Discurso durante a 62ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEFESA DA INTEGRAÇÃO ECONOMICA MUNDIAL PELO FORTALECIMENTO DE BLOCOS REGIONAIS COMO O MERCOSUL.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ECONOMIA INTERNACIONAL.:
  • DEFESA DA INTEGRAÇÃO ECONOMICA MUNDIAL PELO FORTALECIMENTO DE BLOCOS REGIONAIS COMO O MERCOSUL.
Publicação
Publicação no DSF de 31/05/2001 - Página 10798
Assunto
Outros > ECONOMIA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ESTUDO, HISTORIA, DESENVOLVIMENTO, CAPITALISMO.
  • AVALIAÇÃO, RISCOS, SOBERANIA NACIONAL, ANALISE, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, AUMENTO, INTERCAMBIO, INFORMAÇÃO, INTERNET.
  • CRITICA, DIFERENÇA, INTEGRAÇÃO, MERCADO INTERNACIONAL, ANALISE, NECESSIDADE, UNIÃO, PAIS, AMERICA LATINA, OBJETIVO, TRANSPOSIÇÃO, DIFICULDADE, CONCORRENCIA, COMERCIO, AMBITO INTERNACIONAL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quando se fala em economia contemporânea, não há como desconhecer uma incontrastável realidade: mais do que em qualquer outra época histórica, a exuberante revolução tecnológica de nosso tempo impulsiona a produção em níveis até então inimagináveis, promove a rápida circulação de bens e de capitais e estabelece novos parâmetros para o funcionamento dos mercados mundiais.

Em verdade, o que se vê, hoje, em termos econômicos, é a natural conseqüência - ou, quem sabe, a culminância - de um longo processo que, iniciado por volta dos séculos XV e XVI, com a expansão comercial e marítima pioneiramente conduzida pelos países ibéricos, adensou-se com a Revolução Industrial inglesa, a partir de meados do séc. XVIII. A moderna industrialização consolidou o capitalismo como sistema econômico plenamente estruturado e, no transcurso do séc. XIX, promoveu sua expansão em escala planetária. A partir de seus primeiros centros dinâmicos, a Europa Ocidental e os Estados Unidos, a economia capitalista universalizou-se de maneira notável, incorporando novas áreas ao seu campo de atuação.

Não foi tranqüila a trajetória desse sistema no decorrer do séc. XX. Duas guerras mundiais, a monumental crise de 1929 e a Grande Depressão dela decorrente, sem falar da ascensão dos regimes totalitários nazifascistas e da própria experiência socialista iniciada com a Revolução Bolchevista de 1917, são exemplos clássicos das vicissitudes pelas quais passou o modelo econômico consagrado pela Revolução Industrial. Todavia, sua força intrínseca suplantou as adversidades e, transformando-se no tempo, tornou-se hegemônica na atualidade.

Pode-se dizer que, nas duas décadas que vão do final dos anos quarenta aos sessenta, a economia mundial conheceu uma prosperidade ímpar, autêntica “Era de Ouro”. A crescente aliança entre pesquisa científica e sistema produtivo promoveu o grande salto que, multiplicando a capacidade de produção e ampliando consideravelmente os mercados consumidores, acabou por contribuir decisivamente para a mais radical transformação da fisionomia das sociedades: pela primeira vez na História, a sociedade vai deixando de ser rural e, a passos largos, se urbaniza, com todas as mudanças que isso implica - hábitos, valores, costumes, formas de moradia, de expressão cultural e de convivência social.

Essas transformações, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aceleraram-se profundamente nas três últimas décadas do séc. XX. Tendo por suporte uma esplêndida revolução tecnológica, cuja capacidade de aperfeiçoar-se parece não ter limites, a economia deixou de ser meramente internacionalizada para se tornar efetivamente mundializada. A própria noção tradicional de fronteiras nacionais não mais consegue se sustentar: rotas eletrônicas permitem a circulação virtual diária de bilhões de dólares e não há região do Planeta imune à presença de artigos produzidos em todos os cantos.

A questão essencial é que esse processo se fez - e se faz - de maneira desigual, melhor dizendo, aprofundando as desigualdades preexistentes. Justamente para tornar mais equânime a participação nesse mercado mundial por demais competitivo é que se enxergou na formação de blocos regionais uma alternativa inteligente de inserção, raciocínio válido especialmente para os chamados países emergentes. Nessa perspectiva, quando se trata de nossa América Latina, o exemplo do Mercosul torna-se crucial.

