Discurso durante a 161ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a possibilidade de importação de álcool combustível, em virtude da iminência da perda de 20% da safra 2000/2001 de cana-de-açúcar na região centro-sul.

Autor
Carlos Wilson (PPS - CIDADANIA/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • Preocupação com a possibilidade de importação de álcool combustível, em virtude da iminência da perda de 20% da safra 2000/2001 de cana-de-açúcar na região centro-sul.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2000 - Página 233116
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • APREENSÃO, ORADOR, DIVULGAÇÃO, NOTICIARIO, VONTADE, GOVERNO, IMPORTAÇÃO, ALCOOL ANIDRO CARBURANTE, MOTIVO, POSSIBILIDADE, PERDA, PERCENTAGEM, SAFRA, CANA DE AÇUCAR, REGIÃO CENTRO SUL.
  • COMENTARIO, SUFICIENCIA, ESTOQUE, ALCOOL, PAIS, ATENDIMENTO, NECESSIDADE, ATUALIDADE, DESNECESSIDADE, GASTOS PUBLICOS, IMPORTAÇÃO, PREJUIZO, POLITICA, AJUSTE FISCAL, AGRAVAÇÃO, DEFICIT, BALANÇA COMERCIAL, BRASIL.
  • RECOMENDAÇÃO, IMPORTANCIA, INTERVENÇÃO, GOVERNO FEDERAL, SETOR, ABSORÇÃO, EXCEDENTE, ALCOOL, REGIÃO NORDESTE, DEFESA, ATENDIMENTO, REIVINDICAÇÃO, PRODUTOR, VIABILIDADE, RACIONALIZAÇÃO DE COMBUSTIVEL, GARANTIA, ABASTECIMENTO, PAIS.

O SR. CARLOS WILSON (PPS - PE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, tenho verificado, recentemente, com grande surpresa e preocupação, a veiculação de notícias sobre uma possível intenção do Governo Federal em importar álcool combustível, a pretexto de fazer face a uma propalada e discutível escassez do produto nativo, por conta de uma expectativa de quebra de cerca de 20% na produção de cana da safra 2000/2001 da região centro-sul, atingida por estiagem nos últimos anos.

Trata-se de medida que, se confirmada, traria grandes prejuízos à Nação, não só quanto à política macroeconômica de ajuste fiscal, com incidência negativa na já deficitária balança comercial brasileira, mas, sobretudo, seria injustificável do próprio ponto de vista invocado para a sua adoção, ou seja, o de uma maior racionalidade no abastecimento do produto em nível nacional.

Isso porque o setor sucroalcooleiro brasileiro tem a seu favor uma notável vantagem econômica relativa, proporcionada pela natureza, e que consiste na sazonalidade complementar de sua produção, considerada em âmbito nacional, uma vez que a safra do centro-sul ocorre, anualmente, de abril a novembro e a do Nordeste, de setembro a março.

Ora, no momento, graças ao excelente desempenho da última safra de 1999/2000, os produtores nordestinos estimam um excedente de produção de 250 a 300 milhões de litros de álcool, disponíveis e suficientes para suprir eventuais problemas de abastecimento no centro-sul do País, com menores custos para o Tesouro Nacional e sem o desperdício de divisas advindo de uma importação apressada e sem critério.

Não faz sentido, então, que um país com dificuldades notórias em sua balança comercial compre em dólares um produto nativo cujo estoque disponível é, hoje, mais que suficiente para cobrir todas as suas necessidades atuais, dando-se, ainda por cima, ao luxo de desprezar, assim, até mesmo o dom gratuito de uma vocação natural: a da sua sazonalidade inter-regional complementar.

Além disso, nem sequer um adequado e preciso dimensionamento da safra do Centro-Sul deste ano e da oferta real do produto pode dar-se por concluído, exigindo, ainda, por parte do Governo Federal um monitoramento mais atento da questão, ou seja, impõe-se um diagnóstico mais acurado do problema antes de qualquer açodamento em sua solução.

Seria, assim, de todo recomendável a intervenção do Governo Federal no setor, absorvendo os excedentes de álcool do Nordeste e evitando-se gastos desnecessários com sua importação, retomando, aliás, dessa maneira, uma política já realizada com êxito no passado, isto é, uma logística de transferência do álcool por cabotagem para a região centro-sul.

