar as mãos na garganta do Sr. Alberto Fujimori, porque o contrato já era de outra empresa. A Shell e a Mobil Oil já estavam fora. Os argentinos e os coreanos estavam liderando o projeto. Chamaram para uma participação de 19% apenas uma pequena empresa regional americana, a Hunt, do Texas, na tentativa de não serem desestabilizados por ações de política empresarial empreendidas por essas empresas. A Hunt entra como uma espécie de direito de proteção, como resguardo para as pressões, mas a participação dela é pífia, a liderança é argentina e são os argentinos que estão falando neste momento para todo o mundo em nome de Camisea.

           Srªs e Srs. Senadores, a história se repete, parece que a roda do mundo anda sempre na mesma direção e que aquele cidadão de caráter autoritário, desrespeitador das tradições constitucionais do Peru, que desmontou as instituições como o Poder Judiciário peruano e formou uma Suprema Corte ao molde da sua vontade, um ditador que muitas vezes utilizou o poder de forma abusiva, que merecia, sim, entregar o Governo para que o povo elegesse um legítimo representante, infelizmente não caiu por isso. Ele caiu por um gesto de nacionalismo, por um gesto de defesa do interesse peruano porque ele ousou arrostar as grandes corporações, o Embaixador dos Estados Unidos e o Governo americano. Enquanto ele era simpático, supostamente um subordinado, todas as práticas desairosas contra a democracia eram inteiramente perdoadas e assimiláveis. No momento em que ele feriu os interesses dos investimentos estrangeiros dentro do seu país, defendendo minimamente, como era seu dever, o interesse nacional, ele caiu.

           É preciso que algumas pessoas expliquem as fontes de financiamento para as campanhas feitas, candidatos que tiveram respaldo externo nas suas campanhas, compromissados inteiramente com a visão da direita internacional e que esses candidatos expliquem como alguns organismos que conhecemos há tantos anos e que pensamos que já tinham sido banidos da vida e do cotidiano das relações internacionais, como a CIA e outros organismos, passaram a realizar investidas internamente e encontram, enfim, o fulcro para desestabilizar o Sr. Alberto Fujimori.

           Na verdade, temos aí algo que nos deixa satisfeitos e que nos preocupa. O que nos deixa satisfeitos é ver que, agora, o povo peruano livrou-se do ditador, do homem sem tradição e sem compromisso democrático, e elegerá, legitimamente, o seu Presidente da República, pelo voto sagrado, legítimo, que é o voto direto da democracia. O que me preocupa é que a sua queda tem a ver com algo muito importante, algo que é sagrado para o Brasil, que é o direito à autodeterminação dos povos, o direito à não-intervenção, o direito à não-ingerência, o direito de cada povo auto-realizar o seu caminho.

           Sr. Presidente, independentemente de o Presidente ser o Sr. Alberto Fujimori ou seja quem for, nenhuma nação pode, de fora, escolher quais os destinos de outra.

           Isso é o que me preocupa, Sr. Presidente.

 

           O SR. PRESIDENTE (Moreira Mendes) - Concedo a palavra ao Senador Lauro Campos, por vinte minutos.

           O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aproveitando a oportunidade de falar após o nobre Senador José Fogaça, quero expressar a minha admiração pelo trabalho que acaba de apresentar. S. Exª realmente trouxe luzes novas e detectou elementos que nos ajudam a compreender e a decifrar um pouco os hieróglifos de nossa sociedade latino-americana.

           Eu iria abordar ligeiramente o assunto, não desse aspecto, mas de um outro ângulo. Chamei algumas vezes o Presidente Fernando Henrique Cardoso de “Fujinando”, porque considero que parece muito e em muitas coisas com o ex-Presidente Alberto Fujimori, do Peru, que está fugido no Japão.

           Gostaria de alertar alguém que me escuta dos perigos da “re-reeleição”. O dia em que começaram a tratar da reeleição do Presidente Fernando Henrique Cardoso, ouvi alguém dizer que aquela não era uma reeleição, mas uma “reindicação”, e que a reeleição então seria a próxima, a “re-reeleição” da qual se valeu o Sr. Fujimori - e não deu certo, obviamente, porque ele não pôde gozar as delícias do poder, que ele, de qualquer forma, já usurpara, quando pelo menos de sua primeira reeleição.

            Eu, que sou um leitor contumaz e incansável de Sua Excelência, o Presidente da República, posso dizer hoje que já li, reli e tresli todas as suas obras, todos os seus livros. Portanto, foi com grata satisfação, que recebi este pequeno exemplar de A outra face do Presidente - Discursos de Fernando Henrique no Senado, organizado por B. Calheiros Bomfim, uma coletânea excelente. Eu conhecia muito pouco de seus discursos. Já havia lido uma publicação do próprio Senado, em que alguns discursos proferidos por Sua Excelência nesta Casa estavam transcritos, mas essa seleção é realmente preciosa, e eu gostaria de congratular-me com o seu organizador.

            A propósito, quero dizer que esses discursos de Sua Excelência não podem ser acoimados por aqueles que nunca leram nada ou quase nada dele e gostam de dizer que eu extraio algumas velharias, algumas antigüidades já esquecidas por ele, que também aconselhou que todos esquecessem, arquivassem aqueles conhecimentos. Mas ele continua a publicar novas edições. Não deveria fazê-lo. No dia em que eu ou qualquer outro autor perceber que as suas idéias já perderam o vigor, já estão prescritas e não prestam para nada, a não ser para os arquivos mortos, obviamente não deixarei que essas obras continuem a ser editadas.

            Continuando, Sr. Presidente, ao ler esses trechos de discursos, percebo muitos deles tão próximos ao pensamento do PT, muitos deles tão próximos àquilo que ainda penso e continuo a pensar! Mas não posso, obviamente, comparar a minha medíocre passagem por este mundo com a elevada, narcísica e iluminada vida de Sua Majestade, o Presidente Fernando Henrique Cardoso - expressão que não é produto da minha parca imaginação, mas o título de um livro publicado por um inglês cujo nome não me lembro agora e que foi cônsul no Brasil por algumas décadas: Sua Majestade, o Presidente do Brasil. A referida obra mostra que realmente existe não na fulanização, mas, nas nossas instituições, uma semelhança muito grande entre a Presidência do Brasil e a estrutura do Império britânico.

