Discurso durante a Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Defesa do Programa Especial de Treinamento - PET, face ao processo de desmonte do programa, iniciado por órgãos vinculados ao Ministério da Educação.

Autor
Ronaldo Cunha Lima (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ronaldo José da Cunha Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ENSINO SUPERIOR.:
  • Defesa do Programa Especial de Treinamento - PET, face ao processo de desmonte do programa, iniciado por órgãos vinculados ao Ministério da Educação.
Publicação
Publicação no DSF de 03/02/2001 - Página 305
Assunto
Outros > ENSINO SUPERIOR.
Indexação
  • ANALISE, EDUCAÇÃO, BRASIL, PRIORIDADE, MELHORIA, QUALIDADE, ENSINO, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, ENSINO SUPERIOR, FORMAÇÃO, PROFESSOR.
  • ELOGIO, PROGRAMA ESPECIAL, TREINAMENTO, BOLSISTA, ENSINO SUPERIOR, AMBITO, ENSINO, PESQUISA, EXTENSÃO, AVALIAÇÃO, BENEFICIO, GRADUAÇÃO.
  • CRITICA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), TENTATIVA, EXTINÇÃO, PROGRAMA ESPECIAL, TREINAMENTO, ENSINO SUPERIOR, REDUÇÃO, RECURSOS, ANALISE, POLITICA, SETOR, SOLICITAÇÃO, APOIO, SENADOR, MINISTRO DE ESTADO, CONTINUAÇÃO, PROJETO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RONALDO CUNHA LIMA (PMDB - PB) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não posso deixar de trazer à reflexão deste Plenário aquilo que considero um dos maiores paradoxos da atual política educacional. Todos nós sabemos, as avaliações o demonstraram e os meios de comunicação já o difundiram à exaustão que a qualidade é, atualmente, o grande dilema da educação brasileira. Apesar disso, recentes medidas governamentais, que tentam desativar experiências bem sucedidas de busca de qualidade no ensino, parecem ignorar a principal demanda educacional do País.

            Em relação à educação básica, sabe-se que já estão quase totalmente superadas as dificuldades de acesso e que sua universalização é uma realidade. Entretanto, recentes resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (SAEB) mostram uma tendência geral para a queda, particularmente nos testes de Português e Matemática.

            Quanto ao ensino superior, as avaliações têm demonstrado a necessidade de investir na qualificação dos docentes, promover a atualização de métodos e processos pedagógicos, incentivar a produção didático-científica e a implantação e expansão de projetos e experiências destinados a estimular a melhoria do ensino, a integração da formação acadêmica com a atividade profissional e a formação de profissionais críticos e atuantes.

            Exatamente com esses objetivos, foi criado, em 1979, pelo Professor Claudio de Moura Castro, então Diretor-Geral da Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior - CAPES -, o Programa Especial de Treinamento - PET, destinado a incentivar, nas Instituições de Ensino Superior - IES - o surgimento de grupos de estudo que se dedicassem ao trabalho intelectual em tempo integral, sob a orientação de um professor tutor, num ambiente que favorecesse o envolvimento, a participação e a troca de idéias e experiências entre alunos e professores.

            Hoje, o PET está instalado em 59 universidades brasileiras, com 315 grupos em funcionamento, envolvendo, aproximadamente, 3.500 bolsistas. Trabalha com as três vertentes da atividade universitária: ensino, pesquisa, extensão. Cada grupo PET, que conta com 12 alunos e um professor tutor, forma cidadãos que aprendem, durante três anos, a trabalhar em equipe e a irradiar para os demais colegas o espírito de liderança e o compromisso com a geração de conhecimentos para a solução dos mais diversos problemas.

            A renovação dos bolsistas é feita anualmente por meio de processo seletivo, quando da saída daqueles que concluem a graduação. Para ser tutor, o professor também passa por seleção. Em vista disso, a maioria dos tutores são aqueles que mais se destacam nas faculdades, estando, portanto, envolvidos em várias outras atividades e projetos, o que enriquece os participantes e gera grupos de excelência.

