Discurso durante a 70ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

ADVERTENCIAS SOBRE A IMINENCIA DE COLAPSO NO SETOR RODOVIARIO, EM CONSEQUENCIA DA DETERIORAÇÃO E ABANDONO EM QUE SE ENCONTRAM AS ESTRADAS NACIONAIS.

Autor
Nabor Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Nabor Teles da Rocha Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • ADVERTENCIAS SOBRE A IMINENCIA DE COLAPSO NO SETOR RODOVIARIO, EM CONSEQUENCIA DA DETERIORAÇÃO E ABANDONO EM QUE SE ENCONTRAM AS ESTRADAS NACIONAIS.
Aparteantes
Waldeck Ornelas.
Publicação
Publicação no DSF de 12/06/2001 - Página 12914
Assunto
Outros > POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, GOVERNO FEDERAL, FALTA, PLANEJAMENTO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, PREJUIZO, SOCIEDADE.
  • APREENSÃO, PRECARIEDADE, SITUAÇÃO, RODOVIA, CRITICA, OMISSÃO, GOVERNO FEDERAL, AUSENCIA, INVESTIMENTO, SETOR, PREJUIZO, ECONOMIA.
  • DEFESA, RESTABELECIMENTO, FUNDO RODOVIARIO NACIONAL, OBJETIVO, MELHORIA, RODOVIA.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso.) - Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a imprevidência, quando ocorre, é uma das mais lastimáveis marcas impostas à Administração Pública. Nos dias atuais, pagamos um alto preço pela falta de medidas concretas para evitar o colapso no abastecimento de energia elétrica. O próprio Governo, com louváveis autocrítica e ponderação, já admite sua parcela de responsabilidade no grave problema, que está causando imensos transtornos no dia-a-dia dos cidadãos.

O elevado custo da correção de tal imprevidência será pago por toda a sociedade, porque as obras feitas de afogadilho ou sob o guante da pressa inexorável sempre saem mais caras que as efetuadas dentro de cronogramas racionais e consistentes. O desespero que cerca a necessidade da criação de um vasto sistema de termelétricas, de usinas nucleares e de sistemas alternativos, dos mais diferentes matizes, tudo isso vai causar, nas finanças públicas e na economia popular, um dano irrecuperável.

O que acabo de dizer pode ser aplicado, sem qualquer restrição, à questão rodoviária. Há vários anos ouvimos denúncias e palavras de alerta sobre o caos que se avizinha nas estradas brasileiras, até mesmo naquelas mais importantes para o transporte de cargas e a circulação de pessoas. Não é preciso ir muito longe nem mergulhar nos grotões distantes da Pátria; basta assumir o volante do carro em Brasília e ir para o Rio de Janeiro, cobrindo uma das rotas mais consagradas e importantes, a que liga a capital dos nossos dias à antiga sede do governo federal.

Pessoas que fazem esse trajeto há 20, 30, 40 anos, queixam-se de que a estrada, principalmente no trecho Brasília - Belo Horizonte, nunca esteve tão ruim. Rodas quebradas, pneus estourados, veículos postos em risco e, pior do que tudo, vidas efetivamente ceifadas pelas gigantescas crateras que pontilham vários quilômetros de asfalto deteriorado.

No ano passado, o Ministro dos Transportes, Eliseu Padilha, já advertia severamente para a seriedade do quadro e seu inexorável agravamento, porque qualquer buraco no asfalto tende a crescer, devido ao esboroamento das bordas, o qual, por seu turno, decorre da erosão do solo afetado.

Se as providências então propostas por S. Exª tivessem sido adotadas naquela oportunidade, a gravidade do problema e a previsão de despesas não teriam crescido tanto, decorrido um ano.

Neste último final de semana, o Ministro Eliseu Padilha voltou a advertir a sociedade para a destruição do sistema rodoviário nacional, dizendo, com a sinceridade que o caracteriza, sem meias-palavras, que, se o Brasil não investir no setor - com urgência e consistência -, já a partir dos próximos meses estaremos enfrentando um “apagão das estradas”.

Nós perdemos tempo na questão energética. Não ouvimos os técnicos que alertaram para o caos que se avizinhava. Vamos agora errar de novo? Vamos fechar os olhos e os ouvidos às advertências feitas pelas autoridades e pelos técnicos do setor rodoviário? Vamos fingir que não assistimos e não lemos as reportagens diárias em torno do problema? Temos nós o direito de, por omissão, permitir que o povo, já sem luz, fique também impossibilitado de transportar seus bens e seus produtos com o mínimo de conforto e, principalmente, segurança? É lícito exigir que o cidadão pague, nas oficinas e borracharias, o preço da incúria administrativa?