            Tenho uma preocupação que aprofundei à medida que me lembrava do Presidente Alberto Fujimori: onde será que Sua Excelência, o Presidente Fernando Henrique Cardoso, nesse seu caminho tão plano - e, por ser plano, talvez escorregadio -, tem encontrado a casca de banana que o tem levado dos passos verticais para a horizontalidade da queda? Onde será? Por que será? Que forças são essas que cortaram uma estrada tão bem traçada, tão respeitosa e respeitável?

            Não tenho ainda a resposta completa para essa minha inquietação. Mas uma coisa eu sei: há muito tempo - e foram cerca de 20 dias antes de ser deflagrado o Plano Cruzado, o chamado Cruzado Um -, em duas páginas do Jornal dos Economistas, fiz algumas previsões e, ao acompanhar o processo, não tive dúvida alguma de que não tinha sido injusto quando falei que os economistas brasileiros, esses tecnocratas, na realidade ajudaram a mudar o nome da economia política, que nasceu e se desenvolveu na Inglaterra, para uma tal de “Economics”, para fingir que o que eles fazem não é político! Retiraram o adjetivo “político” da economia, para que ela parecesse coisa séria, ciência exata, e não uma economia política. Esse tema economia política, aliás, foi cunhado e impresso pela primeira vez por um francês que escreveu um livro de economia em versos, em vez da aridez da matemática e do inglês, o latim moderno.

            Srs. Senadores, o que me preocupa é que todos esses planos foram montados, arquitetados e cronometrados, o timing foi obtido e conseguido para que aqueles planos de combate à inflação fizessem com que a inflação zero ou próxima de zero durasse até as próximas eleições. Foi assim que o Plano Cruzado I elegeu 23 Governadores. Qual político no Brasil já conseguiu eleger 23 Governadores? Nenhum jamais conseguiu tal feito, e os economistas conseguiram! Foram eles que arquitetaram um plano e calçaram esse plano com “cruzadinhos” e outros artifícios, até que a vitória nas eleições - que era o seu objetivo principal e não declarado - fosse alcançada.

            Agora, para encurtar a conversa, o Real consegue um milagre: pela primeira vez no Brasil, consegue eleger e reeleger um Presidente da República, e com a maioria nas Casas do Congresso.

            Eles não são engenheiros, tecnocratas, economistas e economicistas; são politiqueiros. O que eles fazem é principalmente, ou quase exclusivamente, política. E, para fazer política, eles passam de certos ensinamentos, certas práticas, para práticas opostas, inversas. Prova disso, por exemplo, são as declarações do Sr. Camdessus, hoje Assessor do Vaticano para a Dívida Externa, feitas quando era Diretor-Gerente do Fundo Monetário Internacional. Disse ele que “as mazelas pelas quais passava a economia brasileira eram devidas à reeleição de Fernando Henrique Cardoso”. E que “no Brasil houve atraso em relação a medidas que deveriam ter sido tomadas muito antes - por exemplo, a desvalorização cambial -, mas que foram adiadas, proteladas, para que Fernando Henrique ganhasse e vencesse a sua reeleição”. Isso quem diz é o Camdessus, ex-Diretor-Gerente do FMI.

            Eu receava que o próximo Presidente fosse um daqueles que, durante muito tempo, encomendariam e preparariam planos e combateriam a inflação até que vencessem os pleitos, as eleições e a reeleição. Agora eles sabem que vão perder a próxima eleição! A prova de que sabem é que, agora, ao invés de chamarem o Bacha e outros especialistas no timing, na cronometragem e no rearranjo dessa engenharia, estão preparando a retirada. Sabem que não vencerão as próximas eleições e, portanto, não estão preparando um novo plano para uma provável “re-reeleição” - o que não deu certo para o Sr. Fujimori, exemplo saudável para todos nós e calmante também. Tirou-me um peso das costas ver o Sr. Alberto Fujimori não conseguir exercer o mandato ganho numa “re-reeleição”.

            Como quem vê a barba do vizinho pegar fogo põe as suas de molho, talvez o exemplo de Alberto Fujimori espante, exorcize para sempre o fantasma da ambição que leva à “re-reeleição”.

            Agora eles querem preparar a casa para o próximo hóspede, preparar as medidas. E podemos ver que o interesse partidário sobrepuja as necessidades nacionais, o interesse da Nação. Quem diz que essa é uma medida que costuma ocorrer é o próprio Fernando Henrique Cardoso.

            Por exemplo, se vencer as próximas eleições, o Lula não poderá substituir os Presidentes do Banco Central, que adquiriram a tal da independência e terão mandato de dez anos. Dessa forma, o Governo de Lula não poderá mexer no Banco Central. O Governo atual, de Fernando Henrique Cardoso, projetará para o futuro e engessará as medidas que o próximo Presidente poderia tomar, medidas discordantes daquelas que estão em prática.

            “A Nação exige que o atual Governo limite a negociação ao seu período de mandato, deixando ao futuro Governo a responsabilidade de escolher o que melhor convier ao País”. Este é um conselho dado pelo ex-Senador Fernando Henrique Cardoso ao País!

            A Nação deve exigir que este Governo também faça isso, que não possa nomear Presidentes de Banco Central e de Banco do Brasil etc além do período do seu mandato, deixando - como diz o ex-Senador Fernando Henrique Cardoso - “ao futuro Governo a responsabilidade de escolher o que melhor convier ao País”.

            Estão sendo tomadas medidas em nome de um Orçamento Plurianual, medidas que impõem aquilo que Fernando Henrique Cardoso, pelo menos por duas vezes, escreveu como motivo para que sejam impossíveis de ser aplicadas: equilíbrio orçamentário e pagamento da dívida externa, página 242 do livro “As Idéias e Seu Lugar”, de sua autoria.