            Em 1997, foi realizada uma pesquisa ampla para avaliar a influência do PET na graduação, uma vez que o desempenho dos grupos já era aferido periodicamente. A pesquisa, coordenada pela Professora E. Galbachevsky, do Núcleo de Pesquisas sobre o Ensino Superior da USP, apontou resultados relevantes, assim sintetizados: “... o PET é um programa bem-sucedido no que se refere aos seus alunos e bolsistas. As oportunidades de treinamento oferecidas pelo programa são ímpares, mesmo quando comparadas com outros programas até certo ponto similares”.

            No ano seguinte, um grupo de docentes designados pela CAPES procedeu a outra avaliação, cujos resultados, divulgados em abril de 1999, destacavam vários pontos relevantes, entre os quais enfatizamos: melhoria substancial nos cursos de graduação em que o PET se instalou; contribuição notável para promover a proximidade dos alunos com a faculdade e para fazer reaparecer o papel da instituição universitária para os estudantes; otimização da estrutura curricular, refletindo o espírito da Lei de Diretrizes e Bases; fundamental para a implementação de ações dirigidas à comunidade, principalmente aquelas voltadas para o Ensino Fundamental e Médio; formação de profissionais mais bem preparados para integrar a comunidade científica ou as áreas profissionais e empresariais em seus campos de formação.

            Em seu parecer final, a Comissão considera: “... o PET é uma das iniciativas mais consistentes e produtivas no sentido de estimular os estudantes e melhorar a qualidade do ensino de graduação no País...”; “... o PET melhora o desempenho global do curso no qual se insere, tanto no que tange à eficiência na formação dos estudantes quanto no que se refere à maior produtividade dos professores...”; “Como uma das prioridades do País, no âmbito educacional, é melhorar a formação superior, um dos mecanismos mais eficazes, instalado no momento, é, sem dúvida, o Programa Especial de Treinamento”.

            Ao iniciarmos este pronunciamento, falávamos, Senhoras e Senhores, de um paradoxo. Antes de anunciá-lo, porém, fornecemos os elementos que lhes permitissem avaliar sua dimensão e gravidade.

            Apesar de todos os aspectos positivos apontados a respeito do PET e, embora as duas avaliações promovidas tenham sido amplamente favoráveis à sua continuidade e ampliação, inexplicavelmente, os órgãos vinculados ao Ministério da Educação iniciaram um processo de desmonte do programa, que só não teve êxito devido ao amplo apoio que o programa tem recebido dos mais diversos setores da sociedade.

            Em 1997, tentaram reduzir o número de bolsistas de 12 para 6, mas, devido a pressões e manifestações em contrário, não realizaram esse intento. A seguir, decretaram que o PET encerraria as atividades em 31/12/99. Apesar de muito esforço, não conseguiram o objetivo. Vencidos no mérito de seu propósito, começaram as manobras no campo da formalidade. Retiraram o PET da CAPES e passaram para a Secretaria de Ensino Superior - Sesu, que não deu continuidade às avaliações anuais.

            Várias outras ações foram levadas a efeito no sentido de minar as bases do programa. Retiraram as Taxas Acadêmicas, que eram recursos essenciais para aquisição de equipamentos, livros e material didático. Não foi mais destinada bolsa de mestrado para o melhor petiano de cada grupo, assim como foi cortada a possibilidade de solicitação de professor recorrente. Para não pagar os tutores, a Sesu tem-se servido dos mais diferentes argumentos, todos sem sustentação.

            Inegavelmente, o que está ocorrendo é uma ação deliberada por parte do Ministério da Educação para extinguir o PET, o que, convenhamos, é uma política totalmente contrária à construção da Nação Brasileira, haja vista que esse programa foi avaliado como de excelência para o nosso sistema educacional.

