Discurso durante a 45ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O ADIAMENTO DA VOTAÇÃO, PELA COMISSAO DE FINANAÇAS E TRIBUTAÇÃO DA CAMARA DOS DEPUTADOS, DO PROJETO DE LEI DE AUTORIA DE S.EXA., QUE ATUALIZA A TABELA DO IMPOSTO DE RENDA DE PESSOA FISICA. TRANSCRIÇÃO DO DESPACHO DA JUIZA LILIA BOTELHO NEIVA, DA QUARTA VARA FEDERAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL, QUE CONCEDEU LIMINAR A AÇÃO PUBLICA MOVIDA PELO CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL CONTRA O CONGELAMENTO DA TABELA DO IMPOSTO DE RENDA.

Autor
Paulo Hartung (PPS - CIDADANIA/ES)
Nome completo: Paulo César Hartung Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
TRIBUTOS.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O ADIAMENTO DA VOTAÇÃO, PELA COMISSAO DE FINANAÇAS E TRIBUTAÇÃO DA CAMARA DOS DEPUTADOS, DO PROJETO DE LEI DE AUTORIA DE S.EXA., QUE ATUALIZA A TABELA DO IMPOSTO DE RENDA DE PESSOA FISICA. TRANSCRIÇÃO DO DESPACHO DA JUIZA LILIA BOTELHO NEIVA, DA QUARTA VARA FEDERAL DE JUSTIÇA DO DISTRITO FEDERAL, QUE CONCEDEU LIMINAR A AÇÃO PUBLICA MOVIDA PELO CONSELHO FEDERAL DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL CONTRA O CONGELAMENTO DA TABELA DO IMPOSTO DE RENDA.
Aparteantes
Gerson Camata, Ricardo Santos.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2001 - Página 7990
Assunto
Outros > TRIBUTOS.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, ADIAMENTO, VOTAÇÃO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, ATUALIZAÇÃO, TABELA, IMPOSTO DE RENDA, PESSOA FISICA.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DESPACHO, LILIA BOTELHO NEIVA, JUIZ, CONCESSÃO, AÇÃO CIVIL PUBLICA, LIMINAR, MOVIMENTAÇÃO, CONSELHO FEDERAL, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), OPOSIÇÃO, CONGELAMENTO, IMPOSTO DE RENDA.

O SR. PAULO HARTUNG (Bloco/PPS - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estava previsto para ser votado ontem na Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados o projeto de lei do Senado de minha autoria que atualiza as tabelas do Imposto de Renda da Pessoa Física.

Pelo que se pode compreender do noticiário de hoje, a discussão, mais uma vez, foi adiada, não evoluiu, embora houvesse um acordo de lideranças para que a matéria começasse a ser votada ainda nesta semana na Câmara dos Deputados.

A nossa expectativa agora é a de que o Presidente da Comissão, Deputado Michel Temer, do PMDB de São Paulo, paute para a próxima semana a discussão do parecer do relator da matéria, o ilustre Deputado Pedro Novaes, também do PMDB, do Estado do Maranhão, uma vez que são crescentes as manifestações e se avolumam as ações judiciais favoráveis à correção da tabela de Imposto de Renda da Pessoa Física.

Sr. Presidente, o Congresso Nacional corre o grave risco de ser acusado de omissão nessa questão, e, se for, não terá como se defender. Isso ocorrerá à medida que o Judiciário continuar demonstrando - o que já vem ocorrendo - maior eficácia e agilidade no tratamento de um assunto que tem despertado duras críticas de vários setores da sociedade organizada à insensibilidade e à intransigência do Governo em negociar uma questão tão clara como essa. A sociedade quer negociar, o autor do projeto quer negociar e o Governo se mantém distante, como se não fosse com ele.

No mês passado, a Justiça Federal do Paraná e a de Minas Gerais concederam liminar ao Sindicato dos Bancários do Paraná e à entidade representativa dos policiais e do Corpo de Bombeiros de Minas Gerais, como ontem fiz questão de informar rapidamente em pronunciamento que fiz. A Justiça autorizou a correção dos gastos com educação, no caso dos bancários, e, no caso dos policiais, de toda a tabela.

