Discurso durante a 16ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTANCIA DA APROVAÇÃO DA REFORMA TRIBUTARIA.

Autor
Ricardo Santos (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo Ferreira Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REFORMA TRIBUTARIA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A IMPORTANCIA DA APROVAÇÃO DA REFORMA TRIBUTARIA.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/2001 - Página 3469
Assunto
Outros > REFORMA TRIBUTARIA.
Indexação
  • ANALISE, COMPLEXIDADE, REFORMA TRIBUTARIA, DEMORA, TRAMITAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, DEFESA, ORADOR, DEBATE, AMPLIAÇÃO, CORREÇÃO, EXCESSO, TRIBUTOS, ASSALARIADO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, SIMPLIFICAÇÃO, IMPOSTOS, REINCIDENCIA.
  • DEFESA, REDUÇÃO, TRIBUTAÇÃO, CONSUMO, APRESENTAÇÃO, DIRETRIZES GERAIS, REFORMA TRIBUTARIA.

O SR. RICARDO SANTOS (PSDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a reforma tributária voltou a ser lembrada na abertura do ano de 2001. Ressurgem as manifestações que clamam pela urgência da medida, dessa feita sob a liderança do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, inserida, como se sabe, entre as prioridades da agenda do Governo para o biênio 2001-2002, divulgadas recentemente.

O projeto de emenda constitucional, de iniciativa do Poder Executivo, conhecido como PEC nº 175, com os seus sucessivos substitutivos, já completa quase seis anos de discussão, a despeito da prioridade da reforma tributária e da aparente unanimidade sobre a questão. Afinal, todos são a favor de uma reforma tributária. Entretanto, o histórico da tramitação da Emenda é revelador da complexidade do tema e dos interesses por ele despertados.

A discussão contemporânea em torno das mudanças do sistema tributário nacional e as propostas encaminhadas para sua alteração têm sido focadas na reestruturação dos tributos sobre o consumo, mantendo fora do âmbito da discussão a exploração mais abrangente da base de tributação sobre a renda e o patrimônio.

Os aspectos deletérios da atual estrutura e práticas fiscais do País podem ser assim sumariados:

a) Nossa estrutura tributária distribui-se de forma bastante desigual, alcançando desproporcionalmente os assalariados e os brasileiros de menor renda;

b) Desde 1970, foram reintroduzidos impostos em cascata, aumentaram-se as alíquotas dos impostos tradicionais, criaram-se novos impostos sobre a mesma base tributária e passou-se a explorar bases tributárias heterodoxas, como as operações financeiras. Uma das conseqüências deste processo foi o agravamento das distorções do sistema, com o aumento da sonegação e da elisão fiscais, o que, por seu turno, exigiu novos casuísmos para preservar a extração fiscal preexistente;

c) A ampliação do número de impostos e contribuições e a constante mudança na legislação transformaram o ato de lançar e pagar impostos numa operação complexa e custosa. Daí ter-se observado uma redução na eficiência da fiscalização, sobretudo federal, e uma elevação do custo para o atendimento das obrigações fiscais no setor privado. Esses ingredientes, por sua vez, produziram o aumento das práticas do planejamento fiscal e da sonegação;

d) Os índices de cobertura dos impostos no Brasil (relação entre a base efetivamente tributada e a potencial) são muito baixos. Estimativas indicam que ele se situa próximo dos 40% para o IR, IPI e ICMS e de 14% para o Imposto Territorial Rural (ITR);

e) Os impostos em cascata (COFINS e PIS) alcançam todas as transações ao longo da cadeia produtiva, cumulativamente, impactando diferentemente setores, produtos ou atividades econômicas, favorecendo, artificialmente, a integração vertical e onerando, de modo gravoso, as nossas exportações.

Obviamente, o que se deseja numa reforma é construir um arcabouço tributário que elimine ou iniba as diversas distorções acima apontadas. Por essa razão, e já por uma década, a revisão tributária tem sido objeto de atenção do Congresso, da classe empresarial e dos demais segmentos da sociedade.

Existem algumas questões relevantes a serem aprofundadas acerca do posicionamento oficial sobre a questão tributária brasileira, desde o envio da Proposta de Emenda Constitucional nº 175 ao Congresso, em agosto de 1995.

