Discurso durante a 166ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Considerações sobre a decisão judicial que manteve a proibição de participação de crianças na novela Laços de Família, da Rede Globo.

Autor
Bello Parga (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Luís Carlos Bello Parga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
Outros:
  • Considerações sobre a decisão judicial que manteve a proibição de participação de crianças na novela Laços de Família, da Rede Globo.
Publicação
Publicação no DSF de 02/12/2000 - Página 24120
Assunto
Outros
Indexação
  • ELOGIO, INICIATIVA, ANTONIO DE PADUA RIBEIRO, MINISTRO, SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA (STJ), MANUTENÇÃO, DECISÃO JUDICIAL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), PROIBIÇÃO, PARTICIPAÇÃO, CRIANÇA, PROGRAMA, EMISSORA, TELEVISÃO, MOTIVO, OFENSA, COSTUMES, FAMILIA, PAIS.
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DO BRASIL, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), AUTORIA, ALBERTO DINES, JORNALISTA, IMPORTANCIA, VALORIZAÇÃO, COSTUMES, FAMILIA, PAIS.

  SENADO FEDERAL SF -

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            O SR. BELLO PARGA (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aproveito esta manhã para trazer a esta Casa e à Nação a repercussão de um assunto que vem mobilizando a opinião pública e que não tem recebido do Congresso Nacional a importância e a atenção que deveria merecer, porque se trata de um assunto que fere profundamente os valores da sociedade brasileira.

            A TV Globo está exibindo uma novela intitulada “Laços de Família”, em que tem mostrado situações e ocorrências que não são, de modo nenhum, aceitas pelo grosso da sociedade. Tanto isso é verdade que houve uma sentença judicial de Primeira Instância, de um juiz da Vara de Família do Rio de Janeiro, que proibiu a exibição da novela em determinado horário, por ser incompatível com a presença de menores nas residências, e também o trabalho de menores na própria novela.

            A Rede Globo procurou defender judicialmente o que chama de seus direitos. Mobilizou um poderoso lobby contra a decisão judicial, sob a alegação de que isso seria o renascimento ou a ressurreição da censura. Tentou apresentar essa decisão judicial como uma das cabeças da Hidra de Lerna da censura.

            A matéria subiu ao Superior Tribunal de Justiça e, anteontem, um Ministro daquela colenda Corte, Dr. Antônio de Pádua Ribeiro, manteve a proibição à participação de menores no elenco da novela.

            O Ministro Pádua Ribeiro, que, a meu ver, merece os encômios da sociedade e da Nação, negou o pedido da emissora de concessão de liminar, que suspenderia a decisão do Tribunal de Justiça do Rio, proibindo a exibição de cenas com menores de idade.

            Em seu lapidar aresto, o Ministro Pádua Ribeiro “considerou que a exibição de cenas com a presença de crianças implicaria risco de danos à sociedade, como ‘acentuada dissolução dos costumes e dos laços familiares e sociais”.

            O meritíssimo Presidente do STJ considerou os argumentos emocionais e sem embasamento jurídico, apresentados pelos advogados da Rede Globo.

Em um despacho de 27 páginas, ele afirmou que a liberdade de imprensa e de criação artística não poderiam ser consideradas um valor absoluto. Segundo o ministro, esse direito à liberdade está no mesmo plano de outros constitucionalmente assegurados, como a difusão de programas educativos, artísticos, culturais e informativos e o respeito a valores éticos e sociais da pessoa e da família.

            Afirmou aquele Juiz, aquele Ministro da alta Corte brasileira no despacho que “eventuais restrições à liberdade de imprensa e de criação artística não podem ser confundidas com censura, por nada terem de autoritário ou arbitrário e respeitarem o direito alheio”.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores, os argumentos expendidos por aquele Ministro do STJ repercutem também a opinião de um ilustre brasileiro, o Jornalista Alberto Dines, que, em sua coluna no Jornal do Brasil, do dia 25 de novembro, abordou o assunto de maneira magistral, completa e de modo a ser entendido pela maioria da população brasileira, refletindo o espírito da família brasileira, que não pode se coadunar com a maneira como essa novela vem-se apresentando, mostrando normais situações de anormalidade social, humana e de costumes.

            Aproveito a oportunidade para ler o texto da coluna daquele jornalista, que reflete, a meu ver, a opinião da maioria do povo brasileiro, da grande massa da sociedade brasileira

            O título da coluna é Eppure se Muove. É uma expressão em Língua Italiana, atribuída ao cientista Galileu, quando a inquisição o proibiu de prosseguir em seus estudos sobre a tese coperniciana.

            Diz o texto do Jornalista Alberto Dines:

Saído da hibernação, estalando de vitalidade, o Ministro da Cultura, Francisco Weffort, invadiu a seara da Educação para manifestar-se sobre a qualidade do ensino no País. Para ele, a questão resolve-se com a reintrodução do latim como disciplina obrigatória, assim como o grego, o espanhol e o francês.

