Discurso durante a 83ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

RATIFICAÇÃO DA IMPARCIALIDADE NA CONDUÇÃO DOS TRABALHOS DO CONSELHO DE ETICA E DECORO PARLAMENTAR QUANTO AS REPRESENTAÇÕES CONTRA O PRESIDENTE DA CASA, SENADOR JADER BARBALHO.

Autor
Gilberto Mestrinho (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AM)
Nome completo: Gilberto Mestrinho de Medeiros Raposo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • RATIFICAÇÃO DA IMPARCIALIDADE NA CONDUÇÃO DOS TRABALHOS DO CONSELHO DE ETICA E DECORO PARLAMENTAR QUANTO AS REPRESENTAÇÕES CONTRA O PRESIDENTE DA CASA, SENADOR JADER BARBALHO.
Aparteantes
Bernardo Cabral.
Publicação
Publicação no DSF de 02/08/2001 - Página 15116
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • ANALISE, CRISE, SENADO, NECESSIDADE, RECUPERAÇÃO, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, COMBATE, IMPUNIDADE.
  • SOLICITAÇÃO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, DISCURSO, DOCUMENTAÇÃO, DEFESA, ORADOR, CALUNIA, ACUSAÇÃO, IMPRENSA.
  • COMPROMISSO, ORADOR, QUALIDADE, PRESIDENTE, CONSELHO, ETICA, SENADO, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, CORRUPÇÃO, BENEFICIO, JADER BARBALHO, SENADOR, REPUTAÇÃO, LEGISLATIVO, REFORÇO, DEMOCRACIA.

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, inicialmente, quero agradecer a generosidade do Senador Mozarildo Cavalcanti, que me cedeu o seu tempo para este pronunciamento.

Nas últimas semanas, ou, melhor dizendo, nos últimos meses, venho assistindo a um espetáculo que nos deixa a todos perplexos. O Senado Federal vive hoje a maior crise moral de toda a sua história. Vivemos um estado de emergência moral e ética. Quero sensibilizar a todos desta Casa que soluções menores, covardes ou caudatárias só poderão agravar a presente crise. Estou perfeitamente consciente disso.

O momento exige coragem, coragem para restaurar a credibilidade ameaçada desta que é a mais alta Casa legislativa do País. Processos dolorosos como o que estamos vivendo naturalmente provocam na sociedade, na mídia e em toda parte os mais variados tipos de excessos, injustiças e julgamentos precipitados.

            Por isso, ao lado da coragem para extirpar o que for prejudicial, temos de ter a necessária serenidade e equilíbrio para não nos afastarmos do rumo que a sociedade deseja.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, eu mesmo tenho vivido dias difíceis. Sofri ataques injustos, tão absurdos e inaceitáveis que não cabe detalhá-los neste discurso. Iria fazer um pronunciamento a respeito hoje. No entanto, entendo que mais importante do que a defesa de um Senador é a defesa do Senado Federal. Por isso, Sr. Presidente, encaminho a V. Exª o referido pronunciamento com os documentos comprobatórios de minhas afirmações, que requeiro seja transcrito e publicado na íntegra para conhecimento das Srªs e dos Srs. Senadores. Só posso dizer que, mesmo ferido, entendo a atmosfera emocional que galvaniza o País nos dias de hoje.

Neste rápido pronunciamento, quero deixar claros os meus pontos de vista e a forma como atuarei como Presidente do Conselho de Ética desta Casa. Em primeiro lugar, não podemos desconhecer ou minimizar o que está em jogo neste momento. Quando, sucessivamente, quatro dos mais importantes Senadores - sem querer desmerecer os demais - são atingidos e questionados da forma como o foram, episódio que levou um deles à cassação e outros dois à renúncia, fica claro que não se trata de casos isolados. O que está em jogo não é a honra desse ou daquele Senador; o que está em jogo não é a seriedade ou a ética de um ou de outro. É duro reconhecer, mas a sociedade suspeita do Senado como um todo. Estão em jogo, portanto, Sr. Presidente, a honra, o conceito e a ética desta instituição.

Quando o Senado está diante de um desafio tão perigoso, é preciso que se tenha um pensamento e uma atitude à altura da situação; quando uma instituição como o Senado sofre máculas tão profundas, a ameaça não recai sobre um Parlamentar, mas é o próprio regime democrático que corre risco.

