Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CRITICAS A NOVA REGULAMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO A DISTANCIA PELO MINISTERIO DA EDUCAÇÃO. ELOGIOS A INICIATIVA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, QUE INSTITUIU O PRIMEIRO CURSO DE POS-GRADUAÇÃO A DISTANCIA NO PAIS, NA AREA DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO.

Autor
Moreira Mendes (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Rubens Moreira Mendes Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
REGIMENTO INTERNO. EDUCAÇÃO.:
  • CRITICAS A NOVA REGULAMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO A DISTANCIA PELO MINISTERIO DA EDUCAÇÃO. ELOGIOS A INICIATIVA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, QUE INSTITUIU O PRIMEIRO CURSO DE POS-GRADUAÇÃO A DISTANCIA NO PAIS, NA AREA DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO.
Aparteantes
Leomar Quintanilha.
Publicação
Publicação no DSF de 05/04/2001 - Página 5369
Assunto
Outros > REGIMENTO INTERNO. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • CRITICA, PRIVILEGIO, SENADOR, RELAÇÃO, USO DA PALAVRA, NECESSIDADE, CUMPRIMENTO, REGIMENTO INTERNO.
  • IMPORTANCIA, DESENVOLVIMENTO, TECNOLOGIA, AUMENTO, DEMOCRACIA, EDUCAÇÃO, DISTANCIA, ESPECIFICAÇÃO, POS-GRADUAÇÃO, ELOGIO, INICIATIVA, UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA (UFSC), AREA, ENGENHARIA DE PRODUÇÃO.
  • CRITICA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), REGULAMENTAÇÃO, ENSINO, DISTANCIA, AMBITO, AVALIAÇÃO.
  • ANALISE, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, AREA, EDUCAÇÃO, DISTANCIA, DEFESA, INVESTIMENTO, TECNOLOGIA, INTERNET.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, antes de abordar o tema do qual pretendo tratar, quero, mais uma vez, enfatizar o meu protesto com relação ao uso da tribuna nesta Casa. Não há aqui Senador de primeira ou de segunda classe, Senador ou Partido mais ou menos importante. Nós todos aqui somos absolutamente iguais. Contudo, há dois anos, desde que vim para esta Casa, tenho verificado, reiteradamente, um determinado grupo de Senadores - uma dúzia ou uma meia dúzia ou, no máximo, duas dúzias - usufruir de certos privilégios que os outros não têm. Essa situação não pode continuar! Deixo aqui o meu veemente protesto e apelo à Presidência no sentido de que faça, efetivamente, cumprir o que determina o Regimento Interno.

Já houve ocasião em que o Presidente foi substituído por outro Senador para vir tomar a minha palavra aqui na tribuna, porque apenas ultrapassei em cinco minutos o meu pronunciamento, embora tenha visto, freqüentemente, muitos Senadores ultrapassarem o seu tempo, e nenhuma providência ser tomada. Por conseguinte, reitero este meu protesto no sentido de que o Regimento Interno seja daqui para frente efetivamente cumprido, valendo para todos os Senadores.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero abordar hoje aqui um tema relacionado à educação a distância. Não se pode imaginar que a tecnologia globalizada sirva apenas para demarcar novos parâmetros de aferição de poder. Antes, tem cumprido uma função extremamente democrática em nossa contemporaneidade, que se traduz na oferta de possibilidades educacionais a um número insuperavelmente enorme de homens e mulheres.

Refiro-me mais especificamente a expansão do ensino virtual de terceiro grau, ou melhor dizendo, a expansão da Educação a distância na pós-graduação.

            Não se pode mais imaginar que a tecnologia globalizada sirva apenas para demarcar novos parâmetros de aferição de poder. Antes, tem cumprido uma função extremamente democrática em nossa contemporaneidade, que se traduz na oferta de possibilidades educacionais a um número insuperavelmente enorme de homens e mulheres. Refiro-me, mais especificamente, à expansão do ensino virtual de terceiro grau, ou melhor dizendo, à expansão da educação a distância na pós-graduação.

No Brasil, embora incipiente, o ingresso do ensino à distância já constitui sucesso insofismável. Apenas como exemplificação, a Universidade Federal de Santa Catarina saiu na frente e já instalou em caráter inédito o laboratório de ensino a distância do programa de pós-graduação em engenharia de produção. Para tanto, não hesitou em investir um volume substancial de capital em avançadas tecnologias da informação e comunicação, além de mobilizar recursos humanos capacitados para o estabelecimento de um robusto referencial pedagógico.