            Se formos engessados por medidas de longo prazo, por compromissos que deverão ser cumpridos sob o comando e o domínio do PSDB e de seus aliados, mas que vão vigorar durante o mandato de Luiz Inácio Lula da Silva, o próximo Presidente da República encontrará um Brasil totalmente engessado, manietado. Se Fernando Henrique Cardoso tem razão, o Brasil transferido junto com a faixa presidencial será um país impossível de ser administrado.

            Está na página 242 do livro de Fernando Henrique Cardoso:

“Já que mencionei a inflação, é obvio que, a partir da perspectiva que adotei, as políticas do estilo característico do Fundo Monetário Internacional, do gênero “controle da base monetária” - arrocho salarial - equilíbrio orçamentário” são insuficientes, pois não enfrentam a questão principal que é o endividamento interligado externo e interno do Estado e propõem o impossível: que se pague a dívida e, ao mesmo tempo, que se equilibre o Orçamento.”

            E a dívida que será passada para a responsabilidade do próximo Presidente é uma dívida muito maior que aquela que existia e que, de acordo com Fernando Henrique Cardoso, tornava impossível a administração do Brasil.

            Disse ainda Fernando Henrique Cardoso:

“Não estou defendendo a inflação, mas digo que não podemos ter como obsessão o nível zero de inflação. Nossa obsessão tem que ser outra: o nível de pleno emprego; e outra mais: a capacidade do País de criar esperança para suas populações mais pobres.”

            Conselhos do Senador Fernando Henrique Cardoso: “A inflação não deve ser uma obsessão, mas sim o pleno emprego”, diz ele, que elevou o desemprego, em nome do combate à inflação, ao mais alto nível que a economia brasileira conheceu em toda sua história e vai passar ao próximo Governo uma inflação que ameaça voltar, porque as âncoras enferrujaram, e o mais alto nível de desemprego que conhecemos.

            Portanto, basta ler para perceber que, agora, não há outro plano para administrar a economia brasileira, suas contradições, seus problemas. Agora, o que existe é um plano para impedir que o próximo Presidente eleito governe.

            Muito obrigado.

 

            O SR. PRESIDENTE (Moreira Mendes) - Com a palavra a Senadora Heloísa Helena pelo tempo que restar da sessão.

            A SRª HELOÍSA HELENA (Bloco/PT - AL. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Claro, Sr. Presidente. Se V. Exª ainda quiser fazer o uso da palavra...

            Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, é evidente que o discurso do Senador Lauro Campos nos levaria a partilhar também do debate sobre os arquitetos de planinhos "cruzadinhos" e "reaizinhos", conforme manda a demagogia política. Todavia, gostaria de partilhar uma preocupação com esta Casa e com outros igualmente arquitetos, com "grampinhos", "arapongazinhos", em que infelizmente o Congresso Nacional, o Senado especialmente, mais uma vez, tem-se omitido de uma forma vergonhosa.

            Estamos chegando ao final do ano e penso que, talvez, houvesse a necessidade de o Senado, de o Congresso, fazer um mea culpa sobre os últimos acontecimentos e sobre a omissão e a cumplicidade desta Casa.

            É evidente que o Senado, enquanto instrumento de representação da Federação, não fez absolutamente nada, não cumpriu sequer suas obrigações constitucionais. Não foi também capaz de fiscalizar absolutamente nada. Sinceramente, não sei como algumas pessoas não se envergonham perante a opinião pública diante de um caso que está aqui abafadinho, como o do Eduardo Jorge. Sinceramente, fico impressionada com o cinismo e a capacidade de simulação de não se fazer nada em relação a isso.

            Espero que o nosso requerimento encaminhado à Mesa - e mais uma vez será cobrado amanhã, com a presença do Presidente do Congresso e da Casa -, que objetiva enquadrar o Ministro Pedro Malan em crime de responsabilidade porque se negou a responder os nossos requerimentos de informação, possa ser apreciado.

            A situação da Abin é realmente algo impressionante, Sr. Presidente! Eu estava procurando os representantes da Liderança do Governo para que pudessem estar no plenário e garantir a presença do General Cardoso junto à Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, onde há requerimento do Senador Jefferson Péres para ser votado. O General Cardoso já pode comparecer a esta Casa, nesta semana, para explicar as denúncias formuladas por meio do jornalismo investigativo, que ocupam páginas de jornais e revistas, e também para apresentar ao Congresso Nacional todas as atividades da Abin, desde a promulgação da lei que a criou, em dezembro de 1999.

            Não seríamos hipócritas e cínicos ao negarmos simplesmente qualquer estrutura de inteligência. Todas as nações do mundo têm suas estruturas de inteligência, seus instrumentos para a produção e análise de conhecimentos, que podem ser disseminados dentro da estrutura de um país por organismos internacionais, quando esteja em risco algo além da soberania nacional específica de um único país. Precisamos saber de fato o que foi produzido de conhecimentos pela Abin durante todo este ano.

            A análise desses conhecimentos gerou o quê e para quem? Assessorou o Chefe de Estado ou o Presidente da República? Foi motivo de alguma representação ao Ministério Público para os atos penais cabíveis? Foi encaminhada a órgãos ou autoridades competentes para ser viabilizada alguma ação necessária? O que foi feito até agora está de acordo com a lei, respeitando o estado democrático de direito, as instituições democráticas, os direitos e garantias individuais? Efetivamente, o que foi feito até agora na produção de conhecimentos?

            É evidente que há um grande preconceito em relação às estruturas de inteligência em função da herança do SNI, que hoje acaba se reproduzindo num mostrengo deformado a serviço da estrutura partidária que comanda o País. Todos gostaríamos muito de ver desvendados todos os mistérios da Abin.

            O que mais me impressiona não é quem está sendo investigado. O filho do Presidente da República merecia ser investigado não de forma dissimulada e subterrânea, mas como muitos amigos do Presidente da República mereciam ser investigados pelo Congresso Nacional, que tem prerrogativa e obrigação constitucionais de fazê-lo. No entanto, acontece absolutamente tudo e ficamos serenos e impassíveis.

