Pronunciamento de Roberto Requião em 18/06/2001
Discurso durante a 73ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
REGISTRO DO APOIO DO DIRETORIO REGIONAL DO PARANA A CHAPA ENCABEÇADA PELO EX-DEPUTADO PAES DE ANDRADE, A PRESIDENCIA DO PMDB. DEFESA DA APROVAÇÃO DE PROJETO DE LEI DE AUTORIA DO SENADOR ROBERTO FREIRE, QUE PROIBE A VENDA DE ESTATAIS DO SETOR ELETRICO.
- Autor
- Roberto Requião (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PR)
- Nome completo: Roberto Requião de Mello e Silva
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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POLITICA PARTIDARIA.
ENERGIA ELETRICA.
PRIVATIZAÇÃO.:
- REGISTRO DO APOIO DO DIRETORIO REGIONAL DO PARANA A CHAPA ENCABEÇADA PELO EX-DEPUTADO PAES DE ANDRADE, A PRESIDENCIA DO PMDB. DEFESA DA APROVAÇÃO DE PROJETO DE LEI DE AUTORIA DO SENADOR ROBERTO FREIRE, QUE PROIBE A VENDA DE ESTATAIS DO SETOR ELETRICO.
- Publicação
- Publicação no DSF de 19/06/2001 - Página 13245
- Assunto
- Outros > POLITICA PARTIDARIA. ENERGIA ELETRICA. PRIVATIZAÇÃO.
- Indexação
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- ANUNCIO, REUNIÃO, PRESIDENTE, DIRETORIO REGIONAL, PARTIDO POLITICO, PARTIDO DO MOVIMENTO DEMOCRATICO BRASILEIRO (PMDB), ESTADOS, REGISTRO, POSIÇÃO, ESTADO DO PARANA (PR), ORGANIZAÇÃO, CHAPA, NECESSIDADE, DEBATE, POLITICA NACIONAL, INDEPENDENCIA, GOVERNO, DEFINIÇÃO, CANDIDATO, ELEIÇÃO, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.
- COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, AUTORIA, CESAR BENJAMIN, JORNALISTA, ANALISE, HISTORIA, POLITICA ENERGETICA, BRASIL, ALTERAÇÃO, SISTEMA, POSTERIORIDADE, GOVERNO, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, OBJETIVO, PRIVATIZAÇÃO, FALTA, INVESTIMENTO, PREJUIZO, GESTÃO, RECURSOS HIDRICOS.
- CRITICA, PRIVATIZAÇÃO, EMPRESA DE ENERGIA ELETRICA, REGISTRO, TRAMITAÇÃO, COMISSÃO, SENADO, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ROBERTO FREIRE, SENADOR, SUSPENSÃO, ALIENAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, PRODUÇÃO, TRANSMISSÃO, ENERGIA HIDRAULICA, APOIO, APROVAÇÃO.
O SR. ROBERTO REQUIÃO (PMDB - PR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sras e Srs Senadores, dois assuntos de alta voltagem me trazem a esta tribuna. O primeiro deles é a reunião que o velho PMDB faz amanhã com os presidentes dos diretórios regionais. O Diretório Regional do Paraná está, com companheiros de outros Estados, organizando uma chapa que se contrapõe à atual direção do Partido. No Paraná, contamos com a unanimidade dos delegados, o mesmo ocorrendo no Ceará, em Minas Gerais, com uma boa parte de companheiros de Santa Catarina e do Rio Grande do Sul.
Os ventos não ajudam navios que não conhecem o seu rumo. O PMDB precisa estabelecer, de uma vez por todas, o seu rumo diante da proximidade das eleições presidenciais. Não é mais possível que o Partido continue como se fora um emplumado tucano em cima do muro, que não discuta propostas alternativas ao neoliberalismo e que se agregue ao Governo Federal à custa de meia dúzia de posições de mando e de vantagens.
O PMDB do Paraná está propondo uma chapa encabeçada pelo velho guerreiro Paes de Andrade, ao tempo em que propõe também que na próxima Convenção Nacional o Partido defina, de uma vez por todas, não se terá candidato, mas quem será o seu candidato à Presidência da República. Este candidato deverá coordenar o partido na elaboração de um programa de Governo. Chega da dubiedade, da tibieza e da flacidez de um partido que ao longo do tempo perde os seus músculos, o impulso e o espaço de participação na política nacional.
