Discurso durante a 58ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

HOMENAGEM A MEMORIA DE HONORIO HERMETO CARNEIRO LEÃO, MARQUES DO PARANA, PELO BICENTENARIO DE SEU NASCIMENTO.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM A MEMORIA DE HONORIO HERMETO CARNEIRO LEÃO, MARQUES DO PARANA, PELO BICENTENARIO DE SEU NASCIMENTO.
Publicação
Publicação no DSF de 24/05/2001 - Página 10181
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • LEITURA, DISCURSO, AUTORIA, LUCIO ALCANTARA, SENADOR, HOMENAGEM, HONORIO HERMETO CARNEIRO LEÃO, POLITICO, PERSONAGEM ILUSTRE, EPOCA, IMPERIO, BRASIL, COMEMORAÇÃO, CENTENARIO, NASCIMENTO, REGISTRO, BIOGRAFIA, ATIVIDADE POLITICA.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Sr. Embaixador, Srªs e Srs. convidados, é com muita honra que recebo a incumbência do Sr. Presidente de proceder à leitura do pronunciamento elaborado pelo Senador Lúcio Alcântara, o autor do requerimento em que se pede seja feita esta homenagem.

            Passo à leitura do discurso de S. Exª:

A Hora do Expediente desta sessão do Senado Federal destina-se a homenagear o estadista brasileiro da época do Império Honório Hermeto Carneiro Leão, distinguido com os títulos nobiliárquicos de Visconde do Paraná, em 1852, e com o título de Marquês do Paraná, em 1854.

Neste ano, comemora-se o segundo centenário do nascimento dessa figura da História do Brasil. Nascido de família humilde na Vila de Jacuí, Minas Gerais, em 11 de janeiro de 1801, viajou, aos 19 anos, para Coimbra, em cuja universidade se diplomou em Direito em 1825.

Parecia fadado a uma carreira meteórica, pois, voltando ao Brasil, foi nomeado Juiz de São Sebastião, na Província de São Paulo e, em três anos, chegou a Desembargador da relação de Pernambuco, com exercício no Rio de Janeiro. Exerceu, concomitantemente, o cargo de Auditor-Geral de Marinha e Ouvidor no Rio de Janeiro, com assento na Corte. Alçado ao Supremo Tribunal de Justiça, não tomou posse, porque foi escolhido, na mesma época, como Conselheiro de Estado.

Entre as vozes a propósito desse estadista, podemos lembrar a de Rui Barbosa, com toda a sua autoridade intelectual, que dele disse que “demarca um trecho decisivo de nossa história constitucional e centraliza-a. Enfeixa as energias do passado e desencadeia as do futuro. Separa duas épocas. Foi o ponto culminante do Império”.

Era conhecido pelo temperamento forte, contrabalançado pela vontade consciente e a decisão uniforme, sabendo aproveitar essas qualidades para atrair a atenção dos contemporâneos e ser guindado às mais altas posições, sempre com a preocupação, conforme dizia Edmundo da Luz Pinto, de “levar a Pátria para adiante, de romper com os mecanismos e preconceitos que lhe retardam o avanço, de idealizar roteiros novos, vendo o amanhã, para mais seguros e maiores passos da nacionalidade”.

Em 1830, começou a carreira política como Deputado por Minas Gerais, aliando-se aos moderados, sob a liderança de Evaristo da Veiga.

Carneiro Leão, um ano depois de eleito, destacou-se colaborando na redação de um manifesto que chamava à ordem o próprio Imperador. Tal fato se deu a 17 de fevereiro de 1831 - poucas semanas, portanto, antes da abdicação de D. Pedro I.

Carneiro Leão tinha uma posição política deveras interessante: era pelo predomínio do Legislativo - posição liberal que restringia os poderes imperiais -, mas, ao mesmo tempo, apoiava a vitaliciedade dos Senadores - posição conservadora, pois os Senadores eram escolhidos pelo Imperador.