No momento em que os dirigentes dos Estados americanos reúnem-se em Quebec, avançando nas tratativas em torno da implantação da Área de Livre Comércio das Américas, a Alca, prevista para 2005, mais e mais se faz necessário que nos debrucemos sobre o tema. Afinal, nas condições atuais da economia mundial, tudo indica ser impossível a qualquer um dos países da América do Sul e do Caribe marchar isoladamente no sentido de inserir-se adequadamente no mercado mundial. Não obstante, também parece indiscutível que inscrever-se em um megabloco, como é o caso da Alca, fatalmente liderada por economias muito mais pujantes que as demais, sem prévia, prudente e cautelosa negociação soaria como uma espécie de “suicídio” coletivo latino-americano, para usar a expressão de mestre Hélio Jaguaribe.

Julgo ser mais do que oportuno, neste momento, que se retome o espírito que embalou a histórica decisão dos Presidentes Sarney e Alfonsín de aproximar seus países, em meados dos anos oitenta. Aquela atitude, embrião do Mercosul, teve, entre outros e indiscutíveis méritos, o dom de promover a superação de histórica - e, em tudo e por tudo, injustificável - rivalidade entre Brasil e Argentina, idiossincrasia, aliás, bastante fomentada nos dois lados pelos respectivos regimes militares. Entre erros e acertos, marchas e contramarchas, o Mercosul avançou e, ao fazê-lo, demonstrou a absoluta necessidade de sua existência.

Em vez de nos preocuparmos em apontar as fragilidades do Mercosul, a exemplo das estratégias nacionais de desenvolvimento ainda assimétricas, da grande vulnerabilidade externa e da persistência de agudos desníveis sociais, penso que o caminho a ser percorrido é o do fortalecimento do bloco do Cone Sul americano. Os acordos celebrados no setor automotivo atestam a viabilidade de uma integração solidária, fixando normas para a atração de investimentos e criando as condições favoráveis para a implantação de verdadeiro modelo industrial para o bloco.

O que a Europa compreendeu há bastante tempo - a vital necessidade de agir em bloco para se fortalecer e, desse modo, auferir resultados positivos numa economia crescentemente globalizada e cada vez mais competitiva - é a lição que precisamos aprender. Mesmo sabendo que longa é a caminhada e, para tanto, basta lembrar que a União Européia de hoje é fruto de esforços iniciados ainda na década de cinqüenta, não é possível esmorecer.

A cada dia fica mais claro que, em termos de América Latina e do Caribe, inserir-se de forma não-subalterna na economia global pressupõe, antes de tudo, a consolidação e a expansão de uma experiência como a do Mercosul. Oxalá possamos ir além, constituindo em breve espaço de tempo aquilo que os especialistas em relações internacionais chamam de “sistema” sul-americano. É pela via do fortalecimento desse tipo de bloco, além do óbvio desenvolvimento interno de cada país da região, que haveremos de reduzir nosso déficit de competitividade em relação às economias integrantes do Nafta, especialmente os Estados Unidos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esse não é, e não pode ser, um debate que se subordine à prisão ideológica. É uma questão política, sim, e dessa forma deverá ser tratada. Imagino o Senado da República assumindo o papel que lhe cabe, o de foro privilegiado da discussão dos grandes temas que afetam a nacionalidade, trazendo o tema ao debate, quer em plenário, quer em Comissões, quer promovendo sua discussão em Audiências Públicas. O importante é que o Executivo não esteja isolado em assunto de tamanha magnitude. Cumpre ao Congresso Nacional a indeclinável tarefa de oferecer sua contribuição, inclusive abrindo à sociedade - empresários, políticos, acadêmicos, interessados em geral - a possibilidade de participar ativamente do processo.

Aprofundar nosso conhecimento técnico em torno do tema, até mesmo para tornar mais objetivas nossas posições, é o primeiro desafio que temos pela frente. Ao mesmo tempo, não perder a sensibilidade política que a matéria requer, como forma de tomar as decisões mais adequadas, é o compromisso que temos que assumir. No fundo, o que estaremos protagonizando é a construção do futuro de nossos povos, futuro esse que parece antecipar-se com incrível celeridade. Estejamos preparados para esse desafio!

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 31/05/2001 - Página 10798