Quero deixar claro, Sr. Presidente, que o Presidente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado não tem amigos; tem deveres. Instituições não têm amigos. Cumprirei rigorosamente o meu dever, de acordo com o Regimento, a lei e a Constituição. Vínculos pessoais de um lado e ódios de outro não combinam com a vida pública. Jamais absolverei um amigo que seja culpado, como jamais condenarei um inimigo que seja inocente.

Quis o destino que eu assumisse a condição de magistrado num processo certamente doloroso para todos nós e, como juiz, não me resta outra alternativa: não se pode absolver o que é condenável. O que é condenável precisa ser sumária e exemplarmente punido. O Senado precisa ter coragem de absolver os inocentes - e eu tenho essa coragem -, mas não podemos tergiversar. Temos que cortar na própria carne quem quer que seja, se necessário for, para preservar o nome desta instituição.

Na condição de magistrado, por definição, não cabe a mim antecipar juízos ou concepções pessoais. É preciso que se dê amplo direito de defesa, já que essa é a base do sistema democrático que tanto lutei para que fosse, como é hoje, uma realidade em nosso País, mas não podemos tapar o sol com a peneira. O que está em discussão é se iremos ou não cassar o Presidente desta Casa.

Quero tranqüilizar a sociedade brasileira, pois iremos fazer o que tiver que ser feito, sem qualquer tipo de constrangimento pessoal. Torço, sinceramente, para que as explicações do Senador Jader Barbalho sejam convincentes e definitivas no processo, mas, acima de tudo, torço por esta Casa, torço pela democracia, torço pela ética, porque torço pelo Brasil.

Tenho que reconhecer que, por tudo que foi divulgado pela mídia até agora, as evidências são gravíssimas e exigem a mais profunda e imediata apuração. Se se confirmarem todas as alegações apresentadas até agora, teremos de fazer, inevitavelmente, uma escolha: restaurar a credibilidade do Senado, por mais dura que seja a medida, com o equilíbrio e o senso de justiça que a gravidade dos fatos apontados exige de nós. Essa é a posição que adotarei à frente do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar do Senado Federal e que quis compartilhar com V. Exªs e com a Nação.

O Conselho de Ética já está convocado para realizar sua primeira reunião na próxima quinta-feira, às 10 horas, quando serão iniciadas as atividades dessa nova fase.

Sr. Presidente, passo ao discurso que faria hoje, acerca das falsas acusações, das felonices que lançaram contra mim desde que fui escolhido Presidente do Conselho de Ética.

O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Permite-me V. Exª um aparte, Senador?

            O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Pois não.

O Sr. Bernardo Cabral (PFL - AM) - Senador Gilberto Mestrinho, ouvi V. Exª com a atenção que o discurso duro que acaba de pronunciar merecia. Quero cumprimentá-lo duplamente. Primeiramente, porque V. Exª traz para a Mesa documentação que, ao que parece - V. Exª não tem tempo disponível para lê-la -, é absolutamente irrefutável. Em segundo lugar, V. Exª acaba de demonstrar que, na Presidência do Conselho de Ética, vai comportar-se como magistrado, porque sabe que acima de tudo está a instituição, ainda que no fim lhe sobrem algumas cicatrizes. Se elas existirem, fique certo, Senador Mestrinho, de que serão cicatrizes orgulhosas do dever cumprido. Eu não poderia ficar calado, numa omissão que é o subproduto do nada e do não, e deixar de cumprimentar V. Exª.

O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Muito obrigado, Senador Bernardo Cabral. O aparte de V. Exª enriquece o meu pronunciamento e é fruto da sua generosidade, da longa convivência que temos e de uma amizade de longos anos.

Quero dizer que serão publicadas, além do que disseram a respeito, as deturpações que fizeram em pronunciamentos meus, as frases explicadas pela metade, as que tinham o intuito de me ridicularizar e as infames. Tenho comigo certidões, jornais de época, decretos de início de obras e uma declaração do Tribunal de Contas de que meu nome sequer consta do relatório. Inclusive, há aqui um decreto autorizando a construção de uma obra com data anterior à homologação de minha candidatura ao Governo do Estado. O Governador da época anunciava que esperava inaugurá-la em fevereiro, e eu assumi o cargo em 15 de março do ano seguinte. No entanto, sou acusado de não ter feito concorrência pública para a obra, de tê-la adjudicado e de ter estabelecido preços e contratos, dentre outras coisas.