Primeiramente, o Governo Federal tem defendido a tese, em diversas ocasiões, de que o objetivo maior da reforma tributária resume-se na necessidade de racionalizar a tributação sobre o consumo no País. O Executivo parece acreditar que esse resultado será alcançado com a redução do número de incidências, eliminando brechas ou vazamentos de receitas, possivelmente reduzindo alíquotas, mas sempre preservando o nível da arrecadação alcançado com os vários tributos envolvidos, sejam federais, estaduais ou municipais.

Praticamos níveis exagerados de tributação sobre o consumo -metade da extração fiscal brasileira tem origem em impostos e contribuições sobre vendas, cumulativos ou não -, o que, com graves implicações distributivas, traz como conseqüência ainda a perda de funcionalidade do próprio sistema tributário e culmina no incentivo à sonegação desses mesmos impostos e contribuições.

Consideramos também relevante para o adequado encaminhamento o fato de que não se deve oferecer à sociedade um tipo de opção tudo ou nada, ou seja, que restrinja a escolha a duas situações extremas: manter a regra atual ou partir para o “ideal tributário”. Necessitamos avançar na eliminação de distorções evidentes e contribuir para o alcance do ideal a médio e longo prazos.

Reescrever de uma única penada um código tributário não tem precedentes em ambiente democrático, nem no Brasil nem no exterior. Trata-se de uma sistemática que desconhece a natureza normalmente evolutiva das instituições públicas e, em particular, dos sistemas tributários.

O conceito de estrutura ideal é sempre discutível. Entretanto, o resultado de debate recente e a observação da própria experiência internacional apontam na direção que acreditamos ser recomendável aceitar como diretrizes gerais para uma reforma tributária no Brasil:

a) A necessidade de redução do número de impostos e contribuições sobre o consumo, bem como do nível de arrecadação desses gravames. Nesse sentido, os impostos sobre o consumo - ICMS, IPI, ISS, PIS e Cofins - deveriam ser reduzidos a dois apenas: um imposto sobre valor adicionado em nível estadual e um imposto seletivo sobre o consumo, de âmbito federal. As contribuições PIS e Cofins deveriam ser eliminadas gradativamente, com a elevação da arrecadação do Imposto sobre a Renda.

b) A elevação da arrecadação do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física, mediante o aumento do número de contribuintes, do alcance mais efetivo da renda do capital e da ampliação da base do imposto.

Estamos, obviamente, falando de uma maior participação dos rendimentos provenientes do capital ou dos segmentos mais abastados da sociedade na composição da receita do Imposto de Renda, podendo-se, com isso, reduzir gradativamente a carga tributária média sobre os mais pobres e sobre os assalariados, por meio da menor incidência do imposto sobre o consumo e do próprio Imposto de Renda sobre os assalariados, que hoje respondem pela sua maior parcela de arrecadação.

O Brasil, que já possui uma extração fiscal de primeiro mundo, deveria mirar-se naqueles países, transformando o Imposto sobre a Renda em sua mais importante fonte de arrecadação (nos países da OCDE, por exemplo, o imposto de renda responde por 40% da extração fiscal média, enquanto no Brasil é pouco superior a 10%).

c) A relação custo-benefício do setor público brasileiro necessita ser melhorada com urgência. A extração fiscal em nosso País é expressiva, sem uma contraprestação compatível de serviços públicos. Juntamente com a questão educacional, esse desequilíbrio em muito tem contribuído para reduzir a produtividade e a competitividade da economia brasileira.

d) A reforma tributária deverá assegurar a redução das disparidades intra e inter-regionais da receita pública, preservando o equilíbrio da Federação.

É interessante observar que o que consideramos da mais alta relevância no contexto de uma reforma tributária, qual seja, maior ênfase na tributação direta, vis-à-vis tributação indireta, em sentido estrito, não exige nenhuma mudança na Constituição. Basta uma legislação ordinária que viabilize uma cobrança efetiva do imposto sobre a renda acompanhada da redução ou zeragem das alíquotas dos impostos em cascata.

Esse fato reforça a idéia de que a reforma poderia ser realizada de maneira mais gradativa, eliminando as principais distorções mais evidentes, conforme já afirmamos, e aproximando-se, a médio prazo, de um sistema tributário mais racional - com menor número de tributos, mais justo socialmente - com menor carga tributária sobre os assalariados e os mais pobres, e menos oneroso para o sistema produtivo - viabilizando a competitividade das empresas brasileiras no comércio internacional.

Sr. Presidente, muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/2001 - Página 3469