Discurso durante a 45ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

REGISTRO DA IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA ADJUNTO DE SOLIDARIEDADE, LANÇADO PELO GOVERNO DO ESTADO DO ACRE, COMO INSTRUMENTO DA POLITICA DE COMBATE A POBREZA.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.:
  • REGISTRO DA IMPLANTAÇÃO DO PROGRAMA ADJUNTO DE SOLIDARIEDADE, LANÇADO PELO GOVERNO DO ESTADO DO ACRE, COMO INSTRUMENTO DA POLITICA DE COMBATE A POBREZA.
Publicação
Publicação no DSF de 04/05/2001 - Página 8032
Assunto
Outros > ESTADO DO ACRE (AC), GOVERNO ESTADUAL.
Indexação
  • REGISTRO, IMPLANTAÇÃO, PROGRAMA, SOLIDARIEDADE, ESTADO DO ACRE (AC), COMBATE, POBREZA, INCENTIVO, ESCOLARIZAÇÃO.
  • ELOGIO, INICIATIVA, JORGE VIANA, GOVERNADOR, ESTADO DO ACRE (AC), PROGRAMA, COMBATE, POBREZA, NECESSIDADE, IMPLANTAÇÃO, BRASIL.
  • INFORMAÇÃO, DADOS, FUNCIONAMENTO, PROGRAMA, PARTICIPAÇÃO, ORADOR.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Estou acompanhando, com bastante atenção, o pronunciamento de V. Exª. Nesse processo todo de discussão, de reformulação do Código Florestal, todos aprendemos muito. É fundamental que essa discussão não seja reduzida apenas à questão de 80% ou não, porque o projeto de conversão aborda vários aspectos referentes ao Código Florestal. E deve necessariamente refletir os avanços que tivemos na legislação ambiental desde que o Código foi feito há mais de 30 anos. Quero dizer também, Senador Moreira Mendes, que o Congresso Nacional e a Comissão Especial terão a enorme responsabilidade de evitar um certo xenofobismo na regulamentação do uso das nossas riquezas naturais, no caso a floresta amazônica. Se a Comissão enveredar pelo caminho de retirar os 80%, estará sendo contraditória com o que se está propondo, que é estabelecer o zoneamento ecológico-econômico como sendo a base de regra para a exceção. Ora, se não temos nenhuma regra, não temos o que flexibilizar. Logo, a Comissão tem que ter a maturidade e a responsabilidade de não querer jogar essa decisão para a platéia, que, muitas vezes, não está informada dessa discussão que estamos fazendo, de que, por exemplo, Rondônia já tem o seu zoneamento ecológico, embora com problemas, é verdade, como foram colocados na audiência, e precisa aperfeiçoar a forma como cuidar das áreas de preservação permanente. O Acre está fechando o seu, os demais Estados também. Que incentivo terão os Estados que ainda não o fizeram, se não houver uma regulamentação que estabeleça que serão aplicados os 80%, como está na lei?

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Concordo plenamente.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - A quem fez o zoneamento ecológico-econômico de acordo com os critérios técnicos será indicada essa flexibilização. O meu medo é o de que, no discurso, digamos que o zoneamento é que vai nortear as mudanças, mas, na prática, tiremos qualquer regra. Ora, os Estados que já o fizeram, muito bem, mas os outros não terão nenhuma razão de fazê-lo, se podem estar usando da forma indevida ou de qualquer maneira. Essa é a observação que faço, para que não criemos aqui uma cultura, que parece partir do Congresso Nacional, de que não queremos nenhum tipo de regulamentação. Falo com a transparência da alma, e V. Exª viu a forma como me posicionei em Rondônia. Havia mais de 1.500 pessoas naquele auditório, e fiz questão de me colocar como ecologista, como pessoa que defende o meio ambiente, porque não sou de fazer discurso fácil para agradar. Sou pessoa de defender os meus princípios, as minhas idéias, de respeitar as idéias dos outros. Mas, com relação a essa questão do Código Florestal, primeiro, penso que não devemos reduzir apenas 80%; segundo, não devemos entrar pelo caminho de que não precisamos de regra nenhuma, porque onde não existe regra não existe o que flexibilizar. Seria falacioso o argumento de que o zoneamento é que fará as exceções. Nesse sentido, poderemos sentar, discutir, debater, para que aquilo que vamos aprovar no Congresso Nacional não seja apenas um instrumento para detonar o nosso meio ambiente, porque não podemos usar o argumento de que isso já foi feito na Europa, nos Estados Unidos, no Canadá. Não me interessa o que de errado eles já fizeram. O que me interessa é como podemos fazer o certo, mesmo sendo um País considerado não-desenvolvido. Com relação a esse aspecto, quero que sejamos desenvolvidos. Não vamos fazer as mesmas besteiras que eles já fizeram. Perdão pela palavra. Espero que a palavra “besteira” não fira o decoro.