            Apelo, mais uma vez, até porque não existe nenhuma desculpa em função de não haver normatização para o tal Conselho de Controle Externo, do qual faço parte também. Apresentamos um projeto de decreto legislativo, regulamentando a ação de controle externo do sistema de inteligência do País. Independentemente disso, que espero seja votado em regime de urgência, o Congresso está provocado moralmente a assumir as suas prerrogativas constitucionais e chamar o General Cardoso, os responsáveis pela Agência Brasileira de Inteligência para, efetivamente, demonstrarem ao Congresso Nacional o que estão fazendo na produção de conhecimentos. Pelo que vem sendo divulgado pelo jornalismo investigativo até imagino o que é que tem sido feito, não na produção e análise de conhecimentos, respeitando a soberania nacional, os direitos e garantias individuais, o estado democrático de direito, porém muito do que está sendo investigado, que não gerou uma única representação no Ministério Público, para os atos e ações penais cabíveis, deve estar sendo utilizado neste Governo, Senador Lauro Campos, como instrumento para tráfico de influência, intermediação de interesses privados, exploração de prestígio, enfim, para as negociatas que já são comuns, infelizmente, ao Governo Fernando Henrique Cardoso.

            Portanto, o meu apelo é pela presença aqui do General Cardoso. Amanhã haverá uma reunião extraordinária da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Que possa a matéria ser votada amanhã, pois há praticamente 10 dias o General Alberto Cardoso disse à opinião pública que estava disponível para vir prestar esclarecimentos. Só espero que não caiba à Bancada de Governo esse papel feio de, mais uma vez, ser omissa e cúmplice diante da bandalheira a que a opinião pública tem assistido. Portanto, o nosso apelo é no sentido de que o General Alberto Cardoso venha a esta Casa, porque estamos ansiosos por saber dos atos importantíssimos do Sistema de Inteligência. Queremos saber o que toda essa estrutura produziu de conhecimentos fundamentais para a soberania nacional, para o combate ao narcotráfico.

            Imagino que o Ministério Público Federal esteja abarrotado de representações para as ações penais cabíveis, que órgãos e autoridades competentes estejam repletos das informações produzidas pela Abin. Precisamos saber de tudo isso para que, efetivamente, possamos cumprir com nossas obrigações constitucionais. Logo, pedimos à Bancada governista que não proteja o General Alberto Cardoso, uma vez que S. Ex.ª mesmo está disposto a vir aqui.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung. Fazendo soar a campainha.) - Eminente Senadora Heloísa Helena, desculpe interrompê-la.

            Consulto o Plenário sobre a prorrogação da sessão por dez minutos, para que a Senadora possa concluir seu discurso.

            Não havendo objeção do Plenário, está prorrogada a sessão para 18h40min.

            A SR.ª HELOÍSA HELENA (Bloco/PT - AL) - Certamente, Sr. Presidente. Encerro a minha intervenção para garantir que o Senador Moreira Mendes possa fazer uso da palavra, que espero seja favorável à humanidade, como o fazemos sempre, e reitero nosso apelo no sentido de que a Bancada do Governo possa trazer aqui o General Cardoso, que já se colocou à disposição do Congresso Nacional para prestar os esclarecimentos necessários, e nós possamos ao menos dizer algo à opinião pública.

            Vejam essa estrutura arquitetônica tão linda e tão maravilhosa, esses tapetes azuis suaves, mas efetivamente poucos aqui sabem explicar alguma coisa do que está acontecendo no País. Alguns podem calar mansamente, de forma domesticada, como convém, para preservar os carguinhos na estrutura de Governo; outros, efetivamente, não podem dizer se estão cumprindo com suas obrigações constitucionais, porque aqui não se fiscaliza absolutamente nada.

            Portanto, Sr. Presidente, deixo o apelo para que o General Cardoso possa vir se explicar à Nação brasileira ansiosa e ao Congresso Nacional, ansioso por cumprir sua obrigação constitucional de fiscalizar os atos do Executivo, para que nós possamos saber toda essa produção de conhecimento - certamente maravilhosa e fundamental para a soberania nacional - elaborada pela Abin desde dezembro do ano passado até agora.

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - Concedo a palavra ao ilustre Senador Moreira Mendes.

            O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na verdade, não vou conspirar pela humanidade, mas vou conspirar pelo meu Estado de Rondônia, desta vez.

            Penso que, com pompa e circunstância, o Presidente Fernando Henrique Cardoso divulgará, no próximo dia 31 de dezembro, os primeiros resultados do Censo realizado este ano pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE. Censo que consumiu R$750 milhões, sem falar nas polpudas verbas publicitárias que o acompanharam. Mas até hoje, segundo informes, 4,75% da população brasileira ainda não foi recenseada, inclusive eu e toda a minha família. E praticamente toda ela está localizada na região Norte em pontos de difícil acesso. Contundentes têm sido as críticas que acompanham esse trabalho do IBGE, a começar pela duvidosa pergunta sobre cor, seguida da indagação sobre a pessoa responsável pelo domicílio em que a mulher é comparada a uma criança mesmo quando divide com o companheiro todas as responsabilidades do lar.

            Outras reclamações comuns referem-se à identificação do recenseador e ao preenchimento do formulário a lápis. Ao todo foram contratadas 220 mil pessoas para trabalhar no censo além do quadro de funcionários pertencente ao IBGE. Mas ficam as perguntas: qual o preparo dado a essas pessoas? Serão elas capazes de enfrentar dificuldades de acesso a Municípios distantes? Estão suficientemente esclarecidas sobre as suas graves responsabilidades? Compreendem a importância da veracidade dos dados coletados? Os Estados do Norte têm sido sistematicamente prejudicados em todas as pesquisas que se fazem no Brasil como se não fizessem parte desta Federação.

            Há poucos anos, muitas queixas foram encaminhadas ao Programa Comunidade Solidária pelos prefeitos nortistas, quando os seus Municípios viviam na faixa da pobreza. Mesmo esse alerta não serviu para que o Censo atual tentasse corrigir as falhas populacionais. O trabalho de campo está atrasado e continua feito sem critérios técnicos que correspondam à realidade. O IBGE publicou nos primeiros dados parciais do Censo uma projeção de 167 milhões de habitantes, mas a coleta de dados continua sendo realizada na região Norte de forma atabalhoada, sem que se possa confiar nos resultados que dela advirão.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, responsável pelos dados referentes à população brasileira, o IBGE realiza o censo de 10 em 10 anos e de 5 em 5 anos faz uma contagem da população baseada em simulações. Anualmente, atualiza os seus dados por amostragem domiciliar.

