Discurso durante a 17ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSTERNAÇÃO DE S.EXA. COM O AFUNDAMENTO DA PLATAFORMA DA PETROBRAS NA BACIA DE CAMPOS. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE ARGENTINA. (COMO LIDER)

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA. DIVIDA EXTERNA.:
  • CONSTERNAÇÃO DE S.EXA. COM O AFUNDAMENTO DA PLATAFORMA DA PETROBRAS NA BACIA DE CAMPOS. CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE ARGENTINA. (COMO LIDER)
Aparteantes
Alberto Silva, José Alencar, José Eduardo Dutra, Ney Suassuna.
Publicação
Publicação no DSF de 21/03/2001 - Página 3619
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA. DIVIDA EXTERNA.
Indexação
  • GRAVIDADE, DESASTRE, PLATAFORMA CONTINENTAL, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REGISTRO, UNIÃO, POPULAÇÃO, RECUPERAÇÃO, REFORÇO, EMPRESA ESTATAL, OPOSIÇÃO, PRIVATIZAÇÃO, TERCEIRIZAÇÃO.
  • CRITICA, DISCURSO, JOSE ROBERTO ARRUDA, SENADOR, ASSUNTO, CRISE, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, CONVOCAÇÃO, UNIDADE, APOIO, GOVERNO.
  • ANALISE, DIVIDA PUBLICA, PAIS, AMERICA DO SUL, OBEDIENCIA, FUNDO MONETARIO INTERNACIONAL (FMI), PREJUIZO, POPULAÇÃO, CRITICA, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA. Como Líder. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, na verdade o tema que pretendo tratar coincide com os já tratados pelo Líder do Governo, nesta Casa, Senador José Roberto Arruda.

Toda a Nação brasileira está consternada. Como disse, e muito bem, o Senador Lúdio Coelho, quando aquela plataforma afundou, era como se afundasse um irmão brasileiro. A Globo News transmitiu ininterruptamente aqueles fatos fazendo entrevistas com autoridades, com pessoas que conhecem a matéria, enquanto filmava aquele trágico acidente. Vimos um quadro comovente: funcionários da Petrobras vestidos naquele macacão laranja, com o belo símbolo que bem representa o Brasil, BR, chorando convulsivamente, lamentando o afundamento daquela plataforma numa demonstração de amor por uma empresa que é sua, por uma empresa que tem história, por uma empresa que traz orgulho a todo o povo brasileiro.

Citava-se ainda, naquela entrevista, a morte de dez trabalhadores, os quais não morreram no instante da primeira explosão. Ao que se sabe, eles morreram num esforço heróico de tentar salvar a plataforma. Em vez de fugir, eles foram para onde aconteceu o acidente, tentando diminuir as dificuldades para salvar aquele imenso investimento dessa grande empresa que tem história e que tem, sem sombra de dúvida, o amor de todos os brasileiros. Morreram heroicamente, morreram lutando para salvar um patrimônio que eles entendem ser não só deles, mas de todo o povo. Não sei se a Senadora Heloísa Helena teve oportunidade de ver o choro daquele petroleiro, que comoveu a todos nós.

Realmente, num momento como esse, podemos pensar em unidade, sim, em unidade do povo brasileiro, para dizer o que se pode fazer, não para condenar - embora seja evidente que, se alguém cometeu erros, deve pagar por eles -, mas para dizer como recuperar a Petrobras, como fazê-la passar por cima dessa enorme dificuldade, como vamos levantá-la, como vamos fazê-la crescer, como vamos fazer com que o povo brasileiro cada vez mais se orgulhe dela.

