Discurso durante a 63ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CRITICAS AO AUMENTO DAS CONTRATAÇÕES POR TERCEIRIZAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA NO PAIS.

Autor
Geraldo Cândido (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Geraldo Cândido da Silva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.:
  • CRITICAS AO AUMENTO DAS CONTRATAÇÕES POR TERCEIRIZAÇÃO DE MÃO-DE-OBRA NO PAIS.
Publicação
Publicação no DSF de 01/06/2001 - Página 10878
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO TRABALHISTA.
Indexação
  • ANALISE, TERCEIRIZAÇÃO, RELAÇÃO DE EMPREGO, BRASIL, PREJUIZO, TRABALHADOR.
  • APREENSÃO, OCORRENCIA, COOPERATIVA, TRABALHO, AUSENCIA, GARANTIA, DIREITO DO TRABALHO, JUSTIFICAÇÃO, PROJETO DE LEI, ALTERAÇÃO, CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT), PREVENÇÃO, EXPLORAÇÃO, MÃO DE OBRA.
  • REGISTRO, SITUAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), REDUÇÃO, QUALIDADE, AUMENTO, ACIDENTE DO TRABALHO, MOTIVO, TERCEIRIZAÇÃO, MÃO DE OBRA, EXPECTATIVA, FISCALIZAÇÃO, MINISTERIO DO TRABALHO E EMPREGO (MTE).

O SR. GERALDO CÂNDIDO (Bloco/PT - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a partir da década de 80, no Brasil, estabeleceu-se uma nova relação de trabalho: a chamada terceirização. Essa modalidade de trabalho vem crescendo a cada ano e é uma forma que muitas empresas encontraram para burlar a lei trabalhista. Os trabalhadores terceirizados, além de perceberem menores salários, o que significa um lucro excessivo para as empresas, não recebem treinamento adequado para o exercício de suas funções, razão pela qual ocorrem tantos acidentes de trabalho em metalúrgicas, em grandes siderúrgicas e em empresas como a Petrobras. Por isso, queremos demonstrar a nossa preocupação em relação a essa modalidade de relação de trabalho.

Ultimamente, surgiu uma outra modalidade de trabalho: as cooperativas de trabalho. Essas cooperativas não devem ser confundidas com as cooperativas tradicionais. As relações de trabalho que regem esse tipo de contrato tem me preocupado, pois, de acordo com o parágrafo único do art. 442 da CLT - introduzido posteriormente na CLT - desvincula qualquer relação trabalhista entre os cooperativados e os tomadores de mão-de-obra. Isso proporcionou a proliferação de cooperativas fraudulentas, que chamamos de “gato-cooperativas” ou de “fraude-cooperativas”, pois legalizou a mão-de-obra que denominamos bóias frias. É um fato muito grave; é pior do que a terceirização. Temos recebido muitas denúncias do Brasil inteiro nesse sentido. Tramita aqui no Senado um projeto de lei que visa revogar o parágrafo único do art. 442, do qual sou Relator. Temos sido pressionados por cooperativas do País inteiro no sentido de que seja mantido esse parágrafo único, porque é interessante a continuação da exploração da mão-de-obra de trabalho de forma aviltante.

Somos contra isso! Queremos a revogação do parágrafo único do art. 442.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, as empresas, nas últimas décadas, tiveram que inovar para se manterem vivas no mercado, que cada vez é mais seletivo. É notória a reformulação das forças produtivas no mundo, com o avanço tecnológico nos meios de produção e novos modelos de gestão na economia, como o toyotismo. Quem não atinge a eficiência está condenado a sair de cena. Algumas novidades têm sido emblemáticas no que tange à relação de trabalho, mas quero chamar a atenção especificamente para um tema: a terceirização no Brasil.

Essa nova onda não nasceu aqui no Brasil, mas, como sempre, não ficamos de fora, já é uma realidade que importamos e está bem presente no nosso mercado. A tendência à terceirização data da década de 80, nos Estados Unidos, mas se intensificou no Brasil nos últimos anos. Muitas empresas brasileiras, principalmente no setor estatal, já incorporaram essa nova prática.

É bem verdade que o nível de produtividade no Brasil, na década passada, foi de 7%, em média, ao ano. Um dos motivos desse crescimento que ajudam a explicar o melhor desempenho produtivo do operário na indústria tem relação direta com o papel que a prestação de serviço passou a desempenhar na economia moderna, ou seja, a terceirização de serviços está contribuindo para agregar valores aos bens produzidos pela indústria de transformação. Um exemplo disso está na indústria automobilística, que apresentou taxas de crescimento significativas nos últimos anos.

O principal argumento de sustentação para a terceirização é o falacioso postulado da redução de custos. Falacioso porque só tem considerado os custos financeiros, desprezando os custos sociais e humanos. Para os empresários, o resultado da terceirização significa mais lucro. Estudos sobre o peso dos encargos sociais realizados pelas empresas constatam que um trabalhador custa entre 104% e 120% a mais do que o valor nominal do seu salário. A aprovação da legislação de contrato temporário ajudou essas empresas a reduzirem em 7% os gastos com encargos sociais.