            O Brasil é um país de vastíssima extensão, com características próprias e diversas em cada região. Nem todos os Municípios são iguais e crescem de forma homogênea. No caso específico do Estado de Rondônia, encontrei alguns Municípios com crescimento totalmente atípico, como o de Machadinho d´Oeste, Buritis e São Francisco do Guaporé. De um dia para outro, esses Municípios recebem, às vezes, centenas de migrantes que acabam sendo assentados pelas prefeituras locais. São também objeto de assentamentos promovidos pelo Incra.

            Ao examinar a contagem da população feita pelo IBGE em 1996, verifiquei que Buritis e São Francisco do Guaporé, cujos códigos são 00452 e 01492, não têm sequer cálculo populacional. Já Machadinho d´Oeste - Código nº 00130 - consta como tendo 28.949 habitantes. Mais ainda: as últimas pesquisas por amostragem domiciliar não incluem a população rural de Rondônia, Roraima, Acre, Amapá, Amazonas e Pará. Esse fato demonstra a dificuldade do IBGE em contratar técnicos competentes para trabalhar em zonas de difícil acesso, servidas por estradas vicinais mal pavimentadas ou até por trilhas e picadas em que só passam animais de carga. É natural, pois, a preocupação das prefeituras interioranas da Região Norte com a contagem exata de suas populações.

            Cioso de sua responsabilidade, o prefeito de Machadinho d’Oeste, Neodi Carlos Francisco de Oliveira, mandou verificar o número de pessoas assentadas no Município, por sua conta, nos anos de 1998 e 1999, chegando ao total de 4.463 neste período. O próprio IBGE, com dados do Censo de 1990, calcula que a média de membros de família residentes na área rural de Rondônia é de 4,62. Assim sendo, só nos dois últimos anos foram assentadas em Machadinho d’Oeste cerca de 20.600 pessoas. Somando-se os 20.600 novos moradores aos 28.900 da contagem publicada pelo IBGE em 1996, temos um total de 49.500 habitantes. Isso sem contar os assentados de 1997, 1998 e 2000.

            A preocupação do prefeito com o trabalho do IBGE é justa, razoável. Se a população contada pelo IBGE não se aproximar do número verdadeiro, o município será prejudicado, posto que vai ter que atender a toda a sua população, recenseada ou não, com ações de saúde, educação, saneamento, entre outros -serviços que a Prefeitura deve prestar a sua comunidade - sem receber do Governo Federal as verbas a que tem direito por imposição legal e não por favor ou por mera liberalidade, isto porque a participação do Município no FPM e em diversos programas do Governo Federal, sobretudo na área da educação, se faz com base na quantidade da população do ano anterior fornecida pelo IBGE.

            Portanto, se o Instituto negligencia na sua tarefa, os Municípios de crescimento atípico como Machadinho d´Oeste, Buritis e São Francisco do Guaporé, especialmente no meu Estado, o trabalho empreendido pela unidade do Censo 2000 em Rondônia, além de estar atrasado não corresponde à realidade local, o que evidentemente preocupa as prefeituras locais.

            Não há como confiar nos dados apresentados. No Rio Grande do Sul, por exemplo, seis novos Prefeitos eleitos estão em situação no mínimo estranhas: suas cidades não constam do site internético do IBGE. E o que dizer do Prefeito de Mesquita, na Baixada Fluminense, que se elegeu com quase quarenta mil votos? Sua cidade é a maior de todas as ignoradas pela estatística oficial do Brasil.

            Dia desses, a revista Veja, edição 1.672, de 15 de outubro do corrente, na coluna Radar, assinada pelo jornalista Lauro Jardim, publicou nota em tom sarcástico e irônico, informando que eu, juntamente com o Deputado Federal do meu Estado Oscar Andrade, havia procurado o IBGE em Brasília, acompanhado do Prefeito Neodi Carlos, de Machadinho d’Oeste, para “arrumar um jeitinho” para aumentar a população de Machadinho d’Oeste, como passo a ler:

Mágica nos números.

Se dependesse de alguns parlamentares, a população brasileira medida pelo Censo seria um samba do crioulo doido. Na semana passada, o senador Moreira Mendes e o deputado federal Oscar Andrade, ambos do PFL de Rondônia, quiseram arrumar um jeitinho para aumentar a população de Machadinho d’Oeste, no interior do Estado. Gastaram muita saliva tentando convencer o chefe do IBGE em Brasília, Antônio Leles, de que a pequena Machadinho precisaria ter pelo menos 45.000 habitantes no Censo 2000. Pelo ritmo da contagem atual, o número não chegará a 30.000. Os pefelistas estavam de olho grande nos repasses federais de verbas, que crescem de acordo com o número de moradores. Em tempo: Mendes e Andrade não tiveram sucesso na tentativa.

            Em primeiro lugar, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero informar aos meus Pares que a revista Veja faltou com a verdade, porque nunca estive na sede do IBGE em Brasília, assim como não assinei nenhum documento pedindo recontagem. O ilustre jornalista bisbilhoteiro que assina a nota deveria, antes de redigi-la, certificar-se da veracidade das informações e não apenas publicar o que ouviu dizer de funcionário do IBGE em Brasília Antônio Leles, que, em vez de cuidar do seu ofício, preocupa-se em dar informações inverídicas, com o objetivo de ridicularizar parlamentares.

            A revista Veja, mesmo depois de por mim informada da verdade, não se dignificou a corrigir o erro. Quanto ao IBGE, igualmente, Sr. Presidente, fez ouvido de mercador em relação aos meus esclarecimentos e nenhuma providência tomou com relação à leviandade do seu auxiliar.

