Discurso durante a 161ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Solicitação de apoio à Proposta de Emenda Constitucional 44, de 2000, tendo S.Exa. como primeiro signatário, que prevê a desincompatibilização, seis meses antes do pleito eleitoral, dos chefes do Poder Executivo que quiserem concorrer à reeleição.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Solicitação de apoio à Proposta de Emenda Constitucional 44, de 2000, tendo S.Exa. como primeiro signatário, que prevê a desincompatibilização, seis meses antes do pleito eleitoral, dos chefes do Poder Executivo que quiserem concorrer à reeleição.
Aparteantes
Carlos Wilson, Heloísa Helena.
Publicação
Publicação no DSF de 25/11/2000 - Página 23118
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, PROPOSIÇÃO, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL, FIXAÇÃO, OBRIGATORIEDADE, CHEFE, EXECUTIVO, CONCORRENCIA, CARGO PUBLICO, REELEIÇÃO, CUMPRIMENTO, PRAZO, DESINCOMPATIBILIZAÇÃO, ANTERIORIDADE, ELEIÇÕES.
  • SOLICITAÇÃO, APOIO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, RESTABELECIMENTO, JUSTIÇA, DISPUTA, CARGO PUBLICO, EXECUTIVO, APERFEIÇOAMENTO, LEGISLAÇÃO ELEITORAL.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no início desta semana apresentei à Mesa do Senado, para que tenha tramitação nas duas Casas do Congresso Nacional, a Proposta de Emenda Constitucional nº 44, de 2000, que altera o § 6º do art. 14 da Constituição Federal, determinando que, para concorrer a quaisquer cargos eletivos, o Presidente da República, os governadores dos estados, o governador do Distrito Federal e os prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.

Como justificativa dessa propositura, alinhei os seguintes argumentos:

“A proposta que ora apresentamos tem o objetivo de contribuir para o aprimoramento de nosso ordenamento jurídico relativo ao sistema eleitoral, dotando o instituto máximo da democracia de maior lisura e transparência.

            Assim, a desincompatibilização dos chefes do Poder Executivo que quiserem concorrer aos mesmos cargos, pela presente iniciativa, torna-se obrigatória na mesma medida em que o é para os outros cargos eletivos. Não vislumbramos razões que possam justificar a não exigência de desincompatibilização para a disputa dos postos de chefia do Poder Executivo no caso de reeleição, porque essa interpretação equivocada afronta o princípio da isonomia, erigido na Constituição com a condição de causa pétrea, princípio que deve prevalecer em todos os terrenos da atuação humana. No caso dos certames eleitorais, fere o conceito de isonomia a não exigência de desincompatibilização no caso em questão, pois privilegia o candidato que já se encontra no posto pleiteado, na medida em que facilita a este o uso da máquina administrativa em favor de sua candidatura, em detrimento de outros postulantes que, já de início, enfrentam a campanha com menor vantagem do que a do governante candidato.

Tais privilégios comprometem a legitimidade de que se deve revestir o processo eleitoral, contrapondo-se, ainda, ao enunciado contido no art. 37 da Lei Maior, segundo o qual “a administração pública direta, indireta e fundacional, em qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, obedecerá o princípio da legalidade, impessoalidade, moralidade e publicidade (...)”.

Na verdade, tendo em vista o caráter teleológico imantado em todo e qualquer dispositivo legal, cremos que o § 6º do art. 14 da Constituição já proíbe a candidatura à reeleição sem desincompatibilização. Se a intenção do legislador constituinte, ao prever a renúncia, foi evitar a corrupção no processo eleitoral e situações de privilégios por parte daqueles que postulam cargos eletivos, não há por que interpretar o § 6º do art. 14, distinguindo hipóteses que, a rigor, resultam na mesma situação. A lei, tendo acima de tudo o seu contexto, exige que o princípio geral, no caso o da desincompatibilização, seja conciliado com os casos especiais, de maneira a não distinguir onde a lei não distingue, pois “deve a legislação de um Estado ser considerada como um todo organizado, exeqüível, útil, ligado por uma correlação natural “ (Carlos Maximiliano, in “Hermenêutica e Aplicação do Direito”, pág. 174.)

