Discurso durante a 24ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

SUGESTÃO DE INICIATIVAS PARA DIMINUIR O NIVEL DE POBREZA E MARGINALIZAÇÃO NO BRASIL.

Autor
Ricardo Santos (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/ES)
Nome completo: Ricardo Ferreira Santos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • SUGESTÃO DE INICIATIVAS PARA DIMINUIR O NIVEL DE POBREZA E MARGINALIZAÇÃO NO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 30/03/2001 - Página 4413
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, POLITICA, COMBATE, POBREZA, REDUÇÃO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, PAIS.
  • COMENTARIO, ATUAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, EXECUTIVO, ACEITAÇÃO, PROPOSTA, REDUÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, COMBATE, POBREZA, ESPECIFICAÇÃO, CRIAÇÃO, FUNDO ESPECIAL, PROGRAMA, BOLSA DE ESTUDO, SAUDE, ALIMENTAÇÃO, FAMILIA.
  • APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, REDUÇÃO, SITUAÇÃO, POBREZA, EXCLUSÃO, MAIORIA, POPULAÇÃO, PAIS.
  • COMENTARIO, ANTERIORIDADE, APRESENTAÇÃO, PROJETO, EMENDA CONSTITUCIONAL, CONCESSÃO, IMUNIDADE TRIBUTARIA, BENS, PRESTAÇÃO DE SERVIÇO, DOAÇÃO, INSTITUIÇÃO ASSISTENCIAL, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, FORMA, INCENTIVO, INICIATIVA PRIVADA, CONTRIBUIÇÃO, COMBATE, POBREZA, PAIS.

O SR. RICARDO SANTOS (Bloco/PSDB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, assumimos a tribuna, nesta oportunidade, para tratar de um tema recorrente neste Senado, relativo ao problema de concentração de renda no Brasil, que tem como conseqüência inevitável a manutenção de milhões de brasileiros em situação de pobreza e mesmo de indigência, aproveitando a oportunidade do início de implementação da Agenda do Governo Federal Biênio 2001/2002.

É necessário considerar, preliminarmente, que o crescimento econômico é uma condição fundamental para que, a partir dele, promovam-se políticas de combate à pobreza e de distribuição de renda. É importante, porém, ter em mente que o crescimento, por si só, não será capaz de garantir o desenvolvimento e a inclusão social, dadas as condições prevalecentes hoje no mercado globalizado. Esta afirmação é comprovada por evidências em décadas passadas: de acordo com dados do estudo “DESIGUALDADE E POBREZA NO BRASIL: RETRATO DE UMA ESTABILIADE INACEITÁVEL”, dos pesquisadores Ricardo Paes de Barros, Ricardo Henriques e Rosane Mendonça, do Ipea, observa-se que as altas taxas de crescimento econômico da década de 70 não evitaram que chegássemos ao final da década de 80 com cerca de 40% da população brasileira considerados pobres. Em outros termos, mesmo na década do milagre econômico, não se conseguiu reduzir, em níveis aceitáveis, o contingente de pobres no Brasil.

Considera-se como linha de pobreza a renda individual mínima necessária para cobrir os gastos com alimentação, transporte, habitação e vestuário, entre outros requerimentos mínimos da cesta básica. De acordo com esses estudos, considera-se a renda familiar de dois salários mínimos ou uma renda familiar per capita de meio salário mínimo.

            Durante os anos 80, os níveis de pobreza, segundo o mesmo estudo, voltaram a subir para patamares superiores a 45% da população, em termos médios, mantendo esses níveis até 1994. No período de 1995 a 1998, com a implementação do Plano Real, reduzimos os níveis de pobreza para cerca de 34% da população total.

A conclusão mais importante que podemos extrair dessas informações é a de que, mesmo com a diminuição do percentual da população pobre do País para 34% - o que, em termos absolutos, representa aproximadamente 50 milhões de brasileiros -, ainda estamos longe de alcançar indicadores compatíveis com os padrões exigidos, principalmente do ponto de vista ético, para uma sociedade democrática e moderna.

O pesquisador do Ipea - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - Ricardo Paes de Barros mostra que “o extraordinário grau de desigualdade de renda brasileiro encontra-se no núcleo da explicação do fato de o grau de pobreza no Brasil ser significativamente mais elevado que o de outros países com renda per capita similar”, a exemplo do Chile, Bulgária, Malásia, Tailândia, Costa Rica, Colômbia, Tunísia e Argélia. Ou seja, esses países possuem renda per capita similar à brasileira, mas níveis de concentração de renda consideravelmente inferiores aos registrados no Brasil.

