Discurso durante a 167ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com a possibilidade de aumento de 12% nos preços dos medicamentos, a partir de janeiro de 2001, conforme denúncia veiculada no jornal O Globo, edição de ontem.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Preocupação com a possibilidade de aumento de 12% nos preços dos medicamentos, a partir de janeiro de 2001, conforme denúncia veiculada no jornal O Globo, edição de ontem.
Aparteantes
Ramez Tebet.
Publicação
Publicação no DSF de 05/12/2000 - Página 24185
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • CRITICA, POLITICA SALARIAL, TRABALHADOR, CONGELAMENTO, SALARIO, SERVIDOR, AUTORIZAÇÃO, REAJUSTE, PREÇO, PRODUTO, SERVIÇOS PUBLICOS, APREENSÃO, ANUNCIO, AUMENTO, MEDICAMENTOS, PUBLICAÇÃO, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), EXCEDENTE, INDICE, INFLAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, EMPRESA MULTINACIONAL.
  • DEFESA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, MINISTERIO DA SAUDE (MS), CONTROLE, ABUSO, LABORATORIO, NECESSIDADE, INCENTIVO, REFORÇO, PRODUTO GENERICO, GARANTIA, INTERESSE SOCIAL, MEDICAMENTOS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, o Congresso Nacional, como espelho da sociedade, está empenhado na discussão de questões essenciais à cidadania, como a fixação dos novos níveis do salário mínimo. Ao mesmo tempo, setores do governo se desdobram na criação de novas fontes de receita para os cofres públicos, o que inclui a reiterada tentativa de impor taxações aos proventos dos trabalhadores inativos e pensionistas.

            No fundo da questão encontramos o descompasso entre a renda auferida pelos assalariados, do setor público e da iniciativa privada, que está comprimida - ou até mesmo congelada, como é o caso do funcionalismo - há vários anos, e a disparada dos preços, sem qualquer controle efetivo. Assim, a liberação, praticamente geral, da economia, veio criar uma situação deveras perversa: de um lado, tudo custando mais caro a cada dia; de outro, os salários progressivamente precários.

            É pacífico o entendimento de que a inflação de demanda está sendo contida justamente pela falta de recursos dos consumidores, porque, se houvesse dinheiro circulando, os índices explodiriam. Mais, ainda: congelar os salários do setor público tem o duplo efeito, para o Governo, de cortar gastos do Tesouro e de evitar que os seus contratados possam investir mais na manutenção das próprias famílias.

            Isso não impede, entretanto, que o Governo autorize reajustes nos preços dos produtos e serviços administrados, como água, luz, derivados de petróleo e outros itens da mesma importância.

            Mas essa perversidade econômica está prestes a dar mais um expressivo e violento golpe na sociedade: o novo aumento nos preços dos remédios, a partir de janeiro, que a indústria quer fixar, na média, em 12%, como denunciou o jornal O Globo em sua edição de ontem.

            Para quem não leu essa assustadora e importante matéria, vou destacar, agora, os seus principais tópicos, encabeçados pelo título “preço de remédios vai voltar a subir em janeiro”, com um adendo: “indústria ameaça aumentar até 12%. Governo rejeita índice”.

            Logo na ampla chamada de capa, o respeitado matutino carioca informa:

O acordo entre laboratórios e Governo para segurar os preços dos remédios vence em 31 de dezembro e a indústria farmacêutica já se prepara para aumentar o preço dos medicamentos em até 12% em janeiro. Os laboratórios argumentam que o aumento será necessário para compensar a inflação e a variação do câmbio, mas o Governo considera absurda a proposta de reajuste, já que há no Congresso projeto para reduzir impostos sobre a produção e comercialização de remédios.

            Como diz o homem do povo: já vimos esse filme!

            Começa com os tubarões da indústria ameaçando índices abusivos e forçando o Governo a negociar para, no fim, aceitar índices elevados. Ou seja, a diferença é quase semântica: os fabricantes, empenhados em explorar abusivamente os cidadãos, acabam concordando em praticar “apenas” uma exploração menos violenta.

            Os argumentos da indústria são absurdos, como esse de “repor a inflação”. E a citada reportagem de O Globo deixa tal fato muito claro, ao cotejar os números obtidos nos últimos 24 meses: em 1999, enquanto os índices inflacionários não passaram de 8,1%, os remédios foram aumentados em 12,7%. Quer dizer, seus reajustes ficaram mais de 50% acima da inflação no período.

            Já no primeiro semestre do ano que chega ao fim, o assalto ao bolso do cidadão foi ainda mais terrível: enquanto a inflação era contida na casa de 0,87%, o preço dos remédios subiu quase 19% - 18,8%, para sermos exatos! Houve então uma intervenção do Governo, liderada pelo Ministro da Saúde, Senador José Serra, forçando os laboratórios a uma negociação que concluiu pelo congelamento dos preços no segundo semestre.

