Discurso durante a 20ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

EXCELENCIA DO MUSEU PARAENSE EMILIO GOELDI, PATRIMONIO CULTURAL DO PARA E DA AMAZONIA, E DA NECESSIDADE DE APOIO GOVERNAMENTAL PARA A CONTINUIDADE DOS TRABALHOS.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.:
  • EXCELENCIA DO MUSEU PARAENSE EMILIO GOELDI, PATRIMONIO CULTURAL DO PARA E DA AMAZONIA, E DA NECESSIDADE DE APOIO GOVERNAMENTAL PARA A CONTINUIDADE DOS TRABALHOS.
Publicação
Publicação no DSF de 24/03/2001 - Página 3931
Assunto
Outros > POLITICA CIENTIFICA E TECNOLOGICA.
Indexação
  • ELOGIO, TRABALHO, MUSEU, ESTADO DO PARA (PA), PESQUISA, CULTURA, RECURSOS NATURAIS, REGIÃO AMAZONICA, AREA, ECOLOGIA, ZOOLOGIA, BOTANICA, CIENCIAS HUMANAS.
  • GRAVIDADE, FALTA, INVESTIMENTO, PESQUISA CIENTIFICA E TECNOLOGICA, IMIGRAÇÃO, CIENTISTA, PESQUISADOR, RISCOS, SOBERANIA, BRASIL, PRODUÇÃO, DIFUSÃO, CONHECIMENTO, REGIÃO AMAZONICA, SOLICITAÇÃO, APOIO, SOCIEDADE, GOVERNO, AMPLIAÇÃO, PRESERVAÇÃO, MUSEU, ESTADO DO PARA (PA).

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no dia de hoje trago um assunto que inicialmente pode parecer mais restrito ao Pará e à Amazônia, mas, na verdade, tem relação com os interesses maiores da Nação e com a soberania brasileira. Trata-se do Museu Paraense Emílio Goeldi, um patrimônio inestimável da cultura e do saber do Pará e da Amazônia, que, ano após ano, se transforma num dos mais respeitáveis centros de pesquisa do País, resgatando o Pará de sua triste condição de Estado secundário ou periférico dentro do cenário neoliberal da Federação brasileira. Inicialmente, irei ressaltar a excelência do trabalho do Museu e a sua organização, mas também quero lembrar que a instituição, a exemplo de outras do gênero, necessita de maior apoio governamental.

Há mais de um século, o Museu foi instituído pelo naturalista Domingos Soares Ferreira Penna, movido pelo ideal científico da dominação do conhecimento sobre a Amazônia. Já são contabilizados 134 anos de trabalho e pesquisa, incansavelmente dedicados à descoberta e à classificação das estruturas elementares da cultura e da natureza amazônicas.

Sobre sua função básica, não nos sobram dúvidas: produzir e difundir conhecimentos e acervos científicos sobre os sistemas naturais e socioculturais relacionados à Amazônia. Em outras palavras, cabe ao Museu Goeldi catalogar, analisar e difundir a diversidade biológica e sociocultural da Amazônia, bem como caracterizar e entender a evolução de seus ambientes físicos.

Suas ações privilegiam quatro setores principais do conhecimento humano: a Ecologia, a Zoologia, a Botânica e as Ciências Humanas. Ao lado dessas quatro grandes áreas, funcionam a Estação Científica Ferreira Penna, a Editoração Científica, a Biblioteca, o Arquivo do Museu e outros laboratórios, que prestam apoio e operacionalização sistemática aos conhecimentos em processo de produção nas quatro grande áreas.

Como não poderia deixar de ser, as coleções científicas, que procuram documentar a sócio-biodiversidade da Amazônia, ocupam lugar de destaque do Museu Goeldi, resgatando o passado histórico e testemunhando a situação presente. No conjunto, trata-se de uma das mais importantes da América do Sul e do mundo, no que tange ao universo material da Amazônia. O resultado disso é que os especialistas consideram sua coleção de aves a mais representativa, seja pelo número de exemplares, seja pela sua vasta variedade.

O Herbário João Murça Pires reúne uma coleção valiosíssima com cerca de dois mil e quinhentos espécimes, que tem dado origem à descrição de várias espécies novas para a ciência. As coleções paleontológica, etnográfica, arqueológica e lingüística se juntam às de mamíferos, peixes e répteis para configurar um dos acervos mais disputados do mundo.

