Discurso durante a 45ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

INCONSTITUCIONALIDADE DA MEDIDA PROVISORIA QUE LIMITA O USO DA TERRA NA AMAZONIA.

Autor
Moreira Mendes (PFL - Partido da Frente Liberal/RO)
Nome completo: Rubens Moreira Mendes Filho
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • INCONSTITUCIONALIDADE DA MEDIDA PROVISORIA QUE LIMITA O USO DA TERRA NA AMAZONIA.
Aparteantes
Gilberto Mestrinho, Marina Silva.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2001 - Página 8027
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, LEO ANTONIO FACHIN, JUIZ DE DIREITO, ESTADO DE RONDONIA (RO), INCONSTITUCIONALIDADE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), LIMITAÇÃO, UTILIZAÇÃO, PROPRIEDADE PARTICULAR, FLORESTA AMAZONICA.
  • ESCLARECIMENTOS, PROPRIEDADE PARTICULAR, ESTADO DE RONDONIA (RO), AUTORIZAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), GOVERNO FEDERAL, CONTRADIÇÃO, UTILIZAÇÃO, AREA ECOLOGICA.
  • DEFESA, EXTINÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), CUMPRIMENTO, DEMARCAÇÃO, INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRARIA (INCRA), BENEFICIO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu disse hoje, na Comissão de Assuntos Econômicos, que usaria todo o meu tempo na tribuna para defender aquilo que julgo legítimo para o Estado de Rondônia. No que se refere a alguns artigos da Medida Provisória nº 2.080, que limita o uso da propriedade privada na Amazônia em 80% da sua área, quero fazer uma trincheira na defesa dos interesses da população do meu Estado.

            Vou ler um artigo de autoria do Dr. Léo Antônio Fachin, Juiz de Direito do Estado de Rondônia, mais precisamente da Comarca de Vilhena:

Constituição para quê?

A Constituição Federal sempre foi, e deve ser, a lei básica de um país, através da qual a nação estabelece princípios gerais e fundamentais que norteiam a vida desta mesma nação, pelo que a Constituição Federal (CF) é a lei suprema do país e todas as decisões administrativas, bem como a legislação federal, estadual ou municipal devem estar rigorosamente adequadas a ela, pena de não terem nenhum valor jurídico. Quando qualquer lei, decreto, portaria, etc, confronta com a orientação geral da CF diz-se que tal norma é inconstitucional, o que desobriga o particular de cumpri-la. A inconstitucionalidade é um fato gravíssimo na edição de leis e gera sérias responsabilidades a quem as edita. Assim, editar uma norma inconstitucional é uma arbitrariedade, um abuso de poder.

Contudo, entre tantos excessos do Governo Federal neste momento, agora sob o manto da ecologia, que interessa ao povo brasileiro mas que satisfaz em escala infinitamente maior a ganância e os interesses escusos da comunidade internacional, o Presidente Fernando Henrique vem editando reiteradamente e por 62 meses consecutivos uma Medida Provisória que literalmente atropela a Constituição, além de literalmente jogar para a marginalidade e sufocar o crescimento com honestidade e dignidade entre 18 e 20 milhões de brasileiros natos (e portanto cidadãos de direito) que trabalham, produzem incontáveis alimentos saudáveis e vivem modestamente nestes 40,1% do território nacional.

Para que o leitor entenda a MP agora de número 2.080-62, esta limite o uso do solo na Amazônia a 20% de cada propriedade do particular [e aqui enfatizo: “particular”] (isso sem contar as volumosas áreas de matas já protegidas por lei), sendo que no Estado de Rondônia 93% das propriedades são de pequenos e mini produtores, que terão de deixar 80% de sua propriedade em matas e só utilizar 20%. Dá para sobreviver assim?

            Faço um parêntese para esclarecer, sobretudo aos ilustres Senadores e aos representantes da Imprensa aqui presentes, que não fica apenas nos 20%, porque dessa área o cidadão ainda tem que descontar as demais áreas protegidas, como as matas ciliares, as cabeças-de-morro, os alagados, as estradas, os espaços ocupados por entidades públicas - como escolas, postos médicos - e a sede da pequena propriedade. Portanto, acaba sobrando para o agricultor, às vezes, menos de 10%.

