Discurso durante a 30ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

IMPORTANCIA DA EXTENSÃO DO PROGRAMA BOLSA-ESCOLA PARA TODO O BRASIL.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA SOCIAL.:
  • IMPORTANCIA DA EXTENSÃO DO PROGRAMA BOLSA-ESCOLA PARA TODO O BRASIL.
Aparteantes
Lauro Campos, Leomar Quintanilha.
Publicação
Publicação no DSF de 07/04/2001 - Página 5640
Assunto
Outros > POLITICA SOCIAL.
Indexação
  • ELOGIO, GOVERNO FEDERAL, IMPLEMENTAÇÃO, AMBITO NACIONAL, PROGRAMA, RENDA MINIMA, VINCULAÇÃO, EDUCAÇÃO, BENEFICIO, DISTRIBUIÇÃO DE RENDA, AUMENTO, ESCOLARIDADE, COMBATE, EXPLORAÇÃO, TRABALHO, CRIANÇA.
  • APREENSÃO, FORMA, RECEBIMENTO, RECURSOS, MÃE, RESIDENCIA, MUNICIPIOS, AUSENCIA, AGENCIA, BANCOS, EMPRESA BRASILEIRA DE CORREIOS E TELEGRAFOS (ECT), LOTERIA, SOLICITAÇÃO, GOVERNO, BUSCA, SOLUÇÃO.
  • DEFESA, AMPLIAÇÃO, RECURSOS, FUNDO ESPECIAL, COMBATE, POBREZA, DESTINAÇÃO, PROGRAMA, RENDA MINIMA, VINCULAÇÃO, EDUCAÇÃO, SUGESTÃO, CONCENTRAÇÃO, ATENDIMENTO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, AUMENTO, VALOR, FAMILIA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há poucas unanimidades no Brasil. Entretanto, o assunto que trago ao Plenário é, potencialmente, uma delas. Nem os mais ferrenhos críticos do Governo Fernando Henrique deixam de reconhecer o grande mérito da adoção do Programa Bolsa-Escola, agora lançado em nível nacional.

O programa, que visa, essencialmente, a incentivar famílias de baixa renda a manter seus filhos na escola, poderá beneficiar, neste ano, 5,9 milhões de famílias com renda per capita mensal inferior a meio salário mínimo, com filhos ou dependentes entre 6 e 15 anos matriculados no Ensino Fundamental. A principal exigência do programa é a de que a criança freqüente, pelo menos, 85% das aulas. A verificação da assiduidade será trimestral.

O objetivo indireto da iniciativa é melhorar a distribuição de renda por meio da ampliação das oportunidades que só a educação proporciona. A taxa de escolaridade no ensino básico no Brasil alcançou 97% no ano passado, segundo dados do IBGE. Isso significa que a quase totalidade das crianças, entre 7 e 14 anos, mesmo nas regiões mais carentes do País, estão freqüentando a escola. Mas não significa que todas elas conseguirão completar o ciclo básico obrigatório de oito anos de escolaridade. As condições de vida das famílias com renda muito baixa forçam a existência do trabalho infantil.

O Bolsa-Escola visa a interromper esse ciclo perverso: a família, melhor dito, a mãe de família receberá o recurso mínimo que lhe permitirá manter o filho na escola. A Bolsa-Escola será distribuída sem intermediários. Com um cartão magnético, a mãe do aluno receberá o valor das bolsas em bancos, agências dos Correios e lotéricas, acabando-se, dessa maneira, com uma tradicional fonte de desvios, que era a intermediação de recursos.

No entanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nesse particular, quero fazer um comentário, com o objetivo de chamar a atenção dos técnicos responsáveis pela elaboração desse programa. Na verdade, a grande maioria dos Municípios do Brasil não tem uma agência dos Correios, uma agência bancária ou uma lotérica. Então, é de se preocupar que, ao se buscar aperfeiçoar o programa, evitando-se intermediários por meio de cartões magnéticos, inviabilize-se o êxito do programa em muitos Municípios, principalmente nos mais pobres. No meu Estado, por exemplo, dos 14 Municípios do interior, apenas quatro têm agência bancária ou dos Correios. Isso faz com que a família que ganha um cartão magnético tenha que se deslocar para outros Municípios a fim de receber o benefício, que é pequeno: de R$15,00 a R$45,00 por família, já que são R$15,00 por aluno na escola.

