Discurso durante a 18ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

PERDA DE RENDA DO SETOR AGRICOLA NACIONAL NOS ULTIMOS ANOS, DESTACANDO A NECESSIDADE DE INCENTIVO A PRODUÇÃO NACIONAL DE TRIGO.

Autor
Osmar Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA AGRICOLA.:
  • PERDA DE RENDA DO SETOR AGRICOLA NACIONAL NOS ULTIMOS ANOS, DESTACANDO A NECESSIDADE DE INCENTIVO A PRODUÇÃO NACIONAL DE TRIGO.
Aparteantes
Casildo Maldaner.
Publicação
Publicação no DSF de 22/03/2001 - Página 3725
Assunto
Outros > POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • ANALISE, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, PERDA, RENDA, SETOR, AGRICULTURA, PREJUIZO, AGRICULTOR, PAIS.
  • DEFESA, ADOÇÃO, POLITICA, REPOSIÇÃO, RENDA, AGRICULTURA, IMPEDIMENTO, DESTRUIÇÃO, MODELO, PEQUENA PROPRIEDADE, INCENTIVO, PRODUÇÃO, TRIGO, PAIS.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, neste fim de tarde o debate não andou muito produtivo aqui no Senado Federal. Esta Casa precisa retomar o ritmo de votações; o Senado precisa votar matérias do interesse da sociedade brasileira, debater temas que interessem aos trabalhadores, aos empresários, aos setores produtivos deste País. O Senado necessita cumprir com suas responsabilidades, suas atribuições. Respeito todos os Senadores que se pronunciaram e que têm se pronunciado desta tribuna, mas creio que chegou a hora, Sr. Presidente, de fazermos um apelo para que essas questões sejam decididas, as denúncias investigadas e resolvidas, e que o Senado não fique apenas assistindo a esse debate, porque temos que cumprir com as nossas atribuições, com as nossas responsabilidades perante a sociedade brasileira. Faço um apelo para que voltemos a trabalhar em favor daquilo que é a nossa obrigação, para cumprir aquilo que é a nossa obrigação.

Por isso, embora num espaço de tempo curto que me sobrou, porque também tenho que presidir a Comissão de Assuntos Sociais para transmitir a Presidência ao próximo Presidente, vou falar de um assunto que creio que tenha muito maior interesse para o País do que o debate que se travou, nesta tarde, aqui no plenário.

Ontem, tivemos uma reunião com o Presidente da República, e não falaria publicamente, evidentemente, o que foi conversado com o Presidente, se não fosse algo de importância para o País e que Sua Excelência faz questão de que seja abordado desta tribuna. Estamos com uma grande preocupação, que é a crise na Argentina, a crise política e econômica no país vizinho. Ao lado da crise na Argentina, temos problemas no Japão, nos Estados Unidos, e o grave problema na União Européia, principalmente no Reino Unido, onde os rebanhos estão sendo atingidos e tendo que praticamente ser eliminados pelos Governos dos países do Reino Unido em função da febre aftosa, que atacou já 300 fazendas, 300 focos.

Esses problemas todos nos trazem à nossa realidade, o Brasil, onde não temos uma crise econômica. O próprio Presidente fez uma análise ontem e se mostrou muito confiante de que a crise econômica e política da Argentina não atingirá o País. Não seremos prejudicados da maneira como muitos entendem. Há aqueles que colocam com gravidade a situação da Argentina a ponto de atingir a economia brasileira. Na verdade, há no Brasil uma crise política que nasceu no Senado Federal, e precisa acabar. Mas não há crise econômica. E por não haver crise econômica, estamos em um cenário que precisa de alguns cuidados do Governo.

É no sentido de contribuir com a confiança que o Presidente da República tem de que continuaremos cumprindo as metas de crescimento econômico e as metas inflacionárias, mesmo com o susto que a Argentina nos causou, que gostaria de alertar desta tribuna, para os problemas de um setor de extrema importância a fim de que a economia brasileira continue com os seus fundamentos, como disse o Presidente da República, consolidados. Falo da perda de renda da agricultura brasileira nos últimos anos, em especial no Plano Real, e que pode ser verificada entre os anos de 1999 e 2000, quando o setor obteve praticamente a mesma renda, sem considerar que houve inflação no período. Portanto, a renda, em valores reais, foi menor em 2000 do que havia sido em 1999.

