Discurso durante a 19ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

NECESSIDADE DE MAIORES INVESTIMENTOS NA EDUCAÇÃO, COMO FORMA DE COMBATE A EXCLUSÃO SOCIAL NO BRASIL. COMENTARIOS A PESQUISA DO INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA - IPEA, SOBRE A DESIGUALDADE SOCIAL CAUSADA PELA CONCENTRAÇÃO DE RENDA NO PAIS.

Autor
Francelino Pereira (PFL - Partido da Frente Liberal/MG)
Nome completo: Francelino Pereira dos Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA SOCIAL.:
  • NECESSIDADE DE MAIORES INVESTIMENTOS NA EDUCAÇÃO, COMO FORMA DE COMBATE A EXCLUSÃO SOCIAL NO BRASIL. COMENTARIOS A PESQUISA DO INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA - IPEA, SOBRE A DESIGUALDADE SOCIAL CAUSADA PELA CONCENTRAÇÃO DE RENDA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 23/03/2001 - Página 3775
Assunto
Outros > DISCRIMINAÇÃO RACIAL. POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • COMENTARIO, PESQUISA, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), CONCLUSÃO, INFERIORIDADE, SITUAÇÃO SOCIAL, ESCOLARIDADE, NEGRO, BRASIL, PROVOCAÇÃO, DIFERENÇA, SALARIO.
  • GRAVIDADE, ESTATISTICA, MISERIA, POBREZA, BRASIL, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, QUESTIONAMENTO, OMISSÃO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, GOVERNO, INEFICACIA, GASTOS PUBLICOS, ORÇAMENTO, AREA, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, INSUFICIENCIA, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO.
  • DEFESA, ESFORÇO, CONSCIENTIZAÇÃO, EDUCAÇÃO, CRIANÇA, ERRADICAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL.

           O SR. FRANCELINO PEREIRA (PFL - MG. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem, dada a dificuldade da agenda, não me foi possível manifestar, em nome do meu Estado, a minha posição em relação à luta pelo fim da discriminação racial. Vários oradores falaram, e hoje estou aqui exatamente para isso.

Sr. Presidente, mais uma pesquisa veio somar-se às muitas que estão surgindo, demonstrando o grau da perversa exclusão a que estão submetidos milhões de brasileiros. A pesquisa a que me refiro foi feita pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, o IPEA, em conjunto com a Organização das Nações Unidas, ONU, constatando a situação de inferioridade econômica e social dos negros em relação aos brancos, no Brasil.

A escolaridade, tão importante para o crescimento econômico e social de um país, para o aumento da oferta de emprego e para a melhoria dos salários, foi o item abordado com maior profundidade pela pesquisa.

E mostrou resultados desalentadores.

Pior, comprovou que a exclusão e a discriminação se mantêm inalteradas ao longo das gerações.

Conforme os dados da pesquisa, um negro com setenta anos, hoje, estudou em média 2,2 anos a menos que o branco da mesma idade. E um negro de trinta anos mantém a mesma desvantagem em relação ao branco da mesma idade: estudou 2,1 anos a menos.

Em matéria de discriminação contra a raça negra, estamos em situação pior do que a África do Sul, que até 1994 viveu um feroz regime racista, vencido pela determinação, pela coragem e pela ousadia de Nelson Mandela e outros líderes. Na África do Sul, os negros também estudam menos que os brancos, mas a diferença vem diminuindo de forma mais acentuada do que no Brasil com o passar do tempo. Antes, a diferença era de sete anos; agora é de apenas três anos.

A comparação com a África do Sul nos coloca em situação de desvantagem quando se trata de educação, mesmo em relação aos brancos. Segundo a pesquisa IPEA/ONU, um branco sul-africano de vinte e cinco anos estuda, em média, doze anos, enquanto um negro permanece apenas nove anos na escola.

Entre nós, o quadro é o seguinte: um branco de vinte e cinco anos fica sete anos e meio na escola, enquanto um negro da mesma idade tem apenas cinco anos e meio de escolaridade.

A importância de utilizar a educação como objetivo da pesquisa é explicada por outro dado significativo: de todos os fatores que contribuem para reduzir o salário do trabalhador negro, a educação entra sozinha com 27%.

Não por acaso, a diferença salarial tem uma relação direta com a diferença da escolaridade, fenômeno válido tanto para brancos como para negros.

Essa é, infelizmente, a mensagem que transmitimos nesse dia dedicado à luta contra a discriminação racial e social, e que levaremos à Conferência Mundial contra o Racismo, que será realizada em agosto próximo em Durban, na África do Sul.

E a ironia está em que todos - brancos, negros, amarelos, pardos, caboclos - somos todos iguais.

