Discurso durante a 43ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

RELATO DA VISITA DE S.EXA. AOS ESTADOS UNIDOS PARA OBSERVAR A POLITICA DE SAUDE DAQUELE PAIS NO TRATAMENTO DE DOENÇAS DE FIBRILAÇÃO VENTRICULAR, CONHECIDA COMO MORTE SUBITA. DEFESA DA APROVAÇÃO DE PROJETO DE LEI QUE OBRIGA O ESTADO A DISPONIBILIZAR A POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA O TRATAMENTO DE DESFIBRILAÇÃO VENTRICULAR, EM TRAMITAÇÃO NA CAMARA DOS DEPUTADOS.

Autor
Tião Viana (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Sebastião Afonso Viana Macedo Neves
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • RELATO DA VISITA DE S.EXA. AOS ESTADOS UNIDOS PARA OBSERVAR A POLITICA DE SAUDE DAQUELE PAIS NO TRATAMENTO DE DOENÇAS DE FIBRILAÇÃO VENTRICULAR, CONHECIDA COMO MORTE SUBITA. DEFESA DA APROVAÇÃO DE PROJETO DE LEI QUE OBRIGA O ESTADO A DISPONIBILIZAR A POPULAÇÃO DE BAIXA RENDA O TRATAMENTO DE DESFIBRILAÇÃO VENTRICULAR, EM TRAMITAÇÃO NA CAMARA DOS DEPUTADOS.
Publicação
Publicação no DSF de 01/05/2001 - Página 7631
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • INFORMAÇÃO, VIAGEM, ORADOR, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), MOTIVO, OBSERVAÇÃO, POLITICA SANITARIA, TRATAMENTO, DOENÇA, CARDIOPATIA GRAVE.
  • NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, ACESSO, TRATAMENTO, DOENÇA, CARDIOPATIA GRAVE, BRASIL, DEFESA, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI, BENEFICIO, POPULAÇÃO CARENTE.

           O SR. TIÃO VIANA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aproveito a oportunidade desta segunda-feira de plenário vazio, quando os Senadores estão se preparando para uma quinta-feira com muitos holofotes, com muitos momentos para se discutir a ética na política, já que estamos diante de um crime de extraordinária proporção e que merece o julgamento do País inteiro como o pior dos crimes, para relatar uma viagem que fiz, na semana passada, em missão de saúde pública.

           Estive nos Estados Unidos, onde conheci a política de saúde para a doença que mais mata naquele país: o evento clínico denominado “morte súbita”. A morte súbita ocorre em um período de até seis horas após um mal-estar muito grande. Seguramente - e segundo especialistas - a mesma situação clínica ocorre no Brasil. Trata-se de uma manifestação secundária ao enfarte agudo do miocárdio e outras manifestações degenerativas do aparelho cardiocirculatório. Registre-se que a doença mata muito mais do que câncer de mama e de pulmão e muito mais do que outras doenças conhecidas e, lamentavelmente, presentes nas sociedades modernas.

           Tive o prazer e a honra de ser acompanhado pelo Deputado Carlos Mosconi, do PSDB, de Minas Gerais, um profissional de saúde também, vinculado à política de saúde em nosso País e membro do Parlamento Latino-Americano; do Deputado do Partido Comunista do Brasil, Agnelo Queiroz, do Distrito Federal, profissional de saúde também; ilustres médicos especialistas do Brasil, como o Dr. Luiz Henrique Hargreaves, que representa a Divisão Médica da Câmara dos Deputados, e o Dr. Sérgio Timerman, que representa a Direção do Serviço de Urgência do Instituto do Coração, em São Paulo, e, ao mesmo tempo, do Hospital Albert Einstein, em São Paulo.

           Numa visita a quatro Estados americanos - Texas, Minnesota, Illinois e Washington -, observamos a política de saúde pública americana com relação a esse evento clínico, principal causa de morte nos Estados Unidos. A perda de vidas é da ordem de 250 mil pessoas, todos os anos, em função da chamada fibrilação ventricular, uma manifestação cardíaca conseqüente a outras evoluções clínicas e que tem como desfecho final a morte do indivíduo.

