Discurso durante a 21ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

APOIO A CRIAÇÃO DE COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO DESTINADA A INVESTIGAR DENUNCIAS DE CORRUPÇÃO EM ORGÃOS DO GOVERNO, CONJUGADA A CONTINUIDADE DA VOTAÇÃO DAS REFORMAS EM TRAMITAÇÃO NA CASA.

Autor
Moreira Mendes (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Rubens Moreira Mendes Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CORRUPÇÃO.:
  • APOIO A CRIAÇÃO DE COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO DESTINADA A INVESTIGAR DENUNCIAS DE CORRUPÇÃO EM ORGÃOS DO GOVERNO, CONJUGADA A CONTINUIDADE DA VOTAÇÃO DAS REFORMAS EM TRAMITAÇÃO NA CASA.
Aparteantes
Antonio Carlos Magalhães.
Publicação
Publicação no DSF de 27/03/2001 - Página 4104
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CORRUPÇÃO.
Indexação
  • APOIO, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), APURAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, ORGÃO PUBLICO, SIMULTANEIDADE, CONTINUAÇÃO, VOTAÇÃO, REFORMA TRIBUTARIA, REFORMA POLITICA, IMPORTANCIA, PAIS.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em meio ao atual quadro de crise política pela qual passa o Brasil, em que pesadas denúncias são feitas por personagens poderosos e atingem a outros igualmente importantes, sem falar dos abalos que causam às instituições, quero fazer deste momento e desta tribuna um singelo apelo à razão.

Move-me a certeza de que, independentemente de entrar ou não no seu mérito, as questões levantadas em todo este processo, de parte a parte, merecem e devem ser convenientemente apuradas. Para tanto dispõe o País de todos os instrumentos adequados, bastando acioná-los. Aí estão as leis, aí está a justiça funcionando regularmente, aí está o Ministério Público apto a cumprir a sua missão, a Polícia Federal, enfim, instituições e foros adequados para seu encaminhamento.

A única coisa que não pode acontecer - e, neste caso, tenho a certeza de estar falando em nome da imensa maioria da população brasileira - é que crises conjunturais assumam uma dimensão tal que acabem por paralisar o País.

Em primeiro lugar, tendo domado o flagelo da inflação e de uma economia desgovernada, o mínimo que a Nação espera dos que detêm responsabilidades políticas é que deixem os setores produtivos trabalharem em paz, seguindo em frente os seus propósitos de aumentarem a riqueza nacional, de modernizarem-se e de inserirem-se, de forma não subalterna, em um mercado mundial por demais competitivo.

Além disso, não é razoável que o Parlamento se sinta constrangido em suas atividades essenciais, perdendo um precioso tempo que poderia utilizar com proposições, votações, debates em torno de grandes temas, esses, sim, fundamentais ao desenvolvimento nacional e à plena consolidação das instituições democráticas.

Ora, Srª Presidente, Srs. Senadores, nada disso está sendo possível, neste momento, ficando o Congresso Nacional à mercê de querelas intermináveis e de denúncias.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Com todo o prazer, eminente Senador.

O Sr. Antonio Carlos Magalhães (PFL - BA) - V. Exª sabe, mais do que ninguém, do apreço que lhe tenho, do respeito a sua figura e dos propósitos que sei do seu discurso. Entretanto, se, como V. Exª diz, esses Poderes todos estão funcionando e acontece tanta coisa, avalie: se eles não funcionassem, o que não aconteceria? Também é preciso que V. Exª entenda que o Parlamento é um órgão fiscalizador e, como tal, é da sua atividade, talvez a mais importante, fiscalizar o Poder Executivo. Daí porque muitas denúncias são válidas. E fatos inacreditáveis estão ocorrendo, inclusive, na região de V. Exª. De modo que devemos tolher o assunto? Não! Esperamos que haja uma pauta para as votações importantes. Nesse caso, a culpa não é de quem reclama, mas de quem não faz. Considero esse fórum apropriado para as denúncias graves a que o País está assistindo, a fim de que o Governo encontre esses setores e acabe com os desvios morais de vários setores, desvios esses que a opinião pública reprova em 84%. Agradeço a bondade do nobre Colega, que, além de ser meu colega de Partido, é uma das pessoas que mais admiro nesta Casa e por quem tenho o maior apreço.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Quero deixar claro a V. Exª que não se trata absolutamente de bondade. O seu aparte certamente enriquecerá o meu pronunciamento. No entanto, ao concluí-lo, V. Exª verá que de forma nenhuma - e quero deixar claro isso - pretendo impedir que as denúncias sejam apuradas. Por diversas vezes, tenho aparteado V. Exª nesse sentido.

