Discurso durante a Reunião do Senado Federal, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE O SUBSTITUTIVO DA CAMARA DOS DEPUTADOS AO PROJETO QUE TRATA DO ESTATUTO DAS CIDADES, DO QUAL S.EXA. FOI DESIGNADO RELATOR. PREMENCIA NA DEFINIÇÃO DE UMA POLITICA URBANA QUE INTERROMPA O PROCESSO DE FAVELIZAÇÃO DOS CENTROS URBANOS.

Autor
Mauro Miranda (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/GO)
Nome completo: Mauro Miranda Soares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA HABITACIONAL. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE O SUBSTITUTIVO DA CAMARA DOS DEPUTADOS AO PROJETO QUE TRATA DO ESTATUTO DAS CIDADES, DO QUAL S.EXA. FOI DESIGNADO RELATOR. PREMENCIA NA DEFINIÇÃO DE UMA POLITICA URBANA QUE INTERROMPA O PROCESSO DE FAVELIZAÇÃO DOS CENTROS URBANOS.
Publicação
Publicação no DSF de 26/05/2001 - Página 10524
Assunto
Outros > POLITICA HABITACIONAL. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO URBANO.
Indexação
  • ANALISE, SITUAÇÃO, PRECARIEDADE, ZONA URBANA.
  • ANALISE, EXISTENCIA, ARTIGO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REGULAMENTAÇÃO, DISTRIBUIÇÃO, RESPONSABILIDADE ADMINISTRATIVA, GARANTIA, CIDADÃO, DIREITOS SOCIAIS, HABITAÇÃO.
  • AVALIAÇÃO, CRITICA, INSUFICIENCIA, QUANTIDADE, HABITAÇÃO, ZONA URBANA, EFEITO, CRESCIMENTO, FAVELA.
  • CRITICA, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, REGULAMENTAÇÃO, POLITICA HABITACIONAL, IMPEDIMENTO, AUTONOMIA ADMINISTRATIVA, MUNICIPIOS.
  • REGISTRO, CAMARA DOS DEPUTADOS, APROVAÇÃO, SUBSTITUTIVO, ESTATUTO, CIDADE, OBJETIVO, IMPLEMENTAÇÃO, DIREITOS, HABITAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL.

O SR. MAURO MIRANDA (PMDB - GO) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, nosso tempo - dizem-no a toda hora - é de globalização. Segundo os arautos da nova era, os Estados Nacionais estariam, para dizer o mínimo, em processo de perda do sentido e da razão de ser, à medida que as fronteiras caem e as distâncias encolhem-se diante da rapidez dos meios de comunicação e da força dos mercados.

Talvez isso, até certo ponto, seja mesmo verdade. A noção de nacionalidade ligada à de Estado Nacional está sendo questionada até mesmo pelos movimentos reivindicatórios de autonomia de subidentidades regionais em diversos países, principalmente da Europa. Esse questionamento a respeito dos Estados-Nação tem, a meu ver - e principalmente para um país com a extensão territorial e a diversidade cultural do Brasil -, uma implicação crucial, a merecer reflexão aprofundada. Trata-se do fato, de resto evidente, de que as pessoas não residem nos países, nem mesmo nos Estados, mas sim nas cidades.

Com efeito, no caso de nosso País, a questão se mostra ainda mais urgente, em face da crescente preponderância da população considerada urbana pelos censos nacionais sobre a população rural.

Essa reflexão se coaduna com a tendência em direção à descentralização administrativa explicitada, de maneira inédita em nossa história constitucional, pela Carta Magna de 1988 e nunca inteiramente regulamentada e implementada. Além de uma nova estrutura de distribuição das responsabilidades administrativas e dos recursos resultantes da coleta dos tributos federais, nossa Lei Fundamental, em seus artigos 182 e 183, dedica-se precisamente à indicação da necessidade de uma política urbana que grave a propriedade imobiliária localizada em cidades com a obrigação do cumprimento de uma função social.