Entretanto, para evitar divergências de interpretação ao citado dispositivo magno, já que há juristas que entendem diferentemente, vislumbrando a possibilidade de candidatura à reeleição sem o afastamento do cargo, resolvemos ingressar com a presente emenda para evitar sofismas a nosso ver equivocados no tocante ao assunto.

Cremos que o instituto da reeleição, por si só, já beneficia a candidatura dos aspirantes aos mesmos cargos, cujos nomes já se encontram em evidência perante o eleitorado. Não exigido o afastamento, o privilégio se manifesta de maneira a afrontar veementemente o maior princípio do Estado de Direito - o princípio da igualdade -, prejudicando, assim, a transparência que deve nortear o exercício da soberania popular.

Por todas as razões supracitadas, esperamos dos nossos ilustres Pares a aprovação da presente proposta”.

O Sr. Carlos Wilson (PPS - PE) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador Nabor Júnior?

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Com muito prazer, Senador Carlos Wilson.

O SR. CARLOS WILSON (PPS - PE) - Antes de tudo, quero louvar a iniciativa de V. Exª quando apresenta o presente projeto, obrigando os atuais ocupantes de cargos a se desincompatibilizarem. Hoje, o processo de reeleição neste País é um processo que dá margem a muitos questionamentos. Veja V. Exª que, há pouco mais de 20 ou 30 dias, tivemos aqui uma romaria de prefeitos pedindo o adiamento da aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal, o que é uma demonstração de preocupação quanto ao mal uso da máquina que foi feito por alguns dos atuais prefeitos. A reeleição é o que pode existir de mais desigual num País como o nosso. Ficou provado que, na reeleição, a máquina administrativa é usada de forma descarada. A reeleição de Presidente da República ficou marcada, ficou manchada quando, logo após a reeleição ter sido aprovada no Congresso Nacional, levantou-se a suspeita de terem sido comprados votos de alguns parlamentares, aqui no Congresso Nacional. A reeleição deveria ser banida, mas, já que não se consegue acabar com ela, a desincompatibilização de seis meses do cargo já é um passo. Então, essa iniciativa de V. Exª é uma iniciativa semimoralizadora, porque o ideal seria que não existisse reeleição neste País. Então, essa iniciativa de V. Exª é uma iniciativa semimoralizadora, porque o ideal seria que não existisse reeleição neste País. Também ficou provado, agora nas eleições para prefeitos e nas eleições para governadores, o quanto a máquina foi usada, e de forma despudorada, por alguns. Por isso é que sou solidário, assinei o projeto de V. Exª e fico aqui na expectativa de que o Congresso Nacional venha a colocar novamente a desincompatibilização como um pré-requisito para poder se disputar a reeleição neste País. Muito obrigado a V. Exª.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Senador Carlos Wilson, não só agradeço o oportuno aparte de V. Exª - que corrobora os pontos de vista por mim expedidos, na defesa da proposta que acabei de encaminhar ao Congresso Nacional - como também o apoiamento a ela dado por V. Exª, junto a mais de trintas outros Srs. Senadores, atendendo-se, destarte, às exigências do nosso Regimento Interno e da própria Constituição Federal.

E V. Exª tem razão, quando diz que o ideal seria realmente acabar com o instituto da reeleição. Confesso que votei a favor da implantação dessa regra, em nosso País. Inclusive, durante o período da Assembléia Revisora da nossa Constituição, em 1993, cheguei a apresentar emenda propondo a reeleição, pois a mesma Assembléia havia reduzido o mandato do Presidente da República de cinco para quatro anos, e eu entendia que o prazo de quatro anos era exíguo e não permitiria o desenvolvimento de planos de trabalho por parte do Presidente da República, dos governadores e prefeitos. Mas minha proposta, semelhante às de outros parlamentares, previa a obrigatoriedade da renúncia ao cargo, para quem quisesse disputar reeleição, seis meses antes do pleito.

Mas, como o Relator, Deputado Nelson Jobim, não aceitou a tese da desincompatibilização dos candidatos à reeleição, todas as propostas nesse sentido foram rejeitadas por aquela Assembléia, embora por uma pequena margem, que não passou de três ou quatro votos. Posteriormente foi apresentado projeto propiciatório de reeleições, parece-me, por um Deputado de Pernambuco, o Sr. Deputado Mendonça Filho, que foi aprovado e deu margem àqueles comentários de que teria havido influência do poder econômico, de que Deputados teriam vendido seus votos para que a proposta fosse aprovada, etc.

