Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

APREENSÃO, COM O ANUNCIO PELO GOVERNO FEDERAL, DA EXTINÇÃO DA SUDENE.

Autor
Carlos Wilson (PPS - CIDADANIA/PE)
Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • APREENSÃO, COM O ANUNCIO PELO GOVERNO FEDERAL, DA EXTINÇÃO DA SUDENE.
Aparteantes
Antonio Carlos Valadares, Edison Lobão, Geraldo Melo, José Alencar, José Eduardo Dutra, Sebastião Bala Rocha.
Publicação
Publicação no DSF de 21/03/2001 - Página 3568
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • APREENSÃO, ANUNCIO, EXTINÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), NECESSIDADE, DEBATE, LEGISLATIVO.
  • REGISTRO, DADOS, AVALIAÇÃO, ATUAÇÃO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), BENEFICIO, REGIÃO NORDESTE, CRIAÇÃO, EMPREGO, RENDA, INDUSTRIALIZAÇÃO, INEXATIDÃO, CRITICA, INEFICACIA.
  • REGISTRO, OMISSÃO, GOVERNADOR, PARTICIPAÇÃO, CONSELHO, SUPERINTENDENCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE (SUDENE), ATUALIDADE.
  • DEFESA, COMBATE, CORRUPÇÃO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PRESERVAÇÃO, ORGÃO PUBLICO.

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o motivo da minha presença hoje, nesta tribuna, é manifestar a minha preocupação com os destinos da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste - Sudene, ameaçada de extinção por força de uma medida provisória, segundo declarações do Ministro da Integração Regional, Fernando Bezerra, veiculadas pela imprensa nos últimos dois anos.

O que me parece grave e inaceitável, para quem tem, como eu, responsabilidade política com o Nordeste, é a ligeireza quase indiferente dedicada ao assunto pelas autoridades federais e a reação tímida por parte dos atingidos pela medida. Ou seja, os nove Estados do Nordeste e Minas Gerais.

Dessa forma, decidi romper esse silêncio ensurdecedor para compartilhar com toda a sociedade e, em particular, com minha gente do Nordeste o desconforto e a apreensão que experimento em face da morte de uma agência criada em 1959, como a vanguarda institucional de um projeto generoso de planejamento e desenvolvimento econômico e social do Nordeste.

Como se sabe, o contexto da criação da Sudene, tendo como antecedente a criação da Chesf, ainda no segundo Governo do Presidente Getúlio Vargas e do Banco do Nordeste do Brasil, e do Banco do Nordeste do Brasil, era a politização, no melhor sentido, da questão da integração nordestina, vista como um assunto de dimensão nacional.

Desse modo, a Sudene obedeceu a uma concepção ampla e abrangente do problema do atraso da região e da necessidade de viabilizar investimentos em um projeto de industrialização gerador de renda e de empregos associado a uma mudança de estrutura agrária e à modernização agrícola.

Tudo isso tendo como sustentação financeira uma política de incentivos fiscais e investimentos federais, através do Finor. Um conselho deliberativo formado pelos Governadores do Nordeste, mais o Governador de Minas Gerais, tem a incumbência de aprovar a expansão de novos empreendimentos industriais.

E, apesar de todas as críticas de ineficiência e desvio de recursos, não se pode de maneira simplista concluir pela falência desse modelo. Mais grave ainda é tentar fazer crer que, como tudo no Nordeste, a Sudene também teria, nesses 40 anos, apenas alimentado as oligarquias regionais. Não é verdade, ou pelo menos é apenas uma meia verdade.

Com todos os problemas de gestão decorrentes, não da concepção original do órgão, mas do seu esvaziamento político e administrativo, orquestrado no regime militar e perpetuado até hoje, a Sudene pode contabilizar, a meu ver, uma série de resultados positivos.

No final dos anos 50, o Nordeste participava, Sr. Presidente, de apenas 13% da renda nacional e a sua renda per capita era de 43% da média do País.

Desde a criação da Sudene, a renda per capita do Nordeste cresceu a um ritmo superior à média nacional e a participação do Nordeste na renda do Brasil aumentou para 15,6%.

