Pronunciamento de Carlos Wilson em 29/06/2001
Discurso durante a 82ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
CRITICAS AO POSICIONAMENTO DO GOVERNO DIANTE DA REALIDADE NORDESTINA AGRAVADA PELA SECA.
- Autor
- Carlos Wilson (PPS - CIDADANIA/PE)
- Nome completo: Carlos Wilson Rocha de Queiroz Campos
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
- CRITICAS AO POSICIONAMENTO DO GOVERNO DIANTE DA REALIDADE NORDESTINA AGRAVADA PELA SECA.
- Publicação
- Publicação no DSF de 30/06/2001 - Página 14583
- Assunto
- Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
- Indexação
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- CRITICA, GOVERNO FEDERAL, INEXISTENCIA, PROGRAMA, COMBATE, SECA, FALTA, VONTADE, NATUREZA POLITICA, RESULTADO, MIGRAÇÃO, POPULAÇÃO, INTERIOR, CIDADE, AUMENTO, VIOLENCIA, AUSENCIA, SANEAMENTO BASICO, SAUDE, EDUCAÇÃO, REGIÃO NORDESTE.
O SR. CARLOS WILSON (Bloco/PPS - PE. Pronuncia o seguinte discurso.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aconteceu de novo. O Governo Federal, mais precisamente o Presidente da República, fez uma descoberta novamente impressionante. Depois de descobrir que o País estava sujeito a ficar no escuro e que não chove no Nordeste, Sua Excelência, segundo os jornais, descobriu que “a fome nos Estados atingidos pela seca é conseqüência direta da ausência de renda”.
Quer dizer que finalmente o Presidente da República descobriu que fome é igual a miséria. Onde há miséria, há fome, e vice-versa.
Enquanto os integrantes do Governo procuram digerir tal revelação, a situação no Nordeste beira o desespero. Cansados de esperar por socorro, os trabalhadores rurais invadem Municípios e bloqueiam estradas.
Não foi o cenário tão bem descrito pelo meu conterrâneo, que nos orgulha muito, João Cabral de Melo Neto, em Morte e Vida Severina, que mudou. Mas aqueles personagens estão, felizmente, longe da inanição provocada pela ausência de cidadania.
Os efeitos da seca são os mesmos. A inclemência da carência de chuvas, a terra seca e árida, os poços e açudes esturricados. A fome e a miséria. Nada disso mudou. Também não mudaram as estruturas de posse de terra, a má distribuição de renda e as relações trabalhistas entre fazendeiros e camponeses.
Mas o nordestino mudou. O sertanejo não é mais o mesmo. Felizmente, hoje ele se articula, organiza-se e grita alto o seu drama, que de poético não tem nada, mas tem muito de dor e sofrimento.
Não se pode negar articulação das tentativas de saques e invasões que marcam o quadro social da região. É a forma radical encontrada para provocar o poder público e obrigá-lo a tomar alguma iniciativa.
O Ministro Raul Jungmann, pernambucano como eu, Secretário de Planejamento do Governo do Estado de Pernambuco durante o tempo em que tive a honra de governar o meu Estado, sabe como ninguém que palavras e boas intenções não são suficientes para minorar o sofrimento secular das populações que vivem no sertão sob a inclemência da seca.
Dotado de notável capacidade de trabalho, mais técnico que político, o Ministro consegue o milagre de integrar um governo e não se deixar contaminar por ele. Não bastasse ter que lidar com a fratura exposta da questão agrária, está agora assoberbado também com a questão da seca, que conhece tão bem.
Portanto, não lhe causou nenhuma consternação o confronto provocado pelas lideranças rurais e pelos Secretários de Agricultura dos Estados do Nordeste.
Repito: não dá para combater a seca com palavras e boas intenções. É preciso materializar as ações.
O programa Sertão Cidadão, por exemplo, que busca reforçar a ação na educação e na capacitação rural, é um retrato acabado dessa indecisão do Governo Federal. Não há no programa detalhamentos de ações concretas e muito menos de investimentos. Palavras e boas intenções, Srªs e Srs. Senadores, só isso.
O Governo Federal não tem agilidade, nem disposição política para definir os investimentos das ações permanentes. Com isso, prejudica também a ação emergencial. Mais uma vez o Governo revela o seu distanciamento da realidade do País.
Afinal, o bolsa-renda prevê o pagamento de míseros R$60 e mais uma cesta básica para as famílias atingidas pela estiagem em troca da participação delas em cursos de capacitação profissional.
Não é difícil entender que a burocracia acadêmica imobiliza a ação.
Na retórica, o Governo agora fala em convívio com a seca. Mais uma descoberta notável. Chegou-se à conclusão de que o Presidente da República não tem poder para fazer chover. Mas enquanto essa divagação já dura seis anos, as grandes cidades do Nordeste estão inchadas, vítimas de uma migração constante, animada pelo desalento de arar a terra seca.
Não me surpreenderá se, em breve, o Governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso trouxer à luz a revelação de que a seca no sertão é a principal causa da deterioração das grandes cidades nordestinas. Responsável pela violência urbana, por problemas de saneamento, habitação, educação e saúde nessas cidades. Afinal, vivemos tempos de descoberta do óbvio.
Muito obrigado.