Essa é uma faceta da terceirização, mas não podemos esquecer os custos sociais e humanos, como já disse antes. O custo social está em criar uma nova categoria de subempregados, isto é, empregados discriminados pelo salário aviltado, pela precariedade na garantia de permanência no emprego e até mesmo pelo não recolhimento dos encargos sociais pelos intermediários (na grande maioria). O custo humano está na falta de especialização, no risco de acidentes a que são geralmente submetidos e conflitos entre empregados de mesma classe.

Aproveito para lembrar um conflito de remuneração. Vejam o exemplo de um funcionário da Petrobras que trabalha oito horas e percebe R$2 mil. Já um trabalhador terceirizado, que realiza a mesma atividade, podendo trabalhar além das oito horas, percebe aproximadamente R$1 mil, sendo que não tem direito a seguro por acidente no trabalho, nem pode ser sindicalizado junto ao Sindicato dos Petroleiros, pois a legislação trabalhista não o permite. Urge ao movimento sindical elaborar propostas para organizar esse segmento de trabalhadores, criando mecanismos de combate aos abusos por eles sofridos.

Não é à toa que o termo terceirizar criou uma antipatia entre os trabalhadores. Eles têm uma boa razão, ou seja, a transferência de renda do trabalhador para o intermediário. Enquanto a empresa contratante desembolsa R$4 pelo serviço prestado, o intermediário abocanha R$3 e o empregado recebe apenas R$1, isso numa estimativa muito otimista. Por outro lado, terceirizar também pode significar oferecer mão-de-obra barata, mas com seus agravantes, ou seja, desqualificada. É oportuno lembrar também que muitas terceirizadas descontam os encargos trabalhistas, mas não repassam a quem de direito. Ainda justificam essa arbitrariedade por estarem lidando com empregados temporários, que normalmente são rodiziados.

Vou citar um fato notório e recente. A Petrobras é um exemplo claro do crescente número de terceirizados e que prejudicou a qualidade dos serviços. Quando se terceiriza serviços de manutenção, o resultado é um aumento de acidentes de trabalho e de riscos para a sociedade como um todo. Sabemos que 81 petroleiros morreram em acidentes desde 1998 - mais de duas mortes por mês. Do total, 66 eram empregados terceirizados, contratados por empresas prestadoras de serviço, de acordo com levantamento feito pela FUP (Federação Única dos Petroleiros). Desde o ano passado, na Petrobras, foram registrados 95 acidentes com 18 mortes, sendo 16 prestadores de serviço. Na bacia de Campos, foram registradas 12 mortes no período. Cumpre lembrar também o aumento de prestadores de serviço na bacia de Campos, de 20 mil, em 1997, para 29 mil no ano passado. Sendo que desses, apenas 6,9 mil são funcionários do quadro da empresa. Uma ação civil pública, ajuizada há dois anos pelos procuradores do Ministério Público do Trabalho, pede que a estatal seja proibida de manter trabalhadores terceirizados nas plataformas. Essa ação ainda aguarda julgamento.

Se há riscos de acidentes ecológicos e ambientais causados pela Petrobras, o que se dirá de acidentes em redes de eletricidade e telecomunicações. Por exemplo, matéria do jornal O Globo, de 7 de maio, revela dados da Companhia de Eletricidade do Ceará - Coelce, privatizada em 1998. A ex-estatal trabalha hoje com mais de 100 prestadoras de serviço, e, desde a privatização, 24 trabalhadores já morreram. A maioria das mortes foi causada por choque elétrico. Já na Petrobras, nos últimos anos, o número é bem maior.

Entretanto, segundo o Enunciado nº 331 do Tribunal Superior do Trabalho, a terceirização só pode ser usada em atividade meio. Ela não está destinada para atividade fim. Com isso, a legislação sobre a terceirização não pode atingir as áreas estratégicas da empresa. Como exemplo, tivemos montadoras do setor automotivo que terceirizaram setores estratégicos e, logo depois, tiveram que voltar atrás, ou seja, recontrataram os seus trabalhadores, pois a qualidade de seus produtos foi afetada.

Diante disso tudo, percebe-se que a terceirização leva à precariedade do trabalho. Falta especialização, ao contrário do que afirmam os empresários. Talvez haja em alguns segmentos empresariais, mas, no geral, não é o que acontece. O Ministério do Trabalho, segundo a mídia, diz já ter identificado os setores onde as irregularidades são maiores: elétrico, construção civil, informática, vigilância, limpeza e alimentação. Identificar apenas não inibe a ação dessas empresas. É necessário uma fiscalização efetiva e não fictícia, como a que temos hoje. Não podemos deixar que esse capitalismo selvagem seja alimentado por trabalhadores que estão em fuga do desemprego crescente e sejam submetidos a essa nova ordem da terceirização.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/06/2001 - Página 10878