Ao lado disso, empresas do sul e sudeste do País têm migrado para o Nordeste, nos últimos anos, em movimento crescente, como, por exemplo, as unidades industriais da Vicunha, da Grandene e da Vulcabrás, no Ceará, e da Ortopé, na Paraíba, reforçando, assim, a posição nordestina como o pólo exportador de calçados.

E mais: o perfil industrial do Nordeste foi modificado. Em 1960, 70% da indústria nordestina era de segmentos tradicionais (têxteis e alimentos), contra apenas 30% de setores mais avançados como química, petroquímica e metalurgia. Hoje, tais percentuais inverteram-se para 40 e 60%, respectivamente.

Além disso, com as indústrias surgidas na região, apoiados pela Sudene, foram criados quase cinco milhões de empregos, diretos e indiretos, e gerou-se um aumento na arrecadação de impostos industriais da ordem de mais de 200%.

Quanto ao propalado fracasso dos projetos para a região, os números desmentem essa falácia. Entre 1959 e 1992, foram aprovados 2.800 projetos, dos quais apenas 12% fracassaram.

Isso representa um número perfeitamente compatível com os índices nacionais em projetos de financiamentos semelhantes. Outro mito sobre a Sudene, talvez fosse melhor dizer meia verdade, diz respeito ao montante dos recursos nela alocados, sempre referidos como astronômicos.

A verdade é outra, Sr. Presidente. Até 1992, isto é, em 32 anos de operação da Sudene, consumiram-se exatos US$8 bilhões, que, repartidos por dez Estados que formam o Conselho da Sudene, dão a cada um menos de US$30 milhões por Estado e por ano. Ora, sabemos que apenas a Usiminas - e não temos nada contra a Usiminas -, em 4 anos consumiu US$ 6 bilhões. Itaipu - e também não temos nada contra Itaipu -, em idêntico período de 4 anos, recebeu US$18 bilhões, mais da metade do que a Sudene recebeu em 32 anos de existência. Isso sem falar nas usinas nucleares que, embora ainda não tenham gerado um só quilowatt sequer, foram contemplados até hoje com US$2 bilhões em período semelhante.

Não tenho notícia de nenhuma apuração sobre isso. Ninguém jamais se preocupou em apurar os responsáveis ou os beneficiários dos recursos que jorraram inutilmente para que o Brasil tivesse energia nuclear.

O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - V. Exª me permite um breve aparte?

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Com o maior prazer, Senador Edison Lobão.

            O Sr. Edison Lobão (PFL - MA) - Quero apenas dizer a V. Exª que tenho preocupações semelhantes às de V. Exª. Não há dúvida de que há desvios, como desvios terão havido em quase tudo quanto se empreendeu de grande envergadura; ou, pelo menos, houve alguma obra malfeita, que poderia ter sido melhor acabada. Porém, o fato é que a Sudene tem prestado relevantes serviços ao Nordeste brasileiro. Isso é irrecusável, é irrefutável. O que seria do nosso Nordeste, hoje, se não tivesse havido, há muitos anos, a instalação da Sudene? Seguramente, estaríamos em uma situação muito pior do que a que estamos. Não tenho a menor dúvida quanto a isso. Aqui, vejo o Senador Bernardo Cabral e logo me vem aos olhos a Suframa; as suas origens, a sua gênese. A Suframa foi de grande importância para o crescimento da Amazônia, sobretudo de Manaus. Portanto, todas essas agências - vamos chamá-las assim -, atualmente, são e continuam sendo importantes. O que se precisa fazer é corrigir o que eventualmente pode estar errado, e não pura e simplesmente passar uma esponja por cima, detonar, colocar uma bomba, uma granada e liquidar com aquilo que, durante tantos anos, contribuiu para o soerguimento de uma região e, por conseqüência, do eu povo. Solidarizo-me com V. Exª pelas palavras que aqui pronuncia e pelas preocupações que tem, tanto quanto eu, em relação à extinção da Sudene.

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Agradeço ao Senador Edison Lobão o aparte.

Lembro-me da participação de S. Exª, como Governador do Maranhão, no Conselho da Sudene. Na época em que o Senador Edison Lobão era Governador do Maranhão, S. Exª deve se lembrar que o Conselho da Sudene funcionava em toda a sua plenitude. A presença dos governadores era o ponto mais alto das reuniões da Sudene. Hoje, o que vejo hoje nesse quadro desolador que estamos enfrentando em relação à Sudene é uma participação tímida por parte dos governadores.

