Discurso durante a 62ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE ENTRE A POLICIA MILITAR E O EXERCITO, NO ESTADO DO TOCANTINS.

Autor
Eduardo Siqueira Campos (PFL - Partido da Frente Liberal/TO)
Nome completo: José Eduardo Siqueira Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
MOVIMENTO TRABALHISTA.:
  • CONSIDERAÇÕES SOBRE A CRISE ENTRE A POLICIA MILITAR E O EXERCITO, NO ESTADO DO TOCANTINS.
Aparteantes
Leomar Quintanilha, Ney Suassuna, Sebastião Bala Rocha.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/2001 - Página 10755
Assunto
Outros > MOVIMENTO TRABALHISTA.
Indexação
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, EDITORIAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INCONSTITUCIONALIDADE, GREVE, POLICIA MILITAR, ESTADO DO TOCANTINS (TO), APOIO, ATUAÇÃO, SIQUEIRA CAMPOS, GOVERNADOR, NECESSIDADE, PREVENÇÃO, CONFLITO, EXERCITO.

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, em primeiro lugar, quero agradecer aos Senadores Freitas Neto e Mozarildo Cavalcanti; este último, por cessão do Senador Freitas Neto, usaria a tribuna nesta tarde, e, com certeza, nos traria mais um importante pronunciamento.

E prosseguindo nos meus agradecimentos, quero agradecer ao Partido que integro nesta Casa, o Partido da Frente Liberal, que, reunido hoje, por expressiva maioria dos seus membros que fazem parte desta Casa, decidiu aprovar uma moção de apoio ao Governador Siqueira Campos e ao Estado do Tocantins, em razão do grave quadro que ali se apresenta.

Sr. Presidente, quero dizer a esta Casa e aos Colegas que pode alguém, ou pode mesmo algum integrante desta Casa perguntar por que estamos aqui - eu, o Senador Carlos Patrocínio e o Senador Leomar Quintanilha -, em Brasília, e não lá, na crise, na raiz do problema, emprestando a nossa solidariedade, utilizando o nosso poder de articulação para que se encontre uma solução para a crise lá instalada.

Sr. Presidente, é preciso que a opinião pública nacional tome conhecimento da seqüência dos fatos que levaram a essa crise, que realmente preocupa as demais Unidades da Federação, assim como preocupa esta Casa e os Srs. Senadores. 

Quero agradecer, antecipadamente, a forma atenciosa, preocupada, que se traduziu no empenho pessoal, da participação do Presidente da Comissão de Direitos Humanos, Deputado Nelson Pellegrino, dos Senadores Eduardo Suplicy e Romeu Tuma, entre outros Colegas - para não cometer injustiça, Sr. Presidente - que tiveram o cuidado de ligar para o Governador, de colocar o seu ponto de vista e de manifestar a sua preocupação. Todos com um único intuito, Sr. Presidente: resolver o problema.

É importante que a opinião pública saiba que, em primeiro lugar, não é comum, não há registro de greve no nosso Estado. Sendo Tocantins um Estado com vastas áreas de expansão agrícola, não se tem notícia de invasão de fazendas ou de prédios públicos por parte do próprio MST.

Sr. Presidente, isso não acontece por que há a tradição no nosso Estado de receber as comissões, de dialogar e de conversar. Essa é uma tradição que é realidade no Estado! A própria realidade do Estado, a ausência do estado de greve, é a maior de todas as comprovações. 

Mas não é porque o servidor tocantinense não reivindica, não é porque ele não precisa, não é porque ele não quer! É porque negociamos sempre por intermédio de comissões. Eu mesmo, como Secretário de Governo, recebi diversos segmentos e conseguimos debelar sempre todas as crises, mesmo antes do seu nascimento.

Mas, Sr. Presidente, no caso dessa, é importante que esta Casa e os Senadores preocupados saibam que não houve um pedido de audiência, que não houve um ofício, que não houve uma comissão a ser recebida, não houve qualquer tentativa de diálogo. O que houve foi a tomada de armas, de armamentos e a tomada de um quartel, de instalações.

Sr. Presidente, quero pedir a transcrição de um editorial da Folha de S. Paulo de hoje, assinado pelo jornalista Fernando Rodrigues, intitulado “Greve Ilegal”, e também de um outro editorial importante, do importante jornal O Globo, intitulado “Cavar Abismos”, também de hoje. Nesses artigos existem colocações importantes que quero trazer à opinião pública nacional.