            Mas, mesmo que esse congelamento esteja sendo respeitado; mesmo que os 18,8% do primeiro semestre sejam mantidos até o próximo dia 31; ainda assim, o abuso terá sido grande, porque a inflação de todo o ano de 2000 não deve passar de 5%, menos de 30% do reajuste das tabelas dos laboratórios.

            E já no dia 1º, no alvorecer do ano 2001, um novo aumento virá, inexorável, massacrar ainda mais a sociedade, em particular os cidadãos idosos e os doentes crônicos, que, sem o uso regular de medicamentos caríssimos, estarão condenados à morte.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sou defensor intransigente da democracia, da economia de mercado, da livre iniciativa. Mas, ao mesmo tempo, advogo uma presença ativa, concreta e corajosa do Poder Público na repressão a abusos como os cometidos pelos fabricantes de medicamentos.

            O Ministro da Saúde, nosso eminente colega Senador José Serra, tem sido um obstáculo à ganância desses industriais - mas, mesmo que continue lutando com denodo e firmeza, S. Exª não conseguirá deter a escalada de preços imposta no setor, em que atuam, praticamente sozinhos, representantes de grandes grupos multinacionais.

            O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - V. Exª me concede um aparte, Senador Nabor Júnior?

            O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Concedo o aparte ao ilustre Senador Ramez Tebet, com muito prazer.

            O Sr. Ramez Tebet (PMDB - MS) - Senador Nabor Júnior, realmente, o tema que V. Exª traz à tribuna, na tarde de hoje, é dos mais relevantes. Diz respeito à cidadania, porque não existe maior desrespeito à população brasileira que o praticado pelos laboratórios. O preço dos remédios sobe, como V. Exª tem salientado, de forma vertiginosa. O Governo, por intermédio do Ministro da Saúde, José Serra, tem procurado coibir esse crime que se pratica contra o povo brasileiro. Há pouco tempo, noticiaram os jornais acordo acertado entre o Ministério da Saúde e os laboratórios para que o preço dos medicamentos não sofresse alta e não sacrificasse, portanto, a maioria esmagadora da população brasileira, já sofrida e sacrificada com o custo daquilo que é indispensável para a manutenção da sua saúde: a aquisição de medicamentos básicos, sem os quais não pode viver. E são justamente os medicamentos contra pressão alta e contra o diabetes os que têm a maior escalada de alta de preços. Então, fico a indagar: o que há? Que força é essa que possuem os laboratórios, que fazem o que querem? Há necessidade de uma medida enérgica por parte do Governo. Não há dúvida de que todos nós somos favoráveis à livre iniciativa e à economia de mercado, mas quando as coisas atingem a cidadania e o trabalhador, quando há ganância, quando não há explicação, quando há abuso, como V. Exª está denunciando, urgem providências enérgicas por parte do Estado. Cumprimento V. Exª por trazer à tribuna do Senado Federal assunto de tanta relevância.

            O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Senador Ramez Tebet, agradeço-lhe o oportuno aparte, que realmente contribui de maneira decisiva para a defesa dos pontos de vista que estou expondo. E, engrandecido pelas generosas palavras e as valiosas considerações do nobre representante de Mato Grosso do Sul, retorno ao texto do meu pronunciamento, sobre os problemas e as dificuldades enfrentadas pela sociedade, quando precisa adquirir e usar medicamentos.

            Sr. Presidente, a indústria farmacêutica brasileira foi estrangulada e absorvida pelo capital vindo de fora. E, hoje, é esse capital quem dita as regras e dá as cartas quando se trata de fixar preços. São grupos poderosíssimos, estruturados em cima de lobistas competentes e muitíssimo bem remunerados, com tentáculos em todos os setores da administração pública e da economia privada.

            Para enfrentá-los e submetê-los a leis semelhantes às que existem em seus países de origem, o Brasil precisa agir com firmeza e transparência , numa ação coletiva de Governo, com todos os seus órgãos empenhados em prestigiar e respaldar a ação meritória desenvolvida pelo Ministro da Saúde.

            Devem ser ouvidos representantes da sociedade, porque é assim que as coisas precisam funcionar numa democracia. Deve ser ouvido, por exemplo, o Presidente do Conselho Regional de Farmácia do Distrito Federal, Dr. Antônio Barbosa, que fez sérias denúncias ao jornal O Globo em entrevista publicada na edição de ontem.

            O Presidente do CRF-DF avisa que, na esteira das alegações de “defasagem de preços”, os laboratórios querem nos impor o peso de suas mãos, o que, para ele, é um absurdo, pois a pretensa “defasagem” não justifica reajuste nas atuais circunstâncias. E explica que as matérias-primas não tiveram aumento algum este ano.

            O Dr. Antônio Barbosa também tece críticas à decisão de zerar as alíquotas do PIS e do Cofins na fabricação, distribuição e venda de cerca de 300 medicamentos. E faz um comentário que deve ser ouvido com atenção e bom senso: “Isso só beneficia a indústria e demonstra que o Governo está nas mãos das multinacionais.”