Os governadores que hoje têm assento no Conselho da Sudene terão também que assumir essa responsabilidade no caso de a Sudene ser extinta, porque, amanhã, eles serão responsabilizados por essa extinção. O Conselho da Sudene é o órgão mais forte da instituição.

Portanto, quando vejo um ex-governador que teve assento no Conselho da Sudene, como é o caso do Senador Edison Lobão, externando a sua preocupação com a extinção da Sudene, reafirmo tratar-se de demonstração inequívoca do que representa aquela instituição para os interesses da região.

O Senador Edison Lobão destacou aqui que muitos erros devem ter sido cometidos na Sudene, mas, com certeza, os acertos foram bem maiores.

No início do nosso discurso, eu disse que a Sudene, em 32 anos, conforme os dados de que dispomos, gerou quase cinco milhões de empregos. Só isso já justificaria a sua permanência.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Ouço V. Exª.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP) - Senador Carlos Wilson, aplaudo V. Exª pelo pronunciamento e me solidarizo com as suas idéias. Apenas acrescento um fato que tem me chamado a atenção nos últimos dias: quando se fala na extinção da Sudene, governadores, parlamentares, lideranças políticas de todos os partidos do Nordeste têm se mobilizado. Buscam juntar esforços para impedir essa extinção ou a transformação da Sudene em agência de desenvolvimento, o que não tem acontecido em relação à Sudam - aliás, já vitimada pelo Governo, está em fase de extinção, de transformação. Sudam e Sudene são irmãs gêmeas e, por isso, devem receber do Governo Federal a mesma atenção e o mesmo tratamento. Sou médico e vou fazer uma comparação bem fácil de se compreender: imaginem V. Exªs se um doente que sofre de um tumor grave precisasse ser morto para que se combatesse o tumor! Imaginem se a Medicina tratasse todos os pacientes desta forma, ou seja, em vez da cura da doença, a destruição de quem a tem. É o que está acontecendo com a Sudam. Se há corrupção na Sudam, o Governo deve investigar - e está fazendo isso - e punir os responsáveis, preservando a instituição. Nós, do Norte, vamos combater, sem dúvida alguma, com muita força e com muita determinação, qualquer discriminação com relação à Sudam e à Sudene. O tratamento tem que ser igualitário. O Ministro Fernando Bezerra, que é do Nordeste, deve estar numa situação muito difícil em função de pertencer àquela região. Por isso, deve ter dificuldade de dar à Sudene o mesmo tratamento que está sendo dado à Sudam. Não defendo que se nivele por baixo; não defendo que a Sudene seja extinta só porque essa medida já está sendo adotada contra a Sudam. Inclusive, é preciso rever o caso da Sudam, porque essas instituições têm que ter os mesmos parâmetros, as mesmas bases, a mesma sistemática de funcionamento; e a corrupção tem que ser punida com rigor, mas sem levar a óbito o paciente, que, no caso, é a Sudam. Solidarizo-me com V. Exª, mas peço que a Bancada do Norte, que os Governadores do Norte atentem para o problema. Aliás, nenhum governador do Norte manifestou-se até agora a esse respeito, e estou vendo que os próprios aliados no Nordeste do Presidente Fernando Henrique Cardoso têm debatido e contestado, com muita ênfase, a extinção da Sudene. No caso da Sudam, estão todos aceitando a situação passivamente. Concordo em que a corrupção deve ser expurgada, mas não concordo que a Sudam receba um tratamento diferente. Obrigado pelo aparte. Minha solidariedade a V. Exª.

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - V. Exª tem razão. Temos que expurgar a corrupção, temos que combatê-la com todo o rigor. Mas não é possível que, para combater a corrupção, tenhamos que acabar com as instituições. Temos que punir os responsáveis pela corrupção na Sudam, na Sudene, na Suframa e em todos os outros órgãos. Na verdade, o que não podemos é beneficiar a corrupção, porque, no momento em que se extingue uma instituição como essas que citamos, estamos premiando aqueles que, na verdade, não mereceram receber os incentivos daquelas instituições.

Agradeço a V. Exª pelo aparte.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Concedo, com muito prazer, um aparte ao Senador Antonio Carlos Valadares.