Perguntaram-me sobre ética e respondi que se trata de um princípio da moral que observa o comportamento humano, procurando discernir o bem do mal. Disse-lhes que essa é a sua definição clássica, mas não é universal, porque depende de momentos históricos e de culturas. Expliquei, por exemplo, que a ética da paz é uma e a da guerra, outra. Na paz, atrair o inimigo para uma cilada é agravante de crime. No entanto, em período de guerra, atrair o adversário para uma emboscada é ser ótimo estrategista, é transformar-se em herói nacional, porque essa é a ética em tempos de guerra. No Oriente, especialmente nos países islâmicos, a poligamia é ética. Está no Livro Sagrado. Ter uma filha no harém do sultão, do emir, do rei, é um glória para a família. Vejam V. Exªs que há uma série de explicações para a palavra ética. No entanto, saiu que a minha ética era de momento, de ocasião. Nada disso foi dito. E por aí foram, dizendo coisas.

Digo a esta Casa que fui cassado na primeira lista do primeiro Ato Institucional de 1964, na madrugada de 9 de abril de 1964, quando o Comando Revolucionário editou o Ato Institucional. Fomos cassados na primeira lista quarenta e dois Parlamentares e outros brasileiros não parlamentares - tudo em nome da honra nacional - tais como: Jânio Quadros, Leonel Brizola, Miguel Arraes, Rubens Paiva, Almir Afonso, Bocaiúva Cunha, e eu inclusive.

Havia um inimigo meu à frente da Revolução que exigiu a minha cassação. Ele fez tudo contra mim, para ver se pegava alguma coisa. Minha vida foi investigada desde os 16 anos de idade, mas não encontraram nem sequer um fato que justificasse minha chamada ao IPM. Havia centenas de unidades de IPMs neste País, e não fui chamado a nenhuma. Dois anos depois da Revolução, fui convidado a prestar esclarecimentos, em Belém do Pará, sobre uma greve geral no Governo Parlamentarista de Brochado da Rocha, e que também havia sido exercitada no Amazonas. Fui lá. Fui bem tratado, prestei esclarecimentos e nunca mais fui incomodado. A única coisa que fizeram contra mim foi um comunicado de que eu estava proibido, enquanto durasse a cassação, de pisar o Amazonas. Efetivamente passei quinze anos e meio sem botar os pés lá. Fiz isso por questão de sobrevivência, porque eu sabia que as intenções eram outras.

Todos esses fatos foram alegados como se eu fosse uma figura abominável. No entanto, por três vezes fui eleito Governador: em 1968, em 1982 e em 1990. Em 1962, fui eleito Deputado Federal por Roraima. Em 1998, fui eleito Senador. Alguns desses fatos aparecem em todas as campanhas. Trata-se de uma montagem que fizeram, em 1957, da qual só tomei conhecimento quando terminava o meu primeiro Governo, do qual V. Exª fazia parte. Portanto, foi naquela oportunidade que tomamos conhecimento dessa molecagem, dessa montagem, que não tiveram coragem de apresentar à época. Então, todas as vezes em que há uma eleição ou quando querem me atacar, lá vem a mesma história!

Como disse, Sr. Presidente, toda a minha vida foi investigada. Ela é limpa. Tanto é verdade que o povo me conferiu três mandatos de Governador, um de Senador, pelo Amazonas, e um outro como Deputado Federal por Roraima.

Assim, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores - situação e oposição - podem ficar tranqüilos, pois não há facciosismo.

Na condução do Conselho observaremos estritamente as normas regimentais e as constitucionais, porque essa é a nossa obrigação.

Muito obrigado.

 

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SEGUE DISCURSO DO SENADOR GILBERTO MESTRINHO.

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O SR. GILBERTO MESTRINHO (PMDB - AM) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Sinto-me no dever de, em respeito a esta Casa, assomar a esta tribuna, a fim de prestar aos eminentes pares esclarecimentos sobre notícias divulgadas nos meios de comunicação, a partir de minha escolha para a Presidência do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, por indicação de meu partido, de acordo com a praxe e as normas regimentais.

Inicialmente, fui tomado de surpresa pela escolha e relutei em aceitar o encargo, segundo testemunho do eminente líder de minha bancada, senador Renan Calheiros. No entanto, consciente de minhas responsabilidades, terminei admitindo o desafio, em hora das mais difíceis para o Senado da República.

A partir daí, passei a ser instado a dar declarações sobre o comportamento que adotaria à frente do Conselho, especialmente sobre o rumoroso caso que envolve o Senador Jader Barbalho. Também tomei conhecimento de críticas, algumas, inclusive, de membros do meu próprio partido, com opiniões divergentes sobre a aceitação da indicação, em razão da minha condição de amigo do senador paraense.