O SR. MOREIRA MENDES (PFL - RO) - Eminente Senadora Marina Silva, talvez tenhamos muitas divergências no que se refere à questão político-partidária, mas no que se refere à defesa da Amazônia e do meio ambiente nossas idéias estão convergindo para uma mesma posição. E quero explicar. Concordo plenamente com o que V. Exª falou: nós temos a responsabilidade de colocar um freio no avanço descontrolado, desordenado sobre a floresta amazônica. Parece-me que o freio é realmente essa questão dos 80%. Mas isso não pode ficar como uma letra fria, sem que se abra a possibilidade, como disse, de cada Estado, soberanamente, por meio da sua lei de zoneamento e de critérios que deverão ser fixados no próprio projeto de conversão, dirigir o seu destino, como está fazendo o Acre, que é muito mais preservacionista do que Rondônia, porque tem quase 92% de suas florestas ainda intocadas e com muita dificuldade de acesso.

Quero repetir que, se Rondônia estivesse começando sua colonização agora, talvez a fizesse com outra mentalidade; talvez os que estivessem indo para Rondônia agora fossem com outra consciência. Entretanto, chamados pelo Governo, viemos para agir da forma como agimos. Então, não podemos ser punidos agora - estou-me referindo a Rondônia.

Concordo com o que V. Exª apresentou - estou defendendo isso e o disse hoje, no Ministério do Meio Ambiente: deixe os 80% como regra geral; que cada Estado resolva o seu problema por meio da lei de zoneamento, baseado em estudo técnico-científico. Também não é chegar lá e simplesmente dizer “é aqui, é ali, vamos derrubar, e acabou”. Tem que ser um estudo tecnicamente perfeito e com regras de limite também. Senão, acaba avançando-se mais do que se deve. Mas defendo, ainda, que o zoneamento deve preocupar-se com o global do território do Estado, e não com a propriedade privada.

É importante que a imprensa tenha consciência do que estamos falando. Ontem, quase todos os grandes jornais brasileiros tinham um artigo, uma nota ou uma manchete sobre esta questão: vão devastar 50% da Amazônia. Isso é piada, não existe. Ainda que fossem os 50%, estamos falando de 24% de propriedade privada, e 50% de 24% são 11% do global. Então, a imprensa está distorcendo muito. É preciso ouvir o outro lado.

Por isso, estou, neste momento, ocupando esta tribuna, Sr. Presidente, e vou fazê-lo muitas outras vezes na defesa do que julgo do maior interesse para o Estado de Rondônia.

 

O SR. PRESIDENTE (Maguito Vilela) - Concedo a palavra à Senadora Marina Silva, pela liderança do Bloco.

A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC. Como líder. Sem revisão da oradora.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Senadora Heloísa Helena, há muito eu estava pretendendo fazer este registro, referente ao programa de combate à pobreza que está sendo implementado pelo Governo do Estado do Acre e que já constitui, com certeza, uma base de referência do trabalho que realizamos na Comissão de Combate e Erradicação da Pobreza. E tenho a felicidade de fazer este registro, tendo V. Exª como Presidente dos trabalhos, porque foi V. Exª o Presidente da Comissão criada no Congresso Nacional, por iniciativa de um requerimento de minha autoria, oportunidade em que visitamos os lugares mais pobres deste País.

Ao final daquele nosso trabalho, tínhamos um conjunto de medidas que infelizmente não foram atendidas na sua globalidade. Apenas o projeto do Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza, de forma tão limitada, foi aprovado. Mas a idéia, que foi aquilo que me mobilizou, da criação de um Orçamento social para as ações de combate à pobreza em todo o nosso País, lamentavelmente, ainda está tramitando, e não se sente, por parte da Casa, uma mobilização para dar uma resposta adequada aos 78 milhões de pobres que aguardam, tanto do Poder Executivo, quanto do Legislativo e da própria sociedade, uma resposta à altura das dificuldades que enfrentam.