Apenas para ilustrar, o PIB da agricultura brasileira foi, em 1999, de trezentos e seis bilhões quinhentos e oitenta milhões. Em 2000, foi de trezentos e seis bilhões, oitocentos e oitenta milhões, o que significa que praticamente não houve crescimento. Pelo contrário, se considerarmos uma inflação que chegou próxima a 9%, tivemos um decréscimo da renda real, portanto, do agronegócio. Se considerarmos somente a renda da agricultura, separando os outros setores, como o fornecimento de insumos, de máquinas e serviços que envolvem a agricultura, a renda também não cresceu; ao contrário, decresceu até em valores nominais. De 86,78 bilhões caiu para 86 bilhões, o que significa quase 1% a menos do que ocorreu em 1999. Somando-se aí a inflação do período, chegamos perto de 10% de redução da renda da agricultura brasileira no ano 2000, em relação a 1999. Enquanto isso, os insumos tiveram um crescimento de cerca de 10%. Isso agrava ainda mais, porque o custo de produção cresceu no tempo em que a renda decresceu. Isso teve influência direta na balança comercial.

A balança comercial da agricultura, que sempre tem oferecido ao País a oportunidade de reduzir o déficit e até de nos aproximar de um eventual superávit na balança comercial brasileira, caiu de 12,23 bilhões para 11,44 bilhões, o que significa uma redução de 6,52%, que é mais ou menos a redução que ocorreu, em termos reais, no setor da agricultura. Portanto, quando a agricultura não tem uma renda compatível com o crescimento da sua produção - o que tem ocorrido sistematicamente -, temos prejuízo para o País todo, porque a balança comercial poderia ter sido, nesse período, não digo positiva, mas pelo menos ter apresentado um déficit menor. E a balança da agricultura, que sofreu praticamente essa redução de R$1 bilhão, tem uma importância essencial como um dos fundamentos da política econômica defendidos pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso.

Então, o alerta que quero fazer neste momento ao Presidente, ligando essa questão da queda da renda da agricultura à crise na Argentina, é o seguinte: falei aqui desta tribuna, há alguns dias, que era hora de o Governo formular e anunciar a política para o plantio da safra de inverno. O Brasil é dependente da importação de trigo em cerca de 80% do nosso consumo, e 90% do trigo importado é proveniente da Argentina. Hoje os noticiários já deram o aumento do pão, que chega a 7% e que vai ter um reflexo na inflação mensal de 0,1%, o que significa que, se multiplicarmos esse reflexo por 12, teremos 1,2% a mais na inflação anual, só em função do aumento provocado pelo trigo, exatamente pela crise argentina. Portanto, já há reflexos na economia brasileira e esses reflexos atingem todos os cidadãos brasileiros, especialmente a classe trabalhadora, que é consumidora de derivados de trigo, como o pão, o biscoito, o macarrão e outros derivados, que terão aumento em função dessa dependência do Brasil do trigo argentino.

Estamos no final de março e vejo o Senador Casildo Maldaner, que tem um carinho muito grande pelos produtores de trigo de Santa Catarina. V. Exª sempre me pergunta quando teremos neste País uma política de estímulo à produção de trigo. Senador Casildo Maldaner, creio que chegou a hora de o Governo brasileiro adotar uma política de incentivo.

Desta tribuna já fiz uma proposta, que é a de aplicar R$500 milhões para o financiamento desta safra e estabelecer um preço de garantia de US$125 a US$140 a tonelada - e ainda assim o preço ficará inferior ao pago pela tonelada do trigo importado. Desse modo, já teremos um incremento diário já para essa safra que poderá crescer sucessivamente nos próximos cinco anos com o aumento no valor financiado, garantindo-se o preço e assegurando a comercialização do produto, porque não é justo que, quando o produtor brasileiro esteja colhendo o trigo, o Brasil esteja importando trigo. Se for assegurada a comercialização do trigo, o produtor plantará novamente no próximo ano e, em cinco anos, teríamos a produção de trigo já abastecendo todo o mercado nacional e atendendo às nossas necessidades.

Esse é o apelo que quero fazer ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, que foi muito otimista e confiante em relação ao cenário econômico. Contudo, Sua Excelência precisa adotar algumas providências e considero essa uma providência importante para que possamos cuidar de duas coisas ao mesmo tempo: do poder aquisitivo da população, não permitindo que seus produtos básicos tenham os preços majorados, e também da balança comercial porque, com o trigo, Senador Casildo Maldaner, mandamos para fora do País todos os anos US$1 bilhão e jogamos fora a oportunidade de gerar 200 mil empregos porque não plantamos aqui o trigo que importamos.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR) - Concedo um aparte a V. Exª.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Eu gostaria de lhe cumprimentar, Senador Osmar Dias, pois V. Exª é conhecedor profundo dessa questão e afirmou que estamos a importar 90% do trigo mais ou menos.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PR) - Oitenta por cento, Senador, sendo que 90% desse trigo importado vem da Argentina.