Ao mesmo tempo em que estou elogiando a iniciativa desse programa, gostaria de pedir ao Sr. Ministro da Educação e aos responsáveis pela sua execução que encontrem uma alternativa para os Municípios onde não existem agências de banco, dos Correios ou lotérica, para não tornar uma idéia tão boa inútil na maioria dos Municípios brasileiros.

Aqueles que criticam o modelo do programa como forma temporária de correção das disparidades na distribuição de renda em nosso País desconhecem que o Programa de Renda Mínima foi experimentado, com maior ou menor êxito, em diversos países. Os Estados Unidos, na década de 30, sob a presidência de Roosevelt, assistiram à forte intervenção do estado na economia, na tentativa de criar empregos e sair da recessão. Na França, logo depois da Segunda Guerra Mundial, as autoridades de Lyon decidiram pagar salário aos pais que enviassem os filhos à escola. O objetivo era proteger as crianças, alimentá-las e educá-las. As emergências do momento imediatamente posterior ao conflito recomendavam políticas inovadoras.

A situação do Brasil também reclama a adoção de políticas inovadoras. O País tem grande população carente e enorme déficit educacional. São duas emergências que se combinam. O Programa Bolsa-Escola ataca os dois objetivos: evita que o filho do pobre seja condenado a também ser pobre, abre perspectivas de futuro por meio da educação e concede aos pais uma renda suplementar.

Além de tudo, Srªs e Srs. Senadores, o Bolsa-Escola não é, como querem alguns, um programa de renda mínima tradicional. Esses programas propõem uma renda mínima para o cidadão sem qualquer contrapartida, simplesmente porque a pessoa é cidadã e, como tal, merece viver com um mínimo de dignidade.

O Bolsa-Escola é um programa que concede uma renda mensal a uma família, mas exige uma contrapartida. Exige que os pais deixem os filhos na escola. O programa parte do pressuposto de que é impossível impedir os pais de utilizarem os filhos em algum tipo de atividade para complementar a renda familiar. Para resolver o problema, o Estado decide pagar para que os pais deixem os seus filhos na escola. Ao fazer isso, o programa elimina o trabalho infantil e garante a única saída que essas crianças terão para melhorar de vida.

O Bolsa-Escola é fundamental na plena implantação do direito à educação. Trata-se de um instrumento que pratica a chamada “gratuidade ativa” em contraposição à “gratuidade passiva”, em que vigora apenas o não-pagamento das mensalidades. A gratuidade ativa volta-se para ofertar o que for necessário para que se realize plenamente o direito à educação.

O instituto da gratuidade do ensino nas escolas públicas serviu, por muito tempo, para alimentar a falsa interpretação de que haveria igualdade de oportunidades. Contudo, além da inexistência ou insuficiência de oferta escolar, há a problemática que cerca a vida de cada criança. Trata-se do custo-oportunidade envolvido na presença na escola. Em um país com os nossos problemas, é responsabilidade da sociedade levar em conta o quanto é oneroso para uma família manter um filho na escola, mesmo que gratuita.

Como se vê, Srªs e Srs. Senadores, o Programa Bolsa-Escola é inatacável sob o ponto de vista da concepção e da proposta de execução, que prevê o acompanhamento do Ministério da Educação. Entretanto, é forçoso admitir que ainda é muito baixo o valor que será repassado às famílias no Programa Bolsa-Escola do Governo - entre R$ 15,00 e R$ 45,00 por mês -, bem menor do que o praticado por governos estaduais, prefeituras e organizações não-governamentais em projetos semelhantes. No Distrito Federal e no Rio de Janeiro, cada família recebe um salário mínimo, enquanto, em Belo Horizonte, a quantia é de R$148,93 e, em Mato Grosso do Sul, de R$136,00. Esses programas beneficiam um número bem menor de famílias. No Distrito Federal, são 23 mil; em Belo Horizonte, sete mil; e no Rio de Janeiro, mil. Já o Bolsa-Escola nacional quer atender, este ano, 5,9 milhões de lares. Famílias com um filho receberão R$15,00 por mês, com dois, R$30,00 e, com três ou mais, R$ 45,00. O programa deverá distribuir R$1,7 bilhão a partir de abril ou maio.

