Discurso durante a 178ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

COMEMORAÇÃO PELOS 50 ANOS DE EXISTENCIA E ATUAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.

Autor
Benedita da Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/RJ)
Nome completo: Benedita Souza da Silva Sampaio
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • COMEMORAÇÃO PELOS 50 ANOS DE EXISTENCIA E ATUAÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS.
Publicação
Publicação no DSF de 27/10/1995 - Página 1845
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • COMEMORAÇÃO, ANIVERSARIO DE FUNDAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU).
  • ANALISE, HISTORIA, ATUAÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), REGISTRO, IMPORTANCIA, ORGANISMO INTERNACIONAL, MOTIVO, INTERMEDIARIO, PROMOÇÃO, ENTENDIMENTO, PAIS ESTRANGEIRO, IMPLEMENTAÇÃO, INTEGRAÇÃO, POPULAÇÃO, MUNDO, DESENVOLVIMENTO, PROJETO, PESQUISA, MOBILIZAÇÃO, GOVERNO, SOCIEDADE.
  • ANALISE, FUNÇÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), MANUTENÇÃO, PAZ, MUNDO, CRITICA, ORGANIZAÇÃO, INSUFICIENCIA, REALIZAÇÃO.
  • REGISTRO, NECESSIDADE, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), REVISÃO, FUNÇÃO, CRITICA, CONSELHO DE SEGURANÇA, DEFESA, ALTERAÇÃO, MEMBROS.

            A SRª BENEDITA DA SILVA (PT-RJ) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no ano em que se comemoram os 50 anos de existência e atuação da Organização das Nações Unidas, muitos se manifestam para afirmar que aquela instituição fracassou, tantos outros para defender seu sucesso.

            Penso que a ONU, como obra da humanidade, em sua trajetória ao longo desses primeiros 50 anos, período relativamente curto em termos de processo histórico, obteve fracassos e sucessos.

            Portanto, o mais correto, a atitude mais lúcida no meu entendimento, seria fazermos uma análise com relação àquela organização. Esta é uma ocasião para avaliarmos a obra que realizou e refletirmos sobre a definição de seu papel para as próximas décadas.

            O primeiro questionamento que faço, então, é o seguinte: como estaria o mundo de hoje sem a existência da ONU, sem a sua atuação? Como estaria o mundo, não fosse a constância da ONU na denúncia, na vigilância, na pesquisa, no debate, na prevenção, na busca? Como estaria o mundo, não fossem as ações desenvolvidas pela UNICEF, pela Organização Mundial de Saúde, pela UNESCO, pela OIT, nos quatro cantos do planeta? Nesse contexto, nenhuma outra organização na história da humanidade foi capaz de realizar as tarefas que a ONU empreendeu.

            A busca do ideal universal, de liberdade e paz, é um sonho que alavanca o homem com esperança para o futuro. A ONU surgiu, em 1945, com o sonho de buscar a paz no mundo, exausto e aterrorizado que estava ao término do segundo grande conflito armado mundial. Constituía-se numa promessa de equilíbrio e tolerância entre as nações. Integravam-na, então, 51 países. De lá para cá, houve alguns descaminhos, algumas frustrações. Até porque o mundo mudou de maneira jamais prevista, armando outros desafios, o desgaste da ONU frente a uma nova ordem mundial foi inevitável. Viu-se comprometida com novos propósitos, novos projetos, novos objetivos. Mas, com certeza manteve seus ideais de liberdade, paz e desenvolvimento para a humanidade, muito embora seus integrantes, na condição de governos, inúmeras vezes tenham descumprido determinações, tenham permitido que a palavra não germinasse em ação concreta.

            Todavia, a ONU permanece como o grande canal para o diálogo, aberto entre as nações. É o maior foro mundial de negociação. Não creio que ele deixe de ser relevante, num mundo onde tanto ainda há para ser conquistado. Por isso, relativizar sua força poderia contribuir para enfraquecê-la e, até quem sabe, extingui-la, atendendo a interesses inconfessáveis.

            Penso que houve avanços importantes. Eu mesma, como integrante da delegação brasileira na última Conferência sobre a Mulher, realizada recentemente em Pequim, sou testemunha da importância ímpar da ONU na promoção da integração dos povos. Sabemos o quanto aquele evento foi mais representativo, mais abrangente do que as conferências anteriores, relativas à questão dos direitos da mulher. É isso. Acredito que toda a história da humanidade se dê como numa espiral ascendente, contínua em seus insucessos e acertos.

            Relativamente à questão dos conflitos armados, temos hoje no mundo mais de 20 que merecem a atenção da ONU. Infelizmente, percebemos que apagar o fogo nos quatro cantos do planeta está acima das forças daquela organização. Dizem, por isso, que ela fracassou em sua mais importante tarefa: manter a paz mundial. Pode ser que neste sentido a ONU, às vezes, deixe-se absorver por injunções políticas, quando estão, infelizmente, o conceito de paz é relativizado. Esta situação se agrava e se explicita quando, num conflito armado, estão envolvidos interesses das potências que ocupam as cadeiras cativas, no seu Conselho de Segurança. Assim, não está dependendo da ONU, enquanto instituição, a resolução desses conflitos. Neste sentido, ela não poderá responder efetivamente enquanto for mantido o poder deliberativo centrado nas mãos dos cinco países que decidem. Também devemos observar que, no mundo moderno, a natureza dos conflitos armados se transformou. São em grande parte guerras civis, fratricidas, para as quais a ONU não adequou sua ação. Mesmo assim, suas forças de paz representam um bálsamo para os refugiados, um alento para a população civil desesperada, de ambos os lados.

            Não creio que o destino da ONU seja intervir diretamente em conflitos armados. Como um organismo vivo, que cresce e desenvolve processos de amadurecimento, a ONU vem definindo sua personalidade. Seu poder não está centrado nas armas, mas na persuasão, no convencimento. Não impõe, apenas determina, cabendo a seus membros acatar e pôr em ação o que aprovou, embora, vale frisar, não raro as intenções se percam por interesses particulares. É justamente como um foro ético mundial que ela mais atua, apontando diretrizes de comportamento e ação universais, denunciando abusos de toda ordem, investindo recursos e esforços na saúde e na pesquisa, na ecologia, na arte, na arquitetura, no trabalho, etc. A atual crise financeira que enfrenta é uma expressão da crise de credibilidade que ora enfrenta, a qual deve ser resgatada o mais depressa possível.

            Acredito na inteligência do ser humano, na sua capacidade de transcender, no seu desejo de um mundo mais igualitário. Acredito no despertar para a busca de uma verdadeira integração entre os povos. Penso que é o momento da ONU rever seu papel. A minha crítica seria no sentido de que a manutenção dos cinco membros permanentes e inamovíveis no Conselho de Segurança, não se justifica mais. Esta realidade se distancia do princípio de igualdade entre as nações grandes e pequenas, preâmbulo de sua carta constitutiva. A ONU conta com quase duas centenas de países e para que seja um efetivo espaço de convivência entre todas as nações, indistintamente. É indispensável sua democratização. Outorgar poder decisório à Assembléia Geral onde estão representados todos os Estados membros, seria o grande passo para que o sonho de liberdade e paz se viabilize. A partir daí, então, poderá desempenhar mais e melhor seu papel no próximo milênio que se anuncia.

            Há uma chama maior que alimenta nossos corações e mentes: o sonho de um mundo cuja consciência evolua para a humanização das relações. Por ele devemos continuar lutando, todos os dias. A palavra é confiança. É democracia. É ação, sempre.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/10/1995 - Página 1845