           No Brasil, os estudos não são precisos, mas a estimativa é de mais de 120 mil mortes todos os anos em função desse evento clínico. E o único tratamento é a desfibrilação ventricular, ou seja, o choque elétrico, que permite o reingresso à vida por parte do paciente, quando ocorre um fenômeno dessa natureza. Todas as pessoas têm na memória a lembrança de terem perdido amigos ou pessoas conhecidas por ter feito uma parada cardíaca e não ter chegado com vida a uma unidade de saúde.

Tivemos oportunidade de nos encontrar com a equipe de governo americana, com profissionais da saúde pública do Estado de Seattle, onde, somente numa pequena comunidade, foram salvas mais de mil vidas ao longo desses anos de implantação do programa. Pudemos observar que o governo americano amplia, de forma expressiva, essa proteção à vida para todas as Unidades Federadas americanas, estabelecendo um arcabouço jurídico de suporte à situação, a chamada Lei da Desfibrilação, que permite o acesso à desfibrilação por parte da população; também criou o movimento legislativo, com amparo em lei, especialmente no Estado da Pensilvânia - que orientou essa manifestação de suporte à solidariedade humana, com a Lei do Bom Samaritano, que torna não mais criminosa a tentativa de uma pessoa salvar a vida de outra. Até a legislação em vigor, entendia-se como crime a tentativa de alguém salvar a vida de outra pessoa que resultasse em morte, em incapacidade de recuperação vital.

Portanto, essa situação tem evoluído de maneira auspiciosa, nos Estados Unidos. Pudemos ver um olhar de esperança profundo das equipes de saúde pública, o olhar de esperança dos paramédicos, dos trabalhadores voluntários que atuam nas áreas de grandes aglomerados urbanos, como os grandes aeroportos. Só no aeroporto de Chicago, por onde passam mais de 200 mil pessoas por dia, pode haver ocorrências clínicas de fibrilação ventricular e perda de vidas, se não estiver ao alcance do cidadão um sistema de desfibrilação que venha, de fato, reintegrá-lo a uma condição de saúde que permita um tratamento efetivo em unidade hospitalar. Visitamos o mais avançado modelo de socorro médico dos Estados Unidos que fica no Estado de Washington, em Seattle especificamente, onde temos uma população que alcançou outras situações críticas pelas quais passam as pessoas nos chamados eventos de perda de consciência por patologia cardíaca, por morte súbita, e até em situações extremas como incêndio, afogamento e atropelamentos. Enfim, traumas que tantas vidas levam por ano naquele país. Seguramente, a realidade é muito semelhante em nosso País. Pudemos observar a responsabilidade, a maneira judiciosa como os profissionais de saúde pública tratam o problema.

É preciso observar que não se trata de uma situação nova. Desde 1955 é compreensível, sob o ponto de vista médico e científico, que o evento motivador do fim da vida, por uma patologia cardiovascular, em regra, é a fibrilação ventricular, que se tem constituído em uma das principais causas de morte em qualquer país do nosso Planeta. Lá, observa-se de maneira clara, estatisticamente, que são mais de 250 mil vidas perdidas todos os anos em função desse evento. Não há outro método de tratamento a não ser a chamada desfibrilação, ou seja, o choque elétrico, de uma maneira acessível, que poderá salvar a vida de uma pessoa que, dessa forma, poderá ser transferida a um hospital, a uma unidade de saúde onde haja a possibilidade de tratar a causa, a doença de base.

No Brasil, agrava-se essa situação pelo fato de termos a doença de chagas, que atinge mais de 5 milhões de brasileiros. O coração é o órgão alvo dessa doença e pode, muitas vezes, ter como evento clínico final a complicação cardíaca da arritmia, da fibrilação ventricular, que também está inserida como causa da morte súbita. É uma situação de grande interesse para a saúde pública. O Brasil se afirmou, nessa visitação das unidades americanas, durante a missão médico-parlamentar, como o país pioneiro na América Latina na observação desse evento clínico.

A Itália já apresenta um serviço modelo de recuperação de vidas com o chamado tratamento da fibrilação ventricular, e o Governo inglês também vem se afirmando pioneiramente na Comunidade Européia, mais a Europa Ocidental, como um modelo que cresce rapidamente a favor do socorro à população na chamada epidemia da morte súbita, trágica epidemia como pode ser considerada e que hoje é incontrolável.

