Discurso durante a 44ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

POSICIONAMENTO DO PPS DIANTE DO EPISODIO DE VIOLAÇÃO DO PAINEL ELETRONICO DE VOTAÇÃO DO SENADO FEDERAL E DA CRIAÇÃO DA CPI DA CORRUPÇÃO. (COMO LIDER)

Autor
Roberto Freire (PPS - CIDADANIA/PE)
Nome completo: Roberto João Pereira Freire
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • POSICIONAMENTO DO PPS DIANTE DO EPISODIO DE VIOLAÇÃO DO PAINEL ELETRONICO DE VOTAÇÃO DO SENADO FEDERAL E DA CRIAÇÃO DA CPI DA CORRUPÇÃO. (COMO LIDER)
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2001 - Página 7890
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • REGISTRO, NOTA OFICIAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO POPULAR SOCIALISTA (PPS), DEFESA, INSTAURAÇÃO, PROCESSO, CASSAÇÃO, MANDATO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, JOSE ROBERTO ARRUDA, SENADOR, CRIME, VIOLAÇÃO, APARELHO ELETRONICO, VOTAÇÃO SECRETA, SENADO, PREJUIZO, DEMOCRACIA, CRITICA, TENTATIVA, ACORDO.
  • ANUNCIO, ACAREAÇÃO, SENADOR, CONSELHO, ETICA, SENADO.
  • NECESSIDADE, ETICA, SERVIDOR, SERVIÇO PUBLICO, OPOSIÇÃO, TRAFICO DE INFLUENCIA.

O SR. ROBERTO FREIRE (Bloco/PPS - PE. Para uma comunicação de Liderança. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, há poucos dias, quando encontrava-me no Chile representando o Brasil na XV Conferência Interparlamentar América Latina - União Européia, o meu Partido - o Partido Popular Socialista - divulgou uma importante nota pública, manifestando a sua inequívoca posição em relação ao episódio de violação do sigilo do voto na sessão que cassou um membro do Senado. Nela, afirmava-se que os indícios colhidos pela Comissão de Ética e Decoro Parlamentar do Senado já eram suficientemente sólidos para instaurar o processo de cassação contra os Senadores Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, membros desta Casa.

A posição do Partido continua a mesma. E não existe nenhum fato novo no cenário político que possa levar-nos a alterá-la.

E por que adotamos tal resolução? Simplesmente porque a questão democrática está no centro da política do nosso Partido e com ela não transigimos. Sem dúvida, não há crime mais grave do que aquele perpetrado contra a democracia. E é também indubitável que a violação do painel foi um crime contra o regime democrático e suas instituições.

Em nossa opinião, não há outro caminho, fora da democracia, para se construir a sociedade justa e moderna com a qual tanto sonhamos. É também na vigência do regime do Estado Democrático de Direito que podemos melhor combater a corrupção e a criminalidade. Nesse sentido, consideramos fundamental a defesa da legalidade constitucional e da República.

Aqui fazemos um breve histórico do nosso comportamento partidário em relação à atual crise. Desde a divulgação do diálogo entre o Senador Antonio Carlos Magalhães e membros do Ministério Público, quando já se evidenciava a violação do painel por ocasião da votação que cassaria o então Senador Luiz Estevão*, solicitamos a rigorosa apuração dos fatos e a punição dos culpados.

Em nenhum momento, abrimos mão dessa postura, nem mesmo em nome de uma aliança tática com denunciados para viabilizar exclusivamente a CPI da Corrupção, como queriam - num grave equívoco - algumas correntes oposicionistas de Esquerda. Afinal, não víamos contradição em apoiar ao mesmo tempo a apuração da violação do painel e a instalação da CPI para averiguar denúncias de corrupção, essas envolvendo o Governo e também outro importante Senador com assento nesta Casa.

Amanhã, quinta-feira, dia 3 de maio, vamos ter o desprazer de assistir, no Senado, a uma cena explícita de constrangimento nacional. Dois Senadores, dos mais importantes e destacados desta Legislatura, irão se submeter a uma sessão de acareação, modalidade comum às investigações policiais, quando a mentira parece ser a regra entre testemunhas ou indiciados em processos.

No caso, a acareação tornou-se necessária pela constatação de que se havia rompido a omertà da mentira, a partir do inquestionável resultado da perícia sobre a violação do sigilo do voto. Iniciou-se aí uma caricata teoria do dominó, em que verdades vão sobrepondo-se a mentiras, e dois Senadores e uma graduada servidora não conseguem acertar-se em suas mentiras ou verdades, diante de uma Nação estupefata e perplexa.