A Petrobras não foi privatizada ainda porque tem história, tem passado e representa um marco na mudança do Brasil. Foi uma conquista e uma luta do povo brasileiro, dos universitários nas ruas, dos trabalhadores na rua clamando: “O Petróleo é nosso!”, ainda no início da década de 1950. Portanto, ela é uma empresa que todos prezamos; é uma empresa de que todos nos orgulhamos. É uma empresa que detém o primeiro lugar, em todo o planeta. em termos de tecnologia de exploração em águas profundas. E é uma empresa sobre a qual, longe de o povo brasileiro agora se colocar contra ela - ou pensar não sei que pensamentos num momento como esse -, nós brasileiros devemos nos inteirar, apoiando essa empresa, apoiando os seus funcionários, ou, quem sabe, mudando a sua política. Temos, ainda, de lamentar a atitude do seu Presidente, cuja idéia me pareceu extremamente inoportuna - esdrúxula, aliás -, qual seja, a de transformar esse nome digno, antigo, estimado pelo povo brasileiro, de Petrobras para “Petrobrax”. Felizmente, a opinião pública nacional reagiu contra isso, e o Presidente da República mandou que se abandonasse essa idéia maluca, retirando-a da pauta dos seus trabalhos - com essa mudança se iria gastar algo próximo de R$50 milhões.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, entendo que, neste momento, o povo brasileiro deveria unir-se para encontrar uma saída. Quem sabe se nós, políticos, trabalhadores, consumidores de uma maneira geral - não sei se essa seria a forma mais correta -, passássemos a prestigiar os postos de gasolina da Petrobras e começássemos a discutir uma forma de fortalecer aquela empresa genuinamente brasileira, que nasceu da luta do povo. E, ao invés de termos medo, poderíamos unir-nos e solidarizar-nos, dando-nos as mãos para que essa empresa se torne, a cada dia, mais forte, transformando-se num símbolo daquilo que o povo brasileiro quer que seja efetivamente seu.

Não queremos que aconteça com a Petrobras o que aconteceu com a Companhia Vale do Rio Doce, com a Companhia Siderúrgica Nacional, com a Usiminas e com tantas outras empresas que foram dadas de graça ao capital internacional e que perderam aquela beleza de ser parte do povo brasileiro e de pertencer à Nação.

O Sr. Alberto Silva (PMDB - PI) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Alberto Silva (PMDB - PI) - Meu caro Senador Ademir Andrade, estou ouvindo com atenção as palavras de V. Exª que conclamam o povo brasileiro para se unir nessa hora e apoiar a Petrobras. V. Exª traz a esta Casa uma proposta, secundando o que falou anteriormente o Líder José Roberto Arruda, que pediu a nossa união em favor dos temas brasileiros, entre eles o da Petrobras. Como estou na política há bem mais tempo, tendo sido eleito por duas vezes nesta Casa, quero cumprimentar V. Exª, um dos jovens Representantes do povo, pela oportunidade do discurso de V. Exª. Ajudemos a Petrobras nesta Casa com a criação de condições possíveis e prováveis. Hoje presidi a reunião da Comissão de Infra-Estrutura já nos últimos dias do nosso mandato. Por solicitação do Senador Geraldo Cândido, reunimos a Comissão e lá estavam presentes representantes de todos os Partidos. Então, solicitamos, por unanimidade de votação, num ofício dirigido ao Presidente da Petrobras e ao Presidente da Agência Nacional do Petróleo (ANP), também a representantes de outras entidades que trabalham com a Petrobras, a presença de todos eles a esta Casa. Agora, por decisão do nosso Presidente, Jader Barbalho, esta sessão plenária está sendo colocada não como uma sessão comum, mas como uma sessão em que a Comissão de Infra-Estrutura e as outras poderão interrogar ou aclarar as razões pelas quais essa plataforma afundou, levando de cada um de nós um pedaço do nosso amor pela Petrobras. Quero parabenizar V. Exª, estou nesta Casa pela segunda vez e estou inteiramente de acordo com a proposta de V. Exª: vamos unir os nossos esforços ao do povo brasileiro, num apelo nosso, que somos seus representantes. Aqui nesta Casa, unamo-nos em favor dos temas brasileiros. Parabéns a V. Exª.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Obrigado, Senador.