A política, nessa época, era um jogo de interesses aristocráticos, já que só existia no Rio ou nas capitais de províncias e era restrita aos senhores de terras e de escravos, aos comerciantes (em grande parte, portugueses) e a alguns elementos das profissões liberais, juízes, militares e padres. Além disso, não havia propriamente partidos, mas apenas três “núcleos”, que disputavam os benefícios do poder.

Um dos grupos, o dos caramurus ou restauradores, formou-se após a abdicação de D. Pedro I e tinha como principal figura José Bonifácio, tutor do herdeiro do trono. Eles lutavam pelo retorno de D. Pedro I e, após sua morte em 1834, desapareceram.

Outro grupo, dos moderados, como Evaristo da Veiga, desejava reformas políticas paulatinas e era responsável pelo Governo regencial.

Os exaltados, entre os quais alguns tinham idéias republicanas, queriam a transformação da Assembléia em Constituinte e a reforma da Constituição, com adoção de um modelo federalista e conseqüente cessão de parte do poder para as províncias.

Nesse ambiente, Carneiro Leão, com paciência e segurança, foi ocupando espaço e começou a marcar posições.

Em 14 de junho de 1831, ao lado de Costa Carvalho e Francisco de Paula Sousa, integrou a comissão parlamentar que elaborou a lei que passou a restringir os poderes da Regência.

Em 1832, depois de um rompimento histórico com os liberais que pretendiam a transformação da Câmara dos Deputados em Assembléia Constituinte, foi nomeado, em 13 de setembro, Ministro da Justiça da Regência Trina (Lima e Silva, Costa Carvalho e Bráulio Muniz) e exerceu esse cargo até 1833.

Após o Ato Adicional de 12 de agosto de 1834, que transformou os Conselhos de Província em Assembléias Legislativas e estabeleceu a Regência Uma, Carneiro Leão liderou a formação do bloco dos regressistas (união dos antigos restauradores e dos conservadores), opondo-se aos liberais.

Em 1837, a sucessão incontrolada de levantes resultou na substituição do Regente Feijó por Araújo Lima.

Em 1840, crescia o movimento para levar ao trono o Príncipe D. Pedro, com 15 anos de idade. Carneiro Leão defendia uma solução constitucional, sustentando que a próxima legislatura deveria receber o mandato expresso para decidir sobre a antecipação da maioridade. Na realidade, o que ele tentava, com essa proposta, era protelar a posse, para que o Príncipe se aproximasse mais da idade condicional prevista, de 18 anos, para ser empossado com Imperador.

Mas as manifestações populares sob a liderança de Antonio Carlos de Andrada, amplamente favoráveis à antecipação da maioridade do Príncipe, para acabar com as disputas partidárias, resultou na posse de D. Pedro II, em 23 de julho de 1840, com apenas 15 anos.

Em 1841, caiu o Gabinete liberal, substituído por um Gabinete dos conservadores. Esse Gabinete reconstituiu o Conselho de Estado, que havia sido extinto pelo Ato Adicional de 1834.

Carneiro Leão uniu-se aos fluminenses e elegeu-se Deputado pelo Rio. Foi nomeado Presidente dessa Província em 1842, época da Revolução Liberal, que ajudou a combater.

Em 20 de janeiro de 1843, organizou o Ministério do qual fizeram parte Silva Maia, José Joaquim Gonçalves Torres, Joaquim Francisco Viana e o Marechal Salvador Maciel, ocupando a Pasta da Justiça e, depois, a dos Negócios Estrangeiros.

Após enfrentar continuada oposição dos liberais, deixou o Ministério por causa de uma questão pessoal que o levou a entrar em choque com o Imperador e, num de seus célebres rompantes, pedir demissão. Foi a mais típica demonstração da “aspereza notável de seu gênio, que muitas vezes lhe dava ríspidos modos”, conforme assinala o historiador Padre Rafael Maria Galante.