            Sr. Presidente, voltando ao tema e já para terminar, não duvido da integridade do Dr. Sérgio Besserman Vianna, Presidente do IBGE, mas penso que o Instituto não se tenha preparado convenientemente para a realização do trabalho de pesquisa na Região Norte.

            Quero, por fim, dizer que não fui ao IBGE em Brasília acompanhar o Prefeito Neodi, mas, se tivesse tido a oportunidade, eu o teria feito com o maior prazer e honra, pois estaria, de alguma forma, ajudando um prefeito competente, sério e cioso de suas responsabilidades, ao contrário de alguns dirigentes do IBGE.

            Para finalizar, quero aproveitar esta tribuna para convidar o ilustre jornalista Lauro Jardim para, não apenas conhecer o meu Estado, em especial o Município de Machadinho d’Oeste, mas também para que possa atestar pessoalmente que, entre o que diz o IBGE e a realidade dos Municípios a que me referi, vai uma distância muito grande e que, na verdade, quem faz o samba do crioulo doido não é este parlamentar, mas sim o IBGE, pelo menos no que diz respeito a Machadinho d’Oeste.

            Muito obrigado.

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - Sobre a mesa, ofício que será lido pelo Sr. 1º Secretário em exercício, Senador .................

            É lido o seguinte

            OFÍCIO N.º 190, DE 2000.

 

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - Será feita a substituição solicitada.

            Sobre a mesa, ofício que será lido pelo Sr. 1º Secretário em exercício, Senador .................

            É lido o seguinte

            OFÍCIO N.º 123, DE 2000

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - A Presidência designa os Srs. Senadores Carlos Wilson e Paulo, indicados pela Liderança do PPS, como suplentes, para comporem as Comissões de Serviços de Infra-Estrutura e de Educação.

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - A Presidência recebeu da Comissão Parlamentar Conjunta do Mercosul relatórios sobre as seguintes matérias:

-     Projeto de Decreto Legislativo n.º 129, de 2000 (n.º 243/99, na Câmara dos Deputados), que aprova o texto da Emenda, por Troca de Notas, ao Acordo sobre Transporte Aéreos, de 4 de julho de 1947, celebrada entre a República Federativa do Brasil e a República do Chile, em Brasília, em 3 de dezembro de 1998; e

-     - Projeto de Decreto legislativo n.º 132, de 2000 (n.º 392/2000, na Câmara dos Deputados), que aprova o texto do Acordo de Cooperação Cultural entre o Governo da República Federativa do Brasil e o Governo da República da Bolívia, celebrado em La Paz, em 26 de julho de 1999.

            Os Projetos vão à Comissão de Relações Exteriores e Defesa nacional onde terão, nos termos do art. 376, III, do Regimento Interno, o prazo de cinco dias úteis para o recebimento de emendas, findo o qual a referida Comissão terá quinze dias úteis, prorrogáveis por igual período, para opinar sobre as proposições.

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - Sobre a mesa, requerimento que será lido pelo Sr. 1º Secretário em exercício, Senador Carlos Wilson.

            É lido o seguinte

            REQUERIMENTO N.º 589, de 2000

(Requerimento de tramitação em conjunto das Propostas de Emenda à Constituição nºs 44 e 45, de 2000. Senadores Jefferson Péres e Nabor Júnior.)

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - O requerimento será publicado e posteriormente incluído em Ordem do Dia, nos termos do art. 255, inciso II, alínea c, item 8, do Regimento Interno.

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - Os Senadores Lúcio Alcântara e Ademir Andrade enviaram discursos à Mesa para serem publicados na forma do disposto no art. 203 do Regimento Interno.

            S. Exªs serão atendidos.

 

            O SR. LÚCIO ALCÂNTARA (PSDB - CE) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, produto de iniciativa do Programa Conjunto das Nações Unidas para o HIV/Aids e da União Interparlamentar, acaba de ser divulgado, em nosso País, o Compêndio para Legisladores sobre HIV/Aids, Legislação e Direitos Humanos. Trata-se de obra valiosa e das mais oportunas, em face de vir a lume no instante mesmo em que o Governo Federal e a sociedade iniciam o debate mais intenso dos temas pertinentes à incidência da ameaçadora moléstia.

            Merecidamente elogiada, a publicação reporta-se à gestão pioneira de constituição de um grupo de parlamentares contra a Aids, efetivada na Inglaterra, no ano passado. A excelência dos resultados, desde então obtidos, estimulou a constituição de grupo similar no Brasil, utilizando-se o Compêndio como passo inicial em direção à soma e disseminação de informações e experiências de combate à doença, a começar das estruturas legislativas nacionais, estaduais e municipais.

            A obra ressalta, a propósito, que os parlamentares ocupam lugar estratégico para a garantia dos direitos humanos e do respeito devido a todo cidadão que vive com HIV/Aids, direta ou indiretamente. Assim, as representações populares, com visão ampla e criatividade, devem ser mobilizadas para assegurar que a legislação seja eficiente, no contexto de uma epidemia de tal proporção.

            A edição do Compêndio representa, ademais, notável contribuição do Brasil aos países africanos de língua portuguesa, numa cooperação técnica que já antecipa os primeiros bons resultados. Servirá, também, para aprofundar a reflexão e a discussão da Aids nas legislações de diferentes países, a partir da discussão do papel da família, da mídia, dos estabelecimentos educacionais, do Estado e da sociedade civil, em busca de conter a epidemia e melhorar a qualidade de vida dos infectados.

            Nada mais procedente e oportuno, como se vê. Desde que constatado o impacto da epidemia sobre o desenvolvimento econômico e a estabilidade social e política das nações, a Resolução emanada da 99ª Conferência da União Interparlamentar, realizada na Namíbia, apontou a importância de ações conjuntas das comunidades locais e das organizações internacionais, encarecendo que os parlamentares de todo o mundo assumissem o compromisso de contribuir para a realização concreta das medidas de combate à doença.

            Entre essas recomendações, relacionaram-se as de envolver a mais ampla gama de componentes sociais, como os portadores de HIV/Aids e as comunidades locais, no processo decisório e no da distribuição de informações e de adotar os sistemas educacional e de prevenção como componentes básicos da estratégia nacional de enfrentamento da doença.

