Discurso durante a 90ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

CRITICAS AOS INSTITUTOS DE PESQUISA ELEITORAL. ANALISE DA RESPONSABILIDADE DO PRESIDENTE DA REPUBLICA DIANTE DA CRISE QUE AFETA A IMAGEM DO SENADO FEDERAL.

Autor
Lauro Campos (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Lauro Álvares da Silva Campos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ELEIÇÕES. SENADO. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • CRITICAS AOS INSTITUTOS DE PESQUISA ELEITORAL. ANALISE DA RESPONSABILIDADE DO PRESIDENTE DA REPUBLICA DIANTE DA CRISE QUE AFETA A IMAGEM DO SENADO FEDERAL.
Aparteantes
Marina Silva, Pedro Simon.
Publicação
Publicação no DSF de 11/08/2001 - Página 16389
Assunto
Outros > ELEIÇÕES. SENADO. PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • ANALISE, CRITICA, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, IMPRENSA, MANIPULAÇÃO, ELEIÇÃO.
  • CRITICA, CANDIDATO, ELEIÇÕES, PAGAMENTO, SERVIÇO, INSTITUIÇÃO DE PESQUISA, OBJETIVO, DIVULGAÇÃO, CANDIDATURA, EX SENADOR.
  • ANALISE, ATUAÇÃO, ANTONIO CARLOS MAGALHÃES, CRITICA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESRESPEITO, LEGISLATIVO, JUDICIARIO.
  • DENUNCIA, FERNANDO HENRIQUE CARDOSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, APOIO, JADER BARBALHO, SENADOR, MOTIVO, TENTATIVA, INFLUENCIA, INTERVENÇÃO, SENADO, OBJETIVO, MONOPOLIO, PODER.

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, parece-me que qualquer pronunciamento em seqüência à fala do nobre Senador Pedro Simon é um pronunciamento menor, ofuscado pelo brilho e pelo peso da inteligência e da experiência política que o Senador do Rio Grande do Sul possui.

Obviamente, S. Exª fala como pré-candidato à Presidência da República. Nós, que o conhecemos, sabemos que S. Exª não é um candidato qualquer, produto da aventura, da esperteza, de ambições individuais.

Tenho pouquíssima experiência política. Este é o meu primeiro mandato, nunca exerci outro na minha vida. Aos 72 anos, sou um ano mais idoso do que o jovem Senador Pedro Simon e dois anos mais idoso do que o juvenil Presidente da República, que consegue ser um septuagenário com todas as características da juventude.

Contudo, gostaria de referendar que essa questão do instituto de pesquisa - que procurei num projeto de lei alterar, mas não consegui - é um problema para os candidatos que não compram, não pagam, não custeiam os institutos. De que vivem esses institutos de pesquisa? Obviamente, daqueles que contratam e pagam os seus serviços. Nunca paguei nada, portanto nunca tive a simpatia, nem a empatia da imprensa e dos institutos de pesquisa.

Na primeira vez em que foram a minha casa para pedir que eu fosse candidato a Senador - e o meu Partido, nos 20 anos em que estive filiado a ele, não me forneceu uma folha de papel em branco, só promessas; não me ajudou em nada, nem com uma folha de papel em branco -, senti na pele o que são esses institutos de pesquisa, esses que eliminam, por exemplo, o nome do Senador Pedro Simon, que não o colocam lá. Olhem os jornais de Brasília: divulgam os candidatos a Senador e esquecem o meu nome.

Na minha primeira candidatura ao Senado, quando havia três vagas, fui o segundo mais votado numa eleição majoritária, mas fiquei de fora. Não tomei posse, embora fosse o segundo mais votado, com três vagas, numa eleição majoritária. Só neste País mesmo podem acontecer coisas assim.

Depois que fui eleito Senador, tive, na televisão, durante o tempo de exposição partidária, a promessa de 20 segundos. Falei, então, que não queria, que podiam socializar os meus 20 segundos, porque não aceitaria falar nesse tempo. Então, disseram que eu teria um minuto. Com esse tempo, estaria bem. Fui lá e gravei por um minuto, mas cortaram, deixando-me no ar por apenas 20 segundos. Se somarem milhares de fatos como esse, entenderão por que não sou mais do Partido dos Trabalhadores.