São números expressivos, mas ainda modestos, se confrontados com as carências existentes. As famílias brasileiras têm, em média, 2,2 filhos em idade escolar. O Programa Bolsa-Escola vai pagar, portanto, R$30,00 por família, em média. Esse é um dinheiro que não pode ser desprezado no interior, principalmente do Norte e do Nordeste do Brasil.

Por outro lado, reconhecemos a dificuldade de se fazer qualquer tipo de diferenciação de valores por região. Mas, se a diferenciação regional é politicamente complicada, por que, então, não concentrar os recursos do Bolsa-Escola? É o caso, por exemplo, dos recursos do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza: dos R$4 bilhões do Fundo, o Governo destinou apenas R$1,7 bilhão para o programa. Se os outros R$2,3 bilhões restantes fossem utilizados, seriam suficientes para dar uma renda de R$70,00 a R$80,00 a cada família que mantivesse os filhos na escola.

Essa é, portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a verdadeira demanda que se deve colocar em relação ao Programa Bolsa-Escola. As discussões a respeito da paternidade do programa são demagógicas e inúteis. O que importa, de fato, é que o Bolsa-Escola representa uma alternativa comprovadamente eficaz para deter o êxodo escolar e estimular a permanência de nossas crianças na escola.

E, aqui, Sr. Presidente, quero fazer um registro: embora se fale que o Distrito Federal, o Rio de Janeiro e outros Estados importantes da Federação implantaram o Bolsa-Escola, o Município de Iracema, no interior do meu Estado, com pouco mais de seis mil habitantes, implantou esse programa, exigindo, para pagar o benefício, não só a presença na escola, a freqüência às aulas, como também a aprovação, a permanente supervisão médica e odontológica a cada aluno, controlada pela direção da escola, e a prática de uma atividade esportiva.

Na verdade, em vários Municípios deste País, esse programa já foi testado com muito êxito. Temos, realmente, que reconhecer que, embora pouco, o que o Governo Federal resolve dar representa um grande passo no sentido de corrigir esta injustiça social que é apenar famílias pobres, impedindo que tenham seus filhos nas escolas.

Se queremos, verdadeiramente, retomar ou construir um projeto de nação, coloca-se a necessidade imperiosa da adoção de mecanismos que propiciem respostas, alimentem os sonhos coletivos e concretizem promessas de realização. O Programa Bolsa-Escola conjuga, favoravelmente, todos esses fatores. Deve ser tratado, portanto, como prioridade de Estado, acima das disputas eleitoreiras e das vaidades pessoais.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT - DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Com muito prazer, concedo o aparte ao Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos (Bloco/PT - DF) - Quero dar os parabéns a V. Exª por ter abordado um tema tão importante quanto este da Bolsa-Escola. Penso que esse problema deve ser considerado juntamente com outro: o da privatização do ensino, que leva, obviamente, aquelas famílias que têm uma renda considerada satisfatória, uma renda média, uma renda da classe média, diante de diversos fenômenos, inclusive a deterioração dos serviços públicos de educação, a recorrerem às escolas privadas, às escolas particulares. Essas escolas particulares constituem, em todos os níveis, do primário à universidade, um dos setores que mais crescem no Brasil. Ora, o que significa isso? Significa que os brasileiros passaram a gastar mais em educação, mais em transporte, mais em eletricidade e, assim, o salário disponível para outros fins, por exemplo, alimentação, obviamente tem diminuído, uma vez que eles estão agora - os salários - afetados a pagamentos de serviços que antigamente eram públicos e que hoje estão sendo adquiridos a preço de mercado. Um outro fenômeno também que o IBGE aponta é que o número de analfabetos funcionais, isto é, aqueles que cursam apenas quatro anos de estudos, tem crescido no Brasil. O analfabetismo funcional mostra que o problema do ensino está longe de alcançar algum equacionamento satisfatório no Brasil. Em 1999, diz o IBGE, 29,4% das pessoas com 15 anos ou mais eram analfabetos funcionais. Os técnicos consideram “dramática” a proporção de analfabetos funcionais no Nordeste, 46,2%! Obrigado pelo aparte. Era isso que eu desejaria acrescentar.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Sou eu que agradeço ao ilustre Professor Senador Lauro Campos pelo aparte. No meu pronunciamento, tive a oportunidade de dizer que, enquanto comemoramos o fato de que 97% das crianças na idade de 7 a 14 anos estão matriculadas, registramos que um percentual muito grande delas não concluem o Ensino Básico, com oito anos de escolaridade.