Também registrei ontem que a Juíza Lília Botelho Neiva, da 4ª Vara Federal de Justiça do Distrito Federal, concedeu liminar à ação pública movida pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil contra o congelamento da tabela do Imposto de Renda, que já se arrasta por mais de cinco anos.

Na decisão, cuja transcrição nos Anais desta Casa solicito, juntamente com a ação da OAB, a juíza reconhece que o congelamento, diante da desvalorização do real, significa aumento de imposto sem o respaldo da lei, o que contraria o princípio da legalidade, portanto, a Constituição do nosso País.

Quero aqui fazer um parêntese para ler alguns trechos do despacho da eminente Juíza Lília Botelho Neiva.

No mérito, considero os fundamentos relevantes.

Verifica-se que por mais de cinco anos não se atualizam as tabelas do imposto de renda e as deduções permitidas, em virtude do disposto na Lei nº 9.250/95. Tal estagnação, em princípio, acarreta um aumento real da carga tributária do imposto a ser suportado pelo contribuinte, sem que tenha havido o correspondente acréscimo patrimonial, que, frise-se, é o fato gerador do tributo em questão, eis que “Não há renda,...

            Continua a sentença em outra parte:

Dessa forma, o congelamento das tabelas e faixas limite de isenção/dedução transmuda-se, diante de persistente desvalorização da moeda, em efetiva majoração do imposto sem lei que o estabeleça, em aparente violação ao princípio da legalidade, o qual fundamenta toda atividade estatal, a garantir o Estado Democrático de Direito.

Ressalte-se que, sem a necessária correção monetária das tabelas, eventual aumento de rendimentos traduz-se, na verdade, em mero ganho nominal [argumento que tenho usado muito], face a inflação verificada no período, já que há um dispêndio maior de recursos em gastos ordinários,...”

            Continua em outro trecho:

...do ano de 1998 para o de 1999, houve um acréscimo de 7,49% na arrecadação do IRPF, conforme divulgado no site da Receita Federal.

Entretanto, em contrapartida a tal ganho não houve, no mesmo período, aumento significativo na renda do assalariado, consoante estatísticas regularmente divulgadas.

E continua a decisão judicial:

Denota-se, assim, uma suspeita de desvirtuação da tributação em questão, indo de encontro às limitações constitucionais ao poder de tributar, consubstanciadas nos princípios da vedação ao tributo com efeito de confisco (art. 150, IV), da capacidade contributiva (art. 145, § 1º), além do princípio da legalidade (art. 150, I), já anteriormente analisado.

            E continua a decisão, cuja transcrição nos Anais da Casa vou solicitar.

Continuo, Sr. Presidente. Não é possível o Governo adiar por mais tempo a discussão desse assunto. E volto a dizer, a minha posição, como autor do projeto, não é de intransigência, é uma posição de negociação. Podemos aprimorar o texto que saiu do Senado e, na Câmara dos Deputados, adequá-lo. O que não podemos fazer é manter essa situação, que é insustentável. Todos os argumentos apresentados pelas lideranças do Governo para protelar a votação do projeto caíram no vazio nos últimos tempos.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. PAULO HARTUNG (Bloco/PPS - ES) - Concedo um aparte, com carinho, ao meu conterrâneo, Senador Gerson Camata.