Como se vê, o Governo, que tanto prega a reforma agrária aqui nesta região, está criando um verdadeiro batalhão de Favelados Rurais, isso exatamente no momento em que a pecuária e a agricultura da região estão demonstrando um potencial de produção que superam até índices obtidos com toda a tecnologia norte-americana, sem transformar o solo em áreas desérticas, como se convencionou dizer no passado sem nenhuma base técnica. Passados 30 anos de ocupação racional da Amazônia, as terras ocupadas dão mostras de uma altamente crescente capacidade de produção, sem o perecimento do solo.

Visando compatibilizar crescimento humano digno com preservação ambiental, o Estado de Rondônia - que foi colonizado pelo próprio Governo Federal e as terras foram vendidas (e não doadas) através de licitação pública nos anos 70 e 80 - discutiu durante 14 anos uma lei estadual, com o que o Estado foi milimetricamente pesquisado e mapeado por técnicos supervisionados pelo Banco Mundial, ao custo para o Estado [e para a União, acrescento] de mais de 20 milhões de dólares do que decorreu o nosso Zoneamento Socioeconômico-Ecológico, consolidado através da Lei Estadual nº 233, de 06-06-2000, única do gênero em toda a América Latina, onde, pela referida Lei, resta preservada em matas 68,69% do território total do Estado. Daí, pergunto: que outro Estado da Federação se dispõe a tanto? Dá para acusar Rondônia de possuir um povo contra a ecologia?

Em que pese esse esforço ímpar de Rondônia (autorizado pelos arts. 23, VII, e 24, VI, da Constituição Federal), que é motivo de aplausos eufóricos de ecologistas conscientes e que deve ser seguido pelos demais Estados da região, o Governo Federal insiste em editar, durante mais de cinco anos, uma MP que viola grosseiramente a Constituição, pois limita brutalmente o direito de propriedade ao limitar o uso do solo sem indenizar aos proprietários legítimos, isso sem contar que o Senhor Presidente está, sob os olhos omissos do Congresso, legislando livremente em matéria que a discussão data de centenas de anos. Onde está a urgência de que o art. 62 da Constituição Federal que exige para edição e tantas reedições da MP?

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - V. Exª permite-me um aparte, nobre Senador?

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Eminente Senador Gilberto Mestrinho, quero apenas concluir a leitura do artigo e, com muita satisfação, concederei o aparte a V. Exª.

Continua o Dr. Léo no seu artigo, publicado nos jornais de grande circulação no Estado de Rondônia:

Com essa postura a ordem democrática está abalada, pois estão se invertendo os papéis institucionais, criando grave instabilidade jurídica no País. Dorme-se com uma disposição legal e acorda-se de sobressalto com outra completamente diferente.

Se, enfim, o Governo quer editar uma lei democrática e transformar a Amazônia num enorme parque florestal, democraticamente sei que o povo daqui aceitará, mas que primeiro indenize e recoloque os cerca de 20 milhões de brasileiros destas terras em outras regiões produtivas do País, pois é direito.

No mais, o Governo faz alarde sobre o ônus de ter que resolver o problema do FGTS criado pelo ex-Presidente Collor, mas com a Medida Provisória 2.080 está criando uma obrigação de indenizar os proprietários rurais produtores da Amazônia que certamente atingirá os cofres públicos em cifras superiores ao rombo do FGTS. Será que a assessoria jurídica de FHC não vê isso? Mas, tudo bem, será o povo mesmo quem vai pagar a conta.

De outro lado, o Governo alardeou nesta semana que a CPI da Corrupção não terá futuro porque afronta a Constituição. Será que o Governo está falando daquela mesma Constituição que, no caso da MP 2.080 ele vem atropelando a cada dia durante já longos 62 meses?

Lamentavelmente constata-se aqui que, mais uma vez, vale aquela eterna máxima do “faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço”. E o povo... Coitado do povo!!!.

            Ouço, com atenção, o aparte do Senador Gilberto Mestrinho.