O Sr. Casildo Maldaner (PMDB - SC) - Sendo só da Argentina, esses valores, com a alteração do dólar, dificultam mais ainda a nossa balança. Senador Osmar Dias, trata-se de pão, é o alimento, dependemos dessa importação e 90% vêm só da Argentina. V. Exª apresenta as fórmulas com R$500 milhões, encaminha o processo e, nessa seqüência, em cinco anos, teríamos condições de ter autonomia para alimentar os brasileiros! V. Exª conhece isso com profundidade - todos sabem - e teríamos uma solução para os brasileiros. Temos aqui a matéria-prima para resolvermos o problema internamente e não ficarmos dependendo de outros! Por que não fazemos isso? Quando V. Exª fala, é com conhecimento de causa. Todos os Senadores sabem disso. Há poucos dias, discutíamos quando estava aqui o Ministro Celso Lafer. Temos que ser mais aguerridos, mais agressivos até sobre as nossas questões. Esteve aqui na semana passada o Ministro Pratini de Moraes. Discutimos a questão da “vaca louca”. A Europa exportava para a Confederação da Rússia em média US$800 milhões em carne bovina e hoje não pode mais fazê-lo. O povo tem que comer alguma coisa, a comida tem de sair de algum lugar. E, do Brasil, zero. Nós não participamos dessa exportação para a Rússia. Não será agora o momento de encaminharmos para lá uma parte dessas exportações? Se exportamos para a Rússia cerca de US$30 milhões por ano de carne suína, não poderíamos agora aumentar esses números, sendo mais agressivos? Vamos buscar mercado, vamos alimentar aquele pessoal! Será que agora o frango não pode ir mais para lá? Não será este o momento? Não seria este o momento - eu dizia para o Pratini de Moraes, que é arrojado neste campo - de ele ir para a pasta da Indústria e Comércio, para o Ministério do Desenvolvimento, e o Governo colocar V. Exª no Ministério da Agricultura para produzir esses alimentos? A fórmula está aqui, V. Exª a está apresentando. Será que o Presidente Fernando Henrique não ouve isso? Aliás, já há mais tempo o Presidente deveria ter aproveitado V. Exª nessa área, para termos autonomia, termos alimentos aqui e não ficarmos dependendo de outros. Meus cumprimentos a V. Exª. Todos dizem aqui, a boca pequena, que V. Exª é a solução para isso.

O SR. OSMAR DIAS (PSDB - PA) - Muito obrigado, Senador Casildo Maldaner, pelas palavras generosas. É um orgulho para mim poder ouvi-lo, principalmente porque sempre, nos bastidores, V. Exª é um dos mais preocupados com a agricultura brasileira e tem buscado informações, apóia e defende esse setor com muita intensidade nesta Casa. Por isso, V. Exª merece as nossas homenagens.

Ao encerrar - porque tenho de participar da reunião na Comissão -, gostaria de dizer que, na próxima semana, voltarei a esta tribuna para oferecer algumas propostas de recuperação da renda da agricultura brasileira, porque este é o grande problema do agricultor brasileiro. E estou falando, Senador Casildo Maldaner, de 5 milhões de famílias de agricultores espalhadas por este País afora, que ainda geram, apesar de todas as dificuldades vividas, cerca de 36 milhões de empregos no País, ou seja, 54% dos empregos brasileiros dependem do agronegócio. Isso é significativo! Não podemos nem admitir pensar na destruição do modelo de pequena propriedade do seu Estado, do meu Estado e do Brasil. Precisamos de uma política de recomposição da renda da agricultura brasileira, e oferecerei aqui algumas idéias, algumas propostas, até porque, Sr. Presidente, se começarmos a tratar nesta Casa de assuntos de interesse da nação brasileira, aos poucos substituiremos o debate agressivo que toma conta desta Casa - mas improdutivo - por um debate produtivo, tentando ajudar o País, principalmente neste momento em que existe ameaça de crise no país vizinho.

Agradeço a V. Exª, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/03/2001 - Página 3725