O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Srªs e Srs. Senadores que nos acompanham, ilustre Senador Paulo Hartung, V. Exª toca num ponto muito interessante. Não se trata apenas do aspecto incluído no projeto do qual V. Exª é o autor, nem das sentenças judiciais que estão atualmente saindo. Há uma gana arrecadadora que nos apavora, em certos tempos, e acaba estimulando a sonegação. E quando ela estimula a sonegação, ela esgarça o tecido moral do cidadão perante o Governo, não fossem outros episódios também que contribuem para isso de maneira pior. Veja V. Exª que o outro aspecto que é preciso analisar - e essa parte V. Exª analisa bem - é: o que o cidadão recebe em troca de tanto tributo? Somos o País que tem a maior carga tributária da América do Sul e, talvez, das Américas. Veja V. Exª que a saúde até que melhorou um pouco, nos últimos anos, mas aquele que não tem um plano de saúde, ai dele se ficar doente, ai dele se precisar bater na rede pública de saúde. Quanto à segurança, V. Exª tem visto e ouvido os esforços dos Governos Federal e estadual, mas os cidadãos não têm segurança. E a crueldade com que se cometem crimes no Brasil abala, moral e psicologicamente, até nós, que acompanhamos pelos jornais. Imagine V. Exª os familiares, os amigos e os parentes das vítimas. Vamos falar agora da educação pública. Se o filho do cidadão não estuda em uma escola particular, ele não passa no vestibular na universidade pública, onde ele não precisa pagar as mensalidades. Isso se falarmos do essencial, sem citar as estradas, que estão esburacadas, e uma série de outros problemas que acontecem por aí. O grande problema que temos que equacionar então é, primeiro, estabelecer uma tributação razoável, lógica, na direção da qual caminha o projeto de V. Exª; depois, retribuir ao cidadão pelo tributo que ele paga. De fato ele é levado a julgar que está sendo explorado, saqueado, já que paga e nada recebe de volta. Talvez saqueado seja uma palavra muito forte, mas ele está pagando impostos e nada está recebendo em troca, o que provoca frustração e derruba qualquer outra aspiração de se tornar um cidadão em seu próprio País. De modo que cumprimento V. Exª pelo projeto e pelo pronunciamento. Avalio que é uma batalha comum de todos nós essa de marchar no sentido de medir a arrecadação e o benefício que o cidadão recebe em troca. Muito obrigado.

O SR. PAULO HARTUNG (Bloco/PPS - ES) - Senador Gerson Camata, agradeço a V. Exª o aparte, que incorporo ao meu pronunciamento com muito prazer. V. Exª cuida de dois pontos no aparte que vêm complementar o meu pronunciamento. Primeiro, fala da qualidade do sistema tributário brasileiro, que não é boa.

Recentemente, o Senador Ricardo Santos fez um denso pronunciamento pedindo uma reforma tributária no País. Podemos observar que tudo o que se fez de ajuste nas últimas crises internacionais, nas crises do México, da Ásia, da Rússia e do Brasil - e já estamos na quinta crise internacional no decorrer do atual Governo -, foi no sentido de atribuir uma qualidade ainda mais baixa à estrutura tributária do nosso País.

Aumentou-se a Cofins, uma contribuição que penaliza a cadeia produtiva brasileira. Criou-se a CPMF e depois se aumentou a sua alíquota, sendo ela também uma contribuição de baixíssima qualidade, se olharmos o sistema produtivo brasileiro. Mantém-se a tabela congelada, o que é um equívoco, porque, a cada ano, congelada, ao contrário do que o Governo fala, quem tem menos paga mais proporcionalmente a sua renda, e não o contrário.

O Imposto de Renda da Pessoa Física deveria ser um imposto progressivo: quem tem mais, quem ganha mais, paga mais. Essa primeira observação feita por V. Exª é muito importante e a incorporo, como já disse, ao meu pronunciamento.

Mas V. Exª faz uma segunda colocação que o complementa ainda mais. Imposto, contribuição e taxa têm que ter uma contrapartida em serviços, em melhoria da qualidade de vida, em obras. E, na realidade, quando passamos por uma estrada federal pelo Brasil afora, encontramos uma estrada esburacada, mal cuidada. Quando vamos verificar um serviço na área da segurança pública, encontramos grandes centros urbanos vivendo quase uma guerra civil - os indicadores de homicídios nos grandes centros urbanos estão acima do que a ONU considera guerra civil. O meu pronunciamento ganhou mais consistência e conteúdo com as contribuições de V. Exª. Agradeço com carinho.

Continuo, Sr. Presidente. Eu dizia que não é possível o Governo adiar por mais tempo a discussão desse assunto. Todos os argumentos apresentados por suas lideranças para protelar a votação do projeto caíram no vazio.

Beira o ridículo a alegação da equipe econômica de que faltam recursos para corrigir aquilo que a Justiça vem seguidamente reconhecendo como um direito dos trabalhadores.

Temos visto bilhões em dinheiro público gastos de forma duvidosa e os casos da Sudam e da Sudene são um exemplo - não sei se pequeno ou grande. Gostaria de dizer que são exemplos pequenos, mas não tenho certeza diante do que estamos assistindo no País.

