Discurso durante a 44ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

COMENTARIOS AO ARTIGO DO JORNAL O GLOBO, QUE ANALISA A POSIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DIANTE DO POSSIVEL DESCUMPRIMENTO DA LEI INTERNACIONAL DE PATENTES PELO BRASIL.

Autor
Ney Suassuna (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PB)
Nome completo: Ney Robinson Suassuna
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE. POLITICA AGRICOLA.:
  • COMENTARIOS AO ARTIGO DO JORNAL O GLOBO, QUE ANALISA A POSIÇÃO DOS ESTADOS UNIDOS DIANTE DO POSSIVEL DESCUMPRIMENTO DA LEI INTERNACIONAL DE PATENTES PELO BRASIL.
Publicação
Publicação no DSF de 03/05/2001 - Página 7921
Assunto
Outros > SAUDE. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • CRITICA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), ACUSAÇÃO, INDUSTRIA FARMACEUTICA, BRASIL, PROTECIONISMO.
  • ELOGIO, JOSE SERRA, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA SAUDE (MS), ATUAÇÃO, POLITICA, COMBATE, SINDROME DE IMUNODEFICIENCIA ADQUIRIDA (AIDS), REDUÇÃO, PREÇO, AMPLIAÇÃO, ACESSO, MEDICAMENTOS.
  • NECESSIDADE, DEFESA, DIREITOS, FAZENDEIRO, IMPRODUTIVIDADE, LAVOURA, REGIÃO NORDESTE, MOTIVO, ERRO, ANALISE, AGRONOMO, Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF).

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, dois assuntos me trazem à tribuna. O primeiro, um artigo hoje publicado no jornal O Globo, com a seguinte manchete: “Brasil rebate crítica dos Estados Unidos à Lei de Patentes. Ministério da Saúde afirma que não vai ceder a pressões americanas para mudar programa de combate a Aids”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Ministério da Saúde tem colocado sua posição firme em relação aos burocratas americanos e principalmente ao Escritório de Comércio dos Estados Unidos, que acusa o Brasil de não cumprir a Lei de Patentes ou, mais ainda, acusa o Brasil de criar protecionismo. E vejam V. Exªs que quem mais conta com protecionismo neste mundo globalizado são os Estados Unidos da América do Norte.

Para começar, não podemos exportar para lá nossas chapas de aço plano. Também não podemos exportar fumo, se não houver a taxação de 360% sobre o produto. O suco de laranja, industrializado significativamente pelo Brasil, foi taxado em pouco mais de 250%. E os exemplos seguem por aí afora. Enquanto a taxa média de importação estipulada pelos Estados Unidos para os 15 maiores produtos importados por eles é de 45%, nossa taxa média de importação de nossos 15 maiores produtos importados é de 12%. Quem tem protecionismo, nós ou eles?

Em relação a essa Lei de Patentes, fui o Relator na Comissão de Assuntos Econômicos. E lá verificamos que todos os 160 países do mundo ligados à Organização Mundial de Comércio têm o mecanismo da licença compulsória. O que é licença compulsória? Alguém chega ao Brasil, pede uma patente e ele a recebe. Há um prazo para que ele fabrique o produto no Brasil ou que mostre a sua inviabilidade e, por isso, possa importar para vender no mercado brasileiro, porque o mercado tem uma demanda pequena. Ainda há o problema sério de determinada doença se expandir pelo País todo, uma epidemia, ou ainda há o problema de os preços serem extorsivos.

Pois bem, falar em extorsão de preços de remédios é quase brincar, porque todo mundo neste País e neste mundo globalizado sabe que os grandes laboratórios estabelecem preços centenas de vezes acima do que deveria ser cobrado. Para se ter uma idéia, produtos básicos de alguns medicamentos custavam US$3.800 o quilo. Esse mesmo produto hoje, com a entrada da China e da Índia na produção, está custando US$900. E, no Brasil, ao invés de o preço do remédio baixar, subiu. O preço do insumo principal caiu de US$3.800 para US$900, mas o preço do remédio, ao invés de baixar, subiu.

Sr. Presidente, eu poderia citar centenas de exemplos, mas não é o objetivo da nossa explanação de hoje. Nosso objetivo é dizer que o Ministro da Saúde José Serra está coberto de razão quando ameaçou usar a licença compulsória. A licença compulsória não chegou a ser usada, houve apenas a ameaça de usá-la, no caso da Aids. Tivemos o risco de a Aids virar epidemia, e o Ministro José Serra disse: “se não baixarem o preço do medicamento, que é extorsivo - está aqui a planilha de custos de insumo -, vou utilizar a licença compulsória no Brasil”. Só essa ameaça fez o laboratório baixar 2,5 vezes o preço. Mas o laboratório reclamou, nos Estados Unidos. Não praticamos a licença compulsória, mas estamos sendo acusados de impor barreiras protecionistas.