E, na última pesquisa de opinião, publicada na minha terceira e vitoriosa candidatura, o que aconteceu? Não apareci entre os 20 candidatos ao Senado mais votados. Dez dias depois, fui o primeiro mais votado. Repito: 20 dias antes, as pesquisas não me colocavam entre os 20 candidatos mais votados, e fui o primeiro na apuração das urnas e não nas contas ladravazes desses institutos comprados.

Muito mais experiência, muito mais sofrença, tem o Senador Pedro Simon do que eu; portanto, tem toda razão em estranhar esse fato a que estou reportando-me.

No entanto, diante do sugestivo leque aberto aqui, com a maestria que possui o Senador Pedro Simon, até me desviei de possíveis assuntos que trataria desta tribuna.

Gostaria de fazer aqui, porque me está incomodando, uma declaração e um esclarecimento a respeito do ponto de vista que externei, quando a Casa era presidida pelo Senador Antonio Carlos Magalhães. A cadeira da Presidência não se havia transformado ainda em cadeira elétrica. Quem senta ali é torrado.

Cuidado, Sr. Presidente! Que sua passagem seja rápida por aí! Esse lugar é perigosíssimo.

Naquela ocasião, tive oportunidade de fazer três discursos - é pena que o filho de S. Exª não esteja aqui -, nos quais procurei mostrar o caráter dual do poder no Brasil. E esse dualismo foi ocupado, em uma de suas partes, em um dos seus pólos, pelo então Presidente Antonio Carlos Magalhães, que, no Brasil, já sofreu outras formas de dualidade, de repartição do poder, de divisão da ditadura.

Eu disse a ele três vezes: “O Presidente Fernando Henrique Cardoso não é um ditador. O que existe no Brasil é uma ditadura compartilhada. O Presidente Fernando Henrique Cardoso é meio ditador, e V. Exª é 50% ditador”. Falei isso três vezes, aqui desta tribuna. E falei mais, sem ter bola de cristal e sem que algumas pessoas acreditassem na possibilidade de o futuro ser apenas partejado, nascido do presente. Basta olhar o presente, diz Leibniz, para percebermos qual é o futuro, porque este é o desdobramento do presente. Desse modo, não é mágica, não é dom divinatório antever, dentro de certos limites temporais, sem data - a data é impossível, do meu ponto de vista -, o que vai acontecer.

Então, eu disse nesses três pronunciamentos: na hora de separar essa unidade que contém a diversidade entre Antonio Carlos Magalhães e Fernando Henrique Cardoso, na hora de separar os irmãos siameses, xifópagos - essa foi a palavra que usei -, vai haver problema. A operação de separação de irmãos siameses costuma ser um desastre, já que, às vezes, eles têm em comum um fígado ou um pulmão.

Já no término do período do Senador Antonio Carlos Magalhães na Presidência do Senado Federal, ninguém queria ser candidato e receber o seu apoio. E havia, pelo PMDB e por outras correntes, a candidatura do Senador Jader Barbalho, uma candidatura que polarizou violentamente, até mais do que o decoro Parlamentar que talvez permitisse, com o Presidente de então, Antonio Carlos Magalhães.

Pois bem, de repente, não mais que de repente, o outro ditador quis ocupar o espaço todo, quis ser o ditador exclusivo e, ao invés de esperar o término do mandado na Presidência do Senado do Sr. Antonio Carlos Magalhães, ele, Fernando Henrique Cardoso, se tomou de um açodamento infanto-juvenil, ficou alucinado com o que estava ocorrendo com a participação do Presidente Antonio Carlos Magalhães, que, por mais que fosse criticado e criticável, eu tinha de reconhecer nele uma qualidade: ele preservou o espaço do Legislativo, ele preservou o espaço do Senado Federal. E eu ficava preocupado: será que o sucessor dele vai ter as qualidades necessárias para que isso ocorra, para dividir a ditadura, ter uma parte da ditadura, colocar os limites impostos a uma personalidade que não respeita a Constituição, que não respeita a ética, que não respeita os limites do período eleitoral, que ampliou para a reeleição? E acho que ele é o candidato dele mesmo a um terceiro mandato, a não ser que fique evidente que a opinião pública já não o suporta mais.