Analisei as objeções opostas, com a necessária isenção, e mais uma vez constatei o acerto da decisão que adotara. A prevalecer entendimento diverso, seria inadmissível qualquer indicação entre adversários políticos. Se o que se busca é a isenção, esta deve valer para todos e não apenas para alguns. Afinal de contas não vivemos em regime totalitário.

Tenho a firme convicção de que todos os membros do Conselho de Ética são sérios, justos e exercitarão suas obrigações tendo em conta, exclusivamente, a apuração da verdade. Aprendi, desde cedo, que somente os totalitários condenam antes de apurar a veracidade dos fatos e que a condição de acusador e juiz reunida numa só pessoa agride os mais comezinhos princípios do Estado Democrático de Direito.

É com esse espírito que exercerei a Presidência do Conselho de Ética do Senado Federal. A amizade que tenho e não nego com o senador Jader Barbalho em nada influirá no meu comportamento e nas decisões que tomarei à frente do Conselho, que possui um regimento, que deve ser e será obedecido em sua plenitude.

De igual modo, faço questão de ressaltar que, em seguida, começaram a deturpar palavras e expressões que proferi, informações pela metade, acusações, enfim, tudo numa clara tentativa de incompatibilizar-me com o cargo que nem bem começara a exercer.

Exemplifico: ao ser indagado sobre o conceito que faço da ética, respondi que seu entendimento permitia a observação do comportamento humano de modo a distinguir o bem do mal. Esta é sua definição clássica. No entanto, essa concepção sempre experimentou variações correspondentes a cada momento histórico ou segundo as mais diferentes culturas da humanidade. Assim, reportei-me à ética da paz e à ética da guerra. Na paz, dizia na ocasião, atrair um inimigo para uma cilada serve como agravante para um crime praticado. Na guerra, atrair o inimigo para uma emboscada e dizimá-lo é um grande feito estratégico e heróico. O mesmo se pode dizer sobre as diversidades culturais. Os muçulmanos são polígamos e a poligamia está inscrita no Livro Sagrado. Ter uma filha no harém do rei, do sultão ou do emir, é uma honra para a família. É a ética deles. Para nós, conquanto compreensível, é inaceitável, segundo nossos parâmetros históricos e culturais.

Esta a verdade, senhoras e senhores Senadores.

No entanto, passaram à opinião pública nacional algo inteiramente diferente. Falaram que teria sustentado uma espécie de ética de ocasião e que tal conceito marcaria minhas ações na Presidência do Conselho. Vejam, portanto, o absurdo da obliteração progressiva da realidade dos fatos.

Nessa mesma linha de desinformações, fui acusado de ter feito a maioria das indicações para preenchimento de cargos na SUDAM. Governei o Amazonas durante a existência desse órgão em dois períodos. Duvido que encontrem nos quadros daquela Superintendência, ou em cargos em comissão da mesma instituição (83 a 87 e 91 a 94), sequer um contínuo que tenha sido nomeado por indicação minha.

Perguntado como agiria sobre as denúncias envolvendo o senador Jader Barbalho, respondi sempre que a função do Conselho de Ética, criado pela resolução 20/93, desta Casa, era acompanhar o comportamento dos senadores durante o exercício do mandato, de modo a fazer observar o respeito pelo decoro parlamentar. Logo, os atos que estivessem dentro desses limites seriam apreciados pelo Conselho. Com relação aos anteriores, opinei que sua averiguação e julgamento seriam de competência da Polícia, do Ministério Público, da Justiça etc., porquanto praticados fora do exercício do mandato do senador. Tais declarações, pasmem senhoras e senhores senadores, causaram incrível celeuma junto aos meios de comunicação, felizmente já completamente superada.

Senhor Presidente.

Até minha cassação veio à baila. Lamentavelmente alguns segmentos da memória nacional sofrem de amnésia democrática e muitos não conhecem e não sabem o que foi 64.