Como observa a ativista negra Diva Moreira, o Projeto Genoma Humano deitou por terra as presunções de diferenças genéticas fundadas na raça. Os genes de um africano são exatamente iguais ao de um ariano.

Sr. Presidente, a pesquisa que o IPEA e a ONU acabam de divulgar apenas ressalta a perversa realidade social do País e destaca o fato de que a estabilidade econômica, com o fim da inflação, por si só não resolve o problema das desigualdades de renda, que está na raiz de todo o nosso drama social como Nação.

A exclusão social, se é mais forte entre os negros e as mulheres, aparecendo, portanto, associada à discriminação, é, ao mesmo tempo, uma praga nacional.

Os dados são do IBGE e do IPEA: dos cento e sessenta e nove milhões de brasileiros registrados pelo censo do ano passado, quase cinqüenta e cinco milhões ainda vivem na linha de pobreza e mais de vinte e quatro milhões são indigentes.

Sob o ponto de vista oficial, ser pobre é conseguir comprar o alimento essencial para a sobrevivência mas não ter dinheiro para remédios, transportes e outras necessidades essenciais.

Ser indigente é ter uma renda mensal inferior a R$37,50, que corresponde à quarta parte do salário mínimo. Ou seja, a renda do indigente é pouco maior do que um real por dia.

A persistência da pobreza - isso não é segredo - sempre esteve associada à péssima distribuição de renda, ou melhor, à forte concentração de renda, um desafio que a estabilidade monetária também não venceu.

O dado é alarmante: 13% da renda nacional estão nas mãos de 1% da população brasileira.

            É verdade que os programas de assistência social mantidos pelo Governo atendem, hoje, a milhões de brasileiros. Mas é igualmente verdadeiro que essa transferência se limita a enfrentar a pobreza no que ele depende da renda para consumo privado, como remédios e alimentos.

As necessidades dos mais pobres são mais amplas e exigem políticas públicas voltadas para investimentos maciços em educação, saúde, nutrição e saneamento. Paralelamente, é indispensável melhorar a qualidade do gasto social.

Os números do Orçamento Geral da União e de outros indicadores mostram que os gastos sociais, no Brasil, são da ordem de 20% do Produto Interno Bruto - cerca de R$200 bilhões.

Ora, Sr. Presidente, se há tanto dinheiro sendo aplicado na área social, por qual motivo a pobreza persiste?

Será que a pobreza nada tem a ver com o volume dos gastos públicos na área social?

Ou será que o problema está na baixa eficiência desse gasto social?

Se investíssemos maciçamente na educação, como o fizeram as nações até mais jovens do que o Brasil e que hoje pertencem ao Primeiro Mundo, não estaríamos trabalhando para romper, de forma definitiva, o círculo vicioso da pobreza?

Não há como negar uma razoável melhoria em alguns indicadores sociais mais expressivos, nos últimos anos.

Em 1983, pelo menos 30% das crianças entre sete e quatorze anos eram analfabetas. Em 1999 essa relação caiu para pouco mais de 11%.

Em 1990, para cada mil crianças nascidas, morriam quase 48 crianças. No ano passado esse número caiu para 35 crianças. 

Há, por outro lado, iniciativas importantes em execução, como o Projeto Alvorada, que propõe investimentos na área social em mais de três mil Municípios de quase todos os Estados da Federação, e o Programa Nacional de Bolsa-Escola.

Porém essas iniciativas, por mais eficazes que sejam, apenas aliviam um quadro de enorme dimensão, próprio de um país continental, com graves disparidades regionais e uma perversa concentração de renda.

Esta realidade é agravada pela persistente concentração da população nas zonas urbanas. Em 1980, revelou o censo de então, 67,59% dos brasileiros viviam nas cidades, relação que cresceu para 81,22% conforme o censo do ano passado.

A urbanização descontrolada transforma a periferia das grandes cidades em enormes favelas, com todos os ingredientes geradores de violência.

Esse quadro é agravado pelas manifestações de racismo, pelo apartheid verde-amarelo, que discrimina os negros e envergonha os homens de bem.

Só a retomada do desenvolvimento, com investimentos maciços em educação, saúde e saneamento, será capaz de, a médio e longo prazos, enfrentar com êxito a exclusão social.

Dentro de pouco tempo começaremos a elaborar o Orçamento Geral da União para 2002. Nada mais oportuno do que, desde logo, assumirmos juntos - Governo, Congresso e sociedade - o compromisso inarredável de aumentar substancialmente os recursos destinados aos programas sociais.

E, sem um esforço permanente e diuturno de conscientização, a partir das crianças nas escolas, jamais erradicaremos a discriminação e o preconceito das estruturas sociopolíticas, da cultura nacional, do imaginário coletivo e da vida cotidiana.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 23/03/2001 - Página 3775