O Sr. Antonio Carlos Valadares (PSB - SE) - Senador Carlos Wilson, quero me somar a V. Exª nessa manifestação em favor da permanência e manutenção da Sudene. Efetivamente ela é uma instituição que prestou inestimáveis e relevantes serviços ao Nordeste do Brasil, quando Juscelino Kubitschek, dentro do espírito de visão de desenvolvimento que o caracterizava, criou essa agência. De lá para cá, ao lado da Chesf e do Banco do Nordeste do Brasil, como também ao lado do próprio Banco do Brasil, a Sudene empreendeu investimentos em todas as áreas, principalmente na agropecuária, na indústria e, como eu disse, prestou relevantes serviços ao nosso País e à nossa região, que adquiriu índices de crescimento louváveis, citados por V. Exª no seu discurso. Isso mostra que o esvaziamento de que a Sudene foi vítima nesses últimos anos foi decorrente do desconhecimento das estruturas econômica e social do Nordeste, do desinteresse das autoridades constituídas. Tanto isso é verdade que, nesta semana, o Presidente da República, o Dr. Fernando Henrique Cardoso, ao se despedir do Governador de Sergipe, em Aracaju, disse: “Quero agradecer ao povo do Recife a manifestação que acabo de receber”. Ora, o desconhecimento é total! A partir do próprio Presidente da República, quantos Ministros da Fazenda já foram às reuniões da Sudene? Pouquíssimos - acredito que não sabem nem onde fica a Sudene. Portanto, Senador Carlos Wilson, acho que não se trata da sua extinção, como asseverou V. Exª. Trata-se, sim, de se reestruturar a Sudene, de fortalecer a instituição, dando-lhe condições para que venha a funcionar a contento. Se há corrupção, vamos combater o mal pela raiz, ou seja, punir os culpados, e não punir o órgão, fechando a instituição, como se ela fosse a culpada. Ora, a instituição só tem vida, só funciona com pessoas físicas, que vão tomar conta daquele órgão. Se as pessoas não estão trabalhando adequadamente, que as tirem, mas que permaneça o órgão com pessoas competentes, honestas e criteriosas. É isso o que está faltando em nosso País. Se formos adotar a regra de extinguir o órgão onde exista corrupção, vamos acabar com a República do Brasil, porque existe corrupção na República brasileira. Vamos acabar, então, com a República? Não, de maneira nenhuma. Vamos acabar, sim, com os atos de corrupção que estão envergonhando este País. Agradeço a V. Exª.

O Sr. Geraldo Melo (PSDB - RN) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Ouço, com muito prazer, o Senador Geraldo Melo, ex-Governador do Estado do Rio Grande do Norte.