Naquele momento, o que acontece? O Presidente Fernando Henrique Cardoso quer ocupar o espaço todo e se torna um inimigo figadal do Presidente Antonio Carlos Magalhães. Dá o apoio incondicional ao candidato Jader Barbalho. Obviamente, esse açodamento do jovem Presidente da República - por isso que, entre outras coisas, o candidato Pedro Simon, com 71 anos de idade, dá mais essa tranqüilidade, caso seja eleito Presidente da República - a pressa de ocupar o palco inteiro, o espaço inteiro do poder fez com que ele, o Presidente da República, continuasse a intervir e pudesse intervir, como sempre fez, no Poder Legislativo e no Poder Judiciário, a não ser quando encontra lá algum Marco Aurélio de Mello, alguns presidentes que defendem a dignidade, a integridade e o Poder Judiciário no Supremo Tribunal Federal.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Permite-me V. Exª um aparte?

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Só um momento, Senador, pois estou terminando a minha tentativa de colocar a minha visão desses fatos.

Muita gente achou que eu ia votar contra a cassação do Presidente Antonio Carlos Magalhães, porque eu sempre reconheci nele alguém que pelo menos esse grande papel estava exercendo. Eu não vim aqui elogiar, fazer encômios, como partidos de oposição fizeram. Quando ele lançou, por exemplo, os R$180 de salário mínimo, eu lembrei, entre outras coisas, que o Dieese, órgão que orientava o PT, havia colocado R$1.030. Citei, entre outras coisas, também que uma pesquisa feita no Japão, em 1995, detectou que um cachorro japonês gastava, em média, com alimentos, remédios, massagens, banhos relaxantes e passeios US$360 por mês. Eu falei isso aqui quatro vezes. E partidos que se dizem socialistas e que choram pelo social, lágrimas de crocodilo, propõem seguir os R$180 que o PFL, via Antonio Carlos Magalhães, havia lançado.

De modo que ele viu, escutou as minhas críticas aos R$180. Que dirá os R$151! A Dona Teresa Ter-Minassian, empregada do Fundo Monetário Internacional, falava que o Brasil não podia colocar como seu piso salarial mínimo se não R$151. A Dona Teresa Ter-Minassian! Nem era o Michel Camdessus ou não sei quem lá do FMI, um pezzo grosso do FMI. Foi a Dona Teresa Ter-Minassian.

Pois bem, só para terminar, nesse açodamento, nesta volonté de puissance do Presidente francês, digo, Presidente brasileiro Fernando Henrique Cardoso, houve uma vontade grande de se apoderar também do Legislativo ou influenciar muito mais no Legislativo do que ele estava fazendo, com as inúmeras medidas provisórias, com a compra de votos para a reeleição, por exemplo, e outros disparates equivalentes.

Assim, não tendo conhecido, escolhido o candidato, ele se transformou no maior cabo eleitoral do Presidente atual Jader Barbalho, elegendo-o e influenciando também na cassação ou na defenestração do Sr. Antonio Carlos Magalhães.

Bem, então ele tem 90% da responsabilidade de estarmos há seis meses parados, fingindo que estamos trabalhando aqui neste Senado. Quem é o responsável de toda essa confusão que se criou? Para mim, o primeiro responsável é "sua majestade" o Presidente da República Fernando Henrique Cardoso.

Concedo, com satisfação, o aparte ao eminente colega Senador Pedro Simon.

