Discurso durante a 87ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO ESCRITOR JORGE AMADO, OCORRIDO ONTEM, EM SALVADOR/BA.

Autor
Paulo Hartung (PPS - CIDADANIA/ES)
Nome completo: Paulo César Hartung Gomes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • HOMENAGEM DE PESAR PELO FALECIMENTO DO ESCRITOR JORGE AMADO, OCORRIDO ONTEM, EM SALVADOR/BA.
Publicação
Publicação no DSF de 08/08/2001 - Página 15890
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, JORGE AMADO, ESCRITOR, ESTADO DA BAHIA (BA), RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, OBRA LITERARIA.

O SR. PAULO HARTUNG (Bloco/PPS - ES. Para encaminhar a votação. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Senador Roberto Freire já falou em nome do nosso Partido, o PPS, registrando todo o nosso orgulho por este grande baiano, este grande brasileiro, Jorge Amado, e que estará sempre entre nós, na nossa vida cultural, por meio de sua obra.

            Respeitando o tempo da sessão - já fui alertado pelo Presidente - desejo apenas, em nome da Bancada capixaba, do Senador Ricardo Santos, do Senador Gerson Camata, e em nome do povo do Estado do Espírito Santo, dizer da nossa tristeza aos familiares de Jorge Amado, ao povo baiano, ao povo brasileiro, por esta grande perda nacional, para um País que precisa ver reconhecidas sua cultura e sua identidade.

Portanto, fica o nosso registro, o meu e o dos capixabas, da dor e da tristeza pela perda de alguém tão importante para um País que tenta buscar o seu caminho, sua trajetória, sua afirmação cultural.

            Obrigado, Sr. Presidente.

O SR. PAULO HARTUNG (Bloco/PPS - ES) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs. Senadores, em nome de PPS, quero registrar o nosso pesar pela perda de Jorge Amado que, antes de ser o grande homem das Letras, era um cidadão preocupado com os destinos do Brasil. Foi através de suas obras que ele refletiu o nosso País, captando a alma brasileira a partir da Bahia, e fez a nossa literatura inserir-se no plano internacional, abrindo as portas do mercado editorial para obras de outros autores.

Jorge Amado interpretou este Brasil eclético, heterogêneo e multifacetado, traduzindo todo nosso sincretismo através dos personagens que habitaram suas obras, retirados do imaginário popular baiano, com toda sua cara de paixão, sensualidade e tensão.

O legado literário de Jorge Amado é inestimável. Suas obras, que foram publicadas em mais de 50 países, tendo vendido mais de 100 milhões de exemplares em todo o mundo, falam de um Brasil de carne e osso, o Brasil dos trabalhadores que suam suas camisas no cais do porto, o Brasil da diversidade religiosa, dos trabalhadores rurais nas plantações de cacau, das prostitutas, dos menores abandonados, dos imigrantes e das populações ribeirinhas.

Seus livros retratam o Brasil como um grande mosaico, imortalizando personagens como Gabriela, Dona Flor, Vadinho, Teobaldo, o turco Nacib, Teresa Batista, Tieta e tantos outros que são a imagem fiel de um país que, apesar de todos os contrastes, tem esperanças. Seus temas são variados, do lirismo de amores impossíveis em Mar morto, passando pela denúncia da miséria e da exploração política da seca em Terras do sem fim; retratando o universo dos meninos de rua em Capitães de areia, ou mostrando a sensualidade e os costumes em Gabriela, cravo e canela e Os velhos Marinheiros. Jorge Armado escreveu a verdadeira literatura brasileira, dentro de em padrão estético e psicológico fiel às nossas origens afro-portuguesas, na mesma linha de um Sérgio Buarque de Holanda e de um Gilberto Freyre, que fizeram uma brilhante interpretação sociológica do Brasil.

Jorge Amado honra não só a cultura nacional, mas também o PPS, pois foi um histórico membro do extinto PCB. Foi deputado federal em 1945, assumindo-se como um “escritor do partido”, dada sua formação marxista e seu repúdio ao Estado Novo e ao nazi-fascismo europeu. Sofreu perseguições, exílio e prisões, foi cassado em 1948, e seguiu para a Tchecoslováquia, só retornando ao Brasil em 1956. Nosso velho comunista abandonou a luta partidária, mas não as idéias, convencido de que, através da literatura poderia contribuir, melhor do que na vida parlamentar, para pensar criticamente o Brasil. E o fez sem desvirtuar-se de seu sentimento de amor ao País, à sua gente, à Bahia e aos livros, com a mesma simplicidade com que viveu. Para ele, “o socialismo é o futuro. A queda do muro de Berlim significou o fim de ditaduras medonhas que existiam em nome do comunismo, mas não eram comunismo”.

Foi um escritor avesso à intelectualidade, porque acreditava mais na simplicidade do que na futilidade, por isso sua obra permanecerá entre as mais destacadas de nossa literatura e uma das mais traduzidas no mundo inteiro, porque o escritor não se dissociou do homem, não se fechou no hermetismo vocabular, nem deixou que o pedantismo intelectual ofuscasse as pessoas. Ele sempre esteve perto do povo e esse povo, com o qual conviveu, é que forneceu matéria e circunstância para seus romances de sucesso.

Esse é Jorge Amado, um homem que amou a vida, as pessoas, foi fiel aos amigos, e, acima de tudo, contou com a parceria, a solidariedade e a cumplicidade de sua mulher, a escritora Zélia Gattai, com quem viveu uma vida de intensa paixão pessoal e literária.

De Jorge Amado fica uma grande lição para todos nós, e quero aqui destacar uma de suas falas, que exemplifica muito bem o caráter de sua escritura: “É ótimo que os escritores sejam cultos, lidos. Mas nada disso servirá, se eles não viverem ardentemente a vida, não amarem os homens, as coisas, as paisagens, não se misturarem intensamente à vida. Se não o fizerem, ficarão livrescos, e essa é a pior desgraça que pode suceder a um escritor”.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/08/2001 - Página 15890