Discurso durante a 51ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

SOLICITAÇÃO DE REVISÃO, PELAS AUTORIDADES DOS ESTADOS UNIDOS, DA NÃO ADESÃO AO ACORDO DE KYOTO, CELEBRADO NO JAPÃO EM 1997, COM O OBJETIVO DE REDUZIR A EMISSÃO DE DIOXIDO DE CARBONO.

Autor
Ademir Andrade (PSB - Partido Socialista Brasileiro/PA)
Nome completo: Ademir Galvão Andrade
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. :
  • SOLICITAÇÃO DE REVISÃO, PELAS AUTORIDADES DOS ESTADOS UNIDOS, DA NÃO ADESÃO AO ACORDO DE KYOTO, CELEBRADO NO JAPÃO EM 1997, COM O OBJETIVO DE REDUZIR A EMISSÃO DE DIOXIDO DE CARBONO.
Publicação
Publicação no DSF de 15/05/2001 - Página 9237
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, GEORGE W BUSH.
  • BUSH, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), AUSENCIA, IMPLEMENTAÇÃO, ACORDO INTERNACIONAL, OBJETIVO, REDUÇÃO, EMISSÃO, GAS CARBONICO, ATMOSFERA.
  • AVALIAÇÃO, EFEITO, EMISSÃO, GAS CARBONICO, ATMOSFERA, DESTRUIÇÃO, CAMADA DE OZONIO, AUMENTO, TEMPERATURA, PLANETA TERRA.
  • ANALISE, CRITICA, AUSENCIA, PUNIÇÃO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).
  • APREENSÃO, QUALIDADE DE VIDA, FUTURO, POPULAÇÃO, MUNDO.

O SR. ADEMIR ANDRADE (PSB - PA) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Acordo de Kyoto, celebrado no Japão, em 1997, com o objetivo de levar os países ricos a reduções substantivas de suas elevadas emissões de dióxido de carbono, causa direta do efeito estufa ou, para ser mais claro, do aquecimento do Planeta, acaba de ser jogado na lata de lixo. Há algumas semanas, o Presidente norte-americano, George W. Bush, anunciou a decisão de não regulamentar no seu Pais as regras para emissão de gás carbono. Com isso decretou praticamente a “morte” daquele que pode ser caracterizado como um dos atos mais relevantes em favor da qualidade de vida no Planeta, em todos os tempos.

As conseqüências para a humanidade ainda não podem ser previstas, em toda a sua extensão. Contudo, a persistirem as emissões nos patamares atualmente verificados, os cientistas imaginam que nos próximos 100 anos a temperatura média da Terra sofrerá acréscimos que variam entre 1,4º e 5,8º na escala Celsius. Estudos mostram que entre os anos 1.000 e 1.900 da nossa era, a variação de temperatura no hemisfério norte manteve-se praticamente estável, com pequenas séries de alterações em torno de 0,3º C. Já no período que compreende os últimos cem anos houve um acréscimo de 0,8º C.

A formalização da recusa norte-americana de ratificação do Acordo não chega a ser uma surpresa, na medida em que o candidato George W. Bush já anunciava essa intenção, uma vez conduzido ao Salão Oval. Essa recusa, no entanto, significa simplesmente que a nação que mais polui a atmosfera continuará com as pesadas e danosas emissões sem qualquer tipo de restrição ou embaraço, desprezando, como regularmente tem feito, os interesses comuns dos habitantes do Planeta, inclusive, evidentemente, os de seus próprios nacionais. Lembram, Srªs e Srs. Senadores que os EUA não ratificaram de forma plena a Convenção da Biodiversidade, fazendo-o apenas com ressalvas aos seus interesses comerciais.

O curioso em toda essa história, que teve o seu desfecho nas últimas semanas de março passado e, diga-se a bem da verdade, com o maciço apoio do Senado americano, Instância a qual incumbe a ratificação do ajustado em Kyoto há quase quatro anos, é que a adesão a esse tipo de concertação havia ocorrido na administração de George Bush, o pai do atual Presidente. Foi ele, na dupla condição de Chefe de Estado e de Governo quem assinou o chamado Quadro Geral sobre Mudança Climática, tratado-referência que desencadeou o processo condutor a Kyoto.

É inegável que o aquecimento global é um problema com o qual nos defrontamos, ou melhor dizendo, evitamos há pelo menos cem anos. Decorrência direta de um crescente e desordenado processo de industrialização experimentado por inúmeras nações, em distintos graus e velocidades, ele se viu acelerar extraordinariamente no século que passou, chegando, então como agora, ao ponto de comprometer seriamente a qualidade de vida de todos nós e das gerações que nos vão suceder.