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - V. Exª está fazendo um pronunciamento da maior importância, e só me atrevo a fazer o aparte porque quero colaborar com V. Exª e dar o meu depoimento sobre esse fato histórico. Essa operação que aconteceu na eleição da Mesa e na cassação do Sr. Antonio Carlos foi um esquema - olha, é difícil encontrar o termo - preparado pelo Senhor Fernando Henrique Cardoso. O Senhor Fernando Henrique Cardoso e parte do PFL não suportavam o Sr. Antonio Carlos; aquele grupo de Marco Maciel, do Bornhausen, o Líder na Câmara, o Líder aqui, que tocavam por música. De repente, veio o Senador Antonio Carlos e implodiu tudo, ficou dono sozinho, levando o partido para um caminho muito complicado. E o Senhor Fernando Henrique tinha dados que diziam que sua queda frontal nas pesquisas, no ano passado, devia-se mais ao deboche, à ironia de Antonio Carlos sobre ele, do que a todo o PT, CUT e companhia. Então, ele queria se ver livre de Antonio Carlos. O que ele fez? Primeiro, a eleição do Senador Jader Barbalho. O Senador Antonio Carlos, na sua vaidade, disse: “Eu veto o Jader Barbalho. Tem que ser o Sarney.” E nos deixou em uma posição de constrangimento, porque ele queria ser o dono da Pátria. Naquela altura, como diz V. Exª, ele era 50% ditador. A Bancada do PMDB se reuniu, e o Senador Jader Barbalho fez uma exposição enorme, de muitas horas, mostrando que tinha razão. E a Bancada do PMDB, por maioria, votou nele, mas quase com a convicção de que o PSDB não votaria. O PMDB cumpre a sua parte e deixa para o PSDB fazer o resto. O que acontece? O Presidente Fernando Henrique determina ao PSDB que vote em Jader Barbalho, e, para surpresa de todos, no meio de todas aquelas manchetes, o PSDB fecha com o Senador Jader Barbalho. A partir daí, o Senador Antonio Carlos procura o PT para fechar com uma candidatura do próprio PT. Apoiaria o PT aqui, e o PFL apoiaria Inocêncio Oliveira na Câmara. Mas o Senhor Fernando Henrique veta. O PFL só poderia votar em candidato da base, não em candidato de fora da base. O que faz então o Senador Antonio Carlos? Volta ao PT e pede, pelo amor de Deus, que votem em alguém, que poderia ser o Senador de Minas Gerais, para derrotar o Senador Jader Barbalho. Mas o PT não aceita. Vai-se para a votação. O Senhor Fernando Henrique Cardoso trabalha, coage, pressiona Senadores do PSDB que não queriam votar no Senador Jader Barbalho, e no próprio PMDB força para que votem no Senador Jader Barbalho, que foi eleito. O Senhor Fernando Henrique age também na Comissão de Ética, pressionando o PSDB a votar favoravelmente à abertura do processo de cassação do Senador Antonio Carlos Magalhães. E o próprio PFL, à exceção dos dois Senadores da Bahia, também votaria favoravelmente na questão fundamental. Por 15 votos a dois é aprovada a abertura do processo de cassação. Eu estava na Comissão de Ética e vi a ação do Governo no PSDB e no PFL, forçando a cassação do Senador Antonio Carlos Magalhães, que veio a renunciar para não ser cassado. O Senador Jader Barbalho ficaria, então, como Presidente do Senado, seria a grande vedete. Dois dias depois, o Banco Central lança um terceiro relatório que já estava na gaveta. Se aquele relatório tivesse sido lançado antes, o Senador Jader Barbalho nem teria sido candidato à Presidência. Por que então o Senhor Fernando Henrique deixou que aquele relatório saísse apenas depois da eleição do Senador Jader Barbalho para a Presidência desta Casa? Porque foi macabro. Destruiu os Senadores Jader Barbalho e Antonio Carlos Magalhães, além de desmoralizar o Senado. Foi o grande responsável por uma das nossas páginas mais tristes, onde somos humilhados pelo Senhor Fernando Henrique Cardoso. Meus cumprimentos ao pronunciamento de V. Exª.