Por outro lado, numa comparação de renda média dos 20% mais ricos e dos 20% mais pobres, para cerca de 45 países de vários continentes, a razão entre essas duas médias para a maioria dos países é inferior a 10. Somente para cinco países é superior a 20: Brasil, Guatemala, Guiné-Bissau, Lesoto e Panamá. Entre esses, o Brasil apresenta a maior razão: os 20% mais ricos ganham, em média, 32 vezes mais que os 20% mais pobres. Mesmo o Plano Real, que reconhecidamente apresentou efeitos importantes na redução da pobreza, não teve impactos significativos na redução da desigualdade de renda que, isoladamente, responde por 75% do número de pobres no País. Isso explica a constatação de que o Brasil não é um País pobre, mas um País de muitos pobres. Como diz o Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Brasil não é um País subdesenvolvido, mas um País injusto.

            Contudo, é preciso reconhecer que, a par de um esforço público de consolidar a estabilidade monetária e promover iniciativas importantes para a construção das bases do crescimento sustentado, o Congresso Nacional e o Poder Executivo têm se mostrado sensíveis a novas propostas voltadas para a redução das desigualdades e o combate à pobreza, a exemplo da criação recente do Fundo de Combate à Pobreza, do Programa Bolsa-Escola, do Programa Saúde da Família, do Programa Bolsa de Alimentação, além de outras ações relevantes para a inclusão social, consubstanciadas na agenda do biênio 2001/2002, do Governo Fernando Henrique Cardoso.

            É fundamental ainda considerar que, em razão do problema distributivo ter forte componente estrutural, os programas voltados para melhor distribuição de renda devem ter caráter abrangente e integrado e devem ser conduzidos de maneira sistemática e persistente, com a participação do Estado e da sociedade.

            Neste ano, a ênfase às prioridades sociais, já expressas no Orçamento Geral da União e a disposição do Presidente de cumprir a Agenda 2001/2002, fortalecendo os programas sociais, estimulam-nos a apresentar recomendações e sugestões às ações de governo, para que possamos atingir maior eficácia na implementação dessas ações, públicas e da sociedade, que visam à diminuição dos níveis de pobreza e da marginalização social no País.

            Em primeiro lugar, queremos sugerir a intensificação dos investimentos em programas de educação e qualificação profissional, especialmente para os jovens. Tais iniciativas constituem-se, a médio e longo prazos, nos investimentos mais eficazes na correção das desigualdades pessoais de renda. Nesse sentido, são relevantes as iniciativas em curso de alcançar a universalização plena do ensino fundamental e expandir e aperfeiçoar o ensino médio e profissional. Dessa forma, naquilo que diz respeito ao ensino médio e profissional, serão importantes também, de modo especial:

-     Maior ênfase ao ensino profissional e aos cursos pós-médios - que contribuem para completar a formação do jovem, ampliando o número de vagas e adequando-os às demandas atuais do mercado;

-     Criação da Bolsa-Estágio para a formação e profissionalização de jovens em situação de risco social, abrangendo a faixa etária de 18 a 24 anos, reformulando e ampliando programas que visam alcançar a juventude, a exemplo do Programa Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano. A prioridade de um programa dessa natureza, que objetiva atingir oito milhões de jovens no Brasil (25% do universo na faixa etária de 15 a 24 anos), recomendará, para o seu financiamento, a participação de empresas, organizações não-governamentais, complementarmente às ações do setor público;

-     Esforço no sentido de integrar um grande número de jovens à população economicamente ativa do Brasil. Nesse sentido, cabe sugerir a utilização da estrutura física e instalações das universidades, escolas técnicas federais e rede de ensino médio de Estados e Municípios durante os períodos de ociosidade, ou seja, fins de semana e períodos noturnos, em programas especiais de complementação educacional e profissional, contando-se, para isso, com a imprescindível participação do movimento de voluntariado.