            Como não podemos acreditar, Sras. e Srs. Senadores, que essa ação deliberada e sistemática seja fruto de idiossincrasias ou caprichos, somos levados a admitir que o comportamento do Ministério da Educação, em geral, e da Secretaria de Ensino Superior, em particular, revelam uma preocupação excessiva com a questão quantitativa, deixando em segundo plano a qualidade das ações empreendidas. Uma das razões que se pode perceber para justificar esse comportamento prende-se à preocupação generalizada de produzir indicadores sociais capazes de justificar as políticas adotadas.

            Assim, é notória a ênfase que vem sendo dada a alguns programas sociais, principalmente na área de educação, capazes de produzir, rapidamente, as esperadas mudanças estatísticas dos indicadores, sem que possa ser percebida uma efetiva preocupação com as transformações profundas que a sociedade necessita e espera de seus governantes. Assim, o PET, enquanto um programa de qualidade, voltado à formação de cidadãos conscientes e de lideranças, sofre a discriminação por não poder produzir os índices quantitativos, de cunho estatístico, esperados pelas autoridades nacionais e pelas agências financeiras internacionais.

            Outra explicação para as medidas assumidas contra o PET seria considerá-las dentro de um contexto mais amplo de enfraquecimento da universidade pública gratuita - a principal atingida, como forma de fugir da crise financeira, retirando os investimentos no ensino superior, até forçá-lo, quem sabe, a uma inevitável privatização.

            De qualquer forma, é um contra-senso. O Governo revela uma preocupação imediatista, conjuntural, comprometendo, com isso, áreas vitais para o desenvolvimento do País, sem o concurso das quais não enfrentaremos a crise do futuro, mesmo que superemos as dificuldades financeiras do momento.

            Algumas áreas não podem sofrer cortes sob a alegação econômica, pois a interrupção de seus projetos não só compromete as possibilidades de retomada no futuro, como ocasiona perdas irreparáveis no que já se investiu. É o que acontece com o desenvolvimento de recursos humanos qualificados. É um trabalho que exige continuidade e que acarretará, se interrompido, muito mais prejuízo que economia. Não se trata somente do destino pessoal de algumas centenas de jovens, mas da possibilidade de o País passar a contar com um quadro de profissionais capazes de alavancar o seu desenvolvimento.

            Sras. e Srs. Senadores, a morte anunciada do PET fere a autonomia universitária, compromete a expansão quantitativa do ensino superior e neutraliza os esforços empreendidos para a melhoria da sua qualidade. Atinge, portanto, os três pilares sobre os quais, atualmente, assenta-se a demanda da universidade pública brasileira.

            Nesse sentido, é necessário colocar em evidência a sensibilidade que o Congresso Nacional tem tido em relação aos efeitos positivos que um programa do tipo do PET tem trazido à sociedade. Graças à ação decisiva de Deputados e Senadores, o PET tem sobrevivido. Se estivesse apenas sujeito ao humor momentâneo dos responsáveis pela execução das políticas públicas, há muito teria desaparecido. Com isso, teria deixado de existir, também, todo um processo educativo de formação de cidadãos atentos e mobilizados em defesa dos interesses maiores de nossa sociedade.

            Assim, ao tempo em que aproveito este momento para fazer um apelo ao elevado senso de espírito público do Ministro Paulo Renato de Souza, pessoa digna dos nossos efusivos aplausos pela destacada forma com que vem conduzindo as questões atinentes ao Ministério da Educação, e que certamente sinalizará para a melhor solução para esse assunto, subo a esta Tribuna para conclamar todos os colegas Senadores e Senadoras a cerrarem fileiras em defesa do Programa Especial de Treinamento, independentemente de filiação partidária ou adesão ideológica, mas no atendimento dos anseios de toda a comunidade acadêmica, da expectativa de futuro de jovens dedicados e dos altos interesses da Nação Brasileira.

            Muito obrigado.


            Modelo15/5/2412:57



Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/02/2001 - Página 305