Discurso durante a 69ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

CONSIDERAÇÕES A INCONVENIENCIA DA INSTALAÇÃO DA CPI DA CORRUPÇÃO, A PROPOSITO DE ARTIGO DO DR. JOÃO BATISTA ERICEIRA, PUBLICADO NO JORNAL DE SÃO LUIS.

Autor
Bello Parga (PFL - Partido da Frente Liberal/MA)
Nome completo: Luís Carlos Bello Parga
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CORRUPÇÃO.:
  • CONSIDERAÇÕES A INCONVENIENCIA DA INSTALAÇÃO DA CPI DA CORRUPÇÃO, A PROPOSITO DE ARTIGO DO DR. JOÃO BATISTA ERICEIRA, PUBLICADO NO JORNAL DE SÃO LUIS.
Publicação
Publicação no DSF de 09/06/2001 - Página 12713
Assunto
Outros > COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), CORRUPÇÃO.
Indexação
  • LEITURA, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, JORNAL DE SÃO LUIS, ESTADO DO MARANHÃO (MA), AUTORIA, JOÃO BATISTA ERICEIRA, ADVOGADO, CRITICA, EXCESSO, INSTALAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), PREJUIZO, OPINIÃO PUBLICA, CONGRESSO NACIONAL, ANALISE, ORADOR, DESNECESSIDADE, APURAÇÃO, CORRUPÇÃO, SENADO.

O SR. BELLO PARGA (PFL - MA. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, “Hoje, salvar a CPI”, repito essa palavra de ordem porque é o título de interessante trabalho publicado na imprensa de minha terra, por um dos melhores advogados que militam no fórum da capital.

O Dr. João Batista Ericeira, advogado, professor universitário, membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas e responsável pelo Departamento Jurídico do Partido Liberal no meu Estado produziu um trabalho jornalístico de grande valor e de grande atualidade que por se casar com a minha maneira de pensar é que achei por bem trazê-lo ao conhecimento desta Casa e que passo a fazer lendo o seu artigo publicado no Estado do Maranhão, Jornal de São Luís. Diz ele:

           Por meados da década de 80, ponderei com os companheiros do movimento docente sobre a inconveniência da utilização sem critérios, de momento e de oportunidade, de greves nas universidades públicas. Já estava em andamento a operação desmonte do ensino universitário público, por conta da filosofia inserida nos relatórios do Banco Mundial sobre as incapacidades dos países periféricos investirem na rede estatal, restando apenas a falsa alternativa da privatização, com as possibilidades de ingresso de grupos multinacionais em busca de lucros relativamente fáceis.

           A interpretação marxista das greves assinala a etapa histórica em que elas deixam de ser meramente salariais, para adquirirem conteúdo político, é, exatamente, quando os trabalhadores tomam consciência da sua força social, passam a utilizar as suas paralisações levando em conta o apoio do conjunto da sociedade.

           Os inimigos da universidade pública adoravam os fracassos das greves, aproveitavam-se para assinalar as insuficiências das instituições. Mas no que pese a propaganda contrária dos negociantes do ensino, a rede estatal é responsável por quase toda a pesquisa que se produz neste País e, por via de conseqüência é a que oferece melhor qualidade de ensino.

           Ultimamente, virou moda a instalação de Comissões Parlamentares de Inquérito, as CPIs - e este, Sr. Presidente, é o ponto central do trabalho do Dr. João Batista Ericeira - para apurarem tudo ou quase tudo que ocorre no território nacional. A mesma preocupação que tinha em relação às greves nas universidades públicas, assaltam-me, agora, em relação à instalação desmesurada das Comissões Parlamentares de Inquérito. Indiscutivelmente justas, as greves nas universidades foram usadas, por seus adversários, para atacá-las e denegri-las.

           O uso imoderado e inconveniente das CPIs podem conduzir ao desgaste e à desmoralização dessa importante instituição do nosso Direito Constitucional, com a previsão regimental, nas casas congressuais, infelizmente em proveito dos inimigos do regime democrático. Essas CPIs trata-se de invenção dos sistemas parlamentaristas de Governo, adotadas pelos presidencialismos congressuais, como é o caso dos Estados Unidos da América e do Brasil, após a Carta de 5 de outubro de 1988.

           Nos Estados Unidos era largamente utilizada durante os anos 40 e 50, revelando alguns congressistas como Joseph McCarthy, responsável pela instalação da CPI, para investigar atividades antiamericanas, onde se revelou Richard Nixon - então, Deputado - que, depois, viria por conta da promoção obtida naquela Comissão, a se eleger presidente da República, de onde veio a renunciar, em 1974, em conseqüência do rumoroso caso Watergate, um episódio que envolveu a invasão da sede do Partido adversário com o roubo de documentos, suborno, extorsão e acobertamento.

           A Comissão de Investigação de Atividades Antiamericanas era um palco instalado sob o foco das câmeras de televisão, microfones de todos os lados, de rádios, repórteres dos grandes jornais, onde desfilavam parlamentares denunciando atores e diretores de cinema, adversários políticos, funcionários públicos, acusados de inimigos do american way life. A coisa prosperou de tal modo, que muitos se elegeram e promoveram-se a partir da CPI, enquanto muitas reputações eram destroçadas e tantas vidas destruídas. O efeito mídia era simplesmente devastador, os acusadores como Nixon e McCarthy foram elevados à condição de heróis nacionais, de salvadores da pátria.