O Sr. Geraldo Melo (PSDB - RN) - Senador Carlos Wilson, muito obrigado pela oportunidade que me dá. Quero, antecipadamente, pedir desculpas por contribuir para prolongar o excesso de tempo que V. Exª adquire - já nos adverte disso o Presidente Edison Lobão -, fazendo um apelo a S. Exª que me dê oportunidade de fazer esta intervenção. Em primeiro lugar, parabenizo o Senador Carlos Wilson pela iniciativa de provocar um debate em torno deste tema. Na verdade, o Senado tem andado tão envolvido com questões pequenas, e até certo ponto terrivelmente constrangedoras, que nos esquecemos, ou não temos tido a oportunidade, de tratar dos assuntos que justificam a nossa presença aqui. Senador Carlos Wilson, a questão envolve dois aspectos: fala-se da Sudene misturando-se a idéia da instituição com notícias que andam por aí a respeito de corrupção, que é o assunto da moda, mas é preciso reconhecer - V. Exª mesmo enunciou no início do seu discurso uma série de dados sobre as transformações ocorridas no Nordeste depois da sua criação - que a história da Sudene é uma história de êxito, de sucesso e não de fracasso. A Sudene foi instituída quando o Nordeste era a maior região do mundo ocidental com renda per capita inferior a U$100. V. Exª acaba de nos mostrar de que tamanho foi a transformação que ocorreu naquela Região, tanto sob o ponto de vista do produto, quanto da renda individual dos nordestinos. Só se conseguiu isso porque a política seguida foi bem sucedida. A história da Sudene também não é de desperdício de recursos nacionais. Levantamentos citados por V. Exª, conduzidos pelo ex-Senador Beni Veras, hoje Vice-Governador do Ceará, demonstram que a Sudene, em trinta anos, recebeu de incentivos fiscais U$11 bilhões apenas. Esses recursos financiaram, por exemplo, o Pólo Petroquímico de Camaçari, que, sozinho, vale mais do que os US$11 bilhões que a Sudene recebeu em trinta anos; de maneira que todo o restante feito na Região já excede o sacrifício que o País fez para dotar a Sudene de recursos. A questão, agora, é que a concepção original da Sudene tem quarenta anos de idade, e é da própria natureza do planejamento a sua revisão. Quanto melhores forem os programas, maior será a sua capacidade de transformação da sociedade à qual se destinam. Essas transformações, por sua vez, realimentam a necessidade de revisão do próprio programa. Uma concepção que se fez há quarenta anos precisa ser atualizada. O que eu estranho é que, antes de definir a nova política a ser praticada no Nordeste, se decida que é preciso acabar com a Sudene e criar um outro órgão. O ideal é que se tivesse discutido a reformulação da política e a redefinição da ação do Estado brasileiro naquela Região. Uma vez feito isso, saberíamos se a instituição disponível é apropriada para executar o que é necessário, se deve ser reformulada, extinta, substituída por outra ou se não deve ser substituída por nada. Portanto, V. Exª abre um debate que permite a discussão de aspectos como esses que estou me atrevendo a levantar, de certa maneira sentindo-me provocado pela competente intervenção e manifestação de V. Exª. Quero parabenizá-lo pelo seu pronunciamento e agradecê-lo pela oportunidade que me deu.

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Agradeço a V. Exª, Senador Geraldo Melo. Quando lhe concedi o aparte, eu destacava a sua condição de ex-Governador do Estado do Rio Grande do Norte e também de um dos defensores da Sudene, mas, bem antes disso, V. Exª foi funcionário da empresa e talvez, mais do que ninguém nesta Casa, deva estar com o coração dolorido com as notícias, que todos os dias acompanhamos pelos jornais, de que querem jogar na Sudene responsabilidades que ela não tem.

A Sudene teve responsabilidade no desenvolvimento da Região, e hoje, quando se fala tanto na questão do desemprego, deve-se salientar que ela foi a maior geradora de emprego no Nordeste. Até 1992, quase cinco milhões de pessoas conseguiram acesso ao emprego e mais de duas mil e oitocentas indústrias foram instaladas no Nordeste graças ao apoio da Sudene. Então, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, não dá para entender que, agora, de maneira tão abrupta e violenta, fale-se na sua extinção.

Tenho um profundo apreço pelo Ministro Fernando Bezerra, nosso colega nesta Casa, mas não posso admitir que não se discuta de uma forma mais ampla a questão; S. Exª sabe que o Senador Geraldo Melo é um estudioso dos assuntos pertinentes à Sudene e que outros Senadores gostariam de dar alguma contribuição nesse sentido.

Não dá para pensar que por meio de uma medida provisória se extinga a Sudene, porque ela também tem sido palco de muitas promessas em campanha eleitoral. Lembro-me bem, na campanha de 1994, do hoje Presidente Fernando Henrique chegando ao Conselho da Sudene e prometendo o seu fortalecimento, dizendo que a instituição era indispensável e fundamental para o Nordeste. Fernando Henrique se elegeu Presidente naquele ano e voltou, em 1998, como candidato à reeleição, dizendo que não havia conseguido fazer tudo o que gostaria de ter feito pela Sudene, que devia muito àquele órgão, que o Nordeste devia muito à sua atuação, mas que, no segundo mandato, com certeza poderia ter uma ação mais fortalecedora com relação àquela instituição. No entanto, vejo exatamente o contrário.

Fico imaginando a posição do Presidente Fernando Henrique: Sua Excelência, que tanto prometeu o fortalecimento da Sudene, está lançando, hoje, um seminário de acompanhamento dos cem anos do saudoso Presidente Juscelino Kubitschek e tenta se aproximar da sua imagem desenvolvimentista, pois foi o Presidente Juscelino quem criou a Sudene, juntamente com Celso Furtado, outro grande nordestino.