Por exemplo, Sr. Presidente, o que tem a dizer o MDB sobre a questão energética brasileira. Tenho em mão um artigo de César Benjamim que faz uma análise da política brasileira desde 1957, demonstrando com toda a clareza que o Brasil depois da grande seca de 1951 a 1956 - cinco anos de seca - passou a interferir diretamente na produção de energia hidrelétrica. As antigas empresas privadas que ao longo do tempo se digladiavam com o Governo apenas pedindo reajuste de tarifas foram encampadas, e, dos 3.500 megawatts que o País detinha em 1955, saltamos para os 55 mil megawatts de 1995.
Algumas outras informações interessantes o artigo do César Benjamim nos traz. A partir dessa grande seca de cinco anos, o projeto das nossas hidrelétricas passou a contemplar uma reserva de água de cinco anos, em que o sistema brasileiro com 55 mil megawatts resistiria a cinco anos de seca, fornecendo energia firme. Os projetos passaram a contemplar um risco máximo de 5%, em função do aumento da demanda nacional. Teríamos cinco anos de energia firme, acumulando água suficiente para isso em reservas superdimensionadas.
A partir da assunção de Fernando Henrique Cardoso ao Ministério da Fazenda, contratou-se uma empresa inglesa para reestruturar o sistema, com o fulcro na privatização. Essa empresa montou um modelo completamente dissociado do modelo brasileiro e muito parecido com o modelo inglês, que se suportava nas termelétricas. O modelo brasileiro de energia segura e firme era invejado pelo mundo, mas o extraordinário processo de privatização pretendido acabou inclusive com os cinco anos de reserva no momento em que o Fundo Monetário Internacional pressionou o Brasil para diminuir a despesa pública. Os investimentos em energia, que passaram a ser considerados despesa pública no País, cessaram da noite para o dia, e chegamos ao terrível apagão.
Muito diferente do que ocorreu, por exemplo, nos Estados Unidos da América do Norte. O Reagan, o mais direitista e reacionário Presidente americano, consolidou o domínio estatal americano sobre as hidrelétricas. Hoje algumas delas, de grande porte, são administradas pelo exército americano. Por quê, Sr. Presidente? Porque os Estados Unidos passaram a considerar o uso múltiplo da água, que gira uma turbina, abastece uma cidade, irriga o campo, possibilita a navegação nos rios e nos lagos, garante a biodiversidade e o lazer das populações. Lá as hidrelétricas são preservadas; aqui o Governo, no seu afã de privatizar, montou, esgotada a reserva de água dos grandes lagos, dos reservatórios, das represas hidrelétricas, um modelo de compensação por meio de termelétricas, que seriam acionadas a partir de investimentos do capital privado. Gás da Bolívia e do leste da Argentina. Gás com o preço em dólar vinculado à variação do preço do petróleo no mercado internacional. Ao tempo em que acenava para o capital privado a construção dessas termelétricas, reguladoras do sistema, que deveriam entrar em funcionamento no momento em que o nível dos lagos baixasse extraordinariamente criando a crise, insistiu na privatização das grandes usinas públicas.
Evidentemente os capitais internacionais prefeririam comprar uma usina pronta, gerando a energia mais barata do mundo, cujos insumos são apenas a força da gravidade e a existência da água, fornecida pela chuva, que aumenta o caudal dos rios e garante o nível dos lagos.
No Paraná, uma usina do sistema Copel gera energia a US$4 o quilowatt/hora, enquanto uma usina distribuída no Brasil, com o preço da energia elevado pelo Governo para dar viabilidade econômica às termelétricas, está vendendo energia a R$166 o quilowatt/hora. Paga US$4 na boca da usina e cobra R$166 do fornecedor.
O jornalista César Benjamim citou alguns dados extraordinariamente interessantes a respeito da Light. Essa empresa compra energia de Furnas a US$23 o quilowatt/hora e cobra do consumidor residencial do Rio de Janeiro US$120 o quilowatt/hora - é o milagre da multiplicação dos lucros.
Na França, a EDF - Eletric de France, empresa que comprou a Light, fornece energia à população a US$75 o quilowatt/hora, mas compra energia gerada pelas usinas atômicas a um preço extraordinariamente mais alto do que aquele pelo qual recebe a energia de Furnas. Os lucros dessas empresas são simplesmente extraordinários .
O grupo americano AES retirou US$300 milhões da Cemig, em dois anos, sem iniciar nenhuma obra. Segundo a Gazeta Mercantil de 13 de março de 2001 a Light privatizada distribuiu, como dividendos, 98% do seu lucro, generosamente entregues aos novos acionistas estrangeiros.