           Tudo corria muito bem para os mesmos, enquanto o número de vítimas progredia, até que o Senador Joseph McCarthy resolveu acusar vários oficiais do Exército condecorados na Segunda Guerra Mundial, de serem comunistas. O presidente da República era o general Dwight Eisenhower, comandante das tropas aliadas nas batalhas da Europa na Segunda Guerra Mundial, que viu subordinados seus serem injustamente levados ao patíbulo. Exigiu que McCarthy exibisse os documentos comprovando as suas acusações. Ocorreu que o inquisidor não pôde exibi-los, porque não os tinha.

           Com esse episódio, no ano de 1954, a Comissão desmoralizou-se, o acusador estancou suas atividades inquisitoriais, não logrou reeleger-se para o Senado, entrou em crise existencial, começou a beber, e morreu no mais completo ostracismo político e pessoal. Richard Nixon, um dos seus beneficiários, já elegera-se vice-presidente, conseguiu escapar, mas no futuro seria vítima da própria esperteza. Além de ter ficado marcado pela imprensa americana que o caçava, fato que teve conseqüências no caso Watergate, não obstante ter sido promovido a estadista internacional com o fim da Guerra do Vietnam, em 1973. Mas nem isso o salvou.

           Os americanos aprenderam a lição. Desde o fracasso da Comissão de Atividades Antiamericanas, CPI é para apurar fato determinado, e com prazo certo. A nossa Constituição assimilou a idéia, com a disposição constante do seu art. 58, § 3º. Vi algumas cenas do depoimento do traficante Fernandinho Beira-Mar prestado à Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados.

           É bem verdade que se trata de Comissão Permanente, mas vários dos seus integrantes compõem CPIs que apuram matérias correlatas. No depoimento do traficante deu-se o inverso, ele aproveitou o foco televisivo para utilizar a mídia em benefício próprio, ironizando e gozando os parlamentares, que viraram coadjuvantes, enquanto Fernandinho Beira-Mar era o “artista do filme”.

           À exceção de parlamentares delegados de polícia, detentores do conhecimento da técnica de investigação, as perguntas eram despojadas de conteúdo, visavam tão-somente o foco das câmeras, e o resultado foi o pior possível em termos de opinião pública.

           O Estado brasileiro - e é para essa parte do artigo que quero chamar a atenção dos Srs. Senadores - é o que enuncia a Constituição Federal de 1988. Nela, os poderes da República estão separados e com funções distintas. A atividade legislativa é atribuição do Congresso Nacional, que precisa assumi-la, regrando as medidas provisórias, cuidando da atualização dos códigos de Direito substantivo e processual. A atividade investigatória é afeta ao poder de polícia e ao Ministério Público. O poder de julgar é da restrita competência do Poder Judiciário.

           Quando estão investidos de atribuições investigatórias, como no caso das CPIs, os parlamentares devem buscar a assessoria técnica. E não caírem na tentação de fazer da Comissão de Inquérito palanque eletrônico, porque o resultado poderá ser negativo, a curto, a médio ou em longo prazos. Mas o pior é o que poderá vir depois: a desmoralização de instituto oriundo do parlamentarismo, mas com potencialidades de prestar relevantes serviços a qualquer forma de governo.

           O importante mesmo é preservar e aperfeiçoar as instituições indispensáveis ao regime democrático, tais como: Parlamento representativo, e universidade pública e de boa qualidade. Urge, portanto, salvar o instituto da CPI da sanha enfurecida do aventureirismo político, dos “McCarthy da vida”, que existem por lá e por cá. Não estão nem um pouco preocupados com as instituições, interessa-lhes, sim, o carreirismo, a picaretagem ascensorial.

            Sr. Presidente, não poderia ser mais correto nem mais exato o diagnóstico do Professor João Batista Ericeira. O que acabamos de ver no Congresso Nacional foi exatamente isso. Foi oferecido um requerimento para constituição de uma CPI mista com 22 fatos determinados para serem investigados, como se fosse isso materialmente possível.

O Congresso, através da Câmara dos Deputados, negou o seu apoio à constituição dessa Comissão Mista. Agora, ela está sendo pedida no Senado e, pasmem, as investigações foram reduzidas a três ou quatro itens. Apregoava-se que a CPI Mista iria passar a limpo o Brasil! Agora reduziram os itens a serem investigados, desaparecendo os demais por completo; evolaram-se os fatos determinados que iriam colocar o Brasil livre da corrupção. Como se a corrupção não fosse uma endemia social, Sr. Presidente. Como se ela não existisse onde quer que haja governo e onde quer que haja centralismo estatal.

Assim sendo, louvo o artigo do Professor João Batista Ericeira e conclamo os meus companheiros de Senado a refletirem muito sobre a constituição de uma Comissão Parlamentar de Inquérito somente nesta Casa.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/06/2001 - Página 12713