Continuo, Srª Presidente.

O apelo que faço deriva justamente desta preocupação: sem empurrar coisa alguma para debaixo do tapete, sem desqualificar ninguém - mesmo porque as denúncias são graves, e as pessoas envolvidas em todo esse processo são responsáveis e têm o pleno direito de expor os seus pontos de vista. O que a Nação exige, no meu modesto modo de entender, é que sejam adotados procedimentos legais existentes a fim de não prejudicar a rotina da sua vida e do trabalho das instituições do Estado e do Parlamento. Nesse ponto, novamente, concordo com V. Exª. Afinal, a nossa história está repleta de momentos críticos e em todos eles falou a mais alta prudência. Em cada grande crise pela qual passamos, nunca faltaram aquelas lideranças, que, embora firmes, souberam ser suficientemente moderadas para distinguir do fundamental o meramente acessório e, assim, apontar saídas viáveis para a superação dos problemas.

Exemplos não faltam a esse respeito, a começar pelo processo da Independência. O que seria o jovem Estado brasileiro logo no Primeiro Reinado, imerso em crise prolongada que culminou com a deposição de Dom Pedro I, se não fosse a atuação de lideranças como a de José Bonifácio? Que sérios riscos não correu o País, inclusive de fragmentar-se num período regencial? Bastou-lhe, naquele momento, a ação moderadora de vultos como Araújo Lima, Padre Diogo Feijó para que o mal fosse debelado.

Outro exemplo notável de apaziguamento deu-se no Segundo Reinado: graças a estadistas do porte de Honório Hermeto Leão, conseguiu-se superar a histórica divergência entre liberais e conservadores; e, em pleno regime parlamentar, foi possível organizar-se o célebre Gabinete da Conciliação, onde pastas foram divididas entre os Partidos. E não foi por acaso que, nesse período de 1850 a 1870, o Império atingiu o seu mais elevado grau de estabilidade política e de desenvolvimento econômico. Um País que venceu a crise da substituição traumática da Monarquia pela República, que sofreu o impacto de duas grandes guerras mundiais, não sucumbindo a seus efeitos maléficos, que sepultou a República Velha das oligarquias e do coronelismo, sendo capaz de entrar na modernidade sem romper com as bases essenciais da nossa História, que saiu vivo dos terríveis embates ideológicos dos anos 60, enfim o Brasil é maior, muito maior que as crises pelas quais passou e, sobretudo, pôde contar com a lucidez de grandes lideranças para ajudá-lo a vencer as turbulências. Esse o sentido do apelo à razão que faço neste momento. Se tivermos homens da dimensão de Tancredo Neves, que, ante a iminência de uma guerra civil, naquele sombrio agosto de 1961, contribuiu decisivamente para a adoção do Parlamentarismo, numa espécie de “solução de compromisso”; se pudermos contar com políticos da dimensão de um Petrônio Portella, que, com paciência e competência, ajudou a costurar o tecido da distensão política no regime militar; se, por fim, em todos os momentos de forte tensão, nunca faltou ao País a voz sensata dos que apostam na normalidade como a melhor solução para os confrontos, que põem em risco as nossas instituições, por que não esperar agora que o concurso desse tipo de liderança para repor as coisas nos lugares devidos?

Penso que pessoas, que homens, que brasileiros como Marco Maciel, José Sarney e tantos outros que têm todas as qualidades para interferir positivamente no encaminhamento de saídas corretas para a crise política pela qual passamos. A esses e a todos, em condições de oferecer sua contribuição ao país, lanço o meu apelo para que o façam. A Nação, agradecida, saberá reconhecer em ações dessa natureza a grandeza dos seus autores como hoje reconhecemos todos aqueles eminentes brasileiros já por mim citados.

Em 1930, o Líder mineiro Antonio Carlos bradava “façamos a revolução, antes que o povo a faça”. Agora, se todos nós, membros do Congresso Nacional, ouvirmos a voz das ruas, o que elas estão pedindo? Estão pedindo trabalho, trabalho nosso, trabalho para quantos ainda estão inscritos nas duras estatísticas do desemprego que aflige o mundo inteiro.