Estamos diante de um modelo absolutamente falido. Os capitais estrangeiros não investem nas termelétricas em virtude do risco cambial. Num negócio totalmente inexplicável, o Brasil, possivelmente o único consumidor de gás da Bolívia no planeta, fez um contrato de compra, vinculando o preço do gás em dólar ao preço do petróleo no mercado internacional. É evidente que o caminho não é esse.
A preservação das hidrelétricas está nas mãos do Estado, em função, fundamentalmente, do uso múltiplo da água, um bem fora do comércio - desde o Direito romano - e uma propriedade tão pública quanto o ar que respiramos. Se apropriada privadamente, a água aliena o próprio regime dos rios e das correntes, deixando-nos diante da situação esdrúxula, por exemplo, de termos de pagar a uma empresa norte-americana ou a uma grande multinacional para jogar um anzol no rio Paraná, no rio Iguaçu e pescar um lambari.
No meu Estado, o Paraná, há um rio simplesmente milagroso, uma dádiva da natureza: o Iguaçu, que da nascente à foz tem um declive de 900 metros, o que possibilita a construção de represas e usinas - uma gota d’água pode acionar, em cima, uma usina; um pouco mais abaixo, uma segunda, e mais além, uma terceira. Trata-se de geração extremamente barata num rio de planalto que desce suavemente e permite a construção de barragens não mais em concreto vibrado, mas na moderna técnica do concreto rolado, que diminui de forma extraordinária o seu preço.
Vender por quê? Para quem? Vender num momento de crise para ocorrer um desastre semelhante ao da Califórnia, que tem um modelo diverso do nosso, porque é majoritariamente alicerçado sobre as termelétricas movidas a gás, mas, em virtude da privatização, saltou de US$44 para US$744 no mercado futuro de 2001 - energia tratada como commodity, livre mercado, MAE - mercado atacadista de energia.
No momento em que se pede aos consumidores residenciais e empresariais a poupança e o racionamento e se oferece aos grandes consumidores a possibilidade de - utilizando essa poupança e esse racionamento e substituindo parte de seu consumo por um gerador a diesel - baixar o preço da energia a R$200,00 o quilowatt hora para vendê-lo no mercado hoje, segundo o jornal O Estado de S.Paulo, a R$454,00, abre-se um caminho largo para a especulação.
A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Congresso Nacional já aprovou, por unanimidade, um projeto do Senador Roberto Freire, suspendendo a alienação das geradoras hidrelétricas e da transmissão de energia no Brasil. Esse projeto se encontra hoje nas mãos do Senador José Agripino, que deverá apresentá-lo à Comissão de Assuntos Econômicos. É preciso que o Senado da República, rapidamente, corrigindo os erros do Governo Federal, corrigindo os erros do Executivo nacional, proíba, de uma vez por todas, a venda de hidrelétricas e de linhas de transmissão, mandando rapidamente esse projeto, que é terminativo na Comissão de Assuntos Econômicos, para a Câmara dos Deputados. Precisamos restabelecer o bom caminho do sistema de geração de energia no Brasil.
A crise é irremovível; as reservas de 5 anos, Senador Gilberto Mestrinho, não existem mais. Uma boa chuva pode impedir o racionamento, mas só um dilúvio, como aquele que estimulou Noé a construir a sua arca, recuperaria rapidamente o nível dos lagos, diminuídos com a estiagem. A compra de termoelétricas nos Estados Unidos e Europa se inviabiliza porque as três ou quatro grandes produtoras mundiais de turbinas estão comprometidas com a demanda norte-americana até 2004. Talvez, por meio de uma negociação política, uma ou outra pudesse vir ao Brasil, mista, funcionando com gás e com vapor, que é a mais eficiente, mas não existe no mercado, e os técnicos do Ministério das Minas e Energia acenam com a bobagem máxima de adquirimos no mercado usinas simples de funcionamento a gás para suprir a demanda e evitar a crise. É como se na insistência de vender as hidrelétricas brasileiras pagas com recursos do povo o Governo resolvesse regredir às usinas de gasogênio, solução para os automóveis da época da última guerra.
O Senado precisa se manifestar. A alienação das hidrelétricas é um crime contra a segurança nacional, contra o fornecimento firme de energia; é um crime contra o desenvolvimento do País, mas, acima de tudo, é uma besteira monumental que só pode ser atribuída à má-fé cínica ou à ignorância córnea. Cabe ao Senado, nesta oportunidade, cumprir o seu papel e iniciar, com firmeza e clareza, a correção dos rumos.