Discurso durante a 78ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

DEBATE SOBRE A QUESTÃO DO NARCOTRAFICO E O PAPEL DA COLOMBIA NA INTERNACIONALIZAÇÃO DA AMAZONIA.

Autor
Mozarildo Cavalcanti (PFL - Partido da Frente Liberal/RR)
Nome completo: Francisco Mozarildo de Melo Cavalcanti
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SOBERANIA NACIONAL. POLITICA EXTERNA. :
  • DEBATE SOBRE A QUESTÃO DO NARCOTRAFICO E O PAPEL DA COLOMBIA NA INTERNACIONALIZAÇÃO DA AMAZONIA.
Publicação
Publicação no DSF de 26/06/2001 - Página 14015
Assunto
Outros > SOBERANIA NACIONAL. POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, TRAFICO, DROGA, PAIS ESTRANGEIRO, COLOMBIA, POSSIBILIDADE, INFLUENCIA, TERRITORIO NACIONAL.
  • ANALISE, CRITICA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), IMPOSIÇÃO, PLANO, COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, AMERICA LATINA, APREENSÃO, INTERVENÇÃO, MILITAR, POSSIBILIDADE, LESÃO, FRONTEIRA, PREJUIZO, SOBERANIA.
  • APREENSÃO, ORADOR, INVASÃO ESTRANGEIRA, FRONTEIRA, BRASIL, POSSIBILIDADE, INCORPORAÇÃO, TERRITORIO, REGIÃO AMAZONICA, MOTIVO, SUBSOLO, RIQUEZAS, MINERIO.
  • REGISTRO, NECESSIDADE, BRASIL, REPUDIO, PLANO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), COMBATE, TRAFICO INTERNACIONAL, OBJETIVO, DEFESA, TERRITORIO, SOBERANIA NACIONAL.

O SR. MOZARILDO CAVALCANTI (PFL - RR. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o assunto que me traz à tribuna, na sessão de hoje, deve ser considerado da maior importância para o Senado Federal. Trata-se da questão do narcotráfico e da implicação da Colômbia no jogo da internacionalização da Amazônia.

Na verdade, endossando matéria publicada, recentemente, pelo matutino Amazonas em Tempo, não há como duvidar de que o Estado colombiano está sendo dirigido como um autêntico quartel-general das drogas, a partir do qual rotas de produção, comercialização e distribuição são minuciosamente definidas.

Não obstante, parece inteiramente descabida e politicamente intolerável a iniciativa norte-americana de impor goela abaixo o fatídico Plano Colômbia à América Latina. Nessa perspectiva, o Brasil fica extremamente vulnerável às ações militares e paramilitares na região, não podendo em absoluto descuidar de suas fronteiras. Caso contrário, a Amazônia brasileira será, em tempo breve, incorporada ao violento território do narcotráfico internacional, renunciando de vez à sua legítima soberania sobre o território.

Conforme a matéria publicada no Diário acima mencionado, mais de um milhão de colombianos já abandonaram sua pátria em virtude da guerra civil que se arrasta por anos. Exército, guerrilha e grupos paramilitares, financiados pelos narcotraficantes, travam violentos conflitos diariamente, provocando um caos social e político de dimensões extremamente trágicas e devastadoras.

Não por acaso, nossas fronteiras com a Colômbia atravessam um período de extrema tensão, desde quando se comprovaram as suspeitas de que a guerrilha colombiana vem, já há algum tempo, mantendo relações de intensa troca com os traficantes brasileiros, como foi o caso reportado sobre o traficante mais conhecido do Brasil, Fernandinho Beira-Mar.

Mais que isso, nos últimos meses, virulentas ações se intensificaram por conta da implementação do denominado Plano Colômbia, arquitetado pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos, em comum trabalho com sua Agência de Inteligência. Autoritário em sua concepção, restaura a onda imperialista das intervenções militares sob o pano de fundo da ordem e da paz internacionais.

Segundo o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, a possível ocorrência de uma onda de refugiados colombianos para territórios dos países limítrofes torna-se inevitável diante do Plano Colômbia. Como é sabido, tal plano consiste no treinamento das tropas colombianas por instrutores do Pentágono, com o objetivo de combater o narcotráfico e seus agentes diretos, a FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) e o ELN (Exército de Libertação Nacional). Para tanto, o Governo norte-americano disponibilizou quase US$8 bilhões.