            Segundo ele, está faltando uma atitude mais transparente no trato do problema, porque “uma boa solução seria o Governo divulgar listas comparativas de preços das indústrias periodicamente”.

            E explica o Presidente do Conselho Regional de Farmácia do Distrito Federal: "A atitude de tornar públicas as tabelas das indústrias e compará-las informaria melhor a população e ajudaria a baixar os preços dos remédios. Na verdade, ninguém pode ser ingênuo, quando se fala de finanças e controle de abusos econômicos. Sabemos que essa política de cortar impostos, na tentativa de baixar preços, só tem duas conseqüências, quase simultâneas: os cofres públicos perdem importantes receitas e os fabricantes continuam cobrando valores abusivos, mesmo que sofram uma redução simbólica durante algum tempo nos dias imediatos à adição da medida.

            Os laboratórios jogam, inclusive, com a velha mágica dos falsos descontos: conservando as tabelas nominais em níveis absurdos, praticam algumas reduções aleatórias nos preços efetivamente cobrados aos distribuidores, os quais, por seu turno, repassam-nas aos consumidores. Só que, à medida que suas matrizes exigem maiores remessas de lucros, vão cortando essa gordura e - reduzindo os descontos - aproximam-se do elevado valor oficialmente estabelecido.

            O Governo não desconhece essa manobra dos laboratórios.

            O Secretário de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, Cláudio Consídera, também fala em defasagem de preços, para anunciar: “existem produtos no mercado que não têm seus preços reajustados desde o começo do ano. Nesses casos, será preciso que se faça uma correção, e o desconto deverá ser menor”.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nunca é demais repetir: remédio é assunto do mais alto e relevante interesse social, que não pode ficar entregue à voracidade das multinacionais que dominam o setor e também não pode ser ignorado pelas autoridades, mesmo que em nome de uma enganosa democracia econômica. Digo enganosa e reafirmo que todos os regimes fincados na livre iniciativa dispõem de mecanismos severos para impedir abusos e crimes contra a economia popular. O que dizer, então, quando o atentado vai além da economia do povo, chega a ameaçar a sua própria vida?

            Podemos imaginar o desespero de quem precisa usar regularmente, várias vezes ao dia, remédios essenciais à própria sobrevivência.

            E não uso de metáforas quando o digo, porque, se um hipertenso não tomar seus medicamentos com regularidade, vai morrer a curto prazo.

            Quem tem câncer enfrenta o mesmo drama, agravado pela necessidade de tratamentos hospitalares e clínicos de alto custo financeiro. Os idosos, para enfrentarem com dignidade seus últimos dias, precisam de medicamentos especiais, prescritos pelos especialistas em geriatria.

            Da mesma forma, estão ameaçados os portadores de doenças crônicas digestivas, respiratórias; enfim, os carentes dos mais diversos tipos de medicamentos, esporádica ou regularmente, o que, decerto, inclui todos os homens, mulheres e crianças.

            O problema é grave e deve ser encarado com seriedade pelo Governo. Mesmo adotando soluções emergenciais, as autoridades não podem descartar medidas corretivas, firmes e exemplares, contra a sanha dos grandes trustes estrangeiros, que dominam o setor medicamentoso.

            Uma providência anunciada hoje pelo Ministro José Serra é capaz de atenuar momentaneamente o problema: a importação de medicamentos, na tentativa de baixar os preços internos. Mas não podemos esquecer que, nessa compra, a sociedade estará queimando preciosas divisas em moeda forte, que farão falta para outras operações. E, além disso, é grande o risco de adquirirmos os remédios nas matrizes ou em outras filiais internacionais dos mesmos fabricantes que, por suas seções aqui instaladas, tentam abusar do consumidor brasileiro.

            É hora de repensar toda a situação. Fortalecer, por exemplo, a presença dos chamados “genéricos” nas prateleiras de farmácias, porque a simples eliminação da grife torna o remédio mais barato em 30, 40 ou 50%.

            O Governo precisa deflagrar, imediatamente, uma campanha simultânea, junto aos médicos e aos farmacêuticos, para expandir a comercialização dos genéricos. Em primeiro lugar, as receitas deverão conter justamente o nome corrente do princípio ativo do remédio, evitando as marcas de fantasia criadas pelo marketing dos laboratórios; depois, incentivar distribuidores e revendedores a trabalharem com aqueles produtos, oferecendo opções mais razoáveis aos consumidores.

            Sem isso, estaremos todos condenados a sofrer em dobro as nossas dores físicas, emocionais e mentais: além de amargar sofrimentos, certamente os veremos agravados, devido à impossibilidade de adquirir os remédios que poderiam diminuir ou até mesmo eliminar essas mazelas.

            Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


            Modelo15/16/243:50



Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/12/2000 - Página 24185