O Sr. Waldeck Ornélas (PFL - BA) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Ouço V. Exª com prazer.

O Sr. Waldeck Ornélas (PFL - BA) - Senador Nabor Júnior, V. Exª aborda um assunto extremamente oportuno. Eu também o farei logo mais, desta tribuna, porque o problema das estradas brasileiras é grave. É preciso evitar o colapso econômico do País. Temos um apagão, temos um “buracão” e temos problemas, também, de falta de água em várias metrópoles nacionais. É preciso voltar as vistas para a infra-estrutura. V. Exª é de uma região, a Região Norte, que, assim como a Nordeste, é profundamente dependente de investimentos públicos. Nas nossas regiões não existe a alternativa da terceirização dos serviços, no caso das estradas particularmente. Portanto, somente o Governo Federal, com recursos próprios ou mediante financiamento de organismos internacionais, como o BID e o Banco Mundial, pode financiar e executar a infra-estrutura de nossas regiões. Gostaria de cumprimentá-lo por essa iniciativa, que vem para que depois ninguém diga que foi pego de surpresa, colhido de surpresa com as crises. Não! Não podemos ter um País deste tamanho, desta dimensão, não apenas física, mas, sobretudo, humana, populacional e econômica, sendo tragado pelas emergências. Precisamos ter, efetivamente, uma retomada do planejamento no País, e o Governo Federal, o setor público assumindo seu papel de prevenir, porque prevenir é melhor do que remediar.

O SR. NABOR JÚNIOR (PMDB - AC) - Agradeço ao nobre Senador Waldeck Ornélas o oportuno e objetivo aparte que dá ao meu modesto discurso, do qual, com muita honra, faço constar seu teor.

Os números são assustadores: cerca de 70% dos 56 mil quilômetros de rodovias federais têm conservação e sinalização deficientes. Quinze mil quilômetros, 26,7% do total, causam horror a quem precisa percorrê-los, pois suas condições vão de “más” a “péssimas” - isso, é bom que se frise, dentro dos padrões brasileiros, já muito abaixo das formidáveis estradas alemãs e européias em geral e das dos Estados Unidos.

Quem mais conhece as nossas vias terrestres são os profissionais do setor, os caminhoneiros e os donos das empresas de transporte. Pois eles garantem que 80,3% das estradas brasileiras se encontram em estado de conservação péssimo ou deficiente.

As campanhas de segurança do trânsito costumam acentuar a irresponsabilidade com que dirigem muitos dos nossos motoristas.

Realmente, existem verdadeiros criminosos ao volante de automóveis, caminhões e ônibus. Mas, da mesma forma, não se admite atribuir aos motoristas a culpa integral pelos acidentes que, todos os anos, enlutam milhares de famílias.

Sim, porque o Estado não tem como negar estatísticas, de sua própria elaboração, que comprovam o abandono a que relegou a malha rodoviária nacional.

Nos últimos dez anos, os investimentos no setor despencaram. Se formos buscar números ainda mais antigos, encontraremos registros assombrosos: em 1975, os investimentos nas estradas representaram 1,8% do Produto Interno Bruto; na última década, não passaram de 0,2%.

Repito, para os Colegas que não entenderam ou não acreditaram: o Brasil investiu nas estradas federais, em 1975, 1,8% do PIB; nos anos 90, a média anual não passou do 0,2%!

E vejam que falo, basicamente, de rodovias já existentes. Se quisermos cobrar a ampliação do tapete asfáltico, em condições de atender ao próprio crescimento nacional nesse período, encontraremos um déficit dificilmente mensurável, mas que, sem dúvida, é gigantesco. Afinal, de dez anos para cá, pouco mais de mil quilômetros foram acrescentados à rede.

Permitam-me Vossas Excelências uma análise, em particular, das rodovias que servem o sudoeste da Amazônia, onde se situam o Acre e Rondônia. Pois lá, como sempre, o problema é muito maior que nas demais partes do território nacional. Dados do próprio Ministério dos Transportes destacam a precariedade da importantíssima BR-364, não apenas na ligação entre as capitais dos dois Estados, Porto Velho e Rio Branco, mas também no seu prolongamento ocidental, até Sena Madureira, totalmente destroçado em larga extensão.