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Agradeço muito o aparte de V. Exª, que veio corroborar todo o meu juízo. Eu, independentemente de partido ou de interesse pessoal, nunca exerci a liderança do meu partido quando tinha direito disso e nunca fui diretor nos 36 anos que lecionei na Universidade de Brasília. Em certo momento, havia 32 PhDs, somente eu era titular. Nunca exerci função nenhuma e, portanto, nunca fui responsável pela determinação de receitas e de despesas. Se nunca roubei, não há muita vantagem nisso, porque nunca tive dinheiro sob a minha responsabilidade, nunca fui testado, porque fui professor, e exclusivamente professor, de sala de aula e biblioteca durante a minha vida inteira.

Assim, V. Exª tem toda razão ao dar-me razão, porque não pode haver duas pessoas com óticas não tão idênticas que examinem esse processo com isenção, como V. Exª e eu, e acabem por concordar em vários pontos.

O que não se sabia - ou não queriam saber - é que essa separação dos irmãos siameses seria o desastre que foi: o Presidente Fernando Henrique Cardoso, principal eleitor do Senador Jader Barbalho - não sei em que momento ele se arrependeu...

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Na minha opinião, ele não se arrependeu em momento nenhum, já está precavido: “Livro-me do Senador Antonio Carlos, elejo o Senador Jader Barbalho Presidente do Senado, publico o relatório do Banco Central, queimo o Senador Jader Barbalho e desmoralizo o Senado”.

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Penso que essa antecipação de V. Exª é impecável. Realmente, sabiam que o Legislativo seria invadido, desmoralizado, paralisado; uma paralisia geral, já falei disso aqui antes. Entramos em recesso. Recesso do quê, se não chegamos a trabalhar?

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - E abrimos os trabalhos. Trabalho do quê, se não estamos trabalhando?

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Portanto, a invasão do Legislativo, principalmente do Senado, foi uma invasão praticada com essa arrogância, com esse poder, com esse poderio de fogo tão grande que nem o cavalo de Átila poderia conquistar de uma forma tão arrasadora a Presidência do Senado, essa cadeira que se transformou em uma cadeira elétrica. Muitos Senadores estão com medo de sentar-se nela e em outras cadeiras relevantes, como, por exemplo, a cadeira da Comissão de Ética, que também parece-me que há alguns fiozinhos; não sei qual a voltagem.

Senador Pedro Simon, meu pai foi professor universitário a vida inteira, ele só foi isso, com exceção de dois períodos em que foi deputado. Basicamente, nasci em uma universidade e não queria nada na vida a não ser ser professor universitário - a universidade não se havia decomposto como ela se encontra hoje; ela era outra coisa. Eu não tinha motivo algum, portanto, para não admirar o Presidente Fernando Henrique Cardoso quando ele não era político ainda. Depois ele se transformou em político e mandou esquecer tudo, mas eu havia pago os livros dele, gasto horas e horas estudando os seus livros. Devolva-me as horas que perdi e o dinheiro que gastei; não é assim, esqueçam tudo, não!

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Procon nele!

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Aí começaram as minhas decepções com o Presidente Fernando Henrique Cardoso. Não tenho ira alguma, ódio, rancor contra ele, mas uma grande e profunda decepção, porque o conhecimento que ele tinha do processo, do capitalismo subdesenvolvido e periférico, a consciência que ele tinha dos nossos problemas não lhe permitiriam fazer um desgoverno entreguista, antinacionalista, destruindo todo o aparelho de Estado, destruindo o parque industrial, fechando empregos e causando o empobrecimento, com mais essa dose de FMI nas nossas costas descarnadas, com as nossas costas emagrecidas. Então, é óbvio que não gosto dele. Mas não é por isso que eu faço uma análise crítica a respeito do comportamento dele, perturbando inteiramente a atividade parlamentar ao impor esse cabresto...

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - V. Exª me permite, Senador Lauro Campos?

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Pois não, cedo com prazer.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Primeiro, peço à Mesa que prorrogue a sessão por, pelo menos, uns 15 minutos, para que V. Exª conclua o seu discurso e eu possa fazer o registro do aniversário da morte do Sociólogo Herbert de Souza; e, segundo, para também poder aparteá-lo, ainda que brevemente.