O que se pode compreender é que há, por parte dos financistas do Governo, um rigor extremo na hora de abocanhar parte do salário dos trabalhadores, até porque desconta-se na fonte. É fácil cobrar impostos assim. Mas há, também, a prática de uma política de rédea frouxa quando se trata de conceder empréstimos, em condições generosas e subsidiadas, para projetos mirabolantes, que não passam de verdadeiros embustes, como agora estamos vendo diariamente pela mídia.

As ações judiciais, Sr. Presidente, às quais me refiro neste pronunciamento, são um alerta para o Governo, que precisa compreender que pode ficar com mais um esqueleto no armário; e para o Congresso Nacional, que é a casa de representação do povo e que só existe para cumprir uma missão de controle e de fiscalização dos atos do Governo. É por isso que ele existe.

Po isso o mundo evoluiu na direção da democracia representativa e o Congresso não pode ser omisso, tem que cumprir a sua missão. Este é um alerta: precisamos urgentemente buscar uma forma de promover justiça para o trabalhador ou, em pouco tempo, estaremos diante de uma avalanche, de uma enxurrada de ações judiciais que acabarão atropelando as atribuições próprias do Parlamento brasileiro.

O Sr. Ricardo Santos (Bloco/PSDB - ES) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. PAULO HARTUNG (Bloco/PPS - ES) - Concedo um aparte, com muito prazer, ao Senador Ricardo Santos.

O Sr. Ricardo Santos (Bloco/PSDB - ES) - Senador Paulo Hartung, parabenizo-o pelo pronunciamento deste dia. Ele é bastante oportuno à medida que V. Exª toca num ponto essencial: a não-correção da tabela do imposto de renda vem trazendo uma altíssima concentração da receita e da tributação do referido imposto sobre os segmentos assalariados e sobre a classe média brasileira. O argumento de que não se pode ou é impossível corrigir essa tabela talvez esteja sendo dado pelas autoridades monetárias sem se levar em conta os efeitos que já teremos, a partir deste ano, da possibilidade de cruzamento dos dados da CPMF e das declarações do Imposto de Renda, no sentido de se cotejar a movimentação financeiras com dados patrimoniais. Acredito que uma reforma no Imposto de Renda, uma reforma tributária mais ampla do que a apregoada pelo Governo, e os novos dados de Receita - com certeza, o Governo já os possui - poderiam possibilitar o projeto de lei de V. Exª, que, de maneira tão oportuna, foi apresentado ao Senado e que se encontra em discussão na Câmara dos Deputados. Congratulo-me com V. Exª por esse pronunciamento e pelo projeto de lei que se encontra em tramitação na Câmara.

O SR. PAULO HARTUNG (Bloco/PPS - ES) - Concluindo o meu pronunciamento, Sr. Presidente, quero, primeiro, agradecer e acolher o aparte que me oferece o meu conterrâneo e amigo Senador Ricardo Santos.

A sua consideração é muito importante também porque ela inova os argumentos em relação ao que já falamos até aqui sobre o tema; relembra esta Casa e o País que nos assiste neste momento que, no ano 2000, demos os instrumentos necessários para que o Governo e a Receita Federal, por meio do Sr. Everardo Maciel e de sua equipe, pudessem combater com mais eficácia a sonegação fiscal no nosso País e todas as formas de ilícitos que são praticados na arrecadação tributária da Nação. Esse instrumento foi colocado por esta Casa, pelo Congresso Nacional, nas mãos do Governo.

Portanto, agradeço a V. Exª o aparte porque ele complementa a intervenção que estou fazendo.

Sr. Presidente, quero pedir a transcrição, nos Anais da Casa, em primeiro lugar, da ação civil pública, com pedido de liminar, movida pela Ordem dos Advogados do Brasil e, em segundo, da decisão tomada pela Drª Lília Botelho Neiva, Juíza Federal Substituta, com exercício pleno na 4ª Vara do Distrito Federal, no dia de ontem.

Era o que tinha a dizer. Agradeço os apartes e a atenção de todos.

Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUEM DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR PAULO

HARTUNG EM SEU PRONUNCIAMENTO.

1 - ação civil pública movida pela OAB

2 - decisão da Juíza Dra Lília

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2001 - Página 7990