Portanto, o povo brasileiro não quer, como naquele tempo, revolução. Quer trabalho, a população continua desacreditando da classe política e como haveremos de justificar e até resgatar a sua credibilidade se, apesar de todo o esforço e de tantos outros Parlamentares dedicados, projetos fundamentais não tramitam, não andam. Como rebater essa descrença se reformas da maior importância, como a administrativa, a tributária, a da Previdência, a da política, a do próprio Judiciário, continuam estagnadas, atravancando o desenvolvimento do País? Por que não tramitam? Não tramitam porque, nestas últimas semanas, temos estado mais preocupados com as denúncias apresentadas do que com o nosso verdadeiro objetivo, que é o de legislar, sem, evidentemente, nos descurar da responsabilidade de também apurar as denúncias. E pior, Srª Presidente: estamos todos permitindo que esse espetáculo acabe transformando o Senado Federal num verdadeiro tribunal de inquisição -- e é a isso que eu me oponho --, com a possibilidade de ver aqui instalada a tal CPI da Corrupção, tão genérica, tão abrangente, tão sem objetivo pontual, que, enquanto palanque e holofote para a Oposição, só vai prejudicar o País, não tenho dúvida alguma disso.

Uma denúncia não exige mais do que vinte minutos de discurso nesta tribuna e um requerimento, talvez um ofício, ao Ministério Público, para o seu encaminhamento. Por que essa novela infindável? Por que permitirmos, então, essa tentativa de desestabilização da nossa economia, tão duramente conquistada? Por que jogarmos por terra a credibilidade que o Brasil conquistou no exterior? Será que o Brasil e os brasileiros não valem mais do que algumas denúncias pontualizadas que, certamente, podem ser procedentes e já devem estar, neste momento, sendo adequadas e devidamente apuradas por órgãos competentes?

Vale, sim, Srª. Presidente, Srs. Senadores, porque o que estamos assistindo é a uma tentativa de levar o país ao abismo, à ruptura do bom senso que foi o que prevaleceu em momentos recentes e muito mais difíceis, quando, em 1984, por exemplo, Tancredo Neves e José Sarney fizeram com que os interesses da Nação prevalecessem sobre divergências ideológicas e partidárias históricas. O mesmo exemplo, a mesma postura e igual papel foram protagonizados em 1994 pelo então Ministro da Fazenda, Fernando Henrique Cardoso, hoje Presidente da República, àquela época candidato do PSDB à Presidência, e Antonio Carlos Magalhães, desde há muito, um dos principais líderes do meu partido, o PFL, e reconheço isso.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, o já citado e exemplar Senador Padre Diogo Feijó disse em 1928 que “a prudência é o único farol que deve marchar diante do legislador”. Pois está mais do que na hora de que acendamos esse farol, considerando a advertência de outro homem público notável Nabuco de Araújo, para quem, “mal desenvolvida e executada a política de uma nação, é um abismo aberto pelas mãos dos seus próprios filhos.

De minha parte, sou um homem de cabelos brancos, de longa vivência no exercício da advocacia e na rotina empresarial, mas, quanto à arte da política, considero-me ainda um aprendiz. Por esse motivo, não tenho pretensão nenhuma de insinuar a qualquer dos meus pares desta Casa o que fazer e como fazer.

Acontece que, mesmo sendo um Senador aprendiz, com apenas dois anos de mandato, tenho dedicado cada minuto do meu tempo a exercer meu mandato da forma mais produtiva possível. Esforço-me dia e noite para corresponder à expectativa dos meus eleitores e honrar o povo do meu Estado. Mas, enquanto luto contra o tempo, muitíssimo pequeno para tentar honrar plenamente o meu mandato, assisto neste plenário, há quase 60 dias, ao distanciamento da Casa de seus verdadeiros objetivos, enveredando lamentavelmente para a instalação de uma CPI que pretende a Oposição de qualquer forma a fim de utilizá-la como palanque na busca da velha e conhecida estratégia do quanto pior melhor.

            Portanto, Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, desejo apenas pedir que, a par de apurar todas as responsabilidades aqui denunciadas por meio dos órgãos competentes, ou talvez cada caso pontualmente, não nos descuremos desse outro lado que julgo mais importante: o de legislar, de cumprirmos com a nossa obrigação, de votarmos todas as reformas da mais alta importância para o País. Esse é o meu propósito neste pronunciamento. Essa foi a minha intenção. Vamos fazer a nossa parte. Vamos fazer um Brasil melhor e um Brasil para brasileiros. Vamos realmente trabalhar em prol da Nação.

            Esse é o meu pensamento e era o que eu tinha a registrar nesta tarde.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/03/2001 - Página 4104