O SR. PRESIDENTE (Pedro Ubirajara) - A Presidência atende a Senadora Marina da Silva e prorroga a sessão por 15 minutos, a fim de que o Senador Lauro Campos possa concluir o seu discurso, o que, aliás, está nos trazendo grande prazer.

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Muito obrigado. Mas eu não vou usar muito do tempo.

Concedo o aparte à Senadora Marina Silva.

A Srª Marina Silva (Bloco/PT - AC) - Senador Lauro Campos, achei o raciocínio de V. Exª e do Senador Pedro Simon bastante elucidativo, bem como a análise do que aconteceu aqui durante esses últimos meses, envolvendo o ex-Presidente do Senado e o atual Presidente, afastado, e todo o desgaste que a instituição está atravessando. Agora, espero que o ponto de vista que quero trazer aqui não seja compreendido como em socorro ao Presidente Fernando Henrique Cardoso. Entendo, até, que todo esse maquiavelismo - se é que podemos falar assim - pode ter acontecido. Mas nós, também, não podemos perder de vista que esses acontecimentos ou uma ação maquiavélica não poderia ocorrer se não tivéssemos problemas, aqui, dentro da Casa; se o Senador Antonio Carlos Magalhães, juntamente com o Líder do Governo, o Senador José Roberto Arruda, não estivessem envolvidos no episódio da violação do painel e se o Presidente Jader Barbalho não tivesse todo o envolvimento que nós estamos observando e que estão vindo à tona, tanto no caso da Sudam como no caso do Banpará - todos esses processos lamentáveis. Então, o que aconteceu é politicamente criticável e a identificação e a análise que V. Exªs acabaram de fazer é brilhante. Mas nós também temos que resgatar a responsabilidade. Por que não fizeram isso com V. Exª, que, como já disse, nunca administrou dinheiro, com o Senador Pedro Simon e com outras pessoas? Porque não existiu o fato. Então, a melhor forma de não ser usado para tais fatos é, realmente, não os praticar. E, se tudo isso for mentira, como sou uma mulher de fé, acredito que, quando se paga injustamente por um erro não cometido, acumula-se outros tesouros que não terminam aqui na terra. Mas eu quero apenas fazer esse registro, no sentido de que, lamentavelmente, nós tivemos uma ação externa ao Congresso, uma ação que tem todos esses matizes que V. Exªs acabaram de colocar e que são criticáveis, não desejáveis; manobras com as quais jamais poderemos concordar. Porém, o processo interno da Casa, realmente, precisava fazer toda essa depuração e lamento muito que todo esses episódios estejam desgastando a instituição. Mas se as pessoas não tivessem praticado erros que levassem à desmoralização da instituição, a menos que uma mentalidade diabólica começasse a caluniar todo mundo, isso não estaria acontecendo. Entendo que as duas coisas são abomináveis. Não estão isentos aqueles que, de forma maquiavélica, podem ter agido de forma desleal, como também os que, por erros praticados, deram margem a que tudo isso acontecesse e estivéssemos vivendo hoje essa crise.

O SR. LAURO CAMPOS (Bloco/PDT - DF) - Nobre Senadora Marina, quase sempre concordo com os pronunciamentos tão equilibrados de V. Exª, mas, desta vez, não posso concordar. Não se trata de julgar. Nunca julguei ninguém, não gosto de julgar as pessoas. Essa questão de ética também é muito difícil. Estudo isso há tantos anos... Qual será realmente a essência da ética? Eu poderia agora, neste término rápido do meu pronunciamento, dizer que a ética, no sentido diário do comércio dos homens, das relações humanas normais, talvez fosse apenas regida por aqueles princípios da antiga sabedoria romana que afirmava que o supedâneo desse comportamento ético estava em dar a cada um o que é seu (suum quique attribuere), viver honestamente (honeste vivere) e não lesar o próximo (alterum non laedere). Se esses princípios fossem seguidos, estaríamos dentro de padrões éticos aceitáveis.

Mas a questão da ética é muito mais sutil do que isso. Não posso concordar com Emmanuel Kant, que afirma que devemos agir de tal maneira que a nossa conduta individual possa se transformar numa norma universal de comportamento. Esse é o imperativo categórico kantiano, prático. Devemos agir de tal maneira que a nossa ação possa se transformar numa norma universal de conduta.