Quero dizer que, muito antes de julgarmos se uma empresa estatal é ruim ou deficitária - e entendo que a Petrobras tem dado demonstrações de lucratividade em períodos consecutivos, apesar das mudanças políticas nela implementadas -, devemos considerar que, há vinte anos, a empresa tinha mais de 70 mil funcionários do seu próprio quadro. Atualmente, ela tem menos da metade desses funcionários. A maior parte das atividades foi terceirizada, passando para outras companhias em um processo de pagamento por administração. Talvez esses erros, talvez esses tipos de atitude, a venda recente de grande parte das ações que o Governo detinha; talvez esse tipo de atitude permita que esses incidentes mais recentes com a Petrobras aconteçam.

O nosso desejo é o de que a Petrobras volte a ser o que era antes: uma empresa inteiramente nacional, com um quadro efetivo de funcionários próprios, porque, se terceiros podem pagar, não há porque a própria Petrobras não possa fazê-lo. O Brasil tem um grande futuro nessa área e devemos todos nos preocupar, neste momento, em compreender a importância da manutenção dessa empresa como uma empresa do Estado e do povo brasileiro.

Ouço o nobre Senador Ney Suassuna, que está solicitando o aparte.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Nobre Senador Ademir Andrade, parabenizando V. Exª por fazer essa conclamação, quero acrescentar mais uma faceta, mais uma vertente nessa discussão. A Petrobras não é importante só porque é a produtora, a refinadora e a distribuidora de gasolina, de óleo diesel e de outros derivados de petróleo; ela é também um braço muito importante no comércio exterior. Toda vez que compramos - e ainda compramos muito petróleo - temos a oportunidade de colocar produtos lá fora. Lamentavelmente, isso não tem ocorrido como deveria ser. Este é um aspecto da Petrobras que deixou de ser considerado nesses últimos tempos. Deixamos de fazer essa troca e, por exemplo, passamos a comprar petróleo da Inglaterra por meio de agentes ao invés de comprarmos diretamente dos países, quando tínhamos essa oportunidade de fazer o intercâmbio. E esse é um aspecto que eu gostaria de ver corrigido. Concordo com V. Exª que alguma coisa está acontecendo de errado e que temos obrigação, como representantes do povo, de procurar saber o que é. Um acidente, vá lá. Dois acidentes... Mas são seguidos os acidentes que estão ocorrendo. Alguma coisa não está indo bem, porque essa coincidência não é um acaso. É preciso que façamos essa análise e todos nós, que temos interesse em que a Petrobras fique forte, firme e, inclusive, sendo um braço importante na economia, nessa troca internacional, que tenhamos essa oportunidade. Eu me solidarizo com o discurso de V. Exª e queria acrescentar também essa faceta, da importância da Petrobras no balanço do pagamento brasileiro, da possibilidade de fazer esse intercâmbio. Só para encerrar, quero dizer a V. Exª que, por exemplo, compramos um bilhão de dólares da Argélia e vendemos quarenta, porque fizemos por terceiros. Por que razão? Tínhamos que estar fazendo o que fazíamos antigamente, quando comprávamos e vendíamos. Isso era muito melhor para os trabalhadores brasileiros, que tinham emprego aqui, produzindo os produtos que saíam para o exterior. Parabéns, Exª!

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Agradeço a V. Exª.

Agora eu queria fazer uma referência à parte do discurso do Senador José Roberto Arruda, quando S. Exª trata da questão argentina e quando trata da nossa questão específica. No caso - e peço desculpas por dizê-lo na ausência do Senador -, o seu discurso beira um pouco a demagogia, a falta total de lógica. Digo isso porque a Argentina já fez, muito antes do Brasil, tudo o que estamos fazendo. A Argentina seguiu à risca as orientações dos países desenvolvidos do Primeiro Mundo, dadas pelo Fundo Monetário Internacional, que hipoteticamente existe para socorrer as nações em dificuldade, mas na verdade é um agente a serviço dos interesse das nações desenvolvidas do Primeiro Mundo. A Argentina fez aquilo que o Brasil está fazendo: privatizou quase todo o seu patrimônio, atendeu a todas as orientações no que diz respeito à sua política econômica, e ambos os países vivem eternamente atolados em dívidas astronômicas.