            Igualmente, as de se estabelecer grupos parlamentares, independentemente dos partidos, para o debate contínuo e atividades de treinamento, com a finalidade de aprofundar a compreensão da pandemia e de promover o consenso acerca das políticas públicas que a devem enfrentar.

            Dever-se-á, também, assegurar o suprimento de sangue e de produtos sangüíneos seguros; manter cuidados universais de controle da infecção; estabelecer troca de agulhas e seringas; desenvolver vacina eficaz; e possibilitar o acesso de todos aos novos tratamentos.

            A par disso, a Resolução prescreve o exercício da solidariedade internacional, sobretudo para o suporte técnico-social necessário nos países em desenvolvimento, e explicita a necessidade de se colocar em prática as Diretrizes Internacionais para o HIV/Aids e os Direitos Humanos, especialmente as relacionadas à legislação de saúde pública; ao Direito Criminal e sistemas carcerários; à legislação antidiscriminatória; à privacidade, à confiabilidade e à ética, inclusive na condução de pesquisas; e aos padrões e mecanismos utilizados pelos setores público e privado na implementação dessas diretrizes.

            O Compêndio enfatiza que os parlamentares ocupam posição única para influenciar a opinião pública e liderar ações que conduzam a uma resposta nacional à epidemia. De fato, eles podem fazer avançar, em todos os níveis, a implementação de propostas relativas ao HIV/Aids.

            Como líderes políticos, influenciando a opinião pública e aumentando o conhecimento sobre a relevante questão; como legisladores, votando atos que garantam à legislação a efetividade da proteção dos direitos humanos; como representantes de interesses da sociedade, convocando o Governo, o setor público e o privado para a geração de um sentimento de co-responsabilidade; e, como mobilizadores de investimentos, destinando recursos financeiros para incrementar programas sobre HIV/Aids, consistentes com a proteção internacional dos direitos humanos.

            Podem, substancialmente, contribuir para a implementação das Diretrizes Internacionais, encorajando seus colegas em nível federal, estadual e municipal a atuar em favor da promulgação, aceitação e endosso da legislação relacionada ao tema da epidemia; planejando estratégia para difundir as diretrizes a atores-chave; desenvolvendo planos de ação para monitorar e implementar questões prioritárias; e participando, de forma ativa, do processo de formulação e implementação das leis pelos diferentes setores da sociedade.

            Deve-se ter em conta que, há dois anos, estimativas da Organização Mundial de Saúde (OMS) e da UNAIDS indicaram a existência, em todo o mundo, de um número superior a 33 milhões de infectados pelo HIV. Desses, 13,8 milhões, ou 43%, eram mulheres, e 1,2 milhão crianças. A maioria dessas pessoas, segundo as estatísticas, desconhecia que estava infectada e vivia com HIV/Aids em países em desenvolvimento, compreendendo 22,5 milhões na África; 6,7 milhões no sul e sudeste da Ásia; e 1,4 milhão na América Latina.

            Em 1998, segundo esses números, 2,5 milhões de pessoas morreram de Aids. Há duas décadas, com o início da epidemia, anotaram-se 17,3 milhões de pessoas infectadas, das quais 14 milhões já faleceram, em sua quase totalidade nos países em desenvolvimento.

            No ano objeto do estudo, registraram-se 6 milhões de novas vítimas do HIV, correspondendo à marca de 16 mil pessoas infectadas diariamente e a um aumento de 10% nos casos, em relação ao ano de 1997. Cerca da metade desses novos casos atingiram jovens de até 24 anos, permitindo projetar que um número superior a 40 milhões de pessoas poderá estar infectada pelo HIV, nos próximos anos.

            Daí reconhecer-se que, em muitos países em desenvolvimento, a elevação do número de casos de HIV/Aids é exponencial, e que os gastos globais em prevenção, pesquisa e tratamento do HIV/Aids refletem essa disparidade, pois os países em desenvolvimento contam com apenas 12% dos recursos, embora representem 95% dos casos.

            Conseqüência, certamente, de fatores socioeconômicos que contribuem para o aumento da disseminação do HIV/Aids, entre os quais alinham-se a pobreza, o analfabetismo, a desigualdade entre os sexos, a crescente mobilidade de populações dentro e entre países e a rápida urbanização determinada pelo processo de industrialização.

            Devemos registrar, finalmente, que a edição brasileira do Compêndio estabelece rumos objetivos para a atividade parlamentar, no contexto da Aids no Brasil. E que a descrição resumida das atividades de cada integrante do grupo temático do UNAIDS permite um panorama geral das atividades que o Sistema Nações Unidas, as agências internacionais e o Governo brasileiro vêm desenvolvendo no País.

            Como exemplo de iniciativa, sugerida pelo Compêndio e já em prática no Brasil, é apontada a consolidação de foros interburocráticos, como a agenda de compromisso do Grupo Matricial da Criança e do Adolescente; a legislação referente à notificação e segurança do sangue; a estruturação da Rede de Direitos Humanos e HIV/Aids; a cooperação técnica com organismos internacionais; as experiências de associação com a iniciativa privada; e o engajamento das Forças Armadas e da mídia no combate à epidemia.

            Portanto, o Grupo Temático do UNAIDS no Brasil e a Coordenação Nacional de DST/AIDS, ao viabilizarem a edição do Compêndio, estão certos de sua relevância tanto em relação às ações e pesquisas desenvolvidas na área, quanto no que se refere às garantias constitucionais de defesa dos direitos humanos e da educação preventiva.

            Para o Ministério da Saúde e o citado Grupo Temático, “o problema do HIV/Aids só será eficazmente equacionado na medida em que, pelo debate livre de idéias e avaliação de práticas, todos os atores sociais tenham a clara percepção de que são co-responsáveis na reversão dos efeitos perversos da epidemia.

            O exame atento do Compêndio leva-nos à conclusão de que se trata de documento de suma importância, dentre as orientações que vêm sendo divulgadas, em todo o mundo, como parte do Programa Conjunto da ONU de Combate à terrível doença.