O Sr. Gilberto Mestrinho (PMDB - AM) - Nobre Senador Moreira Mendes, o discurso de V. Exª é muito importante ao abordar essa medida provisória que não é, nada mais nada menos, do que o cumprimento daquilo que é ditado no exterior para ser obedecido aqui dentro. São aqueles mesmos que se recusam a atender o Protocolo de Kyoto no que diz respeito à redução da emissão de gases que querem impor a nós a chamada “intocabilidade da Amazônia”. Ora, 76% da Amazônia já é área preservada e oficialmente protegida com reservas indígenas, parques ecológicos, florestas nacionais, etc. Portanto, sobram 24% da Amazônia, que são as propriedades privadas, e não querem mais que as usemos! Não querem mais que se utilize essa propriedade, às quais foram vendidas pelo próprio Governo sob condições de serem usadas, como constava antes nas concessões do INCRA! Ora, falo isso com muita tranqüilidade porque, no Amazonas, 98% da Floresta original está intocada. Mas não podemos ser condenados a essa renúncia econômica a vida toda! Na Amazônia vivem 20 milhões de pessoas, cuja tendência é crescer, é aumentar. E eles querem exatamente impedir esse crescimento e esse desenvolvimento para atender exclusivamente ao interesse internacional e manter a Amazônia como reserva de futuro para essa gente! Ora, Senador, nós, da Amazônia, temos que nos levantar contra isso! É importante manter a Floresta? Conservá-la? É. Mas, mais importante é cuidar dos que vivem na Amazônia. São seres humanos que vivem na Amazônia e que estão sendo garroteados pelo Governo; estão sendo impedidos de sonhar, pelo Governo. Imagine V. Exª que, agora mesmo, o Governo Federal elaborou um tal de Programa de Ações Estratégicas, para aplicação dos recursos do Orçamento deste ano. O meu Estado, por exemplo, corresponde a 30% da Amazônia, em números redondos, e a quase 18% do Brasil. Não existe uma ação estratégica programada para o Estado do Amazonas. Isso demonstra a intenção de manter aquilo lá totalmente entregue à própria sorte. Mais do que isso. Ainda ontem, o Governo Federal assinou uma medida provisória extinguindo a Sudam e a Sudene, a pretexto de combater a corrupção. Tudo bem, todos queremos isso. Agora, a impressão que se tem, e que foi difundida nos meios de comunicação pelo próprio Governo, é a de que esses órgãos só faziam financiamento de projetos, quando a finalidade deles era outra - a principal era o desenvolvimento das Regiões Amazônica e Nordeste para evitar as desigualdades regionais, por intermédio de investimentos constitucionais e de investimentos por opção de dedução no Imposto de Renda. Ora, esses órgãos também tinham a obrigação, tinham por direito a concessão das isenções no Imposto de Renda para aquelas empresas que se estabelecessem nessas regiões, independentemente de terem financiamento ou não da Sudam, da Sudene ou de qualquer outro órgão, mas o reconhecimento da isenção condicional era feito por esses órgãos. Nisso não se toca. Não se sabe que fazem isso, e várias empresas instaladas na região estão com processos prontos, aguardando definição, sem saber quem vai tomar essa decisão. E a Amazônia, que corresponde a cerca de 68% do Brasil, agora está no pelourinho e condenada à estagnação, porque a experiência que temos, na região, daquilo que consta no Orçamento da República e da ação do BNDES não é animadora. Portanto, parabéns a V. Exª pelo discurso. Continuemos na luta!

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Senador Gilberto Mestrinho, agradeço a V. Exª pelo aparte. Concordo com muitos dos pontos que V. Exª aqui colocou, como esse garroteamento da Amazônia como um todo e o interesse internacional escuso e não muito claro.

No entanto, quero voltar, rapidamente, à questão da medida provisória, para deixar clara uma posição pessoal e fazer aqui uma confissão: nos últimos 10 anos, mudei muito o meu pensamento sobre a questão da defesa do meio ambiente. Hoje, sou muito mais preocupado com o meio ambiente do que era há 10 anos, há 20 anos mais ainda.

Quando cheguei a Rondônia - que é um retrato do Brasil, porque lá vivem brasileiros de todos os cantos, diferentemente dos outros Estados da Amazônia, é bom que se diga -, fui para lá atendendo a um chamamento do Governo Federal, que usava, inclusive, a expressão “integrar para não entregar”. E lembro que, na colonização de Rondônia - toda ela oficial, porque foi feita pelo Incra -, o Incra só dava o título às pessoas que derrubavam 50% de sua mata. Ora, pergunto: como isso pode ter acontecido, e o Governo vir, agora, passar uma borracha em cima disso e dizer que não vale mais, que agora são 80% e quem derrubou tem que voltar atrás. Não podemos concordar com isso, absolutamente.