Cavar abismos

O direito de lutar por melhores condições de vida é sagrado. Mas a forma pela qual ele se expressa tem limites, e o mais nítido dele refere-se aos interesses da coletividade. Policiais militares mal pagos podem reivindicar salários adequados e é bom que o façam: em qualquer parte do mundo, um agente da lei que ganha pouco está sempre mais vulnerável à corrupção.

Portanto, a causa dos PMs de Tocantins é, em princípio, pertinente; o que pedem é objeto legítimo de negociação. Mas tudo muda quando a greve se transforma no instrumento principal, quase único, de reivindicação. A falta de policiamento nos últimos dias pôs em xeque a autoridade do governo estadual e abriu espaço para uma onda de violência e roubos. A paralisação e a necessária repressão criaram tensões insuportáveis não apenas para os grevistas e suas famílias: - as crianças e as mulheres que estão lá no Quartel - o estado inteiro foi vítima. E, por mais dramática e comovente que tenha sido a participação de mulheres e crianças, ficou evidente que o caminho fora mal escolhido.

O serviço público tem privilégios que não existem no setor privado. Uma das contrapartidas para isso localiza-se no direito de greve. Ele é autorizado pelo art. 37 da Constituição de 1988 - mas nenhuma lei admite a violência e o absurdo inerentes ao uso contra autoridades de um instrumento de pressão cujas vítimas não estão nos gabinetes oficiais e sim nas ruas e nas casas. Foi o que se viu em Tocantins, onde os grevistas chegaram a impedir pela força que recrutas saíssem às ruas para policiá-las.

É um comportamento que cava um perigoso abismo entre povo e polícia. Nenhum aumento salarial pode compensá-lo; só o tempo poderá fechá-lo.

Sr. Presidente, cito algumas colocações importantes feitas pela Folha de S.Paulo:

É ainda oportuno lembrar que a emenda constitucional nº 18 veio à luz em fevereiro de 1998, poucos meses depois das greves de policiais militares que atingiram vários Estados do país em julho de 1997. É forçoso reconhecer que aquela experiência traumática exerceu alguma influência sobre o legislador.

O importante agora é restabelecer a ordem no Tocantins sem recurso à violência. Há mulheres e crianças no local em que os autodeclarados grevistas se aquartelaram. Seria irresponsabilidade determinar às tropas do Exército que utilizem a força. É preciso, portanto, habilidade. O fato, entretanto, é que o movimento da PM de Tocantins fere a ordem democrática e precisa ser debelado.

Sr. Presidente, quatro editoriais dizem a mesma coisa: o do Jornal do Brasil, o do Estado de S. Paulo, publicados ontem, e os do Globo e da Folha de S. Paulo, publicados hoje. Todos eles apelam pela sensatez e pela retomada da ordem. Mas todos, unanimemente, declaram que não é dado a ninguém, integrante desta nossa sociedade, o direito de pegar em armas para ver os seus direitos reconhecidos.

O Estado ficou refém. A população ficou refém. A violência foi implantada. Foi estabelecida a desordem. Sr. Presidente, é importante que se diga que não existiu nenhuma comissão, não houve sequer um pedido de audiência. Não foi dada ao Governo nenhuma chance de ter se antecipado e, quem sabe, ter impedido a propalada greve.

É importante que se registre, Sr. Presidente, que quem pediu a decretação da prisão não foi o Governador do Estado. É uma decisão judicial.

Hoje, Sr. Presidente, acabo de ouvir pela Band News que tudo o que querem os grevistas, agora, é a revogação da prisão preventiva decretada.

Disse o Governador: - O juiz, o Tribunal de Justiça é quem pode sobre isso decidir. Não me move o sentimento da punição e nem de qualquer perseguição.

Mas não, S. Presidente, nós, que representamos os Estados, temos que ter a responsabilidade de saber que esse mal não pode ocorrer nem no Tocantins e nem em qualquer outro Estado. Porque não é pelo fato de trabalharem com armas que os Policiais Militares podem se valer delas, usando crianças e esposas...