Eis Carneiro Leão de volta à oposição! Felizmente, o episódio com o Imperador não teve caráter definitivo, e, em 1849, foi ele nomeado Presidente da Província de Pernambuco, com a tarefa de pacificar a Província, após a Revolução Praieira. Aí já demonstrava a larga visão do homem público. Restabeleceu a liberdade de imprensa, removeu os presos em navios para a terra, ordenou que voltassem os desterrados em Fernando de Noronha, ordenou o fim do recrutamento e das prisões preventivas que ainda ocorriam.

Em 1851, esteve no Rio da Prata como Enviado Extraordinário e Ministro Plenipotenciário e levou, como secretário para essa empreitada, José Maria da Silva Paranhos, que depois ficou conhecido por sua participação em questões internacionais e se tornou o célebre Barão do Rio Branco.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, continuando sua trajetória de vida pública, Carneiro Leão recebeu do Imperador, em 1853, a difícil incumbência de organizar um gabinete de conciliação, já que a política brasileira atravessava um período difícil, com o esfacelamento do Partido Liberal, devido às revoluções que enfrentara e à perda de energia combativa por parte do Partido Conservador.

Segundo José de Alencar, “assumindo a grande responsabilidade da política que devia seguir e do pensamento que se propunha a realizar, o Marquês de Paraná calculou naturalmente todos os embaraços e dificuldades com que teria de lutar, mas os dois traços característicos do seu gênio eram a coragem para a resolução e a energia para lutar; compreendeu a situação e aceitou o mandato que Sua Majestade lhe confiou no dia 5 de setembro de 1853”.

Paraná ocupou a Pasta da Fazenda; Nabuco, a da Justiça; Abaeté, a dos Estrangeiros; Belegarde, a da Guerra e da Marinha; Bom Retiro, a do Império.

O Gabinete da Conciliação permitiu um grande avanço em várias áreas: foram iniciados os trabalhos das primeiras vias férreas; foram implantadas as primeiras linhas telegráficas e as primeiras linhas de navegação fluvial; cuidou-se seriamente da instrução pública, primária, secundária e superior, da imigração e colonização, da abertura de estradas, do abastecimento de água; concluiu-se o Museu do Império. Além dessas, houve outras iniciativas de grande envergadura, que marcaram uma época de trabalho, de autoridade e de progresso.

No plano administrativo, foram criadas a Província do Amazonas e a Província do Paraná.

Uma reforma política deu-se com a aprovação da Lei dos Círculos, que substituiu o sistema de listas vigente. Pela Lei dos Círculos, os eleitores escolheriam candidatos em seus próprios círculos, o que visava a garantir maior representatividade às minorias. Com o sistema anterior, as eleições eram controladas pelos Presidentes e representantes de Ministérios nas capitais de Províncias, garantindo tranqüilamente a vitória das oligarquias provinciais.

Porém, apesar da habilidade adquirida para tratar de questões políticas, o Marquês de Paraná continuou conhecido pelo autoritarismo e pelo gênio difícil. É ilustrativa a atitude de um de seus secretários, que costumava advertir aqueles que perguntavam sobre o humor do Ministro com uma simples palavra: “Carneiro”... ou “Leão”.

O Marquês de Paraná não pôde ver o resultado da reforma política que ajudara a empreender. A morte o surpreendeu em plena luta pelo Brasil, a 3 de setembro de 1857. Foi, então, sucedido por Caxias na chefia do Gabinete.

O próprio Imperador Pedro II teria afirmado mais tarde sobre Carneiro Leão: “O Paraná não se curvava”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Srs. convidados, quero concluir este registro citando novamente Edmundo da Luz Pinto, que tão bem soube transmitir aos pósteros a síntese do Marquês de Paraná: “Muitas figuras do segundo reinado podem oferecer um conjunto mais harmonioso pela cultura, pendores estéticos e formação parlamentar; nenhuma, porém, apresenta um tão constante caráter de força, enfeixa tão nobremente em seus atos os sentimentos da autoridade, prestigia tanto com os seus gestos de governo a majestade das funções de Estado”.

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

            Sr. Presidente, foi esse o discurso do Senador Lúcio Alcântara, na íntegra.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/05/2001 - Página 10181