Mas a despeito de todas as repercussões na mídia internacional, em especial dentro da União Européia, o mundo finalmente parece resignar-se com essa decisão unilateral dos Estados Unidos. Aí, o ciclo da notícia foi breve, lamentavelmente brevíssimo. Nem mesmo os verdes norte-americanos, liderados pelo seu ex-candidato à Casa Branca, o advogado Ralph Nader, conseguiram sensibilizar o Executivo ou o Legislativo. Para que V. Exªs tenham uma idéia, o Senado americano aprovou resolução negando-se a sequer examinar a ratificação do Acordo, por desconcertantes 95 votos a zero.

Ora, quando sabemos que os Estados Unidos são responsáveis pela terceira maior emissão per capita de dióxido de carbono, sendo que cada um de seus 280 milhões de cidadãos respondeu por 5.5 toneladas, em 1997, o que conforma cerca de 25 por cento das emissões mundiais, é preciso que busquemos alternativas de pressão e persuasão, com rapidez, para salvar as resoluções de Kyoto. Não se pode cruzar os braços diante de atitude tão egoísta e irresponsável.

É importante observar, igualmente, que os Estados Unidos, em sua contumaz arrogância, destoam da conduta adotada por vários outros países industrializados que, ao acatarem o Acordo se viram na contingência de reduzir suas emissões e o fazem corretamente, como a Inglaterra, berço da revolução industrial, e a Alemanha.

As poucas informações disponíveis sobre o que virá depois dessa decisão, indicam um período de indefinições. O que sabemos, via mídia, é que George W. Bush vai posicionar-se sobre a matéria apenas depois que um grupo de estudo, de nível ministerial, complete uma minuciosa revisão de todas as opções disponíveis ao que foi anteriormente aceito pelos Estados Unidos, e por todas as demais nações signatárias do Acordo.

Em uma história cheia de ironias, pode soar paradoxal que empresas como a Ford, a British Petroleum e a Shell, para citar somente alguns dos gigantes do capitalismo industrial contemporâneo, que originalmente rechaçavam o Protocolo de Kyoto, tornaram-se simpáticas pelo menos às linhas gerais propostas.

Isso deriva do natural desdobramento da lógica capitalista, disparada a partir do reconhecimento de que a ciência, consensualmente, aponta com toda a clareza para as sérias e efetivas conseqüências do aquecimento global, além da indesmentível constatação de que unicamente um conjunto de ações, implementadas agora, poderá prevenir uma verdadeira catástrofe, de dimensões imprevisíveis, no futuro.

Aqueles que se mostram mais otimistas a respeito das perspectivas do Protocolo de Kyoto afirmam que ele poderá vigorar, a partir da ratificação do acordado por 55 de seus signatários. Ainda que isso signifique um avanço, capaz de minorar os problemas gerados pelas emissões descontroladas do dióxido de carbono, não devemos ser ingênuos a ponto de pensar que o planeta estará propriamente a salvo do efeito estufa. Registre-se, ainda, que os Estados Unidos da América são os maiores emissores do conjunto dos ditos gases estufa, e caso esse país não se submeta às regulações originalmente ajustadas em Kyoto, uma parte considerável do problema remanesce.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a mudança climática é um problema de toda a humanidade, como tal impõe uma solução coordenada globalmente. Em julho próximo, Bonn sediará uma nova rodada de negociações em torno do Protocolo de Kyoto. É o momento adequado para tentarmos, com firmeza e determinação, reverter o quadro atual.

A Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, no último dia 24, por iniciativa do Senador Jefferson Péres, aprovou uma Moção manifestando ao Governo norte-americano a preocupação e protesto diante da determinação do Presidente Bush de não endossar a regulamentação das normas para a emissão de dióxido de carbono na atmosfera, contidas no Protocolo de Kyoto.

            Logo, ao concluir este pronunciamento, faço um apelo ao Governo dos Estados Unidos, por intermédio de seus representantes acreditados em Brasília, ao tempo em que conclamo o Ministério das Relações Exteriores do Brasil a utilizar o seu melhor empenho para, em conjunto com os inúmeros países inequivocamente favoráveis à confirmação do protocolo, fazer com que os norte-americanos revejam seu posicionamento, considerando que está em jogo interesses não apenas deste ou daquele Estado, mas a toda a humanidade.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/05/2001 - Página 9237