Queremos sugerir ainda a reformulação da política tributária, que deve ter como um de seus principais pilares a justiça social, procurando diminuir a carga tributária sobre os mais pobres. Nesse sentido, torna-se fundamental reduzir os impostos incidentes sobre o consumo, especialmente sobre os itens de maior participação no consumo popular, compensando-os com maior tributação sobre a renda e o capital dos mais abastados, resguardando, ou mesmo reduzindo, a taxação sobre os assalariados.

Dentro do amplo espectro de política de distribuição de renda no País, gostaríamos que ficasse assegurada a convergência dos programas de promoção social e de desenvolvimento local sustentável nos Municípios brasileiros, a exemplo do Programa Comunidade Ativa (Comunidade Solidária), do Pronaf (Ministério do Desenvolvimento Agrário), do Programa Caixa do Município (Caixa Econômica Federal), do Programa Farol do Desenvolvimento (Banco do Nordeste), entre outros. Dessa forma, estaremos garantindo a implementação articulada desses programas oficiais, na base local, evitando a dispersão de esforços, de tempo e de dinheiro.

Também queremos recomendar a mudança dos critérios de enquadramento de Estados e Municípios nos programas integrados de combate à pobreza, a exemplo do Projeto Alvorada I (ou IDH 14) e do Alvorada II, que inclui investimentos de R$700 milhões nas áreas metropolitanas do Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador, evitando a exclusão de áreas extremamente pobres, hoje não contempladas por imperfeições estatísticas, onde a média mascara a existência de bolsões de pobreza em vários Municípios do País. Citamos como exemplo, no nosso Estado do Espírito Santo, as regiões periféricas dos Municípios de Cariacica, Serra, Vila Velha e Viana, apenas para falarmos das principais.

Queremos recomendar ainda a formulação e implementação de uma política urbana com intervenções prioritárias nas áreas periféricas, utilizando-se a experiência de financiamento de projetos integrados de melhoria de infra-estrutura e de habitabilidade urbana e de geração de emprego e renda, tomando como base a ação do BNDES - Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social - nesse campo, a exemplo do Projeto Terra, em execução em Vitória, no Espírito Santo. Para isso, é fundamental a ação integrada da Sedur - Secretaria de Desenvolvimento Urbano, do BNDES e da Caixa Econômica Federal, atuando em pareceria com os Estados e Municípios.

Sugerimos ainda a intensificação das ações que favoreçam a acumulação de ativos para os pobres, a exemplo da reforma agrária, do programa de crédito da agricultura familiar, do programa de microcrédito para as atividades do mercado informal, do Banco da Terra e dos programas de formação de empreendedores, aperfeiçoando esses mecanismos no sentido de ampliar o acesso aos mesmos, como por exemplo a constituição de fundo de aval na área de crédito - que poderia contar, inclusive, com a participação do poder público nos três níveis e das instituições financeiras.

Por último, gostaríamos de sugerir a utilização integral dos recursos de emendas individuais e de bancada em programas focados no combate à pobreza.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o reconhecimento da importância dos programas de combate à pobreza motivaram-nos a protocolar nesta Casa, em outubro passado, projeto de emenda constitucional visando conceder imunidade de impostos aos bens e serviços prestados e doados às instituições de assistência social beneficentes. Trata-se de estimular a iniciativa privada a participar desse grande desafio, sem ser onerada por impostos indiretos da União, dos Estados e dos Municípios e, ao mesmo tempo, contribuir para se desenvolver uma cultura de solidariedade e de paz na sociedade brasileira.

Certamente, as experiências locais exitosas de combate à pobreza e redução das desigualdades, de natureza pública ou mesmo de iniciativa da sociedade civil organizada, não são poucas no Brasil, ainda que não sejam plenamente articuladas.

Algumas se diferenciam pela singularidade e dedicação de voluntários anônimos que se empenham na prestação de serviços humanitários; outras tantas, ainda, pela iniciativa das associações de bairros, entidades filantrópicas e igrejas que se mobilizam em favor dos indigentes e excluídos.

Se essas iniciativas organizarem-se em ações convergentes, articuladas e concertadas desde a União, passando pelos Estados e envolvendo os Municípios e as comunidades locais, certamente avançaremos a passos largos na construção de um Brasil melhor para todos. É necessário, contudo, que nos despojemos de vaidades políticas, de carimbos programáticos e de ações isoladas. Esse é o grande desafio para o País neste início de milênio.

Muito obrigado, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/03/2001 - Página 4413