A previsão para a efetivação do Plano é de cinco anos, já que se destina a recuperar todos os espaços do País perdidos para a Máfia e os guerrilheiros. Não é para menos, as duas organizações terroristas juntas já controlam quase metade de todo o território colombiano. Agora, a Colômbia transformou-se num barril de pólvora, e qualquer faísca, nesse contexto, provocaria um incêndio com remota possibilidade de controle. Por isso mesmo, a intervenção norte-americana nessas circunstâncias adquire um grau de perigo que remonta aos níveis do desastroso envolvimento com o Vietnã.

Na realidade, tudo indica que o Estado colombiano atua, há muito tempo, de maneira conivente com o mercado das drogas, sobretudo com o comércio da cocaína. São 120 mil hectares de folha de coca sob a direção conjunta do Governo, da guerrilha e do tráfico. Totalmente militarizada, a Colômbia serve-se desse aparato para, na verdade, fornecer guarida ao tráfico, de cujas operações retira recursos suficientes para manter em pleno funcionamento uma rede corrupta de autoridades e empresários.

Nessas condições, os Estados Unidos identificam na situação colombiana o filão de ouro da indústria bélica, para cujos fins lucrativos não haveria lugar mais apropriado.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o que nos resta indagar seria: por que o Governo do Sr. George Bush não experimenta atacar o problema na outra ponta do imbróglio, ou seja, no eixo do suprimento de insumo para o refino da folha de coca? Afinal de contas, os produtos utilizados no refino da droga são importados de outras partes do mundo, incluindo nesse rol os Estados Unidos da América. Aliás, vale recordar que, embora assinado há 40 anos em Viena, o compromisso de erradicação do cultivo da coca nos Andes, em troca do apoio a projetos agrícolas na região, nunca foi devidamente consumado. Na verdade, os Estados Unidos nunca abriram seus mercados aos produtos andidos, cujas safras foram paulatinamente sendo desperdiçadas, a ponto de os lavradores se verem pressionados a retornar ao plantio da coca.

            O Plano Colômbia sequer mantém a aparência de uma missão civilizatória. Contempla irrisoriamente o incremento de projetos agrícolas, reservando recursos vultosos à operacionalização da incursão militar. Como bem afirma um especialista no assunto, se os norte-americanos realmente quisessem resolver o problema de um modo menos brutal e selvagem, teriam procedido ao rastreamento imediato das operações financeiras dos barões da droga. Não se pode estar indiferente ao fato de que o narcotráfico movimenta recursos que respondem por quase 5% do PIB mundial.

Ora, diante de tudo isso, ganha plausibilidade a tese de que o objetivo final do Plano consiste na implantação de bases militares permanentes em território amazônico. Por detrás disso, os Estados Unidos se apropriariam de extensões imensas de terras nas selvas do Brasil, do Peru e da Venezuela, entre outros países, em cujos subsolos abundam volume infindável de minérios. Para completar o estrago, os norte-americanos legitimariam o recôndito desejo de dominar integralmente a biodiversidade amazônica, assegurando o desenvolvimento tecnológico dos países do Primeiro Mundo no século XXI.

Nessas condições, o que está em jogo é a soberania brasileira na Amazônia, sobre cujo território os Estados Unidos já ventilam a idéia da relatividade da posse nacionalmente constituída. A própria ONU já faz entender que não se incomodaria em lutar pela declaração da neutralidade da Amazônia, que passaria a ser exclusivamente protegida pelas forças da OTAN. É sintomática, portanto, a recente decisão norte-americana de firmar acordos com os Governos paraguaio e boliviano, visando à implementação ostensiva de exercícios militares nestes países.

No caso do Brasil, espera-se que o Sivam - Sistema de Vigilância da Amazônia - seja capaz de detectar a presença de aeronaves preparadas para as operações de tráfico. Bilhões de dólares foram usados com a instalação de radares na Amazônia, na expectativa de que a tecnologia embutida possa identificar e interceptar os aviões dos narcotraficantes. Para se ter leve noção do problema, nossa fronteira com a Colômbia cobre um percurso de nada menos que quase dois mil quilômetros de extensão de densa floresta.

Em suma, não há mais tempo a perder. O Governo brasileiro tem que tomar uma posição mais firme, no sentido de repudiar a implementação do Plano Colômbia, por detrás do qual se esconde uma bem articulada ameaça dos Estados Unidos à soberania da Amazônia.

Como representante parlamentar de um Estado que compõe a Região Amazônica, não poderia deixar de alertar os demais Colegas Senadores para um problema cuja natureza se aproxima muito, em termos metafóricos, de uma bomba-relógio com tempo quase imediato para a sua detonação.

Na realidade, a Amazônia brasileira há muito vem sendo ameaçada e, a cada passo que se dá, mais se consolida esse plano internacional de tornar a Amazônia uma área não pertencente ao País.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 26/06/2001 - Página 14015