Sua concepção se baseia no rompimento de barreiras no que diz respeito à distância e ao tempo para a transmissão e aquisição do conhecimento nas sociedades modernas. Visa-se assim a suprir a crescente necessidade de formação e qualificação profissional no cenário transnacional do trabalho e da produção. E, no caso da Federal de Santa Catarina, que surgiu em 1995, a modelagem de instrução de cada curso se desenvolve a partir do conhecimento prévio das necessidades da clientela estudantil. Isso pressupõe o conhecimento de seus objetivos na infra-estrutura tecnológica e seu perfil.

Sr. Presidente, Srs. Senadores, no entanto para espanto de todos aqueles que prezam pelo saber e pela educação no País, as ações do MEC, ou melhor, de alguns setores do Ministério da Educação - e tenho certeza que aí não está incluído o pensamento do eminente Ministro Paulo Renato -, sobre a regulamentação do ensino a distância não têm correspondido às expectativas. Em primeiro lugar, cumpre dizer que, somente há bem pouco tempo, o Ministério baixou, por fim, resolução regulamentando a matéria. Se, por um lado, a regulamentação em seu aspecto formal expressa um sentimento inequívoco de avanço; por outro, seu conteúdo deixou muito a desejar.

Surpreendendo a todos, o texto aprovado cai por vezes num excesso de ortodoxia pedagógica. Por exemplo, insiste na retrógrada tese instrutiva, segundo a qual o sistema de avaliação a ser aplicado na educação a distância não pode ser realizado virtualmente. Em outras palavras, aceita-se a virtualidade do ensino, mas não se estende o mecanismo mais característico ao processo de verificação do mesmo aprendizado.

Ora, não me restam dúvidas: trata-se de mais uma pura expressão da contradição da burocracia brasileira. Na minha modesta leitura, o MEC - ou melhor, alguns setores do MEC, como eu já disse - ainda julgam o modelo virtual aplicado na pós-graduação à luz de uma desconfiança infundada. Somente assim, explica-se, no §1º do art. 3º do texto aprovado, a exigência formal de provas e atividades presenciais para os cursos de pós-graduação stricto sensu, do mesmo modo que, no art. 11, prevê-se incluir “necessariamente” para os cursos lato sensu provas presenciais e defesa presencial de monografia ou trabalho de conclusão de curso.

Ao que me consta, o que está em jogo na introdução dos cursos de pós-graduação a distância no Brasil não é, em absoluto, a experimentação provisória de uma sistema educacional corretivo, retificador, ou mesmo propedêutico, visando apenas a remendar o modelo tradicional hegemonicamente vigente. Pelo contrário, trata-se muito mais de uma nova concepção de aprendizagem, cujos princípios técnicos adotam as inovações tecnológicas da linguagem como instrumentos indispensáveis à instrução, à apropriação e à avaliação do conhecimento contemporâneo.

Se para o mundo desenvolvido, onde as disparidades regionais são bem menos acentuadas, a adoção da virtualidade educacional já superou a fase da desconfiança e da resistência, porque seria diferente no Brasil? Os puristas que nos perdoem, mas não podemos esquecer que o nosso País convive com taxas de escolaridade brutalmente contrastantes. E isso se reproduz, ainda mais gravemente, nos níveis mais altos da formação educacional. Enquanto o Sul e Sudeste se apoderam de quase 85% dos docentes-doutores e 75% dos docentes-mestres em exercícios nas universidades brasileira, o Norte não consegue compor sequer 5% do total do número de professores universitários com titularidade pós-graduada. Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, para reverter injusta situação, ao Estado brasileiro não sobra outra alternativa viável senão o investimento na educação a distância em todos os níveis de escolaridade.

Nesse sentido, o apoio das agências financiadoras, tais como a Capes e o CNPq, à instalação de programas virtuais de pós-graduação pelo País se torna objeto de extrema relevância. Pois é inadmissível que, no limiar desse novo milênio, técnicos e dirigentes de ambos os órgãos ainda resistam a uma discussão mais progressistas e menos preconceituosa sobre o assunto. No mínimo, espera-se uma postura de tolerância e de boa vontade para com as instituições que, com sucesso, já incorporaram os cursos de pós-graduação a distância no seu leque de ofertas.

O Sr. Leomar Quintanilha (Bloco/PPB - TO) - Concede-me V. Exª um aparte?