            Entretanto, deixo clara a minha posição. Hoje, sou um defensor do meio ambiente, e Rondônia está dando um exemplo para o Brasil e até para a América do Sul, porque é o primeiro Estado que tem a sua lei de zoneamento sócio-ecológico-econômico, em uma escala de um para 250 mil, discutida com a sociedade durante quase dez anos. O artigo do Dr. Léo fala em 14 anos, mas, na verdade, foram 9 anos, quase 10 anos de discussão com a sociedade, baseada em estudo técnico-científico. Não foi algo feito a toque de caixa, de qualquer jeito; foi uma lei discutida com a sociedade, com embasamento científico. E o Estado de Rondônia conseguiu, a tempo - veja bem, Senador -, preservar o entorno daquela área toda, que são exatamente das melhores terras do eixo da BR-364, que foram “antropizadas”. Mas conseguimos, por intermédio dessa lei, segurar quase 70% da área por meio de reservas, entre todas elas, reservas indígenas, biológicas, florestas nacionais e estaduais. Então, é preciso que quem trata dessa questão no Governo Federal consiga entender que Rondônia é diferente do Acre, que, por sua vez, é diferente de Roraima, do Amapá e do Amazonas, que não podemos ser vistos como os outros Estados da Amazônia, uma vez que temos peculiaridades especiais.

O nosso desenvolvimento ocorreu mediante assentamento feito pelo Incra. Fomos chamados para ocupar essa Amazônia, para ocupar aquele pedaço de chão brasileiro. Se vigorar a medida provisória da forma como está proposta, deixando os 80%, o Estado de Rondônia, que tem toda a sua área constituída de propriedades privadas, que, repito, não chega a 30%, que o cidadão comprou do Governo Federal e pagou, 93% dessas propriedades privadas são constituídas de pequenas propriedades, e o cidadão não consegue viver economicamente explorando a sua pequena propriedade com 80% dela preservados.

            Isso é uma falácia e é preciso que se diga isso claramente. Devemos discutir essa questão com profundidade, assim como fizemos na Comissão Mista. Estivemos no Acre - a Senadora Marina Silva esteve também presente. Escutamos o que pensa o povo acreano, ficamos sabendo de sua experiência. Estivemos em Rondônia. A Comissão teve a oportunidade de sentir o que pensa o povo de Rondônia e qual é a nossa realidade.

            Não podemos, e é este o meu questionamento, simplesmente pegar um número estanque, fixo, seco, frio e determinar 80%. Por que 80%? Por que não 85%, 89%, 90% ou 70%? Pergunto novamente, por que 80%? Então qual seria a solução, eminente Senador Gilberto Mestrinho? Lei de zoneamento sócio-ecológico-econômico.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Com o maior prazer, eminente Senadora Marina Silva, pois V. Exª tem uma participação muito efetiva nessa questão e tenho certeza de que tem dado a sua contribuição para encontrarmos uma solução que possa atender aos interesses de todos os Estados da Amazônia.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Estou acompanhando, com bastante atenção, o pronunciamento de V. Exª. Nesse processo todo de discussão, de reformulação do Código Florestal, todos aprendemos muito. É fundamental que essa discussão não seja reduzida apenas à questão de 80% ou não, porque o projeto de conversão aborda vários aspectos referentes ao Código Florestal. E deve necessariamente refletir os avanços que tivemos na legislação ambiental desde que o Código foi feito há mais de 30 anos. Quero dizer também, Senador Moreira Mendes, que o Congresso Nacional e a Comissão Especial terão a enorme responsabilidade de evitar um certo xenofobismo na regulamentação do uso das nossas riquezas naturais, no caso a floresta amazônica. Se a Comissão enveredar pelo caminho de retirar os 80%, estará sendo contraditória com o que se está propondo, que é estabelecer o zoneamento ecológico-econômico como sendo a base de regra para a exceção. Ora, se não temos nenhuma regra, não temos o que flexibilizar. Logo, a Comissão tem que ter a maturidade e a responsabilidade de não querer jogar essa decisão para a platéia, que, muitas vezes, não está informada dessa discussão que estamos fazendo, de que, por exemplo, Rondônia já tem o seu zoneamento ecológico, embora com problemas, é verdade, como foram colocados na audiência, e precisa aperfeiçoar a forma como cuidar das áreas de preservação permanente. O Acre está fechando o seu, os demais Estados também. Que incentivo terão os Estados que ainda não o fizeram, se não houver uma regulamentação que estabeleça que serão aplicados os 80%, como está na lei?

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Concordo plenamente.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - A quem fez o zoneamento ecológico-econômico de acordo com os critérios técnicos será indicada essa flexibilização. O meu medo é o de que, no discurso, digamos que o zoneamento é que vai nortear as mudanças, mas, na prática, tiremos qualquer regra. Ora, os Estados que já o fizeram, muito bem, mas os outros não terão nenhuma razão de fazê-lo, se podem estar usando da forma indevida ou de qualquer maneira. Essa é a observação que faço, para que não criemos aqui uma cultura, que parece partir do Congresso Nacional, de que não queremos nenhum tipo de regulamentação. Falo com a transparência da alma, e V. Exª viu a forma como me posicionei em Rondônia. Havia mais de 1.500 pessoas naquele auditório, e fiz questão de me colocar como ecologista, como pessoa que defende o meio ambiente, porque não sou de fazer discurso fácil para agradar. Sou pessoa de defender os meus princípios, as minhas idéias, de respeitar as idéias dos outros. Mas, com relação a essa questão do Código Florestal, primeiro, penso que não devemos reduzir apenas 80%; segundo, não devemos entrar pelo caminho de que não precisamos de regra nenhuma, porque onde não existe regra não existe o que flexibilizar. Seria falacioso o argumento de que o zoneamento é que fará as exceções. Nesse sentido, poderemos sentar, discutir, debater, para que aquilo que vamos aprovar no Congresso Nacional não seja apenas um instrumento para detonar o nosso meio ambiente, porque não podemos usar o argumento de que isso já foi feito na Europa, nos Estados Unidos, no Canadá. Não me interessa o que de errado eles já fizeram. O que me interessa é como podemos fazer o certo, mesmo sendo um País considerado não-desenvolvido. Com relação a esse aspecto, quero que sejamos desenvolvidos. Não vamos fazer as mesmas besteiras que eles já fizeram. Perdão pela palavra. Espero que a palavra “besteira” não fira o decoro.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Eminente Senadora Marina Silva, talvez tenhamos muitas divergências no que se refere à questão político-partidária, mas no que se refere à defesa da Amazônia e do meio ambiente nossas idéias estão convergindo para uma mesma posição. E quero explicar. Concordo plenamente com o que V. Exª falou: nós temos a responsabilidade de colocar um freio no avanço descontrolado, desordenado sobre a floresta amazônica. Parece-me que o freio é realmente essa questão dos 80%. Mas isso não pode ficar como uma letra fria, sem que se abra a possibilidade, como disse, de cada Estado, soberanamente, por meio da sua lei de zoneamento e de critérios que deverão ser fixados no próprio projeto de conversão, dirigir o seu destino, como está fazendo o Acre, que é muito mais preservacionista do que Rondônia, porque tem quase 92% de suas florestas ainda intocadas e com muita dificuldade de acesso.

Quero repetir que, se Rondônia estivesse começando sua colonização agora, talvez a fizesse com outra mentalidade; talvez os que estivessem indo para Rondônia agora fossem com outra consciência. Entretanto, chamados pelo Governo, viemos para agir da forma como agimos. Então, não podemos ser punidos agora - estou-me referindo a Rondônia.

Concordo com o que V. Exª apresentou - estou defendendo isso e o disse hoje, no Ministério do Meio Ambiente: deixe os 80% como regra geral; que cada Estado resolva o seu problema por meio da lei de zoneamento, baseado em estudo técnico-científico. Também não é chegar lá e simplesmente dizer “é aqui, é ali, vamos derrubar, e acabou”. Tem que ser um estudo tecnicamente perfeito e com regras de limite também. Senão, acaba avançando-se mais do que se deve. Mas defendo, ainda, que o zoneamento deve preocupar-se com o global do território do Estado, e não com a propriedade privada.

É importante que a imprensa tenha consciência do que estamos falando. Ontem, quase todos os grandes jornais brasileiros tinham um artigo, uma nota ou uma manchete sobre esta questão: vão devastar 50% da Amazônia. Isso é piada, não existe. Ainda que fossem os 50%, estamos falando de 24% de propriedade privada, e 50% de 24% são 11% do global. Então, a imprensa está distorcendo muito. É preciso ouvir o outro lado.

Por isso, estou, neste momento, ocupando esta tribuna, Sr. Presidente, e vou fazê-lo muitas outras vezes na defesa do que julgo do maior interesse para o Estado de Rondônia.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2001 - Página 8027