Digo a V. Exª que votei de maneira livre e espontânea pela reeleição. Mas hoje sou favorável à aprovação de algumas das emendas que estão tramitando no Congresso Nacional, no Senado e na Câmara dos Deputados, para acabar com isso. Verificamos que nas eleições de 1998, quase todos os então governadores concorreram à reeleição e, em sua esmagadora maioria - 21 - foram reeleitos. E, no pleito de outubro último, dos 21 prefeitos de capitais que concorreram à reeleição, 16 foram reeleitos. Veja V. Exª o peso da máquina administrativa nessas eleições; veja como isso funcionou!

Mas o art. 5º da Constituição determina que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Depois, ainda elenca uma série de garantias individuais - e o Senador Bernardo Cabral, que está presente e foi o Relator da Carta vigente, sabe muito bem que aquele artigo e seus diversos parágrafos e alíneas têm o objetivo de assegurar a igualdade de condições para todos brasileiros.

Assim, se um governador, um prefeito ou o próprio Presidente da República vai concorrer à reeleição, estando no exercício do cargo, leva uma vantagem sobre qualquer oponente, em virtude do uso da máquina, da facilidade de angariar contribuições para custear a campanha eleitoral.

Essas, sem dúvida alguma, são vantagens em favor dos candidatos que estão no exercício do cargo, em detrimento daqueles que não estão.

Já que é difícil aprovarmos a supressão do instituto da reeleição, vamos pelo menos restabelecer a obrigatoriedade da desincompatibilização ou renúncia do cargo seis meses antes da eleição.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Com muito prazer concedo o aparte à nobre Senadora Heloísa Helena.

A Srª Heloísa Helena (Bloco/PT - AL) - Senador Nabor Júnior, é evidente que o tema que V. Exª traz à Casa é de fundamental importância. Infelizmente, ao longo dos anos, nós, do Congresso Nacional, temos tido a postura errada de discutir a reforma política conforme alguns penduricalhos que servem ou não em determinados momentos. Ora se discute o financiamento de campanhas, ora não se discute; ora se discute quem deve aparecer na televisão, ora não se discute; ora se discute a questão do horário eleitoral, ora não se discute. Ou seja, discute-se esse ou aquele assunto conforme as conveniências majoritárias do Congresso Nacional. Infelizmente, isso aconteceu também com a questão da reeleição. É lógico que o debate é muito amplo, mas não poderia deixar de saudar V. Exª pela proposta que apresenta. Da mesma forma que o Senador Carlos Wilson, também quero votar contra a reeleição. Sei que não é apenas o processo de reeleição que gera corrupção na máquina administrativa. A própria História mostra isso. Todos sabemos que o processo de reeleição, no Congresso Nacional, foi aprovado de forma vergonhosa, com tráfico de influência, com negócios indecorosos, como foi denunciado publicamente, inclusive com provas. Mas também existem outros mecanismos de instalar a corrupção na máquina administrativa. E ela já se instalou ao longo da História, mesmo sem a reeleição. Mas sou contrária ao processo de reeleição por dois motivos: primeiro, porque é no mínimo ridículo que um Secretário de Estado ou qualquer pessoa que esteja ocupando um determinado cargo administrativo não possa se candidatar a nada enquanto estiver no exercício do cargo, porque supostamente se utilizaria dele para fins eleitorais; que o filho ou um parente em primeiro grau de um prefeito não possa se candidatar a nenhum cargo enquanto seu parente estiver como prefeito, supostamente para evitar a utilização da máquina eleitoral em benefício do parente; e, no entanto, a legislação permite que o prefeito possa, que o governador possa, que o Presidente possa. Ora, se uma segunda ou terceira pessoas não podem ser candidatos para que o Chefe do Executivo não use a máquina a serviço de um outro, como efetivamente poderia ele ficar na máquina e utilizá-la em proveito próprio? Além de a reeleição se constituir em um processo de corrupção gravíssimo no País, há também um segundo motivo: há uma visão, do ponto de vista administrativo, pautada em um conceito personalista, que é o discurso da continuidade administrativa, como se os mecanismos da administração pública só pudessem ter continuidade se girassem em torno de uma única pessoa. Esse é um conceito elitista, personalista, que não se coaduna com os conceitos da administração pública e os mecanismos que já foram inclusive conquistados na legislação vigente, para possibilitar uma maior participação da sociedade em questões importantes, com papel deliberativo, paritário, como é o caso, por exemplo, dos conselhos municipais e estaduais da saúde, educação, assistência social, segurança pública. Portanto, elementos administrativos que já possibilitam que a sociedade, participando, possa dar continuidade administrativa, o que é certo. Nesse sentido, a idéia de que a continuidade administrativa deve estar centrada em uma única pessoa é deplorável do ponto de vista administrativo, porque é absolutamente personalista e não se coaduna com os conceitos mais avançados da administração pública. Portanto, sou absolutamente contrária ao processo de reeleição. Como, infelizmente, o fim da reeleição não está sendo votado ainda - o que estiver sendo votado primeiramente nesta Casa terá o meu voto -, o mínimo que se pode conceder é o projeto que V. Exª apresenta: a desincompatibilização. Ora, a desincompatibilização possibilitará que o Chefe do Executivo possa se apresentar à opinião pública como qualquer outro candidato. Pode até haver um risco - é evidente que não se superam todos os riscos -, pois podem ser feitos alguns acordos com o Vice-Presidente ou com os administradores na Assembléia Legislativa, para que seja utilizada a máquina administrativa. No entanto, entendo que somente poderemos superar essa situação estabelecendo mecanismos de controle, instâncias de decisão, instâncias de poder na administração pública, para que a sociedade possa controlá-la. Sei que somente dessa forma é que se aperfeiçoa a democracia, embora não vivamos em uma democracia, porque o ato de votarmos e sermos votados, por si só, não faz democrática uma sociedade. Há de haver, para isso, justiça social. Enquanto não a conquistamos, pelo menos, devemos assegurar alguns mecanismos ágeis, concretos e eficazes para minimizar os efeitos da utilização da máquina administrativa no processo de eleição. Portanto, sou contra a reeleição. Infelizmente, como a estrutura do nosso País não possibilitou ainda a criação de mecanismos ágeis, concretos e eficazes de controle social para impedir, ou ao menos minimizar, os efeitos da utilização corrupta dos recursos públicos, que pelo menos a desincompatibilização ocorra para que a população, de alguma forma, possa controlar esses efeitos. Portanto, votarei favoravelmente à proposta de emenda de V. Exª.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Agradeço a V. Exª, Senadora Heloísa Helena, que expendeu realmente argumentos irrefutáveis.