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Leomar Quintanilha (Bloco/PPB - TO) - Senador Moreira Mendes, sei da exigüidade do tempo de V. Exª para discutir e abordar um assunto tão importante e tão candente, nesse momento delicado em que a economia nacional avança. Entretanto, o ensino a distância vem seguramente promover uma verdadeira revolução na educação da nossa gente. O Brasil, com um esforço ingente para aprimorar os mecanismos e os meios de educação, no momento em que a globalização acaba por transformar em analfabeto contemporâneo aquele que não tem acesso à educação e facilidade para manusear os meios modernos de comunicação, ainda se arrasta, tentando eliminar uma chaga da nossa sociedade: o analfabeto tradicional, que não aprendeu a ler e a escrever, num índice ainda muito elevado. E, se considerássemos um pouco mais, aqueles que, ainda que tenham aprendido a ler e a escrever, não interpretam aquilo que lêem. Portanto, entendo - e V. Exª coloca isto muito bem - que o ensino a distância efetivamente dará uma contribuição muito grande, primeiro para a universalização do ensino, para que o ensino alcance todos os quadrantes do País simultaneamente, facilitando o acesso a uma gama considerável de brasileiros que não tiveram, em oportunidades anteriores, acesso ao conhecimento e à informação.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Agradeço o aparte de V. Exª, que certamente enriquecerá ainda mais este modesto trabalho.

A título de ilustração, a Federal catarinense organizou, em 98, um programa de mestrado a distância para 48 funcionários de uma mesma empresa em 12 cidades diferentes no Brasil. O sistema de aulas operou por meio de videoconferências na área de engenharia de produção, ministradas por professores sediados em Florianópolis, com duração de 18 meses. Além de ter evitado a saída dos empregados do local de trabalho, o mestrado contraiu despesas por empregado-aluno que não ultrapassaram a faixa dos 500 reais ao mês.

No fundo, a educação virtual no âmbito da pós-graduação tem como objetivo - independentemente da localização geográfica - a promoção, a criação e a disseminação de conhecimentos entre a universidade e os diversos segmentos da sociedade. Por intermédio do desenvolvimento e da utilização de avançados ambientes virtuais de aprendizagem, busca-se a tão sonhada democratização do ensino sofisticado e pormenorizadamente complexo da pós-graduação. Na prática, as atividades de preparação e a realização das aulas estão acumulando conhecimento para uma nova pedagogia, lastreada na estimulação múltipla autorizada pelo uso de recursos como animações e gráficos em terceira dimensão.

Em São Paulo, a diretora da Universidade Anhembi Morumbi, Carmen Maia, avisa que o projeto virtual da instituição consiste em atender demandas de cursos de extensão e especialização para graduação e pós-graduação. Ela integra o consórcio UVB - Universidade Virtual Brasileira, em cuja composição se reúnem mais nove instituições nacionais de ensino de terceiro grau. Trata-se de estabelecimentos privados espalhados por todo o País, de Santa Catarina à Amazônia, do Rio de Janeiro ao Rio Grande do Norte. Nessa mesma linha, o Centro de Pesquisa Paula Souza, no Rio de Janeiro, assinou convênio com a mais expressiva representante do gênero nos Estados Unidos, a American University of Technology, em cujos termos se fixa a abertura de cursos de pós-graduação em ciência da computação e tecnologia da informação.

Cumpre ressaltar que o próprio Governo Federal já lançara em 2000 o projeto intitulado Universidade Virtual Pública do Brasil mais comumente conhecida por UniRede, visando atender a cerca de 100 mil alunos até o final de 2002. Os Ministros da Educação e da Ciência e Tecnologia - Paulo Renato Souza e Ronaldo Sardenberg - classificaram o projeto como de alta prioridade, pois se destinaria a resolver o problema da baixa formação educacional dentro do quadro dos professores dos ensinos básico e fundamental no País. Acrescentaram, à época, que a UniRede, a médio e longo prazos, se ocuparia dos cursos de pós-graduação, mestrados e profissionalizantes. Para tanto, a UniRede se constituiu na forma de consórcio, a cuja estrutura sessenta e três instituições públicas de ensino no País se incorporaram. Diante disso, eis um compromisso que deve ser honrado ainda nessa gestão administrativa sob a batuta do Presidente Fernando Henrique.