O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão) - Senador Carlos Wilson, perdoe-me por interrompê-lo. Reconheço a importância do tema em debate, mas a Presidência solicita a V. Exª que conclua o seu discurso, pois já ultrapassou alguns minutos de seu tempo.

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Vou concluir, Sr. Presidente.

Juscelino criou a Sudene, tendo ao seu lado Celso Furtado, Rômulo Almeida e outros tantos nordestinos importantes. Será que o Presidente Fernando Henrique vai querer passar para a História como o coveiro do Nordeste, aquele que enterrou a Sudene? Espero que não, Sr. Presidente, porque esse órgão é da maior importância para a nossa Região. Espero, também, que o Presidente da República se preocupe em preservar pelo menos um pouco da sua biografia!

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Antes de concluir, Sr. Presidente, solicito a tolerância de V. Exª para ouvir o rápido aparte do Líder do Bloco, Senador José Eduardo Dutra.

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - Muito obrigado, Senador Carlos Wilson. Eu até acredito na necessidade de se fazer uma reestruturação na Sudene, pois o modelo no qual ela foi gestada, há algumas décadas, necessitaria de modificações. Na verdade, o que está por trás dessa tentativa é a velha lógica liberal de achar que a simples mão invisível do mercado vai resolver os problemas das desigualdades regionais no nosso País. Não seria necessário nem Sudene, nem renúncia fiscal, se houvesse uma política de desenvolvimento regional estabelecida no próprio Orçamento que contribuísse para a eliminação dessas desigualdades. Como ela não existe, são necessários outros instrumentos. O que eu lamento é que todas as vezes que se levanta a discussão sobre a Sudene ou sobre a Sudam alguns setores sempre estabelecem a sua análise com uma profunda carga de preconceito, culpando o pessoal do Nordeste, que é um saco sem fundo de dinheiro, renúncia fiscal, quando dados mostram que a grande renúncia fiscal, no Brasil, não está no Nordeste nem no Norte, e sim na Região Sudeste; inclusive V. Exª fez referência a isso em pronunciamento anterior. Portanto, o que se está discutindo, e que tem que ficar claro, particularmente para os Senadores das Regiões Norte e Nordeste, é que a continuidade desse modelo de desenvolvimento acirra essas desigualdades. Portanto, além de termos esse modelo que acirra as desigualdades, ainda querem extinguir os instrumentos que, pelo menos, serviam para amainar esse problema. Creio que a matéria merece todo o repúdio daqueles que querem um Brasil desenvolvido e sem tantas desigualdades regionais e sociais. Por isso, solidarizo-me com o discurso de V. Exª.

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Muito obrigado, Senador José Eduardo Dutra. O aparte de V. Exª enriquece o nosso pronunciamento.

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Sr. Presidente, peço, mais uma vez, a tolerância de V. Exª para ouvirmos o aparte do Senador José Alencar, tendo em vista ser S. Exª profundo conhecedor das atividades e da importância da Sudene para Minas Gerais, notadamente para a região do norte mineiro, a mais pobre do Estado.

Ouço, com muita honra, o aparte do Senador José Alencar.

O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão) - Não tenho dúvida de que o Senador José Alencar tem muito a contribuir com esse debate, mas peço a S. Exª que seja breve.