Tal transferência poderia processar-se de modo transparente, sem risco de movimentos especulativos por parte dos produtores de ambas as regiões, por meio de leilões públicos conduzidos pelo Governo Federal ou pela compra direta da produção centralizada pela Petrobras.

Com isso, além de racionalizar a oferta nacional do produto, sem afetar as contas externas do País, o Governo Federal estaria, simplesmente, prestando obediência, a um só tempo, a três princípios constitucionais, reitores da nossa ordem econômica e inscritos no art. 170, incisos V, VII e VIII da Carta Magna, quais sejam, os que preceituam, respectivamente, a defesa do consumidor, a redução das desigualdades regionais e sociais e a busca do pleno emprego, já que o setor sucroalcooleiro responde por cerca de um milhão de empregos diretos e indiretos.

Além disso, trata-se de um setor bastante eficiente e competitivo em termos internacionais, ocupando, respectivamente, o centro-sul e o Nordeste, a primeira e segunda posições entre os menores custos de produção de todos os 108 países produtores de açúcar e de álcool.

Por outro lado, do ponto de vista financeiro, deve-se ter presente a urgência da intervenção governamental no sentido ora sugerido, dado que, da safra nordestina de cana, ainda restam 70% à espera de moagem, e, mantidos os baixos preços atuais do álcool no mercado nordestino e, principalmente, se confirmados os rumores de importação do produto, são grandes as possibilidades de que o mix de produção das unidades nordestinas seja direcionado fortemente para o açúcar, cujos preços externos dão sinais de reação, coisa que, isso sim, poderia comprometer a oferta de álcool no mercado interno.

De todo modo, pessoalmente, acredito na sensibilidade política e social das autoridades do Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool, que conta com a participação de homens públicos de longa intimidade com os problemas do setor, como os Ministros do Desenvolvimento, Alcides Tápias; da Agricultura, Pratini de Moraes; e Rodolfo Tourinho, das Minas e Energia.

A recente aprovação do Projeto Frota Verde para ampliar a atual frota de veículos a álcool rodando no País, o aumento no percentual de adição do álcool anidro à gasolina para 24% e os estudos em andamento para a adição de 3% de álcool anidro nos veículos a diesel demonstram a sintonia dessas autoridades para a importância estratégica da sobrevivência do programa do álcool, seja do ponto de vista econômico e ambiental, dada a natureza menos poluente do álcool combustível em relação à gasolina, seja pelo lado social, evitando-se um desemprego em massa a que a desativação progressiva ou a ineficiência do setor alcooleiro certamente conduziriam.

Outro indicador seguro da primazia até agora concedida pelo Governo Federal à matéria - é bom que diga, já que não me inspira qualquer espírito de oposição sistemática ao abordar o assunto -, é a inserção do Ministro das Relações Exteriores no Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool, sinalizando, com isso, a disposição política de contextualizar a questão do álcool na perspectiva da globalização e da luta pela viabilização desse produto como combustível do próximo milênio, na qualidade de matriz energética não poluente, auto-sustentável e capaz de romper a dependência interna dos combustíveis fósseis não renováveis.

Nem tudo são acertos, porém, quanto ao tratamento oficial da matéria: com a desregulamentação do setor, culminando com a liberação do preço do álcool hidratado, no ano passado, concomitante à exclusão do combustível da jurisdição da Agência Nacional do Petróleo, ficou uma espécie de vácuo regulatório no setor.

Assim, a futura criação de uma agência reguladora parece inevitável em relação ao setor, para servir de moderno instrumento de gestão, zelando pelos interesses do consumidor, impondo padrões de qualidade na produção e, simultaneamente, sendo capaz de formular regras e metas claras para o mercado, propiciando um quadro de estabilidade normativa absolutamente essencial para os investidores externos numa economia global.

De todo modo, tendo em vista a postura em geral equilibrada e flexível das autoridades afetas ao assunto, fica aqui, então, a recomendação, de caráter emergencial, de intervenção racionalizadora do Conselho Interministerial do Açúcar e do Álcool na aquisição dos excedentes nordestinos do combustível, recomendação que, acredito, possa atender não só aos justos reclamos dos produtores nordestinos de álcool, confrontados nos últimos anos com preços deprimidos do produto, mas também e sobretudo, às necessidades de abastecimento do País como um todo, beneficiado, afinal, pela adoção de uma política de transferência inter-regional do álcool capaz de nos poupar, além do mais, preciosas divisas.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2000 - Página 233116