Sob um olhar retrospectivo, descobriremos que a própria Lei de Diretrizes e Bases, sancionada em 96, contemplava a educação a distância pela primeira vez, proporcionando aos estudantes e profissionais brasileiros uma gama de oportunidades de crescimento e estudo de maneira essencialmente autônoma. Em 98, a educação a distância foi normatizada pelos Decretos nºs 2.494 e 2.561, pelos quais se assegura a emissão de certificados para os cursos de graduação, quando realizados virtualmente em estabelecimentos oficialmente credenciados. Na seqüência, a própria Associação Brasileira de Ensino a Distância elaborou, decorridos dois anos da promulgação da LDB, seu código de ética, com o propósito de evitar a proliferação de empresas ou instituições interessadas tão-somente na locupletação desbragada.

No entanto, apesar da euforia e de todo o controle sobre as regras do ensino a distância, não há absoluta unanimidade no assunto. Além de alguns setores dentro do MEC -- como havia mencionado anteriormente --, acadêmicos protestam contra qualquer tipo de mudança no sistema de ensino. Na verdade, alguns professores universitários vêm alegando que, com a implementação indiscriminada dos cursos de pós-graduação, corre-se o risco de substituir o professor pela máquina, provocando uma dispensa em massa do catedrático universitário sob o falso argumento de sua obsoleta sobrevivência. Isso, segundo os mesmos professores, levaria a uma queda na qualidade do ensino e da pesquisa, além da acentuação do grau de desumanização na produção do conhecimento.

Outro entrave identificado na implantação do programa de educação virtual consistiria, segundo especialistas, na ausência de um comprometimento mais firme do Estado brasileiro com o financiamento dos custos tecnológicos. Se o Ministério da Ciência e Tecnologia e o Ministério da Educação têm, de fato, pretensões de democratizar o acesso ao ensino superior e à pós-graduação mediante a UniRede, então devem lembrar que isso não será possível sem que se democratize igualmente o acesso aos microcomputadores, de cujos preços, que ainda vagam nas alturas, a população tanto reclama.

Ao lado disso, o MEC não pode descuidar-se do comprometimento com o auto-aperfeiçoamento tecnológico ininterrupto, a partir do qual se poderá garantir acesso fácil a banco de dados, bibliotecas virtuais, videoconferências, correios eletrônicos eficientes, CD-Roms de última linha etc. E não é por acaso, portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, que, dos inúmeros cursos a oferecer virtualmente para a pós-graduação, o MBA (Master in Business Administration) ocupa lugar de destaque entre os preferidos. Trata-se de curso que se destina basicamente a um segmento selecionado de executivos que preza as condições excepcionais de ensino e aprendizado.

De acordo com o coordenador do sistema de educação a distância da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Carlos Messeder Pereira, a limitação tecnológica da Internet brasileira representa o único entrave para a exploração do potencial total da proposta virtual de ensino. Somente mediante um sofisticado desenvolvimento tecnológico, é possível confeccionar um design adequado e um planejamento competente dos cursos virtuais oferecidos, a ponto de desafiar os limites e as insuficiências dos cursos tradicionalmente montados.

Por isso, a própria Universidade de São Paulo, uma das universidades mais respeitadas do País, não aderiu integralmente à proposta do ensino a distância, tanto na graduação, quanto na pós-graduação. Tal decisão se justifica na medida em que, nas condições atuais de infra-estrutura e de método pedagógico, não se pode garantir o mesmo padrão de qualidade dos cursos ao vivo. No entanto, a Reitoria da Universidade de São Paulo acena com mais otimismo quando o mesmo assunto se restringe estritamente à pós-graduação. Para ela, os cursos de extensão, mestrado e doutorado são mais afeitos aos moldes do ensino a distância, na proporção em que os alunos já se apresentam com a formação concluída e com método de estudo definido.

Finalizando, Sr. Presidente, quero dizer que, diante do exposto, tenho a impressão de que, embora o ensino a distância ainda encontre resistência em setores restritos do MEC e na academia, seu desenvolvimento no Brasil é irreversível. Não há como interromper uma corrente educacional tão avassaladora. A modernidade brasileira depende de tomadas de decisões rápidas e eficientes dos nossos dirigentes, no sentido de superar nossos atrasos estruturais no âmbito da educação, do conhecimento e da tecnologia. Em suma, seguindo o sucesso que tem alcançado nas poucas universidades que a adotaram, a educação a distância deve contar com o apoio de todos aqueles que torcem por uma educação menos elitista e, assim, mais socializável, mais democrática.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/04/2001 - Página 5369