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO) - Permitirei, Senador Ney Suassuna, em seguida, com muito prazer.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP) - V. Exª me concede um aparte?

 O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO) - Concederei o aparte a V. Exª também, Senador Sebastião Rocha.

Portanto, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não tem o Governador do Estado do Tocantins, hoje, um papel que lhe permita dizer que seja suspensa a prisão decretada pela Justiça ou que se revogue qualquer artigo da Constituição Federal ou estadual.

Mais do que isso, quero dizer aos Colegas, repetindo o que ouvi na Band News há pouco, que talvez tenha sido de extrema sensibilidade e inteligência o ato do Governador de convocar o Exército. Em outras oportunidades, como aconteceu no Carandiru e em Eldorado dos Carajás, foi exatamente a ordem de um Governador e o cumprimento da missão por parte da tropa que acabaram por deixar neste País duas marcas inesquecíveis, irremovíveis, da nossa sociedade.

Não haverá um Carandiru e nem um Eldorado dos Carajás exatamente porque está lá alguém isento, ao qual a tropa não está submetida, que não está lá para invadir, reprimir ou prender. Está lá o Exército brasileiro, do qual todos nós nos orgulhamos, para dizer a uma parcela da população, ainda que pequena, que a ninguém é dado o direito de pegar em armas para dizer que os seus direitos não estão sendo reconhecidos.

Não quero sequer recorrer ao argumento que disse aqui ontem, de que, mesmo sendo o Tocantins a vigésima terceira arrecadação, eles têm o sexto melhor salário do País. Não recorrerei a esse argumento. Mas, de forma alguma, Sr. Presidente, move o Governo do Estado do Tocantins a vontade de invadir o quartel, de usar a força ou de ver lá o sangue do nosso povo derramado. Absolutamente, não! O Exército, mediante sua estratégia e o exercício do diálogo, está acompanhado da Comissão de Direitos Humanos e de outras forças. Mas é preciso tirar a parte emocional do processo. Precisamos partir para a solução que todos desejamos e que certamente ocorrerá.

Ouço o Senador Ney Suassuna, que me havia pedido um aparte.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Eu ia perguntar a V. Exª quem havia dado a ordem, mas V. Exª, em seguida, explicou que a ordem partiu da Justiça e não do Governador. Foi isso?

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO) - É isso. Essa foi uma decisão judicial, Senador Ney Suassuna.

O Sr. Ney Suassuna (PMDB - PB) - Muito obrigado, Senador.

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO) - Houve pedidos do Ministério Público estadual e ainda uma decisão da própria Justiça do Estado em dois sentidos: pedindo a retirada imediata das crianças e decretando a prisão de treze elementos em razão das atitudes deles e dos atos que cometeram.

Ouço o Senador Sebastião Rocha, que, anteriormente, pediu-me um aparte.

O Sr. Sebastião Rocha (Bloco/PDT - AP) - Senador Eduardo Siqueira Campos, na condição de amigo do Governador Siqueira Campos, quero expressar, neste momento, a preocupação do Brasil com o que acontece em seu Estado. O Brasil está atento, e o Senado está acompanhando de perto tudo o que se passa em Tocantins. Não há dúvida de que a prudência e a cautela têm de vir em primeiro lugar. V. Exª, conversando há pouco comigo, fazia questão de ressaltar isto: não podemos colocar em risco uma vida sequer. Não quero entrar no mérito da questão, porque não conheço as particularidades das reivindicações. Tenho a tendência de avaliar toda greve como legítima. Essa é uma tendência minha; são convicções pessoais minhas de que se trata de um direito do trabalhador buscar os meios de que dispõe para obter suas reivindicações. No entanto, tudo tem limite - é claro -, mas o limite, acima de tudo, deve ser a cautela e a prudência dos dois lados. O Governo, sobretudo, com a ajuda do Exército e da Polícia Militar, tem que encontrar uma solução que preserve a vida e possa dar seguimento à grande e relevante função da Polícia Militar no Estado de V. Exª. Continuamos acompanhando de perto os acontecimentos, fazendo votos de que se resolva o problema no Estado do Tocantins sem grandes repercussões e, sobretudo, sem qualquer conflito armado que leve a ferimentos ou à morte de qualquer pessoa. Era essa a observação que gostaria de fazer, Senador Eduardo Siqueira Campos.