Com a chamada “Redentora”, de 31 de março/1º de abril de 1964, instalou-se o “Comando Revolucionário”, constituído pelos comandantes das três forças armadas, que imediatamente assumiu o Poder no Brasil. Em seguida, mais precisamente, na madrugada de 9 de abril, foi baixado o primeiro Ato Institucional que, “no resguardo da honra nacional”, cassava e suspendia os direitos políticos por dez anos de inúmeros brasileiros ilustres, parlamentares ou não, como João Goulart, Jânio Quadros, Luís Carlos Prestes, Miguel Arraes, Almino Afonso, Bocayuva Cunha, Rubens Paiva e outros, inclusive eu, que fui o último dos 42 parlamentares da primeira lista, já que à época era Deputado Federal pelo então Território Federal do Rio Branco, hoje Estado de Roraima.

Cassado e com os direitos políticos suspensos, permaneci no País. Não procurei asilo nem fui para o exílio. Sei que minha vida foi vasculhada, mas não fui chamado a responder a um único IPM (Inquérito Policial Militar), quando havia centenas deles instaurados. Comunicaram-me, apenas, que não deveria voltar ao Amazonas. Dois ou três anos depois, convidaram-me a prestar esclarecimentos sobre uma greve geral que houve no País, inclusive no Amazonas, durante o mandato do primeiro Ministro Brochado da Rocha. Fui bem tratado, prestei os esclarecimentos e nada mais aconteceu.

Também, uma maldade montada em 57 foi levantada. Não levam em conta que a revolução de 64 investigou minha vida desde os 16 anos de idade. A ordem era descobrir qualquer coisa para me incriminar, se não fosse possível minha eliminação física pelo inimigo que eu tinha na cúpula da revolução e que exigiu minha cassação. No entanto, passei incólume pelas investigações e em 58 fui eleito Governador pela 1ª vez, e, posteriormente, com a anistia, mais 2 vezes Governador e agora em 98 - Senador.

O que não dizem é que, apesar de haver governado sempre em épocas de crise nacional - crises políticas e econômicas, fiz mais escolas, hospitais, estradas, prédios públicos e etc. na capital e no interior que todos os Governos juntos, antes de mim desde a fundação da Província.

Em 1979, em decorrência da anistia de 28 de agosto, no dia 3 de setembro, voltei ao Amazonas e anunciei que seria candidato ao Governo nas eleições de 1982, ano no qual a generosidade do povo amazonense me elegeu mais uma vez governador do Estado.

Agora, levantam a questão de uma ação de improbidade administrativa impetrada pelo Ministério Público Federal no Amazonas, que vem servindo de base para noticiários sensacionalistas na grande imprensa brasileira.

Devo ressaltar que a ação, em referência, é inacreditável, senhora e senhores senadores, está toda ela estruturada, todo ela embasada, toda ela exclusivamente fundamentada, em simples RELATÓRIO PRELIMINAR, RELATÓRIO PRELIMINAR, destaque-se, de um auditor do Tribunal de Contas da União, da seccional no Amazonas. Nada além, nenhuma prova concreta, acabada, definitiva.

Na referida ação, acusam-me de:

1.     Prática de fraude no processo licitatório, com dispensa de licitação da obra de construção do Centro Cultural de Manaus, mais conhecido como Sambódromo.

2.     Superfaturamento nos preços da referida construção e de pagamento de serviços não executados.

3.     Responsabilidade pelo desabamento do Sambódromo, com 27 vítimas do desastre, em Manaus, com graves prejuízos para os cofres públicos do Amazonas.

Em homenagem a esta Casa, presto os seguintes esclarecimentos:

1.     O Sambódromo de Manaus não foi projeto de meu governo. Assumi o Governo em 15.03.91 e a obra foi iniciada em julho de 90 quando nem sequer eu estava homologado como candidato. Não promovi a licitação da obra e não contratei sua edificação com a empresa construtora. Não estabeleci preços e outras condições para sua execução. Ao assumir o mandato, tudo já estava em curso, sob a responsabilidade do governo que me antecedeu. Apenas dei continuidade ao projeto, não permitindo que tivéssemos mais uma obra inacabada, como tantas pelo Brasil afora, com graves prejuízos para o erário e para o contribuinte brasileiro. (Documento nº1).

2.     Não é verdade que tenha havido fraude no processo de execução das obras do Centro Cultural de Manaus, durante o meu governo, no período de 1991 a 1994, no Estado do Amazonas. De igual modo, não são procedentes acusações de superfaturamento ou de pagamentos de serviços não executados referentes ao projeto em questão.

3.     Os preços da obra, ao longo da construção, em meu governo, foram praticados segundo valores correntes no mercado para construções especiais, tanto é que as prestações de contas foram regularmente aprovadas pelo Ministério da Educação e Cultura/ Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE - e pelo Tribunal de Contas do Estado do Amazonas, no referente a pequenas ajudas para a obra.(Documentos nº2 e 3).