O mais interessante de tudo isso é que o episódio traz para dentro do Senado, de um lado, a desfaçatez de não se assumirem responsabilidades e, de outro, um sentido estranho, o da “lealdade”, o da obediência ao chefe, de resto, ambas muito utilizadas por lideranças e subalternos do nazismo, que a esses expedientes recorreram para tentar safar-se das denúncias de atrocidades e crimes cometidos contra a humanidade. Mesmo que os culpados pelo caso do painel sejam rigorosamente punidos, como defende o PPS, cabe outra discussão: a Mesa e os demais Senadores devem assumir, com compostura e transparência, suas posições, não podendo considerar os funcionários da Casa como instrumentos a serem manipulados; e os funcionários precisam ter coragem para afirmar o primado da ética no serviço público, não se deixando levar pelos favores dos cargos comissionados ou pelo tráfico da influência política.

Mesmo não gozando de amplo consenso internamente, pela sua complexidade conceitual, o fim do voto secreto no Parlamento é defendido majoritariamente, hoje, pelo Partido. Entretanto, no calor de todo o debate que ora se verifica em torno da punição aos Senadores responsáveis pelo crime de violação do painel, uma questão deve ficar clara: pela Constituição, o voto, no Senado, continua sendo secreto para casos de cassação; o seu exercício, um direito de cidadania - no Parlamento ou fora dele -, e a sua observância e respeito, um dever de todos e, em particular, da autoridade.

Admite-se que cada cidadão ou cidadã - Parlamentar ou não - possa dar conhecimento público do seu voto. É seu direito. A violação do sigilo por terceiros, principalmente por ação de autoridade a quem caberia sua guarda, é prevaricação, é crime. Outro exemplo, com as mesmas características e pressupostos legais, ocorre com os sigilos bancário, fiscal e telefônico: o titular do direito pode deles abrir mão, sendo expressamente vedado a terceiros fazê-lo sem autorização judicial prévia. Como no caso do rompimento do sigilo do voto parlamentar, a violação dos outros sigilos citados tipifica-se como crime.

Abordamos essa questão para deixar claro, desde logo, à Casa e à opinião pública, que o PPS, nas sessões que possivelmente ocorrerão em plenário, não se alinhará a nenhuma proposta demagógica que defenda o voto aberto, em confronto com a lei que se pretende revogada, mas que ainda vige.

Temos consciência do constrangimento que paira sobre todos nós nestes tumultuados dias. Mas uma decisão há que ser tomada, não porque a mídia e a opinião pública pressionam - e pressionam, porque vivemos em democracia -, e, sim, porque, além do atentado violento ao decoro parlamentar, houve um crime de prevaricação, e as instituições republicanas não podem ser desmoralizadas. E desmoralizado ficará o Senado caso admita qualquer acordo entre partidos para minimizar as penas a serem imputadas.

Fujo aqui do discurso escrito, ao ver o Senador Jader Barbalho. Os jornais brasileiros demonstram contradição em algumas de suas manchetes. Um fala de um possível acordo entre os Srs. Senadores Jader Barbalho e Antonio Carlos Magalhães, precedido de telefonemas. Eu comentava com jornalistas que, quanto à questão do telefonema, hoje é muito complicado alguém negar, para, depois, numa teoria do dominó, ter de confirmar. Por outro lado, O Estado de S. Paulo exibe declarações do Senador Jader Barbalho de que não há nenhum acordo e de que não admitirá essa hipótese. Quero vincular-me a esta segunda hipótese, a do Estado de S. Paulo, porque qualquer acordo sobre esse problema que não seja uma decisão clara da consciência de cada um dos Srs. Senadores, evidentemente, desmoralizará este Senado.

O SR. PRESIDENTE (Edison Lobão. Faz soar a campainha.)

O SR. ROBERTO FREIRE (Bloco/PPS - PE) - Já estou terminando, Sr. Presidente. É necessário dizer que o PPS, tal como afirmou na sua nota, na defesa da democracia, será intransigente. E é preciso impor essa intransigência, sem sobressaltos, sem ódio e sem medo.

A fé pública é algo que acompanha a construção e a organização das sociedades e das nações. Portanto, também acompanhou a construção da sociedade e da nação brasileira. Entre nós, em outras épocas, ela poderia ser representada, inclusive, pelo fio do bigode, amplamente celebrado em nossa literatura. Hoje, na complexidade em que vivemos, o fio do bigode não basta: a fé pública se impõe por outros mecanismos e comportamentos, transparentes e repassados, em tempo real, pelos meios eletrônicos, a milhões de brasileiros.

A abertura do processo de cassação de Antonio Carlos Magalhães e José Roberto Arruda, Senadores desta Casa, antes de mais nada, é a afirmação dessa fé pública nas pessoas que, equivocadamente, acreditavam estar ela destituída de valor ou ser inexistente entre nós. Felizmente, ela continua no meio de todos nós e se apresenta como um fio de novo tipo, democrático e auspicioso, sempre a demonstrar que a impunidade não pode ser uma instituição nacional.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2001 - Página 7890