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO) - Agradeço a V. Exª pelo aparte, Senador Sebastião Rocha. Concordo com V. Exª no sentido de que devemos buscar o bom senso e respeitar a legitimidade do direito reivindicatório de qualquer categoria. Entretanto, em algum ponto, somos obrigados, conjuntamente, até porque juramos perante a Constituição, a concordar, senão por intermédio de emenda modificativa à Constituição Federal, que o direito de greve para a Polícia Militar e o uso do armamento como instrumento de reivindicação são vedados não apenas na Constituição brasileira, mas, predominantemente, pode-se dizer, em 93% das Constituições do mundo inteiro. São dados, inclusive, trazidos pelos editoriais de hoje.

Portanto, concordo com V. Exª e tenho a convicção de que vai prevalecer o bom senso, sim. O Poder Judiciário, como já vem fazendo, há de continuar contribuindo.

Aos Senadores, agradeço a preocupação e a participação nesse episódio.

Também quero dizer, com muita sensatez, que, pelos instrumentos adequados, ou seja, com a ajuda do Exército brasileiro, não para invadir ou reprimir, tentaremos trazer de volta o Estado de direito. A situação está se aproximando, creio, de um final feliz para todos.

O Sr. Leomar Quintanilha (Bloco/PPB - TO) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Leomar Quintanilha (Bloco/PPB - TO) - Senador Eduardo Siqueira Campos, V. Exª e eu, que temos a honra de representar o Estado do Tocantins, estamos efetivamente preocupados com a situação que se abate sobre a Polícia Militar do nosso Estado e sensibilizados com as manifestações de preocupação que vemos tomar conta da grande maioria dos nossos Pares. Aliás, hoje o Brasil efetivamente está atento ao que está acontecendo com a Polícia de nosso Estado. Mas gostaria de dar um depoimento com relação à sensibilidade e ao equilíbrio do Governador Siqueira Campos. Quando da instalação do Estado no seu primeiro Governo, fui o Secretário da Educação e houve um movimento com vistas a estabelecer uma greve naquele segmento. Foi graças ao entendimento e à sensibilidade do próprio Governador que a greve não se materializou. A greve foi abortada, porque houve a intenção de negociar para atender às reivindicações daquele setor. Não faltou equilíbrio novamente ao Governador Siqueira Campos no episódio de agora, porque, neste momento, não se configura greve, mas, sim, um movimento armado que procura constranger os oficiais comandantes e os estudantes em formação da Polícia e criar uma comoção social e uma atemorização no Estado, para que a população pressione o Governador a ceder. Enfim, estamos acompanhando essa situação lá. Foi, efetivamente, a decisão da Justiça, que está acompanhando isso tudo, que fez com que a presença do Exército brasileiro fosse imperativa neste momento, para retomar o Estado de direito, a ordem no Estado, e dar garantia ao cidadão tocantinense. E não podemos permitir que o princípio da autoridade seja quebrado. Uma vez quebrado o princípio da autoridade, o Estado de direito também é ferido. Se acontecer de esse princípio ser quebrado, estaremos abrindo um precedente para que outros segmentos adotem procedimento igual ao que está adotando a Polícia Militar do Estado, com o constrangimento armado. E se abre um precedente, inclusive, para que as Polícias de outros Estados adotem um procedimento como esse que está acontecendo ali. Por isso, nobre Senador Eduardo Siqueira Campos, estamos também torcendo, apelando e participando das discussões, mesmo à distância, para que esse episódio tenha o fim que todos desejamos, com harmonia e paz, encontrando as alternativas desejáveis para a população do nosso Estado.

O SR. EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS (PFL - TO) - Sr. Presidente, encerro a meu pronunciamento, manifestando a esta Casa o nosso sentimento de gratidão. E aproveito a oportunidade para dizer que não é pela omissão que não estamos lá todos nós. Aguardamos para as próximas 24 horas o desfecho desta crise. Que prevaleça o bom senso! Que prevaleça para o Estado de Tocantins o nosso lema, que é “O Estado da livre iniciativa e da justiça social”!

Era o que tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

 

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SEGUE DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SENADOR EDUARDO SIQUEIRA CAMPOS EM SEU PRONUNCIAMENTO.

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/2001 - Página 10755