Como o colega invadido é o Ministro Paulo Renato (que não comprou um Porsche e, ao contrário do Ministro Tápias, não está abespinhado com a onda provocada pelo capricho consumista), não se criará uma crise nacional nem se convocará o Presidente da República para afagar os possantes egos.

De minha parte, antigo admirador de Weffort desde os tempos do seu admirável Populismo na Política Brasileira (Paz e Terra, 1978), anuncio minha total adesão à proposta. Recorri ao inesgotável Não Perca o seu Latim, de Paulo Ronai, à procura de um mote para aderir ao revival do classicismo. Como Virgílio, Horácio, Sêneca ou Catilina não cogitaram dessa hipótese, escolhi uma flor do Lácio mais recente, a italiana, e com ela cheguei ao famoso Eppure se muove (No entanto, ela se move).

            Refere-se à declaração sotto voce, que Galileu fazia enquanto ouvia as recomendações da inquisição romana.

            Prossigo lendo o artigo:

Não há comprovação de que o matemático-astrônomo Galileu Galilei (1564-1642) o tenha pronunciado em qualquer tom, sotto voce ou aos berros, como desafio aos censores e inquisidores, depois de abjurar das teses de Copernico sobre o movimento da Terra. Mas a frase tornou-se emblema universal da coragem moral, apego às convicções. É a proclamação da irreversibilidade da ação, palavra ou gesto. Tudo tende ao movimento.

Há 15 dias estamos acompanhando a formidável orquestração executada pelo Cartel da Mídia para abafar um dos mais saudáveis movimentos de autodeterminação da sociedade brasileira. Humilhados pelos degradantes padrões morais emitidos por uma concessão pública - a televisão -, pais, mães , avós, educadores, psiquiatras e jornalistas deixaram de lado a passividade, saíram do anonimato, acionaram ONGs, mobilizaram o Ministério Público, que acionou a Justiça, e num encadeamento de vontades sem precedentes nesta Era da Desinformação impuseram limites àqueles que se arrogam o direito divino de formar nossas consciências e nossos valores.

Como reação, tentou-se ressuscitar o velho número intitulado “luta contra a censura” no grande circo da empulhação mediática. Não colou: onde existe justiça plena inexiste censura. O direito de apelar liquida qualquer arbítrio. Goebbels morreu pela segunda vez, e agora definitivamente, porque a falácia, mesmo reiterada e magnificada, não resiste à aliança do bom senso com o bem público.

E quando parecia que algo moveu-se nesse imenso mar de sargaços, o que faz o excelentíssimo Senhor Presidente da República? Vai pessoalmente à casa do Big Brother para colocar um band-aid na primeira grande cacetada que levou da opinião pública. Compreende-se que atores e altos executivos da Rede Globo peçam uma audiência ao Chefe da Nação, em Palácio, para explicar suas motivações e interesses. Mas que o Presidente vá ao bunker dos derrotados pela sociedade para afagá-los é afronta. É tomar partido contra a sociedade. É fingir que nada aconteceu, que Galileu não existiu e a Terra não se moveu.

Se o Cartel responsabiliza o Governo pela tentativa de “censura”, se o Ministro da Justiça, José Gregori (que, há anos, vem batalhando para ampliar o conceito de direitos humanos, neles incluída a proteção contra a violência moral), é acusado abertamente de inspirador do mutirão nacional contra a baixaria televisiva, torna-se chocante ver o Presidente da República arrastando seu auxiliar e amigo a um convescote cuja anfritriã é a própria maestrina que concebeu e regeu aquela palhaçada pseudolibertária.

Espera-se de um presidente que apague incêndios, mas também se espera que saiba acender outros. Há conflitos que precisam prosperar para que não impere a apatia e se instale a resignação. Laços de Família não é apenas nome de uma atração. É modelo de co-autoria. Mostruário de uma ideologia acrítica, aética e amoral que de cena em cena, capítulo em capítulo, novela em novela, vem sendo instilada por este Brasil afora minando os melhores impulsos da construção e de convivência.

Não será o latim ou o grego que converterá nossas escolas em oficinas do saber ou focos de progresso. Mas quando um Ministro do Desenvolvimento confessar que seu objeto de desejo não é um Porsche mas uma primeira edição de Machado de Assis, então teremos dado um passo adiante na teledramaturgia nacional.

A despeito do desfecho e da decepção, algo acontece. Algo mexe-se e se movimenta. É Galileu cantarolando baixinho: eppure se muove. Mais uma vez.

            Foi esse, Sr. Presidente, o artigo do jornalista Alberto Dines, a quem louvo, que proclamo como um dos documentos importantes na história do jornalismo brasileiro e subscrevo integralmente, porque reflete de maneira cabal e completa o meu pensamento, que é o da sociedade maranhense, a qual represento nesta Casa, e da sociedade brasileira. Espero que ele tenha suas conseqüências nas decisões judiciárias, que saberão defender a moral, a ética e o comportamento adequado desses instrumentos de desinformação, como bem disse um próprio jornalista.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a Justiça brasileira não deixará que prospere esse ataque aos valores tradicionais da família brasileira.

            Muito obrigado.


            Modelo15/18/246:57



Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/12/2000 - Página 24120