Acredito que todos os demais Srs. Senadores e Srªs Senadoras presentes a esta sessão dariam depoimentos semelhantes sobre a gravidade da questão. Tirando o Estado de São Paulo e algumas rodovias excepcionais do Centro-Sul, o quadro é dantesco, inclusive nas ligações do Distrito Federal com os grandes centros econômicos, políticos e sociais do País.

O jornal O Globo, na edição de ontem, ouviu, do Ministro dos Transportes, um impressionante diagnóstico: “as rodovias brasileiras estão vencidas”. Sem fortes investimentos no setor, corremos o risco de vê-las definitiva e irremediavelmente intransitáveis, inclusive em conexões estratégicas em Minas Gerais, Piauí, Maranhão, Ceará e Bahia, que funcionam como pontos de encontro e de derivação para outros Estados. E temos de incluir, nesse quadro, as estradas do Acre e de Rondônia.

Não podemos esquecer a precariedade das finanças do País, que, realmente, torna difícil qualquer investimento nos setores mais carentes de atenção. Pior ainda é quando os recursos existem e são cancelados sem que se estabeleçam fontes equivalentes para suprir sua ausência.

É esse, justamente, o caso das rodovias: em 1988, quando foi promulgada a atual Constituição, existia o Fundo Rodoviário Nacional, diretamente vinculado à venda de combustíveis e que era empregado na construção e conservação de estradas. Com isso, o Orçamento Geral da União passou a ser a única fonte de verbas para aquelas obras - e, como se isso não bastasse, ainda existem os violentos cortes aplicados na liberação e na execução da programação orçamentária.

Em 1999, por exemplo, estavam previstos R$2,5 bilhões, mas só foram liberados pouco mais de R$2 bilhões; em 2000, a proporção foi ainda mais desfavorável: deveriam ter sido aplicados R$4,3 bilhões, mas saíram, efetivamente, menos de R$1,5 bilhão; e as perspectivas para 2001 são aterrorizadoras: de uma previsão total de R$5,2 bilhões, até maio só foram liberados R$173 milhões, em números redondos.

Diante desses números e desse cenário preocupante, a Nação exige seriedade e consciência de seus homens públicos. É hora de trocar a retórica e as promessas vazias por atos concretos, objetivos e capazes de realmente resolver o grave problema rodoviário nacional. Grandes teses, grandes mudanças, por mais bem-vindas que sejam, não podem nos impedir de agir hoje, agora, neste preciso momento, para impedir a iminente destruição irremediável do que foi construído, com dificuldades imensas, ao longo dos tempos.

        Por mais antipático e pouco palatável que seja, a única saída está no restabelecimento imediato do Fundo Rodoviário Nacional, dotando o Estado de recursos para cumprir sua obrigação. Ninguém gosta de pagar impostos - e é justamente por isso que os tributos se chamam “impostos”: é a imposição do interesse coletivo sobre o individual, em nome de valores maiores, como crescimento da economia nacional e segurança para os próprios cidadãos e suas famílias. Ninguém paga impostos por prazer ou por diletantismo, mas, quando o produto dos tributos é bem-empregado, os contribuintes sabem reconhecê-lo. E usufruem dos benefícios deles decorrentes.

Srª Presidente, Srªs e Srs. Senadores, estamos às vésperas de mais um período de férias, em julho. Rogamos a Deus que não permita a repetição das ocasiões anteriores, quando recebemos tantas notícias infaustas, quando tantas famílias foram destroçadas em tragédias que poderiam ter sido evitadas.

Sempre ouvimos de nossos pais que “prevenir é melhor do que remediar”. E quando estamos em face do irremediável? E quando não há remédio, quando só existem a dor e o sofrimento?

Concluo justamente citando a reportagem de O Globo que traz a informação do Ministério dos Transportes e a entrevista com seu titular, em que se afirma:

Segundo estudo do Ministério, o caos nas estradas aumentou em 50% o número de acidentes e elevou em 58% o consumo de combustíveis. A conclusão é de que muitas das 6.500 mortes ocorridas nas estradas federais em 2000 poderiam ter sido evitadas. E o próprio Ministro Eliseu Padilha afirma, textualmente: ‘Os investimentos caíram e a demanda cresceu. A idade média da malha é de 25 anos, embora a vida útil seja de apenas 12. Agora não temos mais margem para não investir!’.

Nas palavras do Ministro Eliseu Padilha, dos Transportes, encontramos a mais fiel e honesta análise da gravidade da situação.

Que ninguém, mais tarde, venha dizer que “era imprevisível” a falência completa do sistema rodoviário nacional.

Era o que tinha a dizer, Srª Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 12/06/2001 - Página 12914