Discurso durante a 42ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

TRANSCURSO, EM PRIMEIRO DE MAIO, DO DIA INTERNACIONAL DO TRABALHO. DEFESA DA REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESEMPREGO.:
  • TRANSCURSO, EM PRIMEIRO DE MAIO, DO DIA INTERNACIONAL DO TRABALHO. DEFESA DA REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO.
Aparteantes
Lauro Campos.
Publicação
Publicação no DSF de 27/04/2001 - Página 7348
Assunto
Outros > DESEMPREGO.
Indexação
  • ELOGIO, LUTA, TRABALHADOR, ORIGEM, DIA INTERNACIONAL, TRABALHO, DEFESA, REDUÇÃO, JORNADA DE TRABALHO.
  • CRITICA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, FALTA, POLITICA DE EMPREGO.
  • CRITICA, COMEMORAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, TRABALHO, BRASIL, NECESSIDADE, REALIZAÇÃO, PROTESTO, AUTORIA, SINDICATO, MOTIVO, DESEMPREGO.

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, na próxima semana, terça-feira, será comemorado o Dia Internacional do Trabalho.

Nós, trabalhadores brasileiros, não temos muito o que comemorar. Pela situação em nosso País, o desemprego, a violência, a miséria, a falta de escola para o trabalhador, de hospitais, de moradias, o salário de fome, por tudo isso, não temos quase nada ou nada a comemorar.

É bom sempre lembrar a história que deu origem ao dia 1º de Maio. Poucos são os trabalhadores ou até mesmo os sindicalistas que conhecem a origem do 1º de Maio. Muitos pensam que é um feriado decretado pelo Governo, outros imaginam que é um dia santo em homenagem a São José; existem até aqueles que pensam que foi o seu patrão que inventou um dia especial para a empresa oferecer um churrasco aos “seus” trabalhadores.

As origens do 1º de Maio prendem-se à proposta dos trabalhadores organizados na Associação Internacional dos Trabalhadores - AIT - de declararem um dia de luta pelas oito horas de trabalho. Mas foram os acontecimentos de Chicago, em 1886, que vieram a dar-lhe o seu definitivo significado de dia internacional de luta dos trabalhadores.

Quando milhares de trabalhadores de Chicago, tal como de muitas outras cidades americanas, foram para as ruas no 1º de maio de 1886, seguindo os apelos dos sindicatos, não esperavam a tragédia que marcaria para sempre essa data. No dia 4 de maio, durante novas manifestações na praça Haymarket, uma explosão no meio da manifestação serviu como justificativa para a repressão brutal que se seguiu, provocando mais de 100 mortos e a prisão de dezenas de militantes operários e anarquistas.

Alberto Parsons, um dos oradores do comício de Haymarket, conhecido militante anarquista, tipógrafo de 39 anos, que não tinha sido preso durante os acontecimentos, apresentou-se voluntariamente à polícia, tendo declarado: “Se é necessário subir também ao cadafalso pelos direitos dos trabalhadores, pela causa da liberdade e para melhorar a sorte dos oprimidos, aqui estou”. Junto com August Spies, tipógrafo de 32 anos, Adolf Fisher, tipógrafo de 31 anos, George Engel, tipógrafo de 51 anos, Ludwig Lingg, carpinteiro de 23 anos, Michael Schwab, encadernador de 34 anos, Samuel Fielden, operário têxtil de 39 anos, e Oscar Neeb seriam julgados e condenados. Os quatro primeiros, Persons, Fisher, Spies e Engel, foram condenados à forca e executados em 11 de novembro de 1887, enquanto Lingg se suicidou na cela. Augusto Spies declarou profeticamente, antes de morrer: “Virá o dia em que o nosso silêncio será mais poderoso do que as vozes que estrangulais hoje”.

Esse episódio marcante do sindicalismo, conhecido como os “Mártires de Chicago”, tornou-se símbolo e marco de uma luta que, a partir daí, se generalizaria por todo o mundo.

O crime do estado americano, idêntico ao de muitos outros que continuaram, durante muitas décadas, a reprimir a luta operária, inclusive as manifestações de 1º de maio, era produto de sociedades em que os interesses dominantes não necessitavam sequer ser dissimulados. Na época, o Chicago Times afirmava: “A prisão e os trabalhos forçados são a única solução adequada para a questão social”. Mas outros jornais eram ainda mais explícitos, como o New York Tribune: “Esses brutos (os operários) só compreendem a força, uma força que possam recordar durante várias gerações...”