É interessante observar, Senador Lauro Campos - e V. Exª pode-me corrigir porque é um expert no assunto -, que, nas décadas dos 60 e 70, praticamente todos os países do continente sul-americano - Uruguai, Bolívia, Paraguai, Chile, Argentina, Brasil - entraram em regimes de ditaduras militares. E aí, o que aconteceu? Nesses períodos de ditaduras militares, tais países ganharam dívidas astronômicas. O Brasil, ao que se sabe, no início de 64 devia US$2 bilhões e passou, ao fim da ditadura, em 85, a uma dívida de US$70 bilhões. Isso aconteceu com todos os países, ou seja, o poder dos países desenvolvidos impôs a sua vontade, estabeleceu ditaduras militares, durante décadas, no continente sul-americano, criou dívidas astronômicas, prendeu esses países pela economia, pela dívida, e aí liberou o poder político. A liberação, a democracia, a eleição de presidentes vieram, acabaram-se as ditaduras militares. Todavia, a ditadura econômica já estava estabelecida. Os governos já estavam presos por uma dívida impagável, e em função dessa dívida, que se constituiu como uma armadilha ao longo de vinte anos, poderiam nossos países deter o poder político, mas não as decisões econômicas.

O que ocorre hoje para que o Senador José Roberto Arruda venha à tribuna - ou S. Exª é inocente ou faz demagogia - e mencione uma proposta de saída de unidade, sabendo o que o Governo dele está fazendo? Há um sacrifício generalizado do povo brasileiro, do povo sul-americano. Não possuo dados da Argentina nem de outros países, mas o Brasil, no ano de 2000, alcançou um superávit primário de R$38,5 bilhões, o que significa que o Governo brasileiro arrecadou da sociedade R$38,5 bilhões a mais do que gastou. E para onde foi essa quantia, Senador José Alencar? Destinou-se ao pagamento dos R$87,5 da dívida do ano passado. De R$87,5 para R$38,5 ainda restam R$39 bilhões que se acresceram à dívida interna, que não diminui nunca, só cresce. O Governo Fernando Henrique Cardoso, em seis anos, aumentou a dívida de R$60 bilhões para R$560 bilhões. Aonde vamos parar com uma situação dessas, quando estamos prevendo no Orçamento do ano de 2001 um gasto de R$140 bilhões de serviço da dívida? Cinicamente, fala-se aqui em unidade, em entendimento, e com esse tipo de posicionamento. Eu penso que o Brasil não pode e não deve continuar aceitando este tipo de situação: tirar do que é arrecadado do povo para pagar pessoas que vivem da especulação e de aplicação financeira. Na verdade, o dinheiro dessa dívida do Governo é tirado das elites nas aplicações financeiras, porque os bancos tomam do povo e o Governo toma do banco, pagando um juro, evidentemente, muito maior.

O Brasil ainda está pagando 15,5% de juro ao ano, mas já chegou a pagar 49,5% ao ano. É o maior juro do planeta. E como é que se quer falar em unidade numa situação de gravidade como essa?

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Senador Ademir Andrade, permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Ouço V. Exª, Senador José Alencar.