4.     A propósito com base nos mesmos frágeis fundamentos, foi anteriormente ajuizada Ação Popular, no âmbito do Poder Judiciário do Amazonas, tendo como autores membros na oposição no Estado, que questionaram exatamente os preços praticados na obra, com argumentos levianos e insustentáveis.

5.     Evidenciada a verdade e exposta a manobra política de meus adversários, inclusive através de perícia técnica e judicial, que analisou o projeto e cotejou custos com obras semelhantes realizadas no Rio de Janeiro e São Paulo, a referida ação foi julgada inteiramente improcedente pela Justiça do Amazonas, em sentença publicada no Diário Oficial, em 5 de maio de 1994, com a qual atestou, de forma irretorquível, a inexistência de qualquer irregularidade, principalmente com relação a preços de construção do Complexo Cultural.(Documento nº4).

6.     São também falsas as informações de que o Centro Cultural tenha desabado dois meses depois de inaugurado. Caiu parte da cobertura metálica, sem vítimas. Ninguém, nenhuma só pessoa, foi ferida no acidente. E, diga-se desde logo, os valores referentes ao custo da cobertura que desmoronou foram imediata e integralmente recolhidos aos cofres públicos, no dia 22 de dezembro de 1994, por minha pronta determinação na ocasião. Anexo cópias das guias de recolhimento.(Documento nº5).

7.     O processo judicial, objeto da reportagem em tela, foi intentado de forma reconhecidamente equivocada, tanto é que, já ingressaram com pedido de desistência da primeira ação proposta. Aguarda-se um breve pronunciamento da Justiça que mais uma vez se fará límpida e serena.

8.     Apresento, também, a Vossas Excelências, as declarações do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação) atestando a aprovação dos convênios - que corresponderam a pouco mais de 5 milhões de reais e não o que dizem. Junto também certidões do Tribunal de Contas da União, certificando que “não consta do cadastro de julgamentos deste Tribunal registro de irregularidades na aplicação de recursos públicos federais sob a responsabilidade do Sr. Gilberto Mestrinho de Medeiros Raposo, ex-governador do Estado do Amazonas, atual Senador da República, CPF 000.659.192-20” (17/07/2001) e que no referido relatório não é sequer citado o meu nome. (Documento nº6 e 7).

Vale frisar, de outro modo, que os convênios em referência foram celebrados para a construção do Complexo com a edificação de salas de aula. Houve, na verdade, uma adaptação dos espaços dos camarotes para sua utilização como salas de aula. Esses locais, com tetos em concreto feitos para suportar cerca de 50.000 pessoas e com paredes de até 2,5 m. de espessura em concreto armado, foram edificados sobre fundações com toneladas e toneladas de aço e concreto, feitas para resistir ao peso de mais de 50.000 pessoas sentadas ou dançando.

Portanto, senhoras e senhores senadores, como se vê pretende-se comparar o incomparável, em cima de fatos e situações absolutamente distintas numa construção de natureza especialíssima, que até então como ficou dito, foi objeto tão-somente de uma inspeção que redundou num relatório preliminar.

Finalmente, Senhor Presidente, requeiro a Vossa Excelência que faça publicar, na íntegra, os referidos documentos.

            Assim, senhoras e senhores senadores, devemos ficar atentos para distinguir o que é efetivamente interesse público. As ditaduras surgiram sempre sob a alegação de que vinham para defender a honra nacional e os mais elevados interesses da pátria. Depois, a perpetuação do arbítrio, a longa noite de trevas, o sepultamento do regime e dos ideais democráticos.

            Feitos estes esclarecimentos, acredito que os trabalhos do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar poderão transcorrer de forma a atender o anseio da sociedade na busca da verdade dos fatos, bem como na defesa dos interesses nacionais e preservação do regime democrático.

Com esse objetivo, já convoquei os senhores senadores, membros do Conselho de Ética, para a primeira reunião do novo Conselho, amanhã às 10 horas, quando iniciaremos os exames das matérias existentes e tomaremos as primeiras providências regimentais.

Muito obrigado.

 

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            DOCUMENTOS A QUE SE REFERE O SR. SENADOR GILBERTO MESTRINHO EM SEU PRONUNCIAMENTO, INSERIDO NOS TERMOS DO ART. 210 DO REGIMENTO INTERNO.

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Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/08/2001 - Página 15116