Seis anos mais tarde, em 1893, a condenação seria anulada e reconhecido o caráter político e persecutório do julgamento, sendo então libertados os réus ainda presos, em uma manifestação comum do reconhecimento tardio do terror do Estado, que viria a se repetir no também célebre episódio de Sacco e Vanzetti.

A partir da década de 90, com a decisão do Congresso de 1888, da Federação do Trabalho Americano e do Congresso Socialista de Paris, de 1889, de declararem o 1º de Maio como dia internacional de luta dos trabalhadores, o sindicalismo em todo o mundo adotou essa data simbólica, mantendo-se até o nosso século como um feriado ilegal, que sempre gerava conflitos e repressão.

Segundo o historiador do movimento operário Edgar Rodrigues, a primeira tentativa de comemorar o 1º de Maio no Brasil foi em 1894, em São Paulo, por iniciativa do anarquista italiano Artur Campagnoli. Iniciativa frustada pelas prisões desencadeadas pela Polícia. No entanto, na década seguinte, iniciaram-se as comemorações do 1º de Maio em várias cidades, sendo publicados vários jornais especiais dedicados ao Dia dos Trabalhadores e números especiais da imprensa operária, comemorando a data. São Paulo, Santos, Porto Alegre, Pelotas, Curitiba e Rio de Janeiro foram alguns dos centros urbanos onde o nascente sindicalismo brasileiro, todos os anos, comemorava esse dia à margem da legalidade dominante.

Falando um pouco da situação atual do nosso País, o desemprego, como frisei no início do meu pronunciamento, já atinge o patamar de 20% nas regiões metropolitanas, segundo pesquisa do Dieese. O Brasil já tem 5% de todo o desemprego mundial. São 7 milhões de desempregados, o que coloca o nosso País em 4º lugar no mundo em número de desempregados, atrás da Índia, Indonésia e Rússia. O número de desempregados no mundo deve ultrapassar os 130 milhões. Estamos caminhando para assumir a segunda posição na lista, atrás apenas da Índia, que oficialmente tem 33 milhões de desempregados.

A taxa de desemprego para jovens entre 18 e 24 anos subiu de 14,3%, em 1998, para 15% este ano. No Rio de Janeiro, o desemprego juvenil chegou à casa dos 11,8%. Salvador é a capital com a pior taxa: 17,15%. Em São Paulo a taxa é de 16,5%.

Quatrocentos e vinte mil dos melhores empregos foram eliminados. O saldo é positivo entre 1989 e 1996 em cerca de 6,9 milhões de postos para as demais categorias de qualificação, sendo mais expressivo para as ocupações de pior qualificação do setor de serviços, como o emprego doméstico, a limpeza e a vigilância.

Houve crescimento da ocupação industrial entre 1989 e 1997, mas as vagas foram geradas em serviços onde as condições são mais precárias, os salários são baixos e os sindicatos têm o trabalho de fiscalização e negociação dificultado pela dispersão das fábricas.

A afirmação de que o setor de serviço é o segmento da economia em que se apresentarão as chances futuras de qualificação é um sofisma. O setor é a prova de que os ajustes quantitativos de emprego foram acompanhados de severa piora nas condições de trabalho.

O setor de serviços tornou-se heterogêneo. A ocupação predomina em atividades não tipicamente capitalistas no setor informal, no pequeno comércio, no comércio ambulante, nos serviços domésticos e de alimentação.

Os trabalhadores informais representam hoje a metade do mercado brasileiro. São 25,2 milhões de pessoas, ou 48,4% do total. Estão distribuídos no mercado informal tradicional (20,4 milhões) e no setor subcontratador - conceito desenvolvido por Dedecca para abrigar empresas que se dedicam à terceirização, prestação de serviços para o grande setor econômico (indústria, serviço público), que também têm alarmantes índices de precariedade. São 4,8 milhões de trabalhadores nessa categoria.

Uma das alternativas para minimizar a situação é a redução da jornada de trabalho. Se nós conseguíssemos reduzi-la, poderíamos minimizar a situação do desemprego no País.