Sinto-me feliz porque a missão foi envolvida de grande responsabilidade ética, de grande conteúdo científico, havendo troca de experiências com os profissionais da saúde pública americana e com Parlamentares americanos, os autores da lei americana no Senado Federal. Teremos a possibilidade de dar um passo que talvez adiante o salvamento de vidas, por esse fenômeno clínico, em pelo menos dez anos, em nosso país.

A Comissão de Seguridade Social da Câmara está analisando o projeto de lei do chamado acesso público à desfibrilação, temos um compromisso efetivo dos Deputados Carlos Mosconi e Agnelo Queiroz de levarem um substitutivo que possa racionalizar aquele projeto de lei, permitindo o acesso de toda a população leiga do Brasil ao recurso da desfibrilação, como um recurso público.

Seguramente, o resultado desse trabalho legislativo será o de podermos salvar, implantado de maneira definitiva e sustentado esse programa, mais de 100 mil vidas por ano em nosso País. Julgo isso da maior importância, porque é difícil imaginarmos o que temos pela frente.

Com a AIDS, temos algumas milhares de mortes. E o Governo gasta 700 milhões de reais. Se formos transpor o que o Governo está gastando hoje com a gripe, o que não deixa de ser importante, é de enorme importância, são alguns milhões de reais, mas com relação ao evento que mais mata em nosso País, o qual pudemos constatar junto ao Governo americano, na sua própria sociedade, é o da morte súbita, mas o Governo brasileiro não tem sequer uma política de saúde estabelecida.

Então, há um projeto de lei tramitando na Câmara dos Deputados, que precisa de um reparo técnico, de prioridade, de oportunidade e de melhor desfecho em sua ação de proteção à sociedade; ou seja, a quem vai caber a responsabilidade civil: se apenas aos órgãos públicos, se ela é extensiva à iniciativa privada, às escolas, etc. Nós temos um projeto que precisa urgentemente ser conhecido pela sociedade brasileira.

Fico muito feliz de ter feito parte dessa missão, onde o Brasil se afirmará como pioneiro em relação à América Latina, capaz de adiantar o salvamento de milhares de vida nos próximos 10 anos. Fico muito feliz de que ele esteja em mãos dos Deputados Carlos Mosconi e Agnelo Queiroz, para uma revisão, que, juntamente com os médicos que chefiam o Instituto do Coração, em São Paulo, juntamente com a equipe do Dr. Luiz Henrique Hargreaves, tiveram a oportunidade de amadurecer todas as dúvidas, todas as peculiaridades e a grande dimensão que esse projeto vai alcançar.

Assim, é como se estivéssemos dando um grito chamado "Acorda, Brasil". Salva mais de 100 mil vidas por ano, e é possível fazer isso num programa de saúde pública, pois essa missão nos proporcionou uma compreensão em sua profundidade, um programa que já tem mais de 20 anos nos Estados Unidos, que a Itália e a Inglaterra estão assumindo, a Europa, e nós podemos fazê-lo também, dando nossa contribuição extraordinária à população brasileira.

Espero que no Senado Federal esse projeto esteja tramitando no máximo em duas semanas. Estou com a responsabilidade, dentro desse grupo, de conversar com o Secretário Municipal de Saúde de São Paulo, Eduardo Jorge, pela sensibilidade de um sanitarista e pela visão de saúde pública que tem de São Paulo, que tem recursos, para que o Estado possa ser pioneiro na implantação desse programa junto com o Estado do Acre, a que pertenço e espero poder se tornar, como dissemos de maneira muito informal no encontro, uma verdadeira Seattle da Amazônia, ou seja, o Estado mais apto, mais atualizado em salvar vidas com esse programa de acesso público à desfibrilação para que se freie, para que se possa evitar a causa de morte mais comum no Brasil, que é a chamada morte súbita.

Encerro o pronunciamento dizendo que foi uma visita de grande contribuição para a saúde pública do nosso País e só aguardo a evolução, em caráter de urgência, na Câmara dos Deputados, desse projeto para que ele possa ter o desfecho necessário dentro do Senado Federal.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/05/2001 - Página 7631