É verdade, portanto, que o sistema educacional precisa ser melhorado. Houve avanços, como aconteceu com o Fundef e agora com a Bolsa-Escola. Tenho certeza de que são mecanismos que nos ajudam a chegar ao lugar em que consideramos satisfatório para o ensino público.

O Sr. Leomar Quintanilha (Bloco/PPB - TO) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Tenho o prazer de conceder o aparte ao Senador Leomar Quintanilha.

            O Sr. Leomar Quintanilha (Bloco/PPB - TO) - Senador Mozarildo Cavalcanti, V. Exª tem razão quando afirma que esse tema é unanimidade, principalmente nesta Casa. De há muito vimos discutindo e observando que alguns governos vêm fazendo, com denominação diversa, renda mínima, Bolsa-Escola, esse esforço fundamental para que efetivamente possamos colocar todas as nossas crianças nas escolas. Sabemos que as dificuldades estão exatamente nos substratos sociais mais baixos, onde as famílias, com pouca renda, enfrentam obstáculos maiores para colocar as suas crianças na escola. Sentimo-nos relativamente gratificados ao perceber que esse sentimento se alastra por todo o País e que governantes, em seus diversos níveis, estão procurando dar a sua contribuição para que possamos colocar todas as crianças na escola. Não há como pensar em desenvolvimento de um povo ou de uma nação se não investirmos maciçamente na educação, começando pela base, o ensino fundamental. Ressalto o sucesso do programa realizado no Tocantins, com a denominação diferente, Pioneiros Mirins, voltado para atender às famílias mais carentes. Hoje esse programa está sendo implementado em todos os Municípios do Estado. Funciona como a Bolsa-Escola, porque há a exigência de que a criança, para integrar o esquadrão dos Pioneiros Mirins, esteja freqüentando a sala de aula. E há a compensação, porque, além de ser dada uma orientação complementar à grade curricular - noções de civismo, por exemplo - ainda há essa pequena remuneração que, em muitas casas, chega a ser praticamente a receita segura de que a família dispõe no final do mês para a sua sobrevivência. No Tocantins está sendo um sucesso. Há visível sentimento de orgulho das crianças que participam desse programa. Eu estava fazendo um cálculo aqui, até com certo receio de me equivocar, mas eu diria que cerca de 2,72% da população estão sendo atingidos pelo Programa Bolsa-Escola. E se pegarmos o universo de crianças na escola, estaríamos atendendo pouco mais de 12% com o Programa dos Pioneiros Mirins, que funciona como a Bolsa-Escola. Portanto, concordo com V. Exª em que isso é uma unanimidade e espero que, num futuro não muito remoto, o Brasil por inteiro, seus Estados e seus Municípios, estejam com programas semelhantes para que possamos ter toda a nossa população infantil nas escolas.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Agradeço ao ilustre Senador Leomar Quintanilha pelo aparte. Fico feliz em saber que, a exemplo do Distrito Federal, que já adota esse programa há algum tempo, e de Tocantins, que, como mencionou V. Exª, também vem adotando, os governantes brasileiros, em nível municipal, estadual, e agora em nível federal, estão conscientes de que não basta construir a escola, contratar o professor e ficar esperando que as famílias pobres, carentes, tenham condição de manter seus filhos lá, para depois, ao final do ano, constatar que a evasão escolar é enorme e não chegar à raiz do problema, que é justamente este: a família pobre não tem condição de manter o filho estudando, mesmo com a escola gratuita.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/04/2001 - Página 5640