Preocupado com essa situação, apresentei ao Senado projeto de lei que propõe a redução da jornada de trabalho para 35 horas semanais. Alguns poderão pensar ser uma utopia, mas experiências em países como a França comprovam a eficácia dessa política, que tem feito crescer o número de postos de trabalho naquela nação.

Temos 13,8 milhões de postos de trabalho ocupados indevidamente. Se o número de empregados (25 milhões) que faz hora-extra caísse drasticamente, haveria ainda mais 2,4 milhões de vagas. Há espaço para a redução da jornada de trabalho no País. Essa redução permitiria uma ampliação na absorção de mão-de-obra, desde que houvesse uma restrição absoluta ao uso de horas-extras. O uso excessivo de horas-extras queima postos de trabalho.

Outra alternativa seria a suspensão do pagamento da dívida externa. Parte dos nossos recursos vai para o pagamento da dívida e, portanto, a Nação fica privada de recursos importantes para investir no seu desenvolvimento.

Uma questão importantíssima é a reforma agrária. Segundo dados da CPT e do MST, existem aproximadamente quatro milhões de famílias sem terra no campo. Como essas famílias não possuem terra para trabalhar e não têm como se fixar no campo, acabam vindo para as grandes cidades, procurar formas de sobrevivência. Assim acontece o inchaço das grandes cidades. Essas famílias não têm onde morar e vão para debaixo das pontes, dos viadutos, das marquises, criando um grave problema de superpopulação nas cidades, sendo que os campos estão com uma parte enorme desocupada, com terras improdutivas que deveriam ser usadas para fins de reforma agrária.

Investir na infra-estrutura, criando frentes de trabalho, gera empregos a curto e longo prazos. Esse é um setor que absorve muita mão-de-obra.

Voltar a crescer é importante até para viabilizar a redução da jornada de trabalho. Na verdade, não é gerar os recursos, é liberá-los, porque hoje o Brasil gasta bilhões e bilhões de reais em juros. Os recursos existem mas estão aprisionados dentro de um circuito financeiro pernicioso do ponto de vista dos objetivos do crescimento.

O Sr. Lauro Campos (Sem Partido - DF) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ) - Com prazer, Senador Lauro Campos.

O Sr. Lauro Campos (Sem Partido - DF) - Nobre Senador Geraldo Cândido, quero solidarizar-me, irmanar-me com o seu pronunciamento diante dessa data cada dia mais triste para os trabalhadores, que é o 1º de abril - digo 1º de maio. Parece realmente um 1º de abril. Parece um conto, uma mentira que o sistema capitalista prega nos trabalhadores de todo o mundo: a globalização do desemprego, a globalização do desespero e, obviamente, a globalização de guerras ou de crises. Hoje, por exemplo, duas crises, a da Argentina e a da Turquia, estão ocupando os noticiários. Considero que o seu discurso toca em pontos muito importantes, não apenas aqueles que marcaram e produziram, como reação, o nascimento do movimento comemorado em 1º de maio, nos Estados Unidos, mas o sacrifício de sempre dos trabalhadores. Já se conta em milhares o número de trabalhadores sem terra que foram assassinados neste País, sendo que esses crimes não foram sequer julgados. Gostaria também de salientar outro ponto do seu discurso. Penso que essas empresas de terceirização exploram o desemprego e a miséria e se valem dessa fantástica ideologia neoliberal que só pensa em enxugar as despesas, reduzir os gastos com o ser humano, com os trabalhadores, concentrando fantasticamente, como os Estados Unidos provaram, os vencimentos na cúpula dos tecnocratas e na direção dessas empresas. Estamos assistindo a uma espécie de bumerangue que os Estados Unidos lançaram contra o mundo, a fim de enxugar o custo Brasil, diminuir o custo Argentina, o custo Índia, etc., agora voltar-se contra aquele país provocando a situação em que se encontra. De modo que é pertinente a antecipação que V. Exª faz, porque, afinal de contas, no dia 1º talvez não tenhamos oportunidade de tocar nesse assunto. Então, quero abraçá-lo e louvar a sua iniciativa. Muito obrigado.