O Sr. José Alencar (PMDB - MG) - Nobre Senador Ademir Andrade, estou ouvindo o pronunciamento de V. Exª com a devida atenção, porque V. Exª, sempre que vai à tribuna, aborda esse tema da economia com muita judiciosidade. De fato, nós estamos vendo, nos últimos anos, a nossa dívida quintuplicar, ainda que tenhamos feito o maior processo de privatização, vendendo praticamente quase tudo o que havia sido feito na área, por exemplo, da telefonia, da siderurgia, da petroquímica, enfim, em quase todos os setores que foram objeto de construção daquela dívida legada pelo regime militar, segundo dados que V. Exª trouxe, de cerca de US$80 bilhões. Temos que reconhecer, todavia, ainda que condenemos o regime de exceção, que aquele foi período em que foram realizadas grandes obras no setor de telefonia, na construção de hidrelétricas, estradas, gerando um acúmulo de dívidas. Agora, vendemos tudo aquilo que foi feito. Portanto, teríamos que recolher de volta aqueles recursos e ter pago a dívida por inteiro. No entanto, não pagamos. Ao contrário, nós a quintuplicamos. E mais: naquela época, a carga tributária girava em torno de 22% do PIB; hoje, é 50% superior. Senador Ademir Andrade, pedi um aparte a V. Exª, primeiro, porque V. Exª me disse que o superávit primário hoje é de R$38,5 bilhões, ou seja, cerca de 4% do PIB. V. Exª perguntou-me para onde teriam ido parar esses R$38 bilhões, como se eu fosse responsável por eles. Então, eu não poderia deixar de pedir um aparte a V. Exª por essa citação e quase uma acusação. Há pouco tempo, foi publicada pela imprensa uma acusação de que as minhas empresas haviam se valido de benefícios escusos da Sudene e do Finor. Essa notícia teria sido liberada pelo Deputado José Pimentel, vice-presidente de uma CPI do Finor que se acha instalada na Câmara dos Deputados. Pedi a essa CPI que me convocasse na condição de investigado. Ainda hoje, tive um encontro com o eminente Senador José Eduardo Dutra, a quem pedi - e prontamente fui atendido - que entrasse em contato com o Deputado José Pimentel, seu colega de Partido, a quem dirigi aquela correspondência. Segundo o jornal, as informações teriam sido dadas por S. Exª. Até hoje não recebi resposta. Porém, agora, o Deputado José Pimentel prometeu, por telefone, que serei convocado pela CPI para ser investigado. Quero ser convocado não com privilégios de senador, mas para ser investigado como cidadão comum. E se houver alguma verdade a respeito das acusações noticiadas pela imprensa, renuncio o mandato. Então, como V. Exª questiona onde estão os R$38 bilhões, será possível que até os recursos de superávit fiscal primário obtidos nesse gigantesco sacrifício a que fomos submetidos vão ser também imputados ao Senador José Alencar? Pelo amor de Deus! Fora isso, quero levar minha palavra de congratulações pela forma como V. Exª, sempre, judiciosamente, aborda os assuntos ligados à economia brasileira.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Agradeço, Senador José Alencar. Longe de mim, em qualquer hipótese, pensar em qualquer tipo de acusação a V. Exª. Eu me dirigi como uma cortesia, com educação, pela admiração que tenho por V. Exª por ser um debatedor nessa área e por estar sempre presente às sessões. Por isso, fiz essa referência; acho que se enriquece o debate quando citamos o nome de pessoas ilustres como V. Exª, como o Senador Lauro Campos e outros.

De forma, Sr. Presidente, que encerro a minha manifestação, dizendo que o Brasil está vivendo uma situação extremamente difícil, insustentável. O Brasil tem a vantagem, diferentemente da Argentina, de ser um País potencialmente muito mais rico, muito mais poderoso, com uma costa fantástica, uma riqueza mineral inigualável, com uma extensão territorial que é a quinta do mundo, a segunda em área agricultável, com uma população de 169 milhões de habitantes. Então, as condições físicas, históricas e do povo do Brasil são, evidentemente, muito melhores. Mas o Brasil está, economicamente, quase numa situação de bancarrota, quase numa situação tão ou mais grave do que a da própria Argentina. Não sei quanto a Argentina está devendo, mas sei quanto nós estamos devendo. Sei que não temos a menor condição de pagar o que estamos devendo, porque o Presidente Fernando Henrique fez a opção de, ao cumprir os compromissos externos, trocar a dívida interna pela externa, já que na economia de Sua Excelência não houve superávit comercial, a nossa balança comercial está praticamente estagnada há seis anos, sempre com pequenos déficit, mas sempre com déficit. Faltaram dólares para pagar os compromissos externos.