Se considerarmos, Srªs. e Srs. Senadores, o escandaloso déficit habitacional, uma das mais profundas chagas de nossa sociedade desigual, não poderemos deixar de concluir que a definição de uma política urbana nem chega a ser uma urgência: ela já tarda, e muito. Déficit impossível de escapar a qualquer visitante e a qualquer brasileiro consciente das questões sociais: ele é visível na crescente favelização de nossos centros urbanos e periferias, não somente nas grandes metrópoles mas já também nas médias cidades e até em alguns pequenos agrupamentos urbanos, à beira das principais rodovias do País.

Em um aspecto, porém, a inclusão da questão urbana na Constituição acabou servindo para retardar os efeitos concretos imaginados e desejados pelo legislador constituinte. De fato, ao remeter à regulamentação por lei federal a instituição das normas penais aplicáveis aos casos de violação da função social da propriedade urbana, a Carta Magna impediu que os municípios estabelecessem suas próprias regras. Mais ainda: tornou inaplicáveis ou judicialmente questionáveis os planos diretores elaborados justamente naquelas unidades municipais cujos administradores e legisladores se mostraram mais sensíveis ao problema.

Por tudo isso, registro o retorno a esta Casa do Substitutivo aprovado pela Câmara Federal ao Estatuto das Cidades - PLS 181, de 1990, de autoria do Senador Pompeu de Sousa, e aqui aprovado em 1991. O Substitutivo, diga-se a bem da verdade, somente agora retorna para nosso escrutínio, após nada menos de onze anos de tramitação naquela Casa, durante os quais as questões sociais - e mormente as relativas à habitação - agravaram-se agudamente.

Esse Substitutivo, de que fui designado relator em sua tramitação no Senado, deve merecer especial atenção por parte dos Senhores Senadores. Ele vem finalmente cobrir a lacuna legal que hoje fragiliza tremendamente os municípios em sua disposição de fazer valer os preceitos constitucionais relativos à habitação e ao uso da propriedade urbana.

Entre os instrumentos propostos para a implementação da política urbana, o Projeto inclui a elaboração de planos, nos níveis nacional, regional e estadual, para a ordenação do território, visando ao desenvolvimento econômico e social. Prevê-se o planejamento das regiões metropolitanas, das aglomerações urbanas e das microrregiões, assim como dos planos diretores municipais e dos institutos jurídicos, financeiros, políticos e tributários que hão de permitir sua administração.

A gestão democrática do espaço urbano, que incluirá considerações de impacto ambiental e de vizinhança é uma das novidades mais positivas incluídas no Projeto. Institutos como o usucapião especial, a concessão especial de uso para fins de moradia e o IPTU progressivo no tempo são alguns dos instrumentos previstos no Projeto que certamente fortalecerão os municípios em suas iniciativas de estabelecimento de políticas urbanas próprias, adequadas a cada caso.

Não nos devemos esquecer, Srªs. e Srs. Senadores, de que o direito à moradia foi recentemente incorporado aos direitos sociais constitucionalmente assegurados. Esse direito, porém, só estará assegurado de fato se houver mecanismos legais que combatam a especulação imobiliária e permitam a implementação de políticas socialmente justas. A ampliação e a generalização dos serviços de saneamento e de transporte também se tornarão menos onerosas se a ocupação dos espaços urbanos se fizer de maneira mais racional.

Aprovar o quanto antes esse Estatuto da Cidade permitirá ainda que o Brasil demonstre ao mundo - antes da sessão especial da Assembléia das Nações Unidas prevista para junho, quando os países do mundo serão avaliados quanto a suas políticas e ações sociais efetivas para a solução dos problemas de habitação - que vem efetivamente fazendo os esforços de política social que se comprometeu a realizar há cinco anos, por ocasião da Habitat II -- Conferência das Nações Unidas sobre Assentamentos Urbanos, ocorrida em Istambul.

Acredito não ser necessário ressaltar aqui a importância de uma boa imagem do País nesta próxima sessão da Assembléia geral para a obtenção futura de financiamentos destinados a obras de infra-estrutura social.

Está em nossas mãos, portanto, Srªs. e Srs. Senadores, dar essa contribuição para a melhoria das condições de vida de nossos compatriotas e, por conseqüência, para a melhoria da imagem de nosso País diante das outras nações do mundo.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/05/2001 - Página 10524