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ) - Muito obrigado, Senador Lauro Campos, agradeço o seu aparte, na compreensão de que V. Exª possui sensibilidade para as questões que afligem a Nação brasileira, especialmente os trabalhadores. É verdade que a política neoliberal, a globalização, bem como o que foi aprovado, na semana passada, em Quebec, no Canadá, ou seja, a implantação da chamada Área de Livre Comércio das Américas (Alca), tudo isso são mecanismos que os países imperialistas, principalmente os Estados Unidos, utilizam, efetivamente, para expandir o seu domínio por todas as Américas. Com isso, são as nações pobres que sofrem e, conseqüentemente, os trabalhadores.

Para concluir, Sr. Presidente, só quero reafirmar o que disse inicialmente: que não temos nada para comemorar no dia 1º de maio. É um dia de luta e protesto e não um dia a ser comemorado. Quero dizer que no painel da história nacional foi uma data cujas celebrações atingiram sempre um patamar de grandiosidade, organizadas que foram pelos sindicatos e associações de classe profissionais, com programações as mais variadas, com a finalidade de ressaltar que a força do proletariado estava em sua união, na luta e conquista de melhorias sociais para os trabalhadores em geral.

No entanto, há muito o nosso 1.º de maio perdeu seu brilho e, nos dias de hoje, sua comemoração é uma pálida lembrança do que se fazia em passado não muito distante. É bem verdade que os líderes sindicais de hoje são outros, um tanto quanto distanciados de suas categorias, mais apegados às mordomias de que possam usufruir e, não raro, constituindo-se em verdadeiros Calabares de suas entidades representativas.

É claro também que existem exceções a essa regra, poucas é verdade, mas existem. No período anterior a 1964, nossos sindicalistas não moravam em apartamentos de cobertura e tampouco desfilavam em belos carros importados. Ser pelego naquela época constituía-se exceção. Hoje parece que virou regra.

A perseguição movida a verdadeiras lideranças sindicais no período pós-64 e a adoção de uma política colonialista de origem alienígena contra as associações de classe, introduzida através de interventores colocados à revelia dessas classes, redundaram num total desvirtuamento da atividade sindical no Brasil, minando por dentro a força das entidades de defesa do trabalhador.

Hoje, nada há para comemorar, pois nem trabalho existe para a classe operária nacional. Estamos nos afogando na maré do maior índice de desemprego já verificado em nossa história, que nos inclui na pouca honrosa lista de um dos três países com maior número de desempregados do planeta, perdendo apenas, por enquanto, para Índia e Rússia.

Comemorar, então, o quê? A venda ou doação do patrimônio nacional, construído pela força de trabalho do homem brasileiro, por esse governo que aí está? Comemorar a nossa entrada nesse processo de globalização que torna os países ricos cada vez mais ricos, e nós, os pobres, cada vez mais espoliados? Viramos masoquistas?

É bem verdade que o Governo do Senhor FHC foi eleito legalmente pelo povo, portanto, deveríamos constatar que é legítimo.

O SR. PRESIDENTE (Jader Barbalho. Fazendo soar a campainha.) - Senador Geraldo Cândido, a Presidência apela a V. Exª que conclua.

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ) - Estou concluindo, Sr. Presidente.

Mas será legítimo aquele que se elege para determinado posto de representação ostentando uma proposta de caráter social e, tão logo assume o posto, parte para desenvolver ações totalmente diversas das propostas apresentadas em sua campanha? O que dizer, então, dos sindicalistas de fachada, que apóiam esse governo discricionário, que provoca hoje tanto mal-estar à sociedade brasileira? Chamá-los de pelegos é o mínimo que me vem à cabeça.

O Dia do Trabalho está, portanto, transformado em um feriado desnecessário. Serve apenas como ponto de referência do passado glorioso de nossas entidades sindicais e de várias lideranças de então. Sem qualquer comemoração que lhe dê autenticidade, vai aos poucos se transformando em uma data a mais no calendário gregoriano. Enquanto não surgirem novos Saccos e Vanzettis para sacudirem esse sindicalismo de resultados negativos, vamos continuar a observar o proletariado nacional perdendo suas suadas conquistas, obtidas até com o sacrifício de muitos líderes do passado, e vendo a colcha de retalhos em que se transformaram a CLT e a atual Constituição Brasileira.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/04/2001 - Página 7348