Então, o Senhor Fernando Henrique e o Sr. Malan acharam uma outra saída para arrumar dólares para pagar os compromissos externos. E qual é? A aplicação no sistema financeiro, trazer capital externo para aplicar no sistema financeiro, ganhando esses juros astronômicos. E foi isso que fez a nossa dívida crescer de R$60 bilhões para R$540 bilhões; foi isso que fez com que tudo que vendemos fosse jogado fora, porque não serviu para absolutamente nada. Não diminuiu o pagamento da dívida. Muito pelo contrário, essa dívida cresce a cada dia, e o balanço resumido da história do ano passado é que pagamos R$87,5 bilhões de juros. Pagamos! Efetivamente, tiramos do bolso e pagamos. Desses R$87,5 bilhões, R$38,5 bilhões foram tirados do povo brasileiro, e os R$39 bilhões restantes foram acrescidos à dívida. Portanto, vamos passar a pagar mais juros. Tudo o que vendemos não serviu para absolutamente nada.

Então, querer mudar, com a continuidade dessa situação, é absolutamente impossível e impraticável. O Brasil tem de tomar uma posição séria com relação à sua dívida. Com relação a essa questão de falar em moratória, de temer moratória, de temer renegociação, de temer retaliação, de ter títulos desacreditados no mundo, devemos levar em consideração que o Brasil tem um grande potencial, que o Brasil tem hoje, em seu território, multinacionais do mundo inteiro, inclusive empresas estatais que compraram os nossos sistemas de telecomunicações, que não servem para o Brasil, mas servem para a Espanha, Portugal, França e outros países do mundo. Então, quem pode pressionar um País onde existe tanto investimento internacional, onde existe tanto capital internacional empregado?

Temos condições de ter mais autonomia, de gerir essa dificuldade que temos, com autonomia, com coragem. E é isso o que lamentavelmente falta ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, ao Governo brasileiro.

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Ouço o Senador José Eduardo Dutra, com alegria.

O Sr. José Eduardo Dutra (Bloco/PT - SE) - Senador Ademir Andrade, infelizmente estamos presenciando aqui como que as Lideranças do Governo e a base governista entendem o debate democrático. Quer dizer, vem o Líder do Governo, faz o seu discurso e é aparteado pela Oposição. Aceitamos o debate político. V. Exª, como Líder do PSB, se inscreve para continuar o debate proposto, e o que vemos é este plenário esvaziado. Eu até havia me inscrito para falar como Líder, após V. Exª, mas vou retirar a minha inscrição, e vou aproveitar apenas o aparte para fazer um rápido comentário. Não aceitamos mais essa chantagem, feita particularmente pelo Ministro Pedro Malan, de que todas as vezes em que surgem crises - e essas crises afetam mais o Brasil exatamente pelo sistema de dependência que estamos tendo em função da política econômica do Ministro Pedro Malan -, aí eles vêm com o velho discurso da união nacional. No entanto, não é a união nacional em torno de uma proposta realmente nacional, de uma proposta que tenha a participação de todas as forças políticas. Eles querem a união nacional em torno deles, em torno da política deles. E não é a primeira vez que vêm com essa chantagem. Isso é feito nas eleições, da seguinte forma: “Olha, a Oposição tem de dizer o que vai fazer”, como se estivessem estabelecendo uma obrigação de que o povo pode mudar, o Presidente da República pode mudar, o Governador pode mudar, desde que esse Presidente aplique a mesma política econômica que vem sendo aplicada, porque, fora disso, é o caos. Então, eles sempre vêm sempre com esse tipo de discurso, que tem de ser repudiado por todos os democratas, porque a questão, nesse caso, é tentar estabelecer uma prioridade ou uma unanimidade em torno de uma política que tem contribuído para manter o Brasil no estado em que se encontra.