            Por isso, também constitui obra de permanente consulta, sobretudo pelos que de alguma forma participam da luta contra o HIV/Aids, na procura, incansável, de instrumentos que reduzam, ao menos, o seu impacto devastador sobre a saúde do homem, e seus danosos reflexos nos campos econômico e social de todas as nações.

            Era o que tínhamos a dizer.

 

            O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr .Presidente, Srªs e Srs. Senadores, venho à tribuna do Senado Federal para tratar de uma questão crucial para qualquer Nação que pretenda ser grande: a educação dos nossos jovens. E faço essa reflexão na oportunidade em que saíram os resultados do principal teste de avaliação do sistema educacional brasileiro, o SAEB. E também, quando o MEC, neste mês de novembro, enviou o boletim individual com o seu resultado nas provas do ensino médio - Enem.

            O Enem teve 390.166 inscritos em todo o País. Do total de alunos, 90,3% compareceram aos 523 locais de provas distribuídos em 169 Municípios brasileiros. No momento, 147 universidades usam o exame do MEC para a seleção de candidatos na graduação, simultaneamente ao vestibular.

            O SAEB, que avalia o sistema de ensino brasileiro, revelou que a qualidade da educação oferecida para os nossos alunos de primeiro e segundo grau despencou em relação a 1997 e está pior do que em 1995.

            O SAEB é composto de seis provas de português e matemática, aplicadas em estudantes do ensino fundamental e médio. O teste foi aplicado em 380 mil alunos de 7 mil escolas de 2.145 Municípios. Os resultados revelados em relação ano de 1999 contrariam as previsões do MEC que considerava que já em 97 colheriam-se frutos da implantação do Fundef - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério.

            É inquestionável que a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (Fundef) representou um avanço para a educação obrigatória e fundamental brasileira. Os administradores municipais das localidades mais pobres, particularmente das regiões Norte e Nordeste, se viram diante de recursos mais significativos para aplicação no ensino fundamental. De início o Fundef possibilitou a criação de um número maior vagas, representando um maior acesso das crianças à escola, especialmente nos primeiros anos do ensino fundamental. Foi possível também reduzir sensivelmente as acentuadas disparidades de gastos por aluno entre as unidades federadas, principalmente no interior de cada Estado.

            Sobre os recursos do Fundef, é bom refletirmos um pouco mais, especialmente neste momento em que esta Casa está discutindo o Orçamento Geral da União para o ano de 2001. Segundo cálculos preliminares partindo da proposta de Orçamento enviada pelo Governo, a previsão do valor mínimo gasto por aluno neste ano deverá ser algo em torno de R$353,00.

            Ocorre que esse valor mínimo, segundo determina a Lei nº 9.424/96 que criou o Fundef, deveria ser calculado tomando por base a média nacional da arrecadação pelos Estados e Municípios, dividido pelo número de alunos. Portanto, seguindo o critério que determina a Lei, segundo informa o Consed (Conselhos de Secretários Estaduais de Educação), o valor mínimo estabelecido para o próximo ano deveria ser R$541,00 da 2ª a 4ª série e R$568,93 da 5ª a 8ª série. Podemos concluir então que o próprio Governo não vem cumprindo a Lei. E os motivos desse não cumprimento tem uma lógica: economizar, reduzir a contrapartida federal. Pela Lei, o Estado ou Município que não arrecadar o suficiente para investir esse mínimo terá o direito de receber a complementação do Governo Federal. Logicamente, mantendo o valor mínimo em patamares mais baixos a complementação irá ocorrer em valores menores e em menos Estados.

            Com essa atitude, o próprio Governo Federal compromete esse que deveria ser um grande instrumento de política social e de redução das desigualdades. Certamente isso explica, em parte, a queda da qualidade do ensino verificada na avaliação do sistema educacional brasileiro - SEAB.

            Além do estabelecimento do valor mínimo a ser gasto anualmente por aluno, outros problemas têm sido verificados ao longo desses quatro anos de funcionamento do Fundef. Um deles está relacionado com o cumprimento de algumas obrigações dos Estados e Municípios no que se refere ao controle do funcionamento do programa e com o gasto correto dos recursos. Vários Prefeitos em todo País estão respondendo a processos judiciais por mau uso dos recursos do Fundef. Em muitos Municípios não foram criados os Conselhos de Controle e Avaliação e nem foi estabelecido o plano de carreira, conforme prevê a Lei, só para citar alguns dos muitos problemas que, na prática, ocorrem na aplicação do Fundef.

            Para corrigir essas e outras distorções da Lei que criou o Fundef, apresentei no início deste ano um Projeto de Lei que tramita nesta Casa sob o n° 67/200, com o qual procuro corrigir os desvios resultantes de falhas na legislação.

            Portanto, Srªs. e Srs. Senadores, em que pese à consciência que hoje se tem sobre a importância da educação para o futuro da Nação e para promover justiça social - e neste momento enfatizo a educação básica - são necessários grandes investimentos. A atitude do Governo de estabelecer um mínimo com gastos por aluno abaixo da média nacional compromete a qualidade do ensino oferecido. Não basta ampliar o acesso à educação para as camadas mais pobres da população, é preciso garantir o direito à educação mas com qualidade.

            A queda da qualidade da educação registrada na recente avaliação do sistema educacional brasileiro é, na verdade, mais uma conseqüência da política do Governo Federal de sangrar o orçamento público, comprometendo a manutenção e os investimentos necessários, em detrimento de pagamento fiel dos escorchantes juros da dívida externa, como parte de compromissos assumidos junto ao Fundo Monetário Internacional.

            Era o que tinha a dizer.

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - Nada mais havendo a tratar, a Presidência vai encerrar os trabalhos, lembrando às Srªs e aos Srs. Senadores que constará da sessão deliberativa ordinária de amanhã, a realizar-se às 14 horas e 30 minutos, a seguinte:

            ORDEM DO DIA

 

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Hartung) - Está encerrada a sessão.

            (Levanta-se a sessão às 18 horas e 48 minutos.)


            20001127ND.doc5/17/242:31



Este texto não substitui o publicado no DSF de 28/11/2000 - Página 23182