Acompanhando as transformações tecnológicas, tais coleções contam com os recursos da informatização para proporcionar acesso facilitado do público ao acervo e à informação inerente a seus exemplares. Para se ter uma sucinta idéia da qualidade do acervo, a coleção de documentos e obras raras compreende arquivos que permitem, com grau alto de fidelidade histórica, a reconstituição do passado de Belém, do Estado do Pará e da região amazônica.

Sem falsa modéstia, o Museu Goeldi pode, na atualidade, ser comparado aos grandes museus instalados na Europa e nos Estados Unidos, em termos de seriedade científica, qualidade de acervo e competência investigativa. Por exemplo, seu congênere francês, o Museu Nacional de História Natural, que foi fundado há mais de dois séculos, é reconhecidamente um dos mais respeitados do mundo. Nem por isso, suas excepcionais coleções nos domínios da botânica, da zoologia e da ecologia amazônicas podem superar em diversidade e volume aquelas abrigadas sob o teto do Museu paraense. A mesma avaliação poderia muito bem ser estendida ao gigantesco Museu de História Natural de Nova Iorque, nos Estados Unidos (The American Museum of Natural History), bem como ao Museu Nacional de História do México. 

No entanto, apesar de toda a pujança do Museu Goeldi, reconhecida no mundo inteiro, houve pouco avanço no arquivo de coleções dessa instituição nos últimos três anos. Isso se explica, em larga medida, pela restrição de recursos financeiros e pela ausência de um programa de inventários contínuos dentro da política de Ciência e Tecnologia para a região amazônica. 

Mais grave que isso é constatar o descaso do Governo Federal para com o vexaminoso problema da fuga de cérebros do País, assunto este que já tratei neste Plenário recentemente. Centros de pesquisa, universidades públicas e laboratórios nacionais estão em indiscutível processo de sucateamento e venda de seus melhores quadros, a preços risivelmente módicos. Há poucas semanas, o matutino Valor Econômico informou a seus leitores que a USP, a mais tradicional e uma das mais competentes de nossas universidades públicas, vive momento de dramática evasão de especialistas e cânones. Na matéria, os jornalistas apontam a questão dos salários, falta de investimento em infra-estrutura e a oportunidade de expansão de pesquisa e conhecimento como fatores essenciais para a decisão da fuga.

Nesse contexto, o impasse sobre a sobrevivência de valioso patrimônio científico e institucional ganha uma força extraordinária. Pois, se o Brasil ainda sonha com um mínimo de independência e progresso para adquirir respeito e auto-estima, aqui e no mundo, é preciso que o Estado reverta, com urgência, sua política radical de desmoralização e privatização de nossa cultura e de nossa ciência.

No caso do Museu Goeldi, do Pará, a publicação de um relatório interno comunica que, de 1997 para cá, o quadro de servidores sofreu um processo de enxugamento brutal. Entre os efetivos, a queda do número de pesquisadores e tecnologistas foi de mais de 10%, sugerindo certo comprometimento no alcance das metas previstas pela instituição para este início de novo milênio. Estamos, portanto, na contramão da história.

Isso, evidentemente, assusta a todos que possuem um mínimo grau de consciência, uma vez que o que está em jogo é a soberania brasileira na produção e na difusão de conhecimento sobre a Amazônia, cuja riqueza da sua biodiversidade gera cobiça em todo o mundo. Nessa agonizante conjuntura, o apelo que ora se faz é no sentido de sensibilizar as autoridades do Governo brasileiro diante dos problemas que afligem as instituições que se ocupam da ciência, do conhecimento e da cultura nacional.

Para concluir, Sr. Presidente, gostaria de apenas ressaltar, uma vez mais, a relevância do Museu Goeldi não somente para o Pará, mas para o Brasil e para o mundo. Sua representatividade no conjunto das instituições que investigam e preservam a história, a natureza e a cultura amazônica é inquestionável. Contudo, para que suas atuais atribuições sejam ao menos garantidas, cumpre ao Estado e à iniciativa privada maior interesse e maior capacidade de ação junto às instituições científicas e culturais do País. Desse modo, em que pese a histórica resistência do Museu Goeldi e de seus defensores, a cooperação da sociedade e do Governo para sua preservação e ampliação deve ser realizada o mais urgentemente possível.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/03/2001 - Página 3931