Uma outra questão que quero registrar é que o Senador José Roberto Arruda, mais uma vez, utilizou uma expressão empregada na nota assinada por todos os Líderes da Base Governista sobre a instalação de CPI, que diz o seguinte: “Somos a favor de investigação, mas através das estruturas normais do sistema democrático.” Até parece que Comissão Parlamentar de Inquérito não é uma estrutura normal do sistema democrático. Não sei o que eles entendem, então, por estrutura normal do sistema democrático. E vêm, para tentar estabelecer um contraponto com uma falácia, tentando fazer uma comparação com a situação que estamos propondo apurar aqui, com a questão da CPI do Lixo em São Paulo, que já respondida pelo Senador Eduardo Suplicy. Até porque a CPI do Lixo em São Paulo não vai ser para investigar a administração do PT, mas os contratos espúrios feitos pelo Sr. Celso Pitta, que teve o beneplácito desta Casa, da maioria, quando veio renegociar a dívida de São Paulo, que fez parte, juntamente com o Sr. Paulo Maluf, do acordo para viabilizar a reeleição do Senhor Fernando Henrique Cardoso. Então, é isso que está sendo investigado e que será investigado no devido momento, até porque, como também já disse o Senador Eduardo Suplicy, a própria Bancada do PSDB entendeu que era prioritária uma outra CPI, e não essa. Então, não foi nenhuma responsabilidade do PT. Então, é falsa aquela conclusão, dita pelo Senador José Roberto Arruda, de que somos a favor da CPI quando não é contra nós. Não, somos a favor da CPI em qualquer circunstância. Queremos, seja na administração do PT, em nível estadual, municipal ou federal, no futuro, que tudo aquilo que venha a ser objeto de denúncia venha a ser investigado pelo Congresso Nacional, porque o Congresso Nacional e a CPI são, sim, estruturas normais do sistema democrático. Quem entendia o contrário era a ditadura militar. Muito obrigado.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Tem V. Exª toda a razão.

Concluo o meu pronunciamento, chamando a atenção para o “pacote” que o ex-Ministro da Argentina tentou implementar. O que era o “pacote”? Era a redução dos gastos nas universidades públicas, era a redução do salário dos aposentados, era a redução dos salários dos funcionários públicos, enfim, tudo aquilo que diminui o direito da população, tudo aquilo que o Brasil vem fazendo ao longo do tempo. Pode-se acabar com tudo. As universidades brasileiras estão passando momentos de extrema dificuldade, os centros de pesquisa, nem se fala. Eu, inclusive, pretendia falar sobre a situação do Museu Emilio Goeldi, no Pará, que vou deixar para amanhã. Mas a política é sempre essa, a de se reduzir gastos que são fundamentais para o desenvolvimento de uma nação em contrapartida para fazer o quê? Para continuar servindo aos interesses dos chamados países desenvolvidos do Primeiro Mundo, para continuar pagando banqueiros nacionais e banqueiros internacionais, para continuar privilegiando pessoas até mesmo de classe média alta que vivem da especulação financeira, com seus dinheiros depositados em banco, que não produzem coisa alguma.

É esta a política do Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso: uma política de tirar o sangue do povo brasileiro. É essa a expressão que temos de usar, quando um Governo arrecada R$38,5 bilhões a mais do que gasta, ultrapassando a meta estabelecida pelo Fundo Monetário Internacional, que era de R$32 bilhões. O Fundo Monetário determinou que o Governo arrecadasse R$32 bilhões a mais do que vai gastar, para pagar uma parte dos juros da sua dívida. Aí, o Brasil bonzinho, o Sr. Fernando Henrique Cardoso ótimo resolve: “não, vamos passar disso; vamos arrecadar R$38,5 bilhões”. Tira-se recurso proveniente de impostos do povo brasileiro e não o aplica em benefício da população, mas utiliza-se esse dinheiro para pagar a especulação financeira e a dívida impagável. Não há, no mundo, uma forma de pagá-la, senão rediscutirmos a questão. Não existe nenhuma possibilidade, dentro do orçamento público e da arrecadação brasileira, de estancar essa dívida, de paralisá-la, de pensar na hipótese de diminuí-la. Não existe possibilidade nenhuma, nem vendendo tudo que o Brasil possui! Não existe possibilidade de estancar essa dívida.

Portanto, é preciso rediscuti-la, repensá-la, renegociá-la - se não quiserem falar em moratória -, mas não podemos continuar vivendo a situação em que estamos hoje.

Vamos, Sr. Presidente, continuar esse debate. Esperamos que o povo brasileiro compreenda e participe da luta junto conosco e ajude a transformar o Brasil no País que ele realmente precisa ser, porque é uma Nação que tem potencial para dar ao seu povo uma vida digna e feliz.

Obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/03/2001 - Página 3619