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Nobre Senador Carlos Wilson, tanto V. Exª como o nosso Presidente foram Governadores de Estados inseridos na área da Sudene, portanto, conhecem bem a instituição. Hoje, em Brasília, houve uma manifestação dando início às comemorações do centenário de um grande brasileiro, o Presidente Juscelino Kubitschek. Juscelino, que conhecia muito bem o Brasil, resolveu dar um tratamento diferenciado de incentivo - não de subsídio -, de estímulo para o desenvolvimento de uma área desfavorecida, o Nordeste, criando a Sudene. Para isso, ele foi buscar a contribuição de um outro grande brasileiro. Refiro-me ao economista, de renome mundial, Dr. Celso Furtado. A Sudene foi muito bem concebida e destinava recursos de incentivos fiscais à opção da pessoa jurídica que iria recolhê-los. E, parcela desses recursos recolhidos do Imposto de Renda era destinada à Sudene. Esses recursos eram depositados no Banco do Nordeste e ficavam à ordem da Sudene. Porém, aquela empresa, aquela pessoa jurídica que havia optado em favor de um determinado projeto o fazia numa compra direta de ações daquela companhia. Depois veio o instituto do Finor, causando algumas modificações e, hoje, outras modificações também já ocorreram. Então, a Sudene vem sofrendo algumas alterações durante a sua história. Há determinados momentos em que, no Brasil, coisas que são feitas tendo em vista estudos acurados e por gente responsável vão sendo mutiladas. O mesmo aconteceu com o Sistema Tributário brasileiro. Houve uma reforma tributária muito bem concebida, à qual acabou com os impostos em cascata e resolveu o problema - Emenda Constitucional nº 18/65, se não me engano. Pois bem, o sistema foi sendo mutilado e acabou se transformando num verdadeiro cipoal burocrático. Assim aconteceu com a Sudene. O Nordeste não pode, de forma alguma, se esquecer de que há uma configuração de antes e depois da Sudene. Quem conheceu bem o Nordeste antes da Sudene sabe que havia um êxodo absolutamente impossível de ser contido, de pessoas que demandavam, naquele tempo, o Sudeste em busca de uma oportunidade de trabalho. A Sudene ofereceu essa oportunidade em todo o Nordeste, inclusive em uma área de 140 mil quilômetros quadrados no norte de Minas, o meu Estado. Essa área, hoje, foi estendida ao Vale do Jequitinhonha por um projeto de minha antecessora, representante de Minas, a eminente Senadora Júnia Marise. Nós, em Minas, sabemos o que foi a Sudene. Hoje, reconhecemos que os recursos da Sudene, provavelmente devessem ser direcionados para obras sociais e também de infra-estrutura, como, por exemplo: saneamento, eletrificação, irrigação, esta tão necessária à região. Parabéns pelo lúcido pronunciamento de V.Exª.

O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão) - (Fazendo soar a campainha.)

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Estou terminando, Sr. Presidente.

Então, há muito o que fazer com esses recursos em uma região que precisa de um tratamento diferenciado. A estrutura da Sudene pode, realmente - como falou muito bem V. Exª e o ilustre Senador do Rio Grande do Norte, Geraldo Melo -, estar a pedir novas mudanças, reestruturação, mas não a sua extinção. Sou admirador do Senador Fernando Bezerra e o respeito muito por ser S. Exª também um homem da área, e creio que S. Exª irá compreender-me. Se me permite V. Exª - não assisti ao início do discurso de V. Exª -, farei uma sugestão - provavelmente ela até já tenha sido feita - para que nós possamos convidá-lo para trocarmos idéias, para debatermos o assunto, e para que S. Exª nos dissesse quais os objetivos, inclusive para que possamos conhecê-los. Sr. Presidente, todos nós precisamos conhecer pormenorizadamente o que se deseja fazer com a Sudene que tantos benefícios tem levado a todo o Nordeste brasileiro.

O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE) - Sr. Presidente, fiz questão de receber o aparte do Senador José Alencar, porque S. Exª demonstra profundo conhecimento em relação à Sudene. Além de ser um dos empresários mais importantes do País, S. Exª sabe da importância daquela instituição para a Região Nordeste e para o norte do Estado de Minas Gerais, e hoje estendendo-se para o Vale do Jequitinhonha.

Nobre Senador José Alencar, no início do meu discurso, eu ressaltava a minha estranheza em relação a notícias a respeito da extinção da Sudene veiculadas na imprensa, cuja autoria era sempre atribuída ao Senador Fernando Bezerra.

Sr. Presidente, ao encerrar o meu pronunciamento, faço um apelo ao Senador Fernando Bezerra - que é um democrata, um homem sensível, um homem extremamente talentoso e que conhece bem a nossa região - para que, antes de pensar em extinguir a Sudene, S. Exª venha a esta Casa conversar conosco.

Hoje, em Recife, reuniram-se todos os Governadores do Nordeste. Não sei o resultado dessa reunião. Mas espero que S. Exas tenham tomado a iniciativa de demover o Senador Fernando Bezerra de ser o autor da medida provisória que visa extinguir a Sudene.

            Sr. Presidente, mais uma vez, agradeço a tolerância de V. Exª.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/03/2001 - Página 3568