Confesso, Sr. Presidente, que, ao término daquele nosso trabalho, tive certa decepção e fiquei muito entristecida, porque os frutos não eram compatíveis com o tamanho da árvore que plantamos, em termos de expectativas. No entanto, tive a felicidade, graças a Deus, de ver, no Governo do Estado do Acre, o Governador Jorge Viana, do Partido dos Trabalhadores, que, com grande sensibilidade, convidou-me para ajudar a desenhar um programa de combate à pobreza. E, lançando mão dos ensinamentos do trabalho da nossa Comissão e do conhecimento de técnicos, que nos ajudaram a desenhar um programa adaptável às necessidades do Acre, apresentamos, juntamente com as Secretarias do Governo - de Planejamento, de Educação, de Assistência Social, do Trabalho, enfim, as Secretarias afins -, uma proposta, a qual chamamos de Adjunto de Solidariedade. Esse é o nome adaptado para a realidade do Acre do Orçamento social, proposta essa que, para alguns do Governo Federal, parecia algo inexeqüível, incapaz de ser implementada do ponto de vista prático. Mas, graças a Deus, no Acre, está sendo implementada.

Só para se ter uma idéia, Sr. Presidente, no Acre, deve haver, mais ou menos, 30 mil famílias que constituem o núcleo duro da nossa pobreza. Haveria algo em torno de 60 mil famílias pobres naquela faixa de pobreza, mas o núcleo duro de pobreza estaria em torno de 30 mil famílias que vivem com menos de US$1 por dia. Essas pessoas, na sua grande maioria, estão nos bairros de periferia, principalmente no Município de Rio Branco, onde temos a maior concentração de pobres devido ao êxodo rural que foi praticado graças a uma política de devastação dos seringais, de inviabilidade da atividade produtiva e que tiveram que vir para as periferias fazendo os bairros periféricos da nossa cidade, onde temos uma massa de desempregados.

O Programa Adjunto de Solidariedade está constituído dentro de uma visão que, em primeiro lugar, é de alcance social estrutural e de alcance social emergencial. É um Programa com uma estrutura democrática para que haja espaço para participação da sociedade e das instituições públicas, sejam elas no plano estadual, municipal ou federal. No caso, estamos começando com recursos do Governo do Estado. Quero grifar aqui que o Governo retirou do seu orçamento a quantia de mais de R$20 milhões para a implementação desse Programa. Alguns que estão nos acompanhando podem achar insignificante. Mas no universo do orçamento do Estado do Acre e se considerarmos a nossa população, é um Programa ousado. Nas palavras de Cristovam Buarque, ex-Governador do Distrito Federal, que tem se dedicado a essa questão do combate à exclusão social e que, inclusive, dirige uma ONG voltada para a educação de crianças, a Missão Criança, segundo suas palavras, no lançamento desse Programa, esse se constitui o maior programa social do País, proporcionalmente falando.

Iremos atender, das 30 mil famílias, até o final deste ano, se Deus quiser, a 18 mil famílias; essas 18 mil famílias serão atendidas a partir de várias modalidades que compõem o Adjunto de Solidariedade.

Antes de falar de cada uma dessas modalidades, quero falar rapidamente da estrutura do Programa, porque uma coisa é propor ao governo dos outros, outra é fazer no nosso próprio governo. E eu fiz questão de fazer no nosso governo aquilo que propusemos ao Presidente Fernando Henrique Cardoso, para que não tenhamos dois pesos e duas medidas.

Primeiro aspecto: o Adjunto de Solidariedade ou orçamento social se compõe de um fórum consultivo, com participação paritária da sociedade e do Governo, para que ele tenha um viés radicalmente democrático; compõe-se de uma comissão gestora, porque é fundamental que as instituições públicas assumam sua responsabilidade; de uma secretaria executiva, para que tenha agilidade e seja capaz de operacionalização, no sentido de dar resposta aos objetivos para que foi criado; de uma coordenação dos benefícios e auxílios, composta pelas várias Secretarias envolvidas, porque é fundamental que haja parceria com as instituições da sociedade civil, a parceria com a sociedade, mas fundamentalmente é preciso que haja uma parceria interna, dentro do próprio Governo. Não se pode pedir o apoio exógeno se não houver uma interligação endógena, se o Governo estiver fragmentado. É por isso que temos uma coordenação de benefícios dividido entre as Secretarias afins: de Educação, de Planejamento, de Saúde, de Cultura, enfim, dos vários segmentos que compõem o nosso Governo.

Existem os núcleos de execução local. Cada regional, naquele Município, no caso na Capital, que é o primeiro que está sendo implementado, já temos quatro núcleos executores implementados, divididos por região, beneficiando diversos bairros. E essa estrutura pretende ser, e se Deus quiser será, uma estrutura democrática, uma estrutura ágil e fácil, inclusive para a fiscalização, o controle e a avaliação, porque queremos tudo com a mais absoluta transparência.