É incrível, em 160 países, a maioria não aceitou o pipeline, e nós aqui aceitamos o pipeline. Quando alguém pede uma patente, ela vale por 20 anos. Quando proclamamos a nossa lei, havia produtos cuja patente ainda valia por dez anos - dez anos a partir da proclamação, porque antes não reconhecíamos. Eles queriam esses dez anos. E, a exemplo de outros países, relatei para que não tivessem esse direito, mas fui derrotado nesta Casa. Foi um dos dias tristes da minha vida parlamentar, um dos dias em que vi que muitos parlamentares não estão preocupados com a situação do País, nem com a brasilidade, com o nosso nacionalismo, pois servem a outros senhores. Fiquei muito triste, irado, naquele dia!

O SR. PRESIDENTE (Antonio Carlos Valadares. Fazendo soar a campainha.) - Senador Ney Suassuna, prorrogarei a sessão por mais oito minutos para que V. Exª termine seu pronunciamento.

O SR. NEY SUASSUNA (PMDB - PB) - Muito obrigado, Presidente.

Na verdade, tivemos o pipeline reconhecido, o que me deixou muito aborrecido.

Em relação à biodiversidade, a Comunidade Européia queria quinze anos. E conseguiu. Nós demos um ano.

Eu queria um INPI forte, que tivesse condição de fazer um banco genético para enfrentar as grandes multinacionais. Não conseguimos. Na ocasião, eu dizia que aquilo ia custar muito caro ao nosso País. De fato, custou alguns bilhões de dólares.

Conseguimos salvar apenas a licença compulsória. Por exemplo, um remédio que custava R$100,00, está sendo vendido por R$25,00. Só aí, o Ministério economizou US$40 milhões, o que permite financiar todo o combate à dengue.

Não me conformo quando não vamos aos tribunais internacionais lutar por nossos direitos. É preciso que tenhamos mais coragem, mais garra, mais espírito de luta para defender nosso povo, que vive sempre sendo assaltado. Se podemos, com uma simples ameaça, baixar duas vezes e meia um preço de um remédio, que era um assalto, com toda a certeza, o preço atual ainda não é o justo.

Mesmo assim, está de parabéns o Ministro Serra, porque está conseguindo, Sr. Presidente, fazer um combate à Aids que é exemplar no mundo, e tudo porque está usando apenas a ameaça da licença compulsória.

Todos devemos cerrar fileira e não permitir que essa licença compulsória seja retirada, mesmo porque são muitos os países que a utilizam. Concedi uma entrevista, na semana passada, para a TV japonesa. O Japão é um dos poucos países que ainda não utiliza a licença compulsória, mas já está discutindo a possibilidade de incluí-la em seu arcabouço legislativo.

Para encerrar, Sr. Presidente, eu vou me referir a um assunto localizado no meu querido Nordeste, tão sofrido e machucado, o IBDF resolveu que podíamos empregar recursos, e houve incentivo para se fazer o reflorestamento. Estudaram algumas plantas, dentre elas a algaroba, e acertaram que, num hectare de terra no Nordeste, podiam ser plantados até 100 pés de algaroba. Para isso, o fazendeiro precisava queimar tudo o que houvesse em cima da terra, arar duas vezes, gradear, arrancar todas as raízes e, depois disso, cavar os buracos a uma distância que permitisse a plantação dessas 100 plantas por hectare. Aí sim, os fiscais do IBDF vinham para analisar e autorizar a plantação.

Todos diziam que a algaroba era uma planta de rápido crescimento, que poderia fornecer 25 quilos de vagens por árvore, o que serviria de alimentação para o gado, e que produziria também madeira. Isso não é verdadeiro. São muitos os que plantaram em inúmeros municípios da Paraíba e de todos os Estados nordestinos. O que está acontecendo no momento? O IBDF deu informações erradas. A algaroba não cresce na velocidade divulgada e, onde cresce, normalmente estraga também o solo. E o pior é que, se as vagens produzidas forem dadas ao gado sem sofrer uma queima - só depois viemos a descobrir -, causam a doença chamada língua-de-pau, que deixa o animal sem poder comer e sem conexão motora até morrer.

Sr. Presidente, houve um erro na pesquisa, nas informações. Os fazendeiros tiveram de gradear, arrancar e estocar com seus recursos para, depois, receberem autorização da fiscalização para poder plantar. Agora, vêm a Receita Federal e o IBDF obrigar todos a devolver os recursos, porque o resultado não foi o que se esperava.

Ora, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, isso é uma barbaridade, um acinte. Primeiramente, deveriam estar sendo processados os que fizeram a pesquisa e disseram que a algaroba se adaptaria, porque ninguém fez qualquer plantação, sem que antes os agrônomos verificassem se a terra prestava para aquele fim; as terras foram inspecionadas. Ninguém tem culpa se essas informações não eram verdadeiras.

Agora, o IBDF e a Receita Federal vêm multar, colocando juros astronômicos e querendo que se devolvam os recursos. O cidadão entrou com a sua parte e fez o que era necessário. Foi o Governo que não cumpriu as promessas que estavam colocadas como verdadeiras.

É esta injustiça que venho denunciar, Sr. Presidente, Sras e Srs. Senadores, solicitando que se repense esse assunto e que se faça justiça.

Muito obrigado, Sr. Presidente, por ter prorrogado a sessão por mais oito minutos.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/05/2001 - Página 7921