Sem entrar, sem aprofundar a ética do poder e as relações entre a ética e a política, entendo que aqui não analisei, não falei nada a respeito do que veio acontecer com o Senador Jader Barbalho, o que apareceu e pode aparecer, levando-o até mesmo à perda de seu mandato. Não falei nada disso, não quero julgá-lo, por enquanto, e não preciso julgá-lo quando menciono as relações espúrias entre Fernando Henrique Cardoso e o Senado Federal. Refiro-me à ocasião em que Sua Excelência, ignorando o funcionamento e a administração da Casa, apresentou seu candidato para derrotar aquela pessoa por quem Sua Excelência encheu-se de ódio, o Senador Antonio Carlos Magalhães.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, com ódio não se pode fazer justiça. Com ódio na cabeça e com o fígado carregado, não se pode dirigir uma ação ética, uma ação que dê bons resultados. Um dos princípios do Direito é que a pena não pode ultrapassar a pessoa do criminoso. E agora, o que aconteceu? O meu companheiro, o meu amigo de Belo Horizonte, o Paulo de Tarso Flecha de Lima, uma pessoa que vi dar saltos fantásticos na sua juventude, foi o mais jovem a ingressar na carreira do Itamaraty, não precisou fazer o curso Rio Branco, foi logo o mais jovem Primeiro-Secretário, uma carreira brilhante, preocupada com os interesses nacionais. Ele estava lá, na Embaixada Brasileira em Roma, aos 68 anos, com a saúde prejudicada por acidentes somáticos, e foi simplesmente demitido. A raiva fez com que não se enxergasse aquela brilhante carreira que Sua Excelência apreciou e freqüentou até muito pouco tempo atrás.

Foi demitido sumariamente da Embaixada em Roma, porque era muito amigo do Senador ACM. O ódio não se satisfez com a cassação, com a retirada da presidência, com os Ministérios que foram recolhidos por "sua majestade" o Presidente da República. Nada satisfez ainda. Tinha ódio até o fundo da alma e esse ódio foi lançado injustamente contra quem tinha sido Embaixador nos Estados Unidos, na Inglaterra e prestou relevantes serviços ao Brasil. Nada valeu. Paulo Tarso foi demitido, porque havia se solidarizado com um amigo.

A solidariedade a um amigo é uma virtude. Tem que ser reconhecida mesmo entre inimigos, quando um se solidariza com o outro. Isso é óbvio. Porque o Embaixador Paulo Tarso foi solidário com o seu amigo Antonio Carlos Magalhães ele pode ser demitido da Embaixada em Roma aos 68 anos de idade?

Não tenho dúvidas de que não estou cometendo nenhuma injustiça para com "sua majestade" o Presidente da República. Conhecemos a sua atuação no Congresso Nacional de há muito tempo, desde quando comprou o voto de alguns Deputados na ocasião da reeleição a R$200 mil cada. Não é calúnia nem injúria. Isso foi confessado. Não faço calúnia, injúria nem fofoca. Se falo, tenho certeza do que estou falando. Abro mão da minha imunidade parlamentar se quiserem me processar por injúria, calúnia ou difamação. Muitas coisas que tenho falado são perfeitamente corretas.

O que aconteceu foi um episódio muito lamentável e que entre outros efeitos secundários paralisou o Senado Federal durante esses últimos sete ou oito meses. Nesses seis anos que estou aqui, esta foi a primeira vez que houve um recesso de trinta dias, que veio na hora certa para jogar uma água fria na efervescência provocada por essas ações, por esse comportamento que, de início, privilegiaram o Presidente atual Jader Barbalho e, agora, obviamente, estão se voltando contra S. Exª.

Os Senadores do Governo já estão retirando - todos os jornais publicam isso - o apoio ao Senador Jader Barbalho. Está, mais uma vez, voltando ou traindo o caminho que antes havia percorrido.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/08/2001 - Página 16389