E eu diria mais: quando Governador, no período de 1983 a princípios de 1987, para concorrer ao Senado, Senador Carlos Wilson, tive que renunciar seis meses antes. Parece-me que V. Exª também exercia o cargo de Governador de Pernambuco e, na época, teve que se afastar.

O Sr. Carlos Wilson (PPS - PE) - Assumi o cargo no lugar do Governador Miguel Arraes seis meses antes da eleição.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Muito bem. O Governador, para concorrer a outro cargo - de Senador, Deputado Estadual ou Federal -, está obrigado a renunciar, nos termos do parágrafo 6º, cuja modificação ora proponho, e que hoje diz o seguinte:

            “Para concorrer a outros cargos, o Presidente da República, os governadores de Estado, do Distrito Federal e os prefeitos devem renunciar aos respectivos mandatos até seis meses antes do pleito.”

Portanto, para concorrer a qualquer outro cargo, o titular de funções no Executivo tem que renunciar; mas, para disputar a própria reeleição, não é preciso. Há incoerência nisso!

A modificação que estou propondo é exatamente esta: para concorrer a quaisquer cargos, inclusive à reeleição, deve ser forçoso renunciar, seis meses antes. Assim, a competição será em igualdade de condições com aqueles que não estão no exercício do cargo.

Creio, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que essa proposta de emenda constitucional, que estou submetendo à apreciação do Congresso Nacional, é da maior oportunidade. E espero contar com o apoio dos ilustres Pares para a sua aprovação antes do prazo fatal, que é o final do mês de setembro do próximo ano, porque toda legislação eleitoral tem que ser aprovada um ano antes da eleição.

Espero que o Congresso Nacional seja sensível, como é de sua tradição, para a necessidade e a urgência dessa mudança na legislação eleitoral, que restabelecerá elementares princípios de justiça e equidade na disputa de cargos do Poder Executivo.

Muito obrigado a V. Exª, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 25/11/2000 - Página 23118