As linhas que compõem o orçamento social do Adjunto de Solidariedade são: a Bolsa-Escola, que irá atender a 10 mil famílias, no valor de 60 reais para cada família - o Governo Federal está destinando apenas 45 reais, e olhe que o Acre é um Estado pobre; a Renda Mínima, para pessoas que não têm filho na idade escolar, mas precisam de um auxílio, porque estão em condição de miséria, também no valor de 60 reais, atendendo a mil famílias; a Bolsa-Primeiro Emprego, para os jovens do Ensino Médio, no valor de 90 reais, para que eles possam prestar 15 horas de trabalho semanal, que pode ser inclusive nas ações do próprio Adjunto de Solidariedade; teremos também a modalidade da Bolsa-Primeira Infância, no valor de 60 reais, para as crianças de 0 a 7 anos que ainda não estão na idade escolar, mas que precisam de uma assistência, principalmente por problemas de desnutrição, em parceria com o trabalho maravilhoso que já vem sendo realizado pela Pastoral da Criança e por outras entidades que lidam com o sofrimento infantil, na faixa dos problemas de desnutrição. Ainda temos a Bolsa-Trabalho, destinada a beneficiar famílias de trabalhadores que estão desempregados mas que podem ter uma atividade econômica produtiva, principalmente nas frentes de trabalho que serão instituídas pelo Governo do Estado, no valor de R$185,00; e a Bolsa-Universitária, também no valor R$185,00, para mil estudantes universitários. A Bolsa-Trabalho beneficiará três mil famílias pobres.

Estou citando apenas algumas dessas modalidades para que se tenha uma idéia de que esse Programa tenta compatibilizar ações estruturais com ações emergenciais. A concepção do Programa é de transferência direta de renda para as famílias; nenhuma delas receberá a modalidade de cesta básica ou coisa semelhante, muito embora, em alguns casos, possa-se fazer esse tipo de atendimento, mas ele não constitui nenhum do eixos do Programa. Foi provado na nossa Comissão que a transferência direta de renda é o instrumento mais eficaz de combate à pobreza, porque as famílias sabem administrar esses recursos.

Agora, todas essas ações estão associadas à idéia de se colocarem as crianças nas escolas, porque nenhuma dessas atividades será desenvolvida ou implementada se as famílias não estiverem de acordo com o item “todas as crianças na escola, com o devido acompanhamento do seu desempenho escolar, e principalmente que essas crianças estejam recebendo as outras formas de assistência na parte de sua saúde especialmente e na parte de alimentação, porque a partir do nosso Programa de Merenda Escolar podemos estar, inclusive, dando um reforço para aquilo que elas já vêm recebendo, que é o auxílio da Bolsa-Escola.

Os núcleos do Adjunto de Solidariedade se constituirão também em núcleos de cidadania. Ali, teremos curso de formação para as mães principalmente, teremos todas as mães e todos os pais inseridos em programas de alfabetização para adulto, para que nenhuma dessas pessoas continue analfabeta. Teremos ações também de acompanhamento na área de saúde para as mulheres, do câncer de mama, do câncer ginecológico, e para as crianças a obrigatoriedade do acompanhamento na parte de vacinação, e outros benefícios na área de saúde. Todos esses elementos se constituem de uma ficha que será apresentada a cada ano, ou de 6 em 6 meses, para que a família se credencie a receber o benefício.

É um Programa de largo alcance. No nosso Estado, para a nossa realidade populacional, estará beneficiando 90 mil pessoas e, se Deus quiser, iremos fazer, na prática, aquilo que nos discursos eu e V. Exª, os Senadores Eduardo Suplicy, Pedro Simon e outros Srs. Senadores defendemos aqui, mas que, lamentavelmente, não tivemos a oportunidade de realizar.

Com alegria, observo que alguns Prefeitos já começam a pedir cópia do Programa para adaptá-lo às suas realidades. Espero que, da mesma forma que o Rio Grande do Sul se constituiu numa referência no que concerne ao Orçamento Participativo, o Acre possa estar dando uma pequena contribuição ao Orçamento Social. Que possamos ter um programa de combate à pobreza e à exclusão social, em que a educação seja o carro-chefe, além das demais atividades de geração de emprego e renda e de reforma agrária adaptada à nossa realidade do Acre, que são os pólos agroflorestais implementados pelo Governo do Acre. Outras ações possibilitam a inclusão social, como a reativação do extrativismo e aquelas que estão sendo levadas pelos projetos que o Governo está realizando na parte de construção civil, e assim por diante.

Sr. Presidente, para concluir este meu registro, devo dizer que estou muito feliz. Primeiro, pela oportunidade de estarmos fazendo do Acre um laboratório de combate à pobreza e à exclusão social. Pretendemos, até o final do ano, beneficiar até 18 mil famílias em todo o Estado do Acre e, até o final do Governo, neste um ano e alguns meses que nos restam, atender às 30 mil famílias que hoje estão abaixo da linha de pobreza no nosso Estado.

Espero que, com essas ações, possamos estar fazendo algo que nos leve a refletir sobre um dos ensinamentos mais importantes que aprendi com D. Mauro Morelli: de que as ações de governo são sempre voltadas para os que são, os que sabem, os que podem e os que têm . Quando assumimos o poder e temos a possibilidade de fazer transformações sociais, temos de pensar, em primeiro lugar - dizia ele -, nos que não são, nos que não podem, não sabem e não têm; dessa forma, estaremos evitando aquilo que Sebastião Salgado disse numa entrevista fantástica, à qual tive oportunidade de assistir na época em que estava acontecendo, no Rio Grande do Sul, o Fórum Social.

Sebastião Salgado é um dos fotógrafos que mostra a miséria humana em todo o mundo, mas também é um dos fotógrafos da esperança humana, porque, no momento em que fotografa a miséria, a pobreza, a exclusão, coloca-nos cara a cara com o desafio de vencê-la, de debelá-la e de dar uma resposta. Por isso, digo que ele também é o fotógrafo da esperança, pelo menos da esperança para aqueles que ainda têm resquícios de humanidade na sua prática social, cultural, política e espiritual.

Dizia ele, nessa entrevista, que a humanidade conseguiu, a partir de 20% da sua camada mais privilegiada - os que têm acesso à educação de boa qualidade, informação em tempo real, alimentação, saúde, segurança, cultura, possibilidade de viajar - criar uma fuga para o futuro, deixando para trás 80%. Esses 80% podem naufragar.

Eu gostaria de dizer que todo esforço e toda utopia devem estar voltados no sentido de não permitir que a raça humana fuja para o futuro com os seus 20% de excluídos, deixando para trás os 80% que não são, não sabem, não podem e não têm, como disse D. Mauro Morelli, porque não haverá futuro para fugir se fizermos isso. Se não formos capazes de debelar a pobreza, utilizando tudo aquilo que foi produzido social, coletiva e historicamente pela humanidade para promover a inclusão social, não haverá futuro para os que pensam que podem fugir. Poderão até fugir, isolando 80% da população para o analfabetismo, a fome, a miséria, o desemprego e a exclusão, mas, com certeza, aonde chegarem, se sentirão menos humanos. Logo, o espaço que alcançarem não será para 20% de possuídos; será o espaço para 20% de despossuídos que expropriaram de si mesmos o componente dos seus valores éticos, de solidariedade e de respeito pelo próximo.

Com essas palavras, Sr. Presidente, agradeço a V. Exª, que, muito gentilmente, permutou para que eu pudesse falar antes de V. Exª. Coloco-me à disposição como Senadora e como alguém que tem sensibilidade para esses problemas. Sinto-me assim, talvez, pela própria experiência de vida, de ter enfrentado os problemas de pobreza que identifico nas famílias que, hoje, juntamente com várias pessoas, inclusive V. Exª, tento beneficiar.

O meu mestre, Senador Eduardo Suplicy, não tem fronteiras ideológicas e nenhum tipo de restrição quando se trata da implementação do Programa de Renda Mínima. Não pergunta se é do PFL, do PMDB ou do PSDB; se alguém quer implementar o Programa, S. Exª se dispõe 100% a ajudar. Da mesma forma, no caso do Orçamento Social, quem quiser a idéia, a cópia, o esforço, o empenho da Senadora Marina Silva e do Governo do Estado do Acre, estamos aí. O nosso objetivo não é carimbar uma idéia como essa para um grupo ou um partido, mas carimbá-la para todos os homens e mulheres de bem que querem ver combatida a exclusão social. Não me refiro a palavras, mas a gestos concretos, principalmente, a ações de governo que levem a um programa estrutural, que combinem as ações sociais emergenciais de combate à fome com as ações estruturais de reforma agrária e educação, para que não tenhamos mais 70 milhões de pobres